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Arquivo para a ‘Linguagens’ Categoria

A eclipse de Deus

23 ago

O livro de Martin Buber com este nome trata como podemos encontrar na filosofia e na história da religião, desde os filósofos pré-socráticos até pensadores do século XX uma interpretação das crenças ocidentais, com ênfase na relação entre religião e filosofia, com a ética e a psicologia junguiana, o que valeu uma réplica de Jung e uma tréplica de Buber.

Vivemos como diz Buber num tempo da eclipse de Deus, como ao ver a Lua passar na frente do Sol, parece que ele não existe mais, quando de fato está encoberto, isto é curioso, porque a polêmica com Jung é causada por uma pergunta em uma entrevista sobre a existência de Deus, Jung respondeu: “Eu não preciso acreditar, eu sei” (Jung, 1977, p. 428).

Isto causou furor na época e até hoje livros como Deus: um Delírio (o titulo em inglês é The God delusion) encontramos uma citação na página 51, num livro que mostra as desilusões de Dawkins mais que os delírios dos que creem, principalmente aquilo que na filosofia se refere ao Absoluto, cujo auge da elaboração ocidental é o conceito abstrato do absoluto de Hegel.

O absoluto de Hegel que é uma articulação entre o objetivo e subjetivo dualista do idealismo, é uma singularidade de uma potência substancial, própria da subjetividade e do conceito como havendo uma substância universal, que através da abstração se efetiva na consciência de si e torna-se igual a essência, uma espécie eu eu-mesmo essencial.

O comentário posterior de Jung, expresso principalmente em uma carta a uma amiga que foi publicada, ele explica: “o que quer que eu percebo de fora ou de dentro é uma representação ou imagem … causada, como eu com ou sem razão suponho, por um objeto “real” correspondente. Mas eu tenho que admitir que a minha imagem subjetiva só é grosso modo idêntica ao objeto … nossas imagens são, em regra, de alguma coisa … a imagem-Deus é a expressão de uma experiência subjacente de algo que não posso alcançar por meios intelectuais …” (Jung, 1959).

A resposta de Jung, sem que a articule de modo implicitamente filosófico é uma resposta ao subjetivismo idealista, ela não se alcança por meio da razão, é um objeto de fé, de crença e quem a tem a possui dentro e fora sendo ao mesmo tempo subjetiva e objetiva.

A passagem bíblica que melhor ilustra este sentimento é aquela (Jo 15, 45-46): “O Reino dos Céus também é como um comprador que procura perolas preciosas. Quando encontra uma perola de grande valor, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquela perola”.

Jung, C.G. The Face do Face entrevista in C.G. Jung Speaking: Interviews and Encounters, Princeton, Belligen paperbacks, 1977, p. 424-439.

Jung, C.G. (1959), Letter to Valentine Brooke in C.G. Jung Letters, Volume 2, 1951-1961, edited by Gerhard Adler, (London: Routledge and Kegan Paul), pp. 525-526, 1959.

 

A modernidade e Deus

22 ago

Se é verdade que o discurso religioso de nossos dias atuais beira a insanidade, é verdade também que aquilo que a modernidade pensou e pensa de Deus é praticamente desconhecimento de presença na literatura não cristã.

Nascido de família de pastores luteranos Nietzsche não falou da Morte de Deus como pensam sua leitura rasa, não leram a Gaia Ciência onde o filósofo proclama “O homem louco – Não ouviram falar daquele homem louco que em plena manhã acendeu uma lanterna e correu ao mercado, e pôs-se a gritar incessantemente: ‘Procuro Deus! Procuro Deus!’?” e pode-se ler mais a frente: “Para onde foi Deus’, gritou ele, ‘já lhes direi! Nós o matamos – vocês e eu. Somos todos seus assassinos! Mas como fizemos isso? Como conseguimos beber inteiramente o mar? Quem nos deu a esponja para apagar o horizonte? Que fizemos nós, ao desatar a terra do seu sol? Para onde se move agora? Para onde nos movemos nós?’” está no §125.

Buscou na filosofia do oriente: Assim falou Zaratustra a mística perdida, mas sua obra o Nascimento da Tragédia tem passagens marcantes onde mostra a necessidade de compreensão desta forma de entender a vida, onde faz estudos sobre o apolíneo e o dionisíaco, onde o capítulo 5 se acredita que é de onde parte Heidegger para escrever a Origem da Obra de arte. 

Da Influência de Husserl nasceram as filosofias de Heidegger e Edith Stein, que depois se tornou mística, sendo judaica se tornou cristã e foi mártir na Alemanha Nazista, ainda sobre a influência de Heidegger está Hannah Arendt, cuja tese de doutorado é “O amor em Santo Agostinho”, ainda que existam lacunas que seus contemporâneos atestam é uma boa leitura.

De Hannah Arendt nasceu as meditações sobre a Vitta Activa e Vitta Contemplativa, que o filósofo contemporâneo Byung Chul Han vai retomar em sua Sociedade do cansaço, não deixando de tocar na filosofia cristã de São Gregório de Nazianzo (ou Nazianzeno).

Ele foi fortemente influenciado por Peter Sloterdijk, que apesar de seu ateísmo, em todas suas obras a marcas profundas do conhecimento do pensamento cristão, reivindica o profeta Jonas para dizer que todos nós temos uma baleia (Jonas ao recusar sua missão foi devorado por uma baleia e devolvido a praia) e um pouco de Jonas, recusa a nossa missão neste planeta.

Byung Chul Han faz um diagnóstico muito atual, ele acrescenta que a “perda moderna da fé, que não diz respeito apenas a Deus e ao além, mas á própria realidade, torna-se vida humana radicalmente transitória” (Han, pag. 42).

Isto não é um problema a parte, é parte essencial do pensamento moderna, recusa do essencial, adoção do transitório, vida fugaz e frívola e de prazeres passageiros e ex-tásicos (extase, está fora, também pode ser transe).

HAN, B. C. A sociedade do cansaço. Petrópolis: Vozes, 2017

 

Entre o testemunho e o perdão: a cura

18 ago

A análise de Paul Ricoeur se o perdão pode curar vai da memória ao esquecimento, mas o autor esclarece que “no quadro da dialéctica mais vasta do espaço da experiência e do horizonte de experiência”, e lembra que Freud chama isto de “translaboração”, que significa ultrapassar a crença que o passado é fechado e determinado e o futuro é indeterminado e aberto.

Os fatos passados são inapagáveis: não podemos desfazer o que foi feito, nem fazer que o que aconteceu não tenha acontecido, mas é preciso lembrar que o testemunho de quem sofreu os fatos ou de quem os praticou pode e deve ser modificado, em função de “nossas lembranças”.

Não se trata do perdão, ou de construir nova narrativa, mas Paul Ricoeur relembra Raymond Aron em sua Introdução a Filosofia da História, como o que ele chama de “ilusão retrospectiva da fatalidade” e que ele opõe a obrigado do historiador de se transportar para o momento da ação e se fazer contemporâneo dos autores.

O autor sentencia: “toda memória é seletiva”, e lembra o autor “se poderia implantar o esquecimento da fuga, a estratégia da escusa, a tarefa da má-fé, que faz do esquecimento passivo-activo um empreendimento perverso”, assim não é só esquecer, mas re-ver.

O ponto do texto de Ricoeur onde pode ser inserido o testemunho é precisamente este no qual afirma, tentando conjugar perdão com trabalho e luto: “Ele casa-se com um e com outro. E, juntando-se a ambos, traz aquilo que em si não é trabalho, mas precisamente dom, O que o perdão acrescenta ao trabalho de lembrança e ao trabalho de luto é a sua generosidade”, diria então lembrando que “dom” tanto em francês (don, termo usado na obra de Marcel Mauss) ou em italiano donno, tem uma tradução difícil (dádiva?), mas seria mais próximo de gratuidade, não gosto de dádiva porque embora possa ter algo de divino, é um desapego de quem dá (o perdão) e é um testemunho.

Relembrando o mito adâmico bíblico, parece natural a morte, a vingança e a guerra, mas é o dom e o perdão que podem dar uma reviravolta civilizatória e construir a paz e a prosperidade.

RICOEUR, P. O perdão pode curar? Trad. José Rosa, Esprit, n. 210, 1995. (pdf)

 

Erro e perdão

17 ago

Do ponto de vista científico encontrar erros em métodos e análises significa mudar a rota e não a hipótese de pesquisa, se uma hipótese não se confirma isto é um resultado e não um erro, aliás para Popper é assim que a ciência caminha, porém outro pensador Thomas Kuhn defende que há rupturas ou novas hipóteses de pesquisa, a física quântica é um exemplo disto.

Já na filosofia a maioria dos filósofos defendem que o perdão é uma virtude moral, assim ele expressa a capacidade humana de superar o ressentimento e a vingança, e com isto restaurar as relações interpessoais e sociais, mas há filósofos que veem o perdão como fraqueza ou ilusão, já que nega a gravidade do mal e a responsabilidade do ofensor.

O filósofo contemporâneo que tratou o perdão foi Paul Ricoeur, que o desenvolveu sem se afastar do sentido religioso (cristão principalmente) e o vê como um paradoxo, pois vai de encontro ao imperdoável, ou seja, àquilo que não pode ser reparado ou compensado pela justiça.

O tema é relevante por que Ricoeur lembra que o tema se tornou relevante “particularmente característico do período pós-guerra fria, em que tantos povos foram submetidos à difícil prova de integração de recordações traumáticas” em texto publicado em Esprit, no 210 (1995), pp. 77-82 e que pode ser encontrado na Internet (pdf).

O autor coloca “o perdão na enérgica acção de um trabalho que tem início na região da memória e que continua na região do esquecimento” (Ricoeur, 1995), e que um fenômeno “que se pode observar à escala da consciência comum, de memória partilhada” e esclarece que deseja evitar a notação discutível de “memória coletiva”.

Embora escrito bem antes de nosso tempo, tanto a questão totalitária está em jogo como a questão do colonialismo, também o racismo e anti-semitismo e isto significa uma memória “partilhada” que pode levar à fúria.

O filósofo usa o vocabulário do filósofo alemão R. Roselleck, que opõe a “nossa consciência histórica global”, que ele chama de “espaço de experiência” e, por outro, o “horizonte da espera”, se olharmos de fato nossa experiência quase recente podemos superar os ódios e ressentimentos entre povos e culturas, por isto considero correto não usar “memória coletiva”.

É preciso superar erros históricos, equívocos e caminhos já trilhados, que nos levaram ao caos.

RICOEUR, P. O perdão pode curar? Trad. José Rosa, Esprit, n. 210, 1995.

 

Ética mínima: corrigir o erro

16 ago

É muito comum o discurso, até eu as vezes digo, que o maior erro é não dizer não, mas educar significa explicar o não e ajudar as pessoas a corrigirem seus erros e ouvir o contra-argumento.

Isto implica em manter a ética, mesmo diante do erro, quando é comum apelar e sair pelo erro, mas o que significa errar?

Diz Aristóteles em sua “Ética a Nicômaco” que é possível, do ponto de vista moral, errar de muitas maneiras, mas só há uma forma de acerta: “Erramos quando temos medo de tudo e não enfrentamos nada; erramos quando nos entregamos sem medida a todo tio de prazer; erramos quando não restituímos o que é do outro por direito. Por outro lado, acertamos quando evitamos os excessos”.

O excesso pode dizer respeito até mesmo aquilo que consideramos virtuoso, que é o que diz respeito ás nossas disposições: o estudo, o lazer, o trabalho enfim tudo que é importante, mas exige equilíbrio e temperança.

Os hábitos e os vícios dependem dos hábitos, e hábitos dependem de contínuas ações, mas como corrigir os vícios e erros? a prática de ir direto ao ponto pode ser um equívoco, todo erro deve ser contextualizado para evitar o julgamento precipitado e ás vezes equivocado

Corrigir é sobretudo dar espaço a que o erro seja compreendido e a repreensão exige já uma ação social, em muitos casos legal, assim exige os fatos comprovados, testemunha e a forma correta de corrigir, a justa medida é sempre aquela que permite o erro ser corrigido.

A correção fraterna é indicada em (MT 18, 15) diz para tomar seu irmão em particular, se ele te ouvir terá um irmão, se não te ouvir toma uma testemunha se ainda não te ouvir é um pecador público.

O que mudou, não há mais correção, mas apenas punição e nem sempre ela é de direito.

 

Impostos, lucro e dizimo

15 ago

Sempre que se aponta ao horizonte uma crise a tentação mais comum é sobrecarregar a sociedade e a questão da tributação está em pauta não só no Brasil, mas no mundo todo.

Os problemas no país são enormes, o mais comum é a bitributação (impostos em serviços sobre os quais já há imposto, taxa rodoviária por exemplo), mas os governos são insaciáveis, precisam alimentar as mesas fartas daqueles que os sustentam no poder.

Para que benefícios sejam incorporados a vida civil, o estado necessita de impostos, porém eles não devem servir para regalias do estado uma vez que é um serviço prestado a sociedade, e impostos incorporados aos custos e preços distorcem e podem estrangular os investimentos, a poupança pública e privada e inibir à exportação.

O lucro deve ser pensado como tendo três finalidades, a manutenção dos serviços sociais que servem também as empresas, os bens e a seguridade social que servem a todos cidadãos, em especial aos trabalhadores e ao crescimento da própria empresa e do país em investimentos.

Por último a contribuição aos interesses culturais, sociais e religiosos de grupos específicos, tanto podem ser vistos como uma sociedade, ao qual todos optam livremente, como de caráter compulsório desde que haja um prévio acordo para isto.

O importante é entender que relações de fraternidade que são espontâneas, diferem de obrigatórias que implicam num tipo de sociedade que uma vez rompida se perde o vínculo, e este deve ser o caso do dízimo, da doação espontânea e da ação “entre amigos”.

No campo filosófico, Paul Ricoeur escreveu sobre estas relações do sócio e do próximo (Le socius et le Prochain, 1954) e

Aqueles que duvidam que isto seja bíblico, recomendo a leitura de Mt 17,25 ao serem indagados se eles pagavam o imposto do templo: Pedro respondeu: “Sim, paga”. Ao entrar em casa, Jesus adiantou-se, e perguntou: “Simão, que te parece: Os reis da terra cobram impostos ou taxas de quem: dos filhos ou dos estranhos?” ao que Pedro respondeu dos estranhos, mas Jesus para “não escandalizar” mandou que se pagassem os impostos.

Os três comportamentos não estão muito distantes: lucros desonestos, tributo alto e impostos dos templos.

 

 

Limites e importância do testemunho

11 ago

Os homens que deram grande virada na história e que fizeram a diferença em seu tempo foram aqueles cujo testemunho influenciou e muitas vezes mudou o rumo da história, o que parecia inevitável foi evitado, o que parecia perdido foi esclarecido.

Não significa que não pensaram e raciocinaram, mas que testemunharam e viveram primeiro.

Mahatma Gandhi desencadeou uma desobediência civil em seu país a Índia, para incentivar a luta pela independência do país da Inglaterra, em 15 de agosto de 1947 foi conquistada com a violência sendo praticada apenas pelos colonizadores ingleses.

Todos conhecem a luta pacífica de Martin Luther King, porém foi o gesto de uma mulher negra que desencadeou sua luta, a mulher chamada Rosa Parks, que no Alabama, em 1º. De dezembro de 1955 se recuou a ceder o lugar no acento de um ônibus a um homem branco, foi presa e obrigada a pagar uma fiança de U$ 14,00.

Nelson Mandela depois de sair da prisão, e liderar o fim do regime racista do “apartheid”, em 1994 torna-se o primeiro presidente negro da África do Sul, ao invés de se “vingar” dos brancos propõe uma nova atitude, contrária a dos dominadores e recria a África do Sul com tolerância racial e os presidentes que o seguiram foram todos negros, numa demonstração que venceu a luta e desarmou seus perseguidores.

Se fala do milagre dos pães, mas o mais importante segue depois na narrativa bíblica em Mateus 14, 22-24, havia despedido a multidão que comera os pães, os discípulos subiram na barca e Jesus retirou para orar sozinho, depois foi caminhando até os discípulos sobre o mar.

Os discípulos assustam com esta imagem, dizem “é um fantasma”, mas Ele diz: “sou Eu”, Pedro também quer andar sobre as águas, Jesus o chama, mas ele afunda, fraco na fé, o testemunho não só requer verdade e vivência, mas também uma crença no sentido religioso e não pode ser distante dela.

Mais do que o milagre dos pães que sacia o corpo, Jesus quer o milagre da fé, que sacia a alma.

 

Filosofia do testemunho

10 ago

A filosofia do testemunho (também, epistemologia do testemunho) considera a natureza da linguagem e a confluência do conhecimento, que ocorre quando as crenças são transferidas entre falantes e ouvintes por meio do testemunho. O testemunho constitui palavras, gestos ou declarações que transmitem crenças.

Conforme Nick (2023) o que sabemos do mundo: história, ciência, política, uns dos outros, etc. vem do testemunho de outras pessoas, embora seja indispensável para o conhecimento, especificar exatamente como somos capazes de aprender com a opinião de um falante é uma tarefa muito difícil, o que aponto pessoalmente é nossa capacidade de abrir e ouvir (ou ler).

Ainda sobre o autor o testemunho é a fonte básica da justificação, porém ela pode ser pode ser reduzida a uma combinação de outras fontes epistêmicas, como percepção memória e interferência?

Outra questão é: o testemunho pode gerar conhecimento ou apenas transmiti-lo?  

Ela pode ser entendida como algo apenas individual (no sentido que a justificação testemunhal de alguém depende inteiramente de fatores relacionados a si mesmo), ou deve ser vista como anti-individualista (no sentido que a justificação testemunhal depende de alguém, ao menos em parte, de fatores que tenham a ver com consigo mesmo) ?

Como entender o testemunho entre um especialista e um novato?

Os grupos testemunham? E se sim, como podemos aprender com a opinião de um grupo?

O que é o próprio testemunho? (uma vez que não se confunde com narrativa, mas vivência).

Em seu trabalho o autor esclarece que não são as únicas questões, cita outros autores como M. Fricker (2007) que leva a questão do crédito de testemunhos que dão origem a uma injustiça epistêmica, também há questões interessantes quanto a testemunhos oculares e a lei (Wells & Olson, 2003) e (Burrogghs & Tollefsen, 2016), e ainda testemunho e afirmação (Pagin, 2007 [2016]).

Há ainda quilo que considero particularmente importante que é uma literatura crescente sobre testemunho moral e estético, e o autor dá o exemplo da opinião de um amigo que acredita que comer carne assada é moralmente errado apenas porque seu amigo lhe diz.

Porém o autor se concentra nas questões apontadas mais acima.

O testemunho deve ser fermento de verdade e ter vivência do falante para ter credibilidade.

Burroughs, Michael D. and Deborah Tollefsen, 2016, “Learning to Listen: Epistemic Injustice and the Child”, Episteme, 13(3): 359–377, 2016.

Fricker, Miranda, Epistemic Injustice: Power and the Ethics of Knowing, Oxford: Oxford University Press, 2007.

Pagin, Peter, “Assertion”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Winter 2016 Edition), Edward N. Zalta (Ed.), 2007 [2016].

Wells, Gary L. and Elizabeth A. Olson, “Eyewitness Testimony”, Annual Review of Psychology, 54: 277–295, 2003.

 

Testemunho e humanismo

09 ago

O humanismo verdadeiro é o que permite a evolução do processo civilizatório preservando aquilo de essencial que todo homem possui que é o seu Ser, isto vai além das condições de sobrevivência econômica, social e política, ele deve incluir o Outro e dar este testemunho.

Testemunhos vão desde casos em que alguém precisa de uma informação e recorre a alguém ou a algum meio epistêmico (organizado do saber) até relatos científicos novos que revelam os mais intrincados mistérios da vida e do universo.

Os epistemólogos estão de acordo quanto a importância do testemunho como fonte de justificação, juto a percepção (cognitiva e além dela), da memória (todos meios de informação e difusão) e do raciocínio (além do lógico, do físico e do metafísico), a divergência estão no modo como crenças falsamente justificadas testemunhais podem surgir de crenças justificadas.

Isto se deve ao fato não apenas de crenças consideradas no aspecto religioso, mas também elas, mas do fato que é possível de crenças testemunhais que envolvem percepção, memória e cognição (acréscimo meu) são confiáveis a partir de crenças previamente justificadas, esta é a corrente chamada de reducionista, porque independente do testemunho, já é justificada.

Anti-reducionistas defendem que a justificação de crenças testemunhais é direta: estamos justificados em acreditar que algo pelo simples fato de alguém testemunhar algo mesmo sem haver razões para não fazê-lo, há diferentes tentativas de respostas a este debate.

Fora deste debate epistêmico, devemos pensar que vivemos num tempo que é difícil o pensar e o organização informações de modo a chegar ao testemunho como fonte de verdade, pode-se defender a paz mesmo fazendo a guerra, pode-se defender a democracia limitando os direitos civis e as ideias divergentes, pode-se definir justiça mudando as regras da lei para dar margem a injustiça, pode-se proclamar uma crença mesmo limitando-se a uma prática parcial.

Assim o que está em jogo não é o testemunho das crenças, mas muitas vezes sua própria negação, e pode-se tratar não apenas de má fé ou má vontade, mas dificuldade de cognição, por isto fiz este acréscimo a percepção e memória, onde o problema é a fonte de informação.

Um verdadeiro humanismo deve ter como pressuposto o testemunho, do contrário não temos um referencial confiável para nossos argumento, diálogos e superação de divergências.  

Só podemos testar nosso modo de viver se vivermos de acordo com o que testemunhamos.

Referência:

Leonard, Nick, “Epistemological Problems of Testimony”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Spring 2023 Edition), Edward N. Zalta & Uri Nodelman (eds.), URL = https://plato.stanford.edu/archives/spr2023/entries/testimony-episprob/ , 2021.

 

A decadência social e a confiança

08 ago

A mais grave crise social de nossa sociedade, é que mesmo sendo eleito democraticamente, governantes eleitos como deputados, senadores, prefeitos e os mandatários máximos dos países são pouco dignos de credulidade e respeito e isto as vezes explode fora do que é moral.

Confiança como um conceito epistemológico, que possa dar credibilidade ao termo, é indispensável se pensamos na vida social, familiar ou de círculos de amizade, mas não há um consenso sobre uma definição confiável, não querendo fazer uma redundância.

Se lermos estudiosos vemos que sentiram necessidade de verificar as origens do conceito, na busca por compreender melhor seu uso em áreas do conhecimento onde há um arranjo epistemológico que auxilie este esclarecimento.

Um trabalho pioneiro do assunto, foi desenvolvido por David Hume, que a partir das razões históricas quanto ao papel do testemunho na justificação das crenças, o que acabou sendo conhecido como Epistemologia do Testemunho.

Quem imagina que isto é um assunto superado e pouco ou nada tem a dizer ao pensamento atual, cito o pensamento de Giogio Agamben em entrevista no Il Manifesto, em que afirmou? “Contra essa experiência testemunhal do mito está a concepção do mito da modernidade, a qual (por um lado, na forma da desmitização e da ciência do mito e, por outro, na busca de uma ‘nova mitologia’), na verdade, é apenas a sombra produzida pela razão iluminista” (reproduzido em Flanagens, em 14-06-2021),  afirmou o octagenário filósofo italiano.

Tanto na cultura oral como na escrita o testemunho é importante, mas surge uma questão para os dias de hoje: por que confiamos, senão em todos, pelo menos em muitos testemunhos?

Na história da epistemologia, o testemunho como fonte de crenças verdadeiras foi relegado a um segundo plano ou desautorizado na conduta filosófica, isso porque a tradição atual da epistemologia é fortemente individualista.

O aspecto social da aquisição de conhecimento, portanto, não era parte do problema do conhecimento. Mas não é difícil demonstrar nossa dependência epistêmica de outros para aquisição de crenças verdadeiras.

Não é possível voltar a confiança sem uma verdadeira Epistemologia do Testemunho.