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A arte, a cisão e a unidade
Hölderlin, poeta alemão citado e elogiado por Heidegger, também manteve intimidade com a filosofia, em um de seus escritos pouco conhecido contestou o “eu absoluto”, mas é preciso questionar também um “nós” preciso a uma bolha, a um mundo hierarquizado e estilizado, na perspectiva do poeta a consciência sem objeto seria inconcebível e todo juízo pressupõe o mundo, o que é muito próximo da consciência de algo que a fenomenologia propõe.
Os princípios teóricos de uma filosofia da história, muito próxima a visão da consciência histórica de Gadamer, foi elaborada como divida em três épocas: a unidade, a cisão e a recuperação da natureza (sob a forma da naturalidade da arte), porém Hölderlin tratou também do aórgico, e poder-se-ia pensar na real recuperação da natureza, em tempos pandêmicos parece dar um respiro: peixes, pássaros e animais reaparecem, o ar está mais leve e parece que a natureza agradece.
A cisão, que faz com que o homem se veja diante de tantas contradições e desigualdades, é também disse Rousseau, uma condição de liberdade, entretanto ao se deparar com indignidades e injustiças esta condição parece estar ameaçada, o poeta lançava mão da poesia como uma “contraposição harmônica” entre o eu e o mundo, porém reivindica um terceiro, poético e harmônico no qual que habita o mundo dos textos como supôs Roland Barthes, diz em sua poesia Metade da Vida:
Onde se é inverno, achar as flores, e onde a luz do sol e as sombras da terra?”
No final restam somente “muros e bandeirolas ao vento”
O próprio poema é metade que não se completa sem o leitor e o mundo.
É também incerteza, conforme esta bela imagem da “canção do destino de Hipérion”:
“como água de penhasco em penhasco lançada incessantemente no incerto”.
A canção de destino de Hipérion diz:
Andais lá em cima na luz
Em chão macio, gênios felizes! Cintilantes brisas divinas
Tocam-vos de leve
Como os dedos da artista Cordas sagradas.
O que Hölderlin me inspira é a diferenciação entre o pensar e o filosofar, Heidegger também descartou o segundo, no caso do poeta sua vida e obra ocasionam relações entre o pensamento e a poesia, e esta sim, numa relação nova com a filosofia propõe um terceiro, não há mais poetas logo filósofos também não.
O mal estrutural e simbólico
Estando claro que não se trata da luta do bem contra o mal, mas a ausência do bem ou a banalidade do mal, existe então uma noite no ocidente que não pode ser desvelada se ficamos na superficialidade ou na “frivolidade” como apontam alguns autores, o bem é frágil, mas não frívolo.
Para entender o problema do “mal simbólico” tratado por Paul Ricoeur, deve-se olhar suas bases na fenomenologia eidética de Husserl e na filosofia existencialista de Gabriel Marcel, sua busca é o que dá sentido à liberdade (a visão moderna do livre-arbítrio) e a relação de reciprocidade entre a experiência voluntária e involuntária humana, isto é essencial para entender o mal simbólico.
A aparição original da questão da consciência (de algo) vem da ligação que Franz Brentano faz ao retomar a subcategoria intencionalidade, que rompia a identificação cartesiana entre consciência e autoconsciência, onde intencionalidade revela-se primeiro voltada ao exterior e assim está projetada para fora com orientações objetivas que vão desde a percepção e imaginação até a vontade, a afetividade e a apreensão de valores (destaca-se a empatia).
O que é voluntário e involuntário depende desta “grande tese”, enquanto Husserl operava na consciência à análise da percepção e dos atos “representativos”, Ricoeur alargou para as esferas do afeto e da vontade.
Assim o que é voluntário está na alternância entre o impulso vibrante da emoção e o ponto de vista do hábito, enquanto o involuntário “absoluto” (simbólico ou estrutural) fica sob aquilo que chamou de caráter (não no sentido moral, mas no de “característica”).
O ponto de apoio que tem na filosofia existencialista de Gabriel Marcel, sem abandona a “análise eidética” é a problemática de um sujeito capaz de distanciar de desejos e poderes, dono de suas ações (e assim voluntárias) e servo das necessidades do inconsciente, o caráter, zona não revelada na consciência real e na vida, embora pareça fica fora das competência do concreto, do histórico, ou do que chama de ocasião, é o reino empírico da vontade, vista em três momentos.
A primeira é a decisão humana resultado de um projeto para o mundo (aquilo que Heidegger mudará para visão de mundo), a ação comporta tanto a dimensão de um projeto com os outros no mundo, como pessoal ou subjetiva, entretanto não as separada e chama-as de corpo, e o corpo é visto tanto como voluntário quanto involuntário, mas há um “consentimento”.
Assim Ricoeur mostra os exageros do idealismo, e torna o “hábito” de tal forma a habitá-lo e torná-lo habitável, e o que o autor aponta que o homem pode falhar (sua obra O homem falível, da década de 60), e a culpa constituída e à consciência dela são expressas nos símbolos da cultura.
Afirma importância da linguagem mítica para tratar esta simbólica, assim a parábola do joio e do trigo (Mt 13,24-29), que afirma que a semente “boa” do trigo floresce junto com o joio (que deverá depois ser descartado), há três situações: a semente que cresce, a que é sufocada pelo joio (simbolismo do mal) e a que cai entre as pedras e não tem raízes (o caráter de Ricoeur seria isto).
RICOEUR, Paul. A simbólica do mal (H. Barros & G. Marcelo, Trad.). Lisboa: Edições 70, 2013 (Original publicado em 1960).
Ascese, virtudes e ascensão
A palavra vem do grego ἄσκησις, se diz áskesis, um “exercício espiritual”, que significa o controle das punções e emoções, um caminho virtuoso, cuja prática leva a um caminho de subida, enquanto o contrário leva as paixões e punções desordenadas podendo levar ao vício e a morte.
Na modernidade isto se modificou profundamente, a ideia que a liberdade tudo pode e que não devemos limitar o prazer e as paixões levou a uma decadência humana, em seu lugar foi colocada uma “vida de exercícios” conforme explica Peter Sloterdijk (que não é religioso) a antropotécnica.
“Como exercício defino qualquer operação que conserva ou melhora a qualificação do ator para realizar a mesma operação da próxima vez, seja ela declarada como exercício ou não” (Sloterdijk, 2009, p. 14), é a definição de Sloterdijk em seu livro “Você pode mudar sua vida”, sem tradução para o português.
Esta é assim uma ascese desespiritualizada, portanto tanto pode levar a virtude quanto ao vício, inclusive no âmbito religioso, se não há de fato uma elevação espiritual, no campo da leitura teológica ou filosófica significa uma propedêutica (iniciação) que leve a hermenêutica, que leve a uma fusão de horizontes e uma vida de co-imunidade (outro conceito de Sloterdijk.
Tanto a leitura que não eleve o sentido de vida, o Lebenswelt de Husserl, quanto a pregação ideológica impregnada de idealismo filosófico não representam uma elevação, não há nela qualquer aspecto de contemplação e elevação espiritual, apenas uma “vita activa”, aquilo que Byung Chul Han chama de Sociedade do Cansaço, sem ela não haverá vida saudável e elevada.
Em termos cristãos a verdadeira ascensão é aquela que foi presenciada pelos apóstolos, e que as igrejas cristãs históricas comemoram nesta semana, as Ascensão do Senhor (na foto pintura em Azulejos em Barcelos, Portugal), que os evangelistas assim descrevem (Mc 16,19): “E o Senhor Jesus, depois de ter-lhes falado, foi arrebatado ao Céu e sentou-se à direita de Deus”.
Mesmo os que não creem devemos em tempos de pandemia exercitar a fraternidade e o desejo e o esforço que tudo isto passe para que em situações parecidas no futuro estejamos mais conscientes.
Sloterdijk, P. Du musst Dein Leben ändern. Über Antropotechnik. Frankfurt, Suhrkamp, 2009.
Entre a essência e o Ser
Como o dualismo permanece presente hoje, se concebe a essência por analogia ao Ser, e esta também era a doutrina tomista, ela permaneceu como uma onto-teologia até o século XX, foi preciso todo um percurso da fenomenologia para encontro o Outro, o não-Ser não como contradição, que o fim do dualismo entre Ser e essência iniciasse.
A longa discussão do período medieval entre realistas e nominalistas, tinha como base um termo hoje desconhecido que era a quididade, que significa que coisa a coisa é, desde a hylé grega até os modelos modernos da metafísica de Heidegger, onde a coisa que pode ser material ou não, e também o que pensamos sobre ela, na linha de Husserl só existe consciência de algo, ou da coisa.
Mas existiu um filósofo na idade média, Duns Scotto (1266-1308) que não fazia distinção entre a coisa que existe (si est) e o que ela é (quid est), e teologicamente era complicado pois a tese de Tomás de Aquino (1225-1274) era pela analogia, ou seja, o significado de semelhança entre coisas ou fatos (dicionário Houaiss, 2009, p. 117), e os religiosos sempre apressados cuidado porque no século XX Duns Scotto foi aceito dentro da doutrina cristã católica, tornando—se beato (João Paulo II o declarou).
A sua teoria do conhecimento usava as duas distinções conhecidas distinctio realis (distinção real) e existe entre dois seres da natureza, e a distinctio rationalis (distinção de razão) que se dá entre dois seres, mas na mente do sujeito que conhece, mas rompe o dualismo ao criar uma terceira possibilidade a distinctio formalis (distinção formal) que se dá no ente percebido e não é nem real e nem na mente.
Assim além de seu discípulo William de Ockham, famoso pelo princípio a simplificação chamado Navalha de Ockham, mas de certa forma Descartes, Leibniz, Hobbes e Kant tiveram sua influência.
Porém a recuperação de Duns Scotto é fundamental para superar o dualismo nominalismo/ realismo e a superação do puro realismo pelo hermenêutica filosófica, e assim também o correspondente moderno do nominalismo que é a viragem linguística faz sentido e abre diálogo.
Não é, portanto, a afirmação do realismo nem do nominalismo, mas o fato que podem dialogar dentro de um círculo hermenêutico é que importa, a recuperação filosófica do nominalismo na viragem linguística, e na fé cristã do nominalismo de Duns Scotto não é sua verdade, mas sua importância para o diálogo filosófico.
Em tempos de pandemia seria muito mais importante a fraternidade de socorrer vítimas, que o debate ainda incerto da ciência e das “crenças” que este ou aquele procedimento é certo, em ambientes hostis quem venceu foi a morte, assim dogmáticos e autoritários só atrapalharam.
A esperança Pascal
Se é preciso superar as divisões, talvez a maior delas seja entre a religião e a ciência, entre a teologia é a filosofia, entre fé e razão.
Mesmo aqueles que reconhecem.esta urgência, por vício e pelos anos dedicados a esta divisão caem em contradição.
Em tempos de pandemia que une todos os corações sinceros de amor a humanidade, tempo que ganhamos tempo para refletir longe da agitação da vida moderna talvez possamos nos abrir e unir a fé que dá esperança aos angustiados pelo medo e pelas mortes é a luta da ciência para superar o vírus.
A urgência também de medidas de proteção mais rígidas e de serenidade com as dificuldades presentes.
Ficar em casa significa também manter um tempo de “parada” que não quer dizer ócio, encontrar boas leituras, bons filmes e a indispensável conversa familiar, também as “mídias” de redes sociais podem ser bem utilizadas.
Revisão do blog e conteúdos
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Esclareço ainda que como todo blog, o conteúdo é opinativo, desenvolvido com conteúdos resumidos, o que necessariamente trás alguma dificuldade de profundidade ou elaboração, não devendo ser tomado fora deste contexto, assim textos científicos, livros e capítulos de livros tem um contexto mais amplo e com referências e conteúdos que devem, na medida do possível, serem verificáveis e confiáveis.
Blogs e microblogs são assim conteúdos restritos quando a abrangência, o sentido que o autor o faz é no sentido de apontar fatos e assuntos que devem ser levados ao público e que nem sempre a grande imprensa o faz.
Sendo até o momento de autor único, é sempre passível de revisão por outros.
Agnus dei de Josefa , Óbidos, sua principal Obra
Josefa d’Ayala e Cabrera, a Josefa d ́Óbidos (1630-1684), foi uma pintora barroca na cidade de Óbidos, sua principal obra foi Agnus Dei, cujo quadro está no museu de Évora.
O quadro “Cordeiro Pascal Agnus Dei” foi pintado entre 1660 e 1670 e se encontra no Museu de Évora, sendo uma de suas principais obras, mas fica para o próximo post.
O seu estilo barroco de natureza morta é característico do período chamado “Siglo d´Oro” das artes.
Havia um novo olhar sobre a natureza ao se integrarem floreiros, cenas de caça e representação de animais e natureza morta na pintura.
Forte influência Ibérica, entre eles de Francisco de Zurbarán, veja Natureza-Morta com Limões, Laranjas e uma Rosa de no estilo ibérico dos “bodegóns” e “floreros”, da época.
A influência cristã também está na obra, o que pode ser observado pelas uvas, dois ramos de trigo abaixo e detalhes das folhas das parreiras, além do próprio Cordeiro.
O que devemos fazer
A aporia dos gregos, a impropriedade (eu traduzo como irrazoabilidade) de Heidegger, o medo e a fragilidade de Martha Nussbaum, podem todos serem compostos em um suco que ajude a olhar para frente o momento atual, com serenidade e esperança.
Antes do advento do nascimento de Jesus, o Natal tem este significado simbólico mais profundo, esperamos uma “salvação” e ela deve ser concreta, João Batista pregava no deserto e a multidão que o seguia tinha apreensão e angustia, perguntavam-lhe: “Que devemos fazer?” João respondia: “Quem tiver duas túnicas, dê uma a quem não tem; e quem tiver comida, faça o mesmo!” (Lucas, 3,11).
Iam para lá também cobradores de impostos, os corruptos de hoje que sujam toda a saúde financeira do estado, este é o protesto na França, e parece que também Teresa Mey no Reino Unido começa a dar sinais de fraquezas, a virada conservadora mostra sua impotência.
O que devemos fazer, não perder a solidariedade, a fraternidade, e que o espírito do advento do natal nos ajude naquilo que deve “advir” e virá, mas é preciso mentes e corações fortes.
O sentimento de morte, e até de certo abatimento nos corações desejosos do futuro podem estar presentes, mas não devem significar rendição nem paralisia, mas sim Aporia.
É preciso estar aberto ao novo, e desenvolver a solidariedade denunciando a violência e os abusos sociais, o prêmio Nobel o médico Denis Mukwege que socorre vitimas de abusos no Congo e que denuncia a violência ignorada pelo ocidente que acontece em seus pais, junto com Nadia Murad ativista contra o abuso sexual de mulheres, que foi ela própria vítima de violência dos
Denis Mukwege elogio o bom uso das novas mídias para denunciar estes fatos que a grande imprensa ignora ou torna-os menos graves do que são, assim a mudança digital, a inteligência artificial, a informação e a comunicação estão aí não para atrapalhar, mas para ajudar isto.
Os exemplos de Denis Mukwege e Nadia Murad nos servem para vencer o medo e seguir em frente, as mudanças que todos esperam virão com nosso empenho sereno e decidido.
A verdade que realmente liberta
É comum se instrumentalizar a verdade para favorecer nossa opinião, nossa “doxa”, um certo exagero ou um pequeno detalhe mentiroso, ou mesmo uma distorção dos fatos, isto nada tem a ver com a episteme ou com a busca sincera da verdade.
A verdade que liberta, portanto, jamais é instrumentalizada, ela é uma abertura ao outro, um escutar atento além de nossos pré-conceitos, nunca é unilateral, é capaz de penetrar no círculo hermenêutico, nas razões além de nossos egos e vaidades.
Assim a pós-verdade e a ignorância da “opinião” ou a doxa que contribui com ela e cria verdadeiras torcidas, de certa forma todas religiões fundamentalistas de uma forma ou outra, só pode ser superada com o diálogo a luz dos fatos, a aceitação mutua de pré-conceitos e a abertura para novos aspectos que surgem a partir da fusão de horizontes, eis o círculo hermenêutico que Heidegger e Gadamer procuraram explicar como método de chegar a verdade.
Ela é, portanto, ontológica, isto é nada tem a ver com a lógica formal, seja ela positivistas, neo-positivista ou puramente idealista, é uma lógica do Ser que admite o Outro, e sua visão de mundo e seus valores.
Estudiosos, exegetas e fundamentalistas pouco ou quase nada dizem do fato que Jesus nasceu, por isto o Natal é uma comemoração especial, e veio ontologicamente com seu Ser dar testemunho da verdade, pouco ou nada tem a verdade com a verdade lógica ou legalista de nossos dias, em João 18,37 ele afirma: “Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz”, e diz isto contrariando os fariseus e Pilatos, os fundamentalistas e a Lei no sentido stricto.
Potência e poder
Emponderamento é a palavra da moda, porém ao contrário de significar mais potencialização significa apenas mais poder e vontade de poder apenas.
Na filosofia quem mais o explorou foi Nietzsche que embora jamais tenda dado uma definição formal deste conceito é possível compreendê-lo como aquela vontade que todos temos de realização, ambição e esforço para alcançar a posição mais alta possível na vida.
Ainda que isto possa ser e em muitos casos foi confundida com potência, em alemão “Der Wille zur Macht“, a vontade de poder é a tradução que aqui usamos para Nietsche.
Significa que ainda restava em Nietzsche um resto de idealismo vindo da cultura grega, já que é possível uma leitura de potência como “virtus”, o virtual vindo do círculo virtuoso do exercício da potência sem nenhum idealismo, a semente é virtualmente a árvore e realizará sua potência de produzir frutos permanecendo como árvore.
Significa também que há um virtus irrealizável, que é a semente não querer ser árvore, e não é a possibilidade de sua negação, quer dizer o grão que morre e apodrece para dar origem a árvore, esta é a virtus verdadeira, mas o grão de trigo que desejaria ser outra coisa.
A passagem bíblica em que Jesus faz o milagre dos pães e pede que os discípulos recolham todas as migalhas, porque certamente logo aquele povo ia sentir fome de novo, há também a saída de Jesus para outro canto, porque após o milagre queriam proclamá-lo rei.
Lê-se em João 6,15 “Mas, quando notou que estavam querendo levá-lo para proclamá-lo rei, Jesus retirou-se de novo, sozinho, para o monte”.