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Tempo de pós-verdade ou de hermenêutica
Uma hermenêutica é aquela que permite uma visão do mundo e uma interpretação dos fatos diferentes, não significa manipulação da verdade, mas exatamente ou desenvolve aquilo que ideologias e teorias não práticas ocultam (não há phronesis, práticas práticas) ou ou exercem práticas voluntárias sem reflexão .
O que acontece é que na busca de espírito absoluto, ou estabelecimento de verdades totais, na verdade eram totalitária, isto é, não admite uma visão de mundo diferente, numa era de diálogo simplesmente ligam a uma verdade já pré-existente, assim como existem verdades a priori para visões totalitárias.
O conhecimento para Emanuel Kant começa com uma experiência, e a razão organizadora dessa matéria de acordo com suas formas estabelecidas, com as estruturas existentes no conhecimento, assim como a formação séria uma forma de organizar a matéria que vem da experiência.
Embora “a priori” se refira a um modo geral como adjetivo de conhecimento, também é usado como adjetivo para modificar substantivos, como uma verdade, assim propor uma verdade a priori, e é um dos dogmas do idealismo.
Porem a verdade por séculos permaneceu velada, sempre foi usada como forma de poder, mas é o tempo em que as verdades são reveladas, não por jornalistas e grupos controlados que fazem parte de torcidas, mas com armas de fotos e celulares, câmeras presentes em muitos locais e em celulares, mas o grande salto é a consciência dos fatos.
Não é por acaso que este é o grande tema atual, desde a questão da filosofia hermenêutica, uma questão de consciência que deixa ser determinista, romântica ou dogmática, até um questionamento, se as máquinas inteligentes terão consciência e na última instância “imitar” o homem .
Para a cultura cristã, isso pode ser um noutro ponto, um tempo que a verdade é revelada, conforme o evangelista Mateus 10,26-29: “Não tenha medo dos homens, pois nada há descoberto que não seja revelado, e nada há de escondido que não seja revelado. O que você diz na escuridão, dizei-o à luz do dia; o que escuta ao pé do ouvido, proclama-o sobre os telhados! Não tenha medo daqueles que matam o corpo, mas não pode matar a alma! Pelo contrário, temei aquele que pode destruir a alma e o corpo no inferno! ”.
O filósofo Peter Sloterdijk, que não é cristão, disse que uma pandemia nos colocou “todos os joelhos”, direção que nem todos ainda aceitam, e.há aqueles que não admitem o mistério, além da nossa capacidade de leitura e entre os religiosos que ainda não se.põem ds joelhos, ao menos por compaixão com os que sofrem, a hermenêutica é esta abertura ao outro discurso, ao diferente, com sinceridade.
Da episteme grega a fenomenologia de Husserl
Os primeiros filósofos, pensando em filosofia como amigos da sabedoria, foram na história ocidental os pré-socráticos, o que eles procuravam era uma ruptura entre o mito e a filosofia, onde no primeiro a verdade é estabelecida pelos oráculos e a segunda é procurada, o que em Platão está simbolizado pelo mito da Caverna.
Platão separou a doxa da mera opinião pela episteme, a sistematização do conhecimento, que em Aristoteles ganharia uma organização chamada de Organon, podendo ser traduzido como “ferramenta”, “instrumento”, no entanto é sua episteme organizada em: categorias e estruturas, no qual estabelece seu método, apesar de não estar declarado explicitamente por Aristóteles, seus comentadores latinos estabelecem que esta lógica era o instrumento para as ciências.
A querela dos universais foi uma filosofia que surgiu a partir de um fragmento encontrado da Obra de Boécio, se existem “conceitos” universais, ou seja, se podemos classificar as ciências em categorias, o que se constituiu uma polêmica entre nominalistas e realistas, Duns Scotus (1266-1308) foi realista moderado (criou o princípio da e hecceidade, a qualidade e propriedade de ser “isto”) e seus discípulo Wilhem Ockam (1285-1347) um nominalista.
Tomás de Aquino (1225-1274) da corrente realista, elabora que era possível uma elaboração que unisse os universais vindo das categorias gregas com uma procedência direta formal (lógica) entre o objeto e sua essência (que representa a forma ideal do objeto), e assim formula a ideia de substância, para Scotus o principal era a experiência.
A ontologia de Tomás de Aquino parte da ideia que alguma coisa existe em essência, se de alguma forma existe mesmo não tendo existencial material, esta coisas que existem em essência existe ontologicamente, estava formada então uma onto-teologia.
Franz Brentano (1838-1917) vai elaborar bem mais tarde o conceito de intencionalidade, a partir de uma sub-categoria de substância, a categoria da consciência.
A categoria “intencionalidade” é uma revisão naquilo que a escolástica tomista chamava de in-existência (ou o existir em, dentro de) intencional de um objeto na consciência, ou o que pode ser chamado de referência a um conteúdo (Beziehung) ou direcionamento (Richtung) a um objeto.
Assim em Brentano o fenômeno psíquico que produz a existência de uma “intentio” significa, literalmente a existência dentro do que pretende ser, como um encaixe dentro dele.
Assim o ideal da neutralidade científica, que pressupõe uma cisão sujeito-objeto, cria um problema para o conhecimento, por que ele supõe que a informação fora pode tornar-se uma compreensão dentro, assim o problema epistemológico é um problema de organização do objeto fora para uma compreensão dentro, ou seja, ontológica, uma in-existência (existir dentro).
Será Edmund Husserl (1859-1938), aluno de Franz Brentano, que proporá o método da fenomenologia transcendental, que significa “vasculhar” o fenômeno, recuperando um conceito grego do epoché, colocar todos os conceitos entre parêntesis, e ao mesmo tempo fazer a redução eidética (diferente das ideias que é um conceito do racional-idealismo), através dos conceitos de noese e noema.
Enquanto noesis é o ato intencional ou a percepção imediata do objeto, noema é o conteúdo intencional, ou aquilo que remete a noesis ao objeto, é a possibilidade de conhecimento.
Assim ao relacionar um conjunto de noesis com conteúdos relacionados a um objeto (noema) estamos criando uma fenomenologia existencial, e esta é essencialmente uma hermenêutica.
Pandemia e poder
Uma situação de catástrofe se enfrenta com solidariedade, compaixão com os que a sofrem diretamente, apoio aos que devem enfrenta-la de frente e principalmente com todo apoio daqueles que podem e devem dar condições para o enfrentamento da catástrofe.
É também uma situação nova, que exige que todos revejam ações, conceitos e o próprio estilo de vida pode e deve mudar, aqueles que se comportam tentando evitar a nova rotina, atrapalham o enfrentamento da catástrofe e a pioram pessoal e socialmente.
Tudo isto envolve poder, os poderes centrais e os micro-poderes, o filósofo Foucault desenvolveu o conceito de biopoder, ou seja, o controle dos fenômenos coletivos a partir dos processos de natalidade, longevidade, mortalidade e fecundidade, já em filosofia recente Byung Chul Han criou o conceito de psicopoder, aquele que através das mídias e da comunicação controla o meio social.
A pandemia parece ter conjugado os dois, e ainda mais aprofundado a antropologia humana no seu retorno a casa, usa tanto a questão do controle da mortalidade como a comunicação, em especial a digital, para tarefas, compras e trabalho em casa, assim como o controle pelo poder.
As instituições do estado são mobilizadas, assim o Estado Moderno entra em cena, para solidarizar ou para abrir suas contradições ao meio social, hospitais, instituições de ensino e meios de comunicação de massas são todos mobilizadas pelas forças do poder.
Aparecem as faces mais fraternas e mais hostis do modelo idealista, na ânsia de substituir a saúde e o poder da solidariedade intrinsicamente fraterna da família, da espiritualidade e do bem-comum social ele poderá apontar para uma saída ou colocar o conjunto da vida em xeque.
O poder religioso também está em xeque, com os templos fechados ou dão respostas sérias e concentras ou ficam no subjetivismo espiritual de frases e chavões conhecidos que não explicam nem resolvem nada, o dualismo subjetivismo/objetivismo desmorona e pedem um transcendente.
Na leitura cristã de João (Jo 15,15) pode se ler: “Já não vos chamo de servos, mas de amigos pois o servo não sabe o que faz o seu Senhor”, e isto é fundamental numa pandemia, e gera solidariedade.
E para aqueles que vão além da amizade e geram o amor fraterno, há uma promessa divina que consola e nos fortalece neste momento (Jo 14,21): “Ora, quem me ama, será amado por meu Pai, e eu o amarei e me manifestarei a ele”, e terão paz interior para enfrentar a guerra exterior que a pandemia gerou.
Além do idealismo, novas lógicas e pandemia
A simplificação de Kant levou a formulações abstratas tão complicadas que seria impróprio chamá-las de complexas já que ele pretendia a simplificação, porém a tentativa de reduzir 12 categorias e 3 três ideias centrais: a psicológica (alma), a cosmológica (o mundo como totalidade) e a teológica (de Deus).
Isto irá produzir um construto engenhoso, racional mas muito complicado que são os três juízos que ligariam Sujeitos (A) a predicados (B), os juízos: analíticos, sintéticos a priori e a posteriori, a ideia de juízos a priori foi a mais polêmica, porque vê a mente como tendo uma memória nata.
Edmund Husserl e Gottlob Frége que tinham forte formação lógica aritmética se debruçaram sobre este tema kantiano imaginando que a lógica não podia ser reformulada a partir da ação, isto é, não mudamos nossa mente porque nossa maneira de agir se modifica, nisto se baseia todos os que ao verem a mudança na lógica da vida cotidiana provocada pela pandemia, imaginam que a mente e a lógica da vida não mudarão.
O afastamento de Husserl da lógica Matemática para o mundo das experiências, sob forte influência de Franz Brentano que trabalhava a intencionalidade (veja o post anterior o outro eidos), o fez formular um novo mundo das experiências, desde as emoções humanas até a total vida do mundo (Lebenswelt).
Enquanto as Investigações Lógicas datam de 1900 e 1901, a sua ideia de intencionalidade formulada em sua fenomenologia como a volta às coisas mesmas, ou como elas se apresentam a consciência através da redução fenomenológica, o seu epoché, que é o de colocar nossos conceitos e pensamentos entre parênteses, uma discordância clara do cogito cartesiano.
No seu retorno ao eidos grego, promoverá a variação eidética, que pode ser explicada como a partir do epoché fenomenológico (colocar entre parêntesis conceitos) produz uma variação eidética sobre a ideia que tínhamos da coisa (conceitos, pensamentos ou objetos) e ela pode produzir ao final novos “horizontes”, categoria fundamental para o diálogo sobre o novo.
Nosso fenômeno pandêmico produziu um epoché, um novo olhar sobre uma virose mortal, tivemos que produzir uma variação eidética, o que pensamos dessa “gripezinha”, e isto deverá produzir novos “horizontes” sobre os conceitos de como viver o dia a dia: atitudes sanitárias, solidariedade econômica e reformulação total da vida em família: espaços, tempo, alimentação e relações e uso da tecnologia.
Os idealistas continuam a imaginar que tudo voltará a ser como antes, não fizeram o epoché, vivem da “lógica”.
Simplificação, idealismo e pandemia
A ideia de que podemos simplificar fenômenos que são complexos parece um bom caminho, mas simplificar o que é por natureza complexo é ignorar o conjunto de fenômenos e interpretações que estão dentro do fenômeno que se deseja analisar, tenha ele a natureza que tiver, e principalmente se for a natureza humana, porque inclui a complexidade social/cultural.
É muito diferente da busca da essência, os pré-socráticos procuraram definir qual era o elemento essencial da natureza: fogo, ar, átomos, números, o Ser, e assim definiram as principais escolas pré-socráticas, ao perceber que se tratava de um fenômeno mais amplo Sócrates, que é lido por Platão divide em dois mundos: o mundo das Ideias e o mundo sensível, porém qualquer leitor atento não dirá que sua escola simplificou, apenas abriu caminho para uma complexidade maior.
O eidos de Platão e do pré-socrático Parmênides é diferente do idealismo moderno, porque nele existe tanto a conceito de forma, por exemplo, uma cadeira seja qual forma for ela tem seu Ser como sendo feita para sentar.
Do eidos grego vem na etimologia a palavra ideia, hoje duas acepções aceitas, uma que é de um sinônimo de conceito, porém num sentido mais lato é pensado como expressão, tendo como princípio implícito a ideia de intencionalidade (*), e este conceito só foi retomado na filosofia moderna após Franz Brentano e seu aluno Edmund Husserl que aplicou-o a sua fenomenologia.
O idealismo moderno, cuja base fundamental é Kant, embora tenha uma parte comum ao eidos grego, que é a ideia que ao estudar a coisa temos uma projeção do saber sobre ela, reduzindo a ideia que este estudo seria o que caracteriza o objeto de estudo (objetividade), e assim introduz um tipo específico de subjetividade, abstraindo-o do Ser, esta abstração tem em Hegel o ápice.
Kant chegou a pensar que seria possível reduzir todo o pensamento a uns poucos conceitos, seria um grande facilitador para o estudo e para o pensamento, porém seu pensamento resultou numa complexidade ainda maior, e sua simplicidade caiu no dualismo sujeito x objeto, que padecemos.
Toda simplificação leva a algum tipo de subjetivismo ou objetivismo, mesmo em termos religiosos, ao estudar O Fenômeno Humano, Teilhard Chardin declarou que o Homem é a complexificação da natureza, difícil para teólogos e exegetas aceitar, mas lhes faço a pergunta: porque Jesus usou de parábolas para explicar coisas que aparentemente poderiam ser simples ? Porque não eram simples, Aquele que criou o complexo universo é simples só no Amor.
O idealismo é no fundo uma “doutrina” que contém a crença segundo a qual é o pensamento e não o mundo físico que está na origem de todas as coisas, ou seja, o mundo objetivo, o que descobrimos com a pandemia, e a física quântica já sabia e a cosmologia está aprofundando, é que a incerteza é parte do conhecimento, e nos deparamos cada dia com um novo fenômeno.
Afinal um dos pressupostos do idealismo kantiano era a submissão da natureza, ela se rebelou.
Esta é a novidade original que os idealistas não aceitam, e esta novidade nos deveria devolver a humildade, proclamada por todos, mas como idealismo fica presa a dualidade, o erro são os outros, nós sabíamos a verdade, não nem a ciência, nem a fé poderiam imaginar a complexidade do fenômeno que toda humanidade vive, o primeiro passo para enfrentar a pandemia é este: dependo do passo do Outro, e que possamos dar passos juntos, ainda parece difícil.
*Enciclopédia Britânica: Disponível em: https://www.britannica.com/topic/idea , Acesso em: 26/04/2020.
A face do Outro na Pandemia
Embora o chamado isolamento horizontal tenha recebido o nome (no caso brasileiro) de “isolamento social”, um nome que seria mais próprio e menos agressivo seria o recolhimento familiar, em outros países também chamado de confinamento, como na França.
O reconhecimento do Outro nos familiares leva também a uma melhoria no relacionamento social, exceto os casos de famílias onde a relação familiar já se encontrava em situação de conflito extremo, a tendência será a de praticar atos de solidariedade e tolerância.
Isto é necessário para um bom convívio social, e para encontrar o rosto do Outro, que não é o mesmo, termo muito difundido na filosofia, Paul Ricoeur, Emmanuel Lévinas, Habermas, Agamben e Byung Chul Han, certamente esqueço vários já que o tema é presente na filosofia atual.
O instinto de auto defesa, que deve estar aliado a uma mudança do comportamento social, pode fazer do vírus um catalisador de uma mudança cultural, a do pensamento está em curso e a religiosa depende essencialmente daquilo que pensam aqueles que proclamam a fé e que deveriam sair da sacralidade de seus pensamentos para a substancialidade do mundo.
Teremos que socorrer pessoas para poder socorrer empresas, o trabalho e a própria educação, em todo mundo ferramentas de EaD (Educação a Distância), vídeo conferencias e os chats, que partindo das famílias podem ser reeducados, estão sendo largamente utilizados, o Brasil teve uma reunião inédita do Supremo Tribunal Federal por Skype, reuniões de condomínio, etc.
Alguns países como a Dinamarca e a Finlândia já anunciam a reabertura de escolas primárias, mas com alguns pais tendo restrição e medo de enviar os filhos, os adultos poderão se virar com formas de educação a distância, ao menos por enquanto.
Como será a reeducação religiosa com templos fechados, um pastor tocava sax para seus fiéis, outro colocou fotos dos paroquianos em sua celebração, mas um passo ainda maior precisa ser dado para que apareça a fé além da solidariedade social (muitas campanhas de alimentos para os mais pobres) que é o ato de misericórdia, o único capaz de fazer enxergar o rosto do Outro sem preconceitos e “exclusão social” daqueles que tem uma visão diferente da religião.
O livro dourado
Escrito em 1962 e considerado um dos grandes romances do século XX o Livro Dourado (Caderno Dourado em espanhol, na foto), conta a história de Anna Wulf, uma escritora imersa em uma crise pessoal que decide contar sua história, a partir do livro negro para sua vida literária quando morou na África do Sul, o livro vermelho sobre sua militância política de esquerda, o amarelo sua vida emocional e azul seu cotidiano.
Doris Lessing que ganhou o Nobel de Literatura aos 85 anos (2007) quando não esperava mais nada, ela própria fez uma piada sobre isto, porém o reconhecimento foi merecido e pouco se sabe hoje desta feminista consequente e que se recusou a aderir a modas e conjunturas seguia sua luta.
Temas como amizade, maternidade e sexualidade tem tons e contornos bem mais profundos nesta autora, em romances como por exemplo “As avós” (2007) onde a velhice é vista por um outro prisma, em especial para as mulheres, ou sobre política no seu livro “O sonho mais doce” que ela sugere como autobiográfico, e que faz reflexões profundas sobre sua visão humanitária.
Mas se tivesse que destacar um romance dela, meu preferido da juventude “Prisões que escolhemos para viver” (1987), ataca de modo sutil e extraordinário a questão da retórica política (ou o que resolveu-se chamar de politicamente correto) onde instiga os indivíduos a saírem das coerções sociais e a construir um mundo melhor, de fato e acima da moda cotidiana.
Não deixa de atacar neste romance a ignorância e a falta de responsabilidade pessoal no desejo de aplausos e mera repetição de lemas, quanta atualidade no seu discurso, diria antecipando os tempos, pois foi justamente pelo excesso de retórica e ausência de atos concretos que caímos em ciladas e ajudamos a ignorância e demagogia contemporâneas.
Sua frase que parece resumir este seu pensamento era: “Não posso e não vou ferir minha consciência só para aderir a moda do dia”, e dizia isto não para conservadores, mas para as posições aparentemente avançadas de seu tempo que não se dirigiam a atitudes concretas.
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Ascese e ascensão
A ascese significa então um processo virtuoso pelo qual por passos e exercícios pode-se adquirir uma espiritualidade colocando a alma diante de obstáculos e situações onde possa superar-se e seguir um caminho de ascensão.
Alguns casos em que há entraves psicológicos, a autoajuda pode ser uma panaceia ou mesmo ser contrária a criação de uma verdadeira ascese, criando superstições e novos problemas e novos vícios entrando num ciclo vicioso que precisará de alguma ajuda profissional.
Momentos de crise e depressão favorecem estes ciclos, mas uma verdadeira ascese é um outro caminho pelo qual sentimos que damos passos cada vez mais elevados e conseguimos transpor os obstáculos naturais e ou impostos pela vida, doenças graves, situações econômicas, etc.
O apelo a solução mágica destes problemas não significa uma espiritualidade nem religiosidade, mas um oportunismo com a pessoa que sofre algum problema conjuntural de vida, pode em muitos casos configurar até mesmo crimes de extorsão e assédio pessoal ou moral.
A ascese é um esforço humano necessário, o dia a dia da vida exige uma forma de viver bem e que se coloque a alma num conforto necessário para a solução de problemas cotidianos, então não se trata apenas de religiosidade ou de mero virtuosismo, a vida nos pede modos de viver bem.
Em qualquer forma de pensamento ou cultura, o esvaziar-se para elevar-se é necessário para um bom andamento de uma perfeita ascese, o epoché grego não era outra coisa senão este processo inicial para adquirir novos pensamentos e permitir a elevação de patamar de consciência, de inteligência e de espiritualidade.
No cristianismo, uma das passagens bíblicas, que fala de modo particular da ascese de Jesus, é aquela que ele toma consigo Pedro, Tiago, João e os leva para “um lugar a parte”, diz o evangelista Mateus Mt 17,1-4: “E foi transfigurado diante deles: o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz. Nisto apareceram-lhe Moisés e Elias, conversando com Jesus. Então Pedro tomou a palavra e disse: ´Senhor, é bom ficarmos aqui, Se queres, vou fazer aqui três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias”, querendo permanecer nesta ascensão.
O fato é que depois “descem” do Monte Tabor (foto acima), isto é, não se permanece sempre num espírito elevado, mas há outra coisa importante nesta ascese que é o fato da presença de Moisés e Elias, claro ambos já haviam morrido a muito tempo, entretanto a presença de “homens” com Jesus.
Também pode haver a interpretação que é a “Trindade Santa” seja num caso ou noutro, o importante é saber que é possível uma ascese “humana” que nos eleve ao divino embora não seja perene.
Some cases in which there are psychological barriers, self-help can be a p
Entre a redução fenomenológica e a variação eidética
O se perguntar sobre a consciência Husserl irá propor um método radical para “vasculhar” o fenômeno, recuperando e modificando um conceito grego que é a redução fenomenológica (epoché).
Suspensão significa que não apagamos de nossa consciência o juízo que temos a respeito das coisas, porém a perspectiva husserliana é “por entre parênteses” o que é mais realista, porque não podemos apagar, ao menos completamente, a memória, no entanto esquecer o que pensamos sobre o que apreendemos sobre o mundo vivencial.
Assim Husserl consegue não fazer uma atitude elevada, como o cogito cartesiano que não apaga o ego, mas uma “atitude natural” para rever como relacionamos com as coisas do mundo.
Assim aprender algo significa captá-las como elas são, assim a fenomenologia procura enfocar o fenômeno no sentido de como ele nos aparece, sem usar o que já conhecemos previamente e suas aplicações de como já foi visto, tendo como objetivo atingir a sua !originalidade!, a sua “pureza” de fenômeno,
Significa deixar de lado todos os preconceitos, teorias, definições e tentarmos adquirir um novo conceito sobre as o mundo da vida, os fenômenos ao nosso redor e o sentido da “coisa”.
Com a epoché não se pretende propriamente duvidar da existência do mundo, nem, muito menos, suprimi-la. O mundo ao redor se apresenta só na consciência.
Para Husserl, os objetos do mundo já estão colocados para nós nas diversas perspectivas e adotamos quase imediatamente um sentido para ele, em geral o que não conhecemos atribuímos uma essência e esta deverá permanecer inalterada porque demos um sentido originário a este objeto.
O segundo conceito fundamental de Husserl é a variação eidética, justamente o que diferencia sua visão do eidos da cultura idealista contemporânea, onde chama de noema o que é do próprio objeto, o que é a coisa, que os antigos chamam de quididade, enquanto chama de noese do grego νόησις , significa a apreensão imediata que pode não ter a necessária dianóia, isto é, o pensar sobre a coisa que a liga ao noema.
Então a fixação nos objetos e a incompreensão de seu sentido por outro lado, é em parte do mundo contemporâneo, esta dessincronia entre noema e noese.
Autoajuda, espiritualidade e psicologia
A diferença é bastante grande, mas para muitos incluindo as livrarias, estes assuntos estão na mesma sessão, fazendo uma brincadeira diria que o primeiro dá a ideia que sozinho você se resolve (se autoajuda) e o segundo você precisa de um profissional, então é mais caro.
Porém a questão é mais profunda e grave a autoajuda criou uma série de crendices populares, por exemplo, Pai Rico, filho pobre, então a autoajuda sugere Filho Rico, ou então Aposentado Jovem e Rico ou ainda Pai Pobre para jovens, enfim a lista é imensa, se fosse verdade todos diriam o mesmo, mas a vida não tem estas fórmulas mágicas.
Porém o objetivo de todo processo de autoconhecimento, entre eles a psicologia é um, pode ser eficaz se for fundamentado em experiencias e fatos reais da vida de uma pessoa, assim não pode ter uma formula geral, e isto é tão antigo como o pensamento epistêmico “conhece-te a si mesmo”, mas é preciso que isto não seja uma doxa, ou seja, mera opinião sem fundamento.
A psicologia clínica, só para dar um exemplo, descobriu que os nossos sintomas, os nossos problemas, o nosso sofrimento surgem e crescem a partir de fontes inconscientes, isto significa que há uma camada que conscientemente temos pouco acesso, que dão origem ao que somos.
Assim hoje há um problema ainda mais graves aonde residem charlatães e falsas promessas de autoajuda, a espiritualidade sem contexto pessoal e social, a “ascese desespiritualizada” como afirma Peter Sloterdijk, uma espécie de catarse ou autoajuda que leva ao fanatismo sem espiritual.
Até mesmo chamá-la de espiritualidade é um engano, é uma autoajuda revestida de uma religião manipulada e de crendices infundadas, mas a verdadeira espiritualidade existe e é uma forma de possibilitar equilíbrio e nos ajudar com fontes inconscientes de problemas ou mesmo de soluções.
Enfim seria bom separar os três campos, fórmulas de autoajuda pessoal, social e laboral, tratamento clínico de problemas psicológicos e verdadeira espiritualidade que não cofunda as três coisas, uma forma de ascese pessoal ou em comunidade que leve a melhoria das relações e uma felicidade maior de convívio.