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Um mundo criado em laboratório
A história de Claude Shannon, que trabalhava num laboratório do MIT de Vannevar Bush e Alain Turing se cruza em meio a II Guerra Mundial, quando trabalhando em projetos secretos, que eram dois lados da mesma moeda, sem saber um do projeto do outro, a ideia de passar a linguagem para um código humano, o System X que trabalhou Shannon, e, o de Turing que era decifrar o código da Máquina Enigma captura do exército alemão.
Não podendo conversar sobre os seus projetos, falando em almoços e encontros do Teorema da Incompletude de Gödel, e a ideia de criar uma máquina que poderia codificar o pensamento humano, dizia em tom de piada, “podia ser um cérebro mundano como o do presidente da Bell Laboratories”, local de desenvolvimento dos projetos secretos das máquinas de codificação (System X) e decodificação da máquina alemã apelidada de Enigma.
Ela começou como um Laboratório em Washington da AT & T (Telefonia americana), e depois tornou-se um laboratório independente, local do desenvolvimento de inúmeros projetos (foto acima).
Os maiores obstáculos às iniciativas de inovação nascem dos bloqueios mentais causados por crenças, preconceitos e percepções não comprovadas sobre as possibilidades da tecnologia, estes além de fortemente alienantes, são inibidores da criatividade e podem condenar a processos de mal desenvolvimento de mentalidades.
Apesar da ironia de Shannon e Turing com o presidente da Bell Laboratories, lá se desenvolveram desde as primeiras válvulas, o primeiro transistor que valeu um Prêmio Nobel, os sistemas telefônicos em suas mais diversas versões chegando a linha discada e o uso da rede para transmissão pela internet, e o sistema de fibra ótima, cujo primeiro teste foi feito na Georgia.
Também linhas de aparelhos de rádio e televisão, o desenvolvimento do sistema UNIX precursor do Linux, as primeiras células solares, diversos prêmios Nobel e alunos famosos passaram por lá.
O desafio de pioneiros nunca é simples, os críticos estão sempre dispostos a desvalorizar o esforço humano de progresso, a Bell Laboratories e outros centros de estudos, como o CERN e Instituto de pesquisa em todo o mundo, o Brasil tem alguns deles como o INPE em São José dos Campos, são centro impulsionadores da criatividade humana e projetam o futuro do homem.
Esclarecer a clareira
O homem sempre quis a luz, sempre andou em busca da “clareira”, o Mito da Caverna de Platão não é senão isto, a luz nas capelas e artes medievais, o esclarecimento (Aufklärung) que Kant apontava como a saída do homem de sua menoridade e as atuais “clareiras” de Heidegger e o “esclarecer as clareiras” de Sloterdijk, o plural é por minha conta.
Na arte medieval a “luz” deve estar associada à arte, ainda que os textos de Boécio, Tomás de Aquino, Averrois e muitos outros são dignos de leitura e análise, foi nas artes que a ideia de luminosidade mais foi presente, um exemplo, é a igreja Saint-Chapelle (foto) consagrada em 1248, com exemplo da desmaterialização das paredes e substituição por vitrais.
Aquilo que devia ser o exercício de plena liberdade, a grande aposta da modernidade, na verdade confinou o humanismo num beco sem saída, basto fazer a pergunta se vivemos numa época esclarecida, opiniões de todos os matizes filosóficos responderão: não é uma época esclarecida, então a pretensão do esclarecimento deu em cegueira e crise civilizatória.
As respostas de Heidegger sobre a “clareira” em meio a esta floresta de questões (alguns acham que é só de informação) foi a retomada do ser, sem dúvida importante, porém a resposta de Sloterdijk às cartas sobre o humanismo a coloca-a em questão: que é “clareira”.
Não tenho uma resposta definitiva, como a de Sloterdijk também não é, ainda que aponte “as esferas” como os círculos de aprisionamento do ser, do pensamento e diria aqui, até a religião.
Minha resposta contempla o livro de Byung-Chul Han “A expulsão do outro”, a opção por uma sociedade massificada, uniformizada e por isto sem valores destruiria a riqueza humana da diversidade, mas é justamente esta diversidade que parece se rebelar, e poderá dar frutos.
Esclarecer a clareira, em face de crise civilizatória de nosso tempo, não poderá encontrar mais resposta, como no passado, na ideia do pensamento único, a diversidade é hoje necessária.
A vida: origem e destino
Para existir vida é essencial a água e alguns outros elementos em abundância: oxigênio, carbono, hidrogênio, nitrogênio, cálcio, fósforo, enxofre, potássio, sódio, cloro e magnésio, assim a busca por planetas habitados ou habitáveis procura-se estes elementos, sobre a vida em outros planetas o cientista Arthur C. Clarke afirmou: “ou estamos sozinhos no universo ou não estamos, qualquer uma das hipóteses é assustadora”.
Tão importante quanto a origem da vida, que ainda é um enigma, é investigar as sociedades originárias que estão submersas sobre as camadas subterrâneas de nossa sociedade, alguns são capazes de ver estes traços e entender que a modernidade não é o destino eterno dos homens, outros mergulhados nos conflitos de nosso tempo querem eternizá-la como se fosse o último estágio civilizatório humano.
Compreender o que é a vida, é também compreender de onde viemos, se na perspectiva cientificista da modernidade temos que saber se viemos da matéria ou não, e para esta questão recomendo o livro de Terrence Deacon “Incomplete Nature: how mind emerged fom matter“ (veja nosso post), exatamente porque une a perspectiva antropológica com a diria cosmológica, num sentido mais amplo que inclui as cosmogonias das diversas culturas e civilizações.
O assunto é demasiado amplo para um post, por isso conto uma experiência estando em Portugal, fui visitar uma destas pequenas cidadezinhas portuguesas Coruche, não são as aldeias que são ainda menores, e lá me deparei com vestígios dos homens pré-históricos na região, os primeiros sinais civilizatórios ocidentais: colunas romanas, aquele que acreditam ser o primeiro sino de Portugal e também início da evangelização cristã na região, a Igreja de Nossa Senhora do Castelo tem este nome por ter sido feita sobre as ruínas de um castelo.
Assim uma civilização soterra a outra, também a cidade fica numa região limítrofe entre o Reino de Portugal e o de Al-Andaluz, onde viviam muçulmanos árabes e onde está a origem dos desenhos dos azulejos de Portugal, senti que tudo isto se compunha numa civilização originária de Portugal desconhecida, e nós netos desta civilização originária.
Não deixa de ter, como em todo Portugal os campos de videiras, quase todo lugar tem uma.
Como está escrito no museu de Coruche sobre a cidade: “O céu, a terra e os homens”, é conhecida também pela produção de cortiça.
Ver e crer: sentir o real
Ao contrário do que pensa o senso comum, o virtual não se opõe ao real, mas aponta-lhe um caminho, tecnologias digitais já em desenvolvimento como realidade aumentada, realidade virtual e hologramas são virtuais não no sentido de irrealidade, mas de potencialidades.
O que se poderá resultar delas ainda depende de alguns avanços tecnológicas, mas o desenvolvimento destes artefatos, como para criar hologramas 3D testado na Universidade de Brigham Young (ver nosso post) publicado na revista Nature de janeiro, ainda dependerão de avanços tecnológicos para chegar ao mercado num futuro próximo, esta é sua virtualidade.
Numa sociedade da informação, a leitura ocupa um papel central, não por acaso está ligado ao artefato impresso, a chamada Galáxia de Gutenberg, no entanto pode-se imaginar que a cultura oral tenha pouco a ver com esta, ou apenas se componha com ela, mas isto não é um fato.
A cultura oral, o ver está ligado ao ouvir, pode parecer curioso ou estranho que nesta cultura é essencial o escutar, e o falar significa certa autoridade, foram assim com os oráculos, profetas e mestres em culturas afros, deve-se ter o dom de contar neles os mitos ocupam lugar de destaque, é por isso que desenvolvemos aqui: vendo não veem, e ouvindo não escutam.
Poderia ser o contrário, se pensamos na fotografia, na TV e no Cinema, mas a chamada “sociedade do espetáculo”, que Guy Debord definiu o espetáculo como o conjunto das relações sociais mediadas pelas imagens, mas estas são apenas artefatos modernos, pois as pinturas rupestres seriam então o que ?
A linha de análise que embora tenha críticas, parece mais coerente é a de Paul Virilio, que a moderna sociedade caminha com “velocidade” para as novas mídias, e a dança e o teatro seriam as verdadeiras resistências a esta velocidade,
Mas Virilio rende-se ao afirma que inovações tecnológicas transformam, modificam, alteram o espaço geográfico em todas as escalas (local, nacional e global), não diz isto, no entanto, é preciso humaniza-las, e este processo será cada vez mais coletivo, é inerente a estas mídias.
Um exemplo de cultura oral está na passagem famosa de Tomé, que interpretada na cultura da informação dizem é ver para crer, está errado, é sentir para crer, releia-se a passagem de João 20,25=27:
“Os outros discípulos contaram-lhe depois: “Vimos o Senhor!” Mas Tomé disse-lhes: “Se eu não vir a marca dos pregos em suas mãos, se eu não puser o dedo nas marcas dos pregos e não puser a mão no seu lado, não acreditarei” … e Jesus disse: põe o dedo aqui e olha minhas mão.”
Jesus apareceu e pediu que ele tocasse também em outras passagens Jesus aparece e só quando fala, e reparte o pão é “visto”, o homem moderno precisa tocar e sentir.
Vendo não veem
Ouvir já escrevemos aqui, é o fato de possuir o aparelho auditivo, escutar é coisa para quem processa mentalmente. aquilo que ouviu, não é possível fazê-lo sem alguma atenção e algum saber, ao menos da linguagem na qual está ouvindo.
Imaginava em Portugal, que em toda a península Ibérica, já havia visto na Espanha, há alguma cultura ligada a visão, algo parecido a tradição oral, mais ainda mais primitivo, sim pois as pinturas rupestres são anteriores a escrita e provavelmente originárias da cultura oral.
Descubro perguntando sobre a importância cultural da Cidade Caldas da Rainha, relativamente próxima a Lisboa, a figura de Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905), inventor do Zé-Povinho, foi também jornalista da gravura, folhetinista do lápis, cronista gráfico, ceramista falido, cartunista antes do tempo. republicano, com algo anticlerical, uma de suas pioneiras caricaturas satíricas se pode ter convulsionado seu país no final do século XIX, ainda monarquista, mas já com ideias republicanas fortes.
As suas cerâmicas que não vingaram em seu tempo, hoje são obras de arte difundidas no mundo interior, no Brasil já vimos aqueles vasos em forma de pinheiro, xícaras (chávenas em Portugal) e outras louças (loiças na terrinha), feitas em formato de frutos e decoradas, feitas muito mais ao gosto do “zé povinho” que as louças reais da aristocracia portuguesa.
Assim como a escuta exige um treino, o olhar exige um duplo treino, pois o artista quer dar ao público algo além do convencional e por isto faz esta ou aquela nuance em seus artefatos,
Talvez a própria expressão de Zé Povinho, usada também no Brasil devemos a ele, também lá como cá esta expressão pode denotar um sentido pejorativo.
O fato da visão no sentido artístico, tanto pode recorrer a figuras míticas, cavalos alados e unicórnios, mula sem cabeça e saci Pererê em lendas populares e outras imagens podem em algum sentido serem místicas no sentido até mesmo de antevisão da realidade, muitos artistas estiveram avante de seu tempo.
Um visionário de nosso tempo não pode recusar as mídias e redes sociais, sendo redundante, é falta de visão.
A parábola da Caverna de Platão
A primeira coisa é que não é um mito, se entendemos por mythos aquilo que é uma simples narrativa em certa cultura, mas se presente no imaginário popular pode ser além então é uma parábola, uma metáfora onde a caverna seria um lugar de “conhecimento” ou simplesmente um ambiente escuro, que nós privássemos de luz, sendo esta luz a luz da verdade.
Este “mito” está na obra de Platão intitulada “A República”, livro VII, onde pretende a luz da teoria do conhecimento, levar os homens a linguagem e a educação para um Estado ideal, portanto refere-se a polis grega em sua formação inicial.
Numa caverna as pessoas caminham e através das sombras nas paredes observam o modo como seus corpos projetam sombras, e nelas os objetos que carregam.
Imagine que os prisioneiros sejam libertados e forçados a olharem o fogo e os objetos que faziam as sombras, eles despertariam uma nova realidade, um conhecimento novo, mas desacostumados com a luz iriam ferir seus olhos e eles inicialmente não veriam bem.
Platão não buscava a essência das coisas na simples Phýsis, como fez, por exemplo, Demócrito e seus seguidores, influenciado por Sócrates, ele buscava a essência das coisas para além do mundo sensível, e, esta é a verdadeira alegoria da caverna.
O diálogo é metafórico, diálogo metafórico sempre em conversas na primeira pessoa entre Sócrates e seus interlocutores: Glauco e Adimanto, os irmãos mais novos de Platão.
No diálogo, a ênfase se dá no processo de conhecimento, mostrando a visão de mundo do ignorante, que vive de senso comum, e do filósofo, na sua eterna busca da verdade.
Pode-se dizer que, ao menos no ocidente, este é o primeiro ensaio sobre a “verdade”.
O zelo da casa e a reconstrução
Na passagem bíblica onde Jesus expulsa os mercadores do templo, vendedores e outros comerciantes de relíquias religiosas de seu tempo (Jo 2,13-16), é mais comum lembrar o chicote de cordas do que a passagem seguinte que diz (Jo 2,19): “Destruí este Templo, e em três dias eu o levantarei”, que parecia um absurdo já que o templo foi construído em 46 anos e como faria isto em 3 dias.
A primeira parte é mais lembrada por exegetas porque havia a profecia sobre o que messias que “O zelo por tua casa me consumirá” (Salmo 69, 9) e portanto, em Jesus se confirma esta profecia.
É verdade que falava de seu corpo a reconstrução em 3 dias, já que morre durante a Páscoa judaica, que agora devido ao calendário nem sempre coincide com a cristã, mas Jesus morre na quinta-feira quando se deveria matar um cordeiro para come-lo ao final da noite de sexta, e na Páscoa cristã é ele próprio o cordeiro imolado.
Visto como sinal dos tempos devemos pensar que também a destruição e reconstrução das sociedades e culturas em nosso tempo se abreviaram, se isto antes era feito em mais de uma geração, hoje tanto a destruição como a reconstrução são rápidas e podem levar apenas horas.
Não há duvida que a Batalha de Guernica (1937), quadro de Pablo Picasso é um símbolo de nosso tempo, a guerra que despedaça o SER.
A velocidade da informação, tema tratado por Paul Virilio, que muitas vezes é da desinformação pode destruir e construir de modo rápido, típico dos tempos atuais, em geral só é lembrado o desconstruir, termo usado na filosofia, mas também existe a construção em muitas áreas do saber e da sociabilidade.
A internet do final da década de 70 até os anos 90 mudou a sociabilidade da comunicação, a Web tornou conteúdos populares em 15 anos, de 1990 a 2005 quando surgiu a Web 2.0, e agora da IoT promete mudar mais profundamente em pouco tempo, mas a sociedade mudou ? estas são considerações de linguagem e estrutura, mas o “templo” é aquele do “Ser”, ontologicamente estabelecido e este seja diante de qualquer tecnologia continua Ser, com angústias e esperanças.
É templo de reconstrução do “templo” do ser, mas isto significa mudar as estruturas, a forma na qual o conteúdo se expressa e se “in-forma”, nela viverá o “Ser” de nosso novo tempo.
Desconstrução não é destruição
Sobre a escrita da história não significa que não possa ser realizada para nos informar a leitura de Balzac ajuda a entender a França revolucionária e o pensamento antimonárquico, assim como sobre o passado e as culturas míticas que antecederam as atuais, parte do pensamento estruturalista ajudou a compreender melhor o que se seguiu ao pensamento da modernidade, .
Então mesmo no pensamento anglo-saxônico a desconstrução é uma maneira de refletir sobre o trabalho historiográfico, sobre o processo de transformação de evidências e informações do passado em história, porém é agora inevitável o questionamento histórico, o trabalho atual dos historiadores de entenderem e explicarem o passado através de fatos das evidências, ajudará a construir o futuro.
Se há uma demanda clara por mudança, há uma necessidade clara de mudança de mentalidade e de pensamento sobre a própria maneira de indagar a história, de reler a literatura, e principalmente, de apontar novos caminhos sólidos para a mudança, a compreensão da desconstrução como destruindo a cultura e o favorecimento a desinformação geral é parte da barbárie e não semente da mudança em curso.
As artes e o mito adâmico
Citamos a obra de Eça de Queiroz: Adão e Eva no paraíso, mas uma obra que parece refletir muito o símbolo adâmico é a obra de Ernest Hemingway, ele parece a voz de uma experiência humana, que busca após a queda adâmica de luta contra o mal, incorporar uma busca de redenção, simbolizando assim a estrutura mítica do conceito de mal original, o mal adâmico.
Em outras palavras, um novo Adão, não apenas a figura de Jesus, mas a recuperação de uma falsa “inocência sábia”, uma busca da simplicidade de linguagem, um segundo Adão.
O que isto tem a ver com a realidade atual, quase tudo, é parte desta ascese do vem “aqui e todos seus problemas estão resolvidos”, e este movimento tanto na filosofia quanto na literatura é uma forma consciente ou subconsciente de utilizar uma apologia ao mito adâmico.
Os arquétipos dos personagens: Schorer, Murray e Frye são uma demonstração abrangente desta hipótese, que foi estudada na universidade de Rice pela estudante de mestrado Anna Gayle Ryan, e pode ser estendida a outros arquétipos utilizados por Hermingway.
O autor escreveu também “Por Quem os Sinos Dobram”, sobre a guerra civil espanhola, onde um soldado americano Robert Jordan, luta ao lado das Brigadas Internacionais que apoiam o governo democrático, com ele está um grupo de guerrilheiros/ciganos, que tem além de Pilar, uma mulher com extraordinária coragem, o perigoso Pablo e a bela Maria.
O romance escrito em Cuba, o que nos dá uma visão mais progressista, mas é possível fazer uma ligação figura com a inserção de americanos quase em todas as guerras do planeta posteriomente, não raramente tomando o lugar de protagonista, como no Vietnã, nas Coréias, no Oriente Médio, etc. para restaurar o “paraíso” do “american way of life” democrático.
A obra ficou marcada no cinema, no filme de 1943 dirigido por Sam Wood, com Gary Cooper e Ingrid Bergman nos papéis principais, o que aparentemente é uma obra de cunho revolucionário esconde os interesses americanos e a ideia de um paraíso adâmico representado pela democracia, o qual hoje é possível fazer esta relação com as guerras no planeta e a tensão atual com a Coréia.
É a ascese dos exercícios, que levadas ao extremo das guerras, impulsionam ideologias, e são parte deste mito moderno do “paraíso perdido”, a verdadeira ascese religiosa que é o ser-com-outro permanece oculta, e as relações humanas vão se tornando violentas.
O bem entre Platão e Aristóteles
A razão que deste tema da antiguidade clássica para a contemporaneidade é o reconhecimento, para diversas interpretações da prática do dia-a-dia para a mais alta teorização que ainda nosso pensamento está intrincado desta ideia de bem.
Hans-Georg Gadamer em seu livro “A ideia do bem entre Platão e Aristóteles” (2009) desmonta desde o início do texto “as comparações ideais e ingênuas, tal como “Platão, o idealista”, ‘Aristóteles, o realista’ “ (pag. 2) e afirma que este é o testemunho da parcialidade “no campo da consciência idealista.” (idem).
Demonstra isto com a interpretação neokantiana de Platão feita por Paul Natorp ao fazer a aproximação de Platão e Galileu, onde interpretou “a ideia” como “a lei natural”, e que fora alertado pela ruptura de Nicolai Hartmann com este tipo de idealismo, e foi o que fez inúmeros autores (Robin, Taylor, Ross, Hardie e Hicks) que mostraram a unidade da filosofia do Lógos com toda “a conceptualidade do pensamento ocidental” (pag. 3).
Reconhece que o conhecimento que goza de amplo reconhecimento é a tekhné, enquanto o conhecimento que é mais importante para o homem: “sobre o Bem parece de outro tipo, diferente de todo o conhecimento conhecido …” (pag. 25) então este tipo é ainda muito mais importante para nossos dias, como mostra a “banalidade do mal” de Hanna Arendt ou a “fragilidade do bem” de Martha Nussbaum, o tema está de volta.
Como isto pode ser dito de modo mais direto: corrupção, violência, terrorismo , fome e diversos tipos de intolerância demonstram a nossa ignorância ainda hoje sobre o tema.
Em densa e complexa análise, Gadamer mostra o fundamento ocidental deste tema,
Destaca o autor, a partir da República de Platão, que o mundo idealizado do Estado pelos autores da Antiguidade Clássica, pensavam que esta ideia de Estado ia harmonizar a sociedade,
Platão em vida observou a corrupção da polis grega, Gadamer cita sua Sétima Carta da República: “a não ser que ocorresse uma reforma de dimensões incríveis” (p. 70),
Fica a pergunta de Leo Strauss e Allan Bloom, citados por Gadamer: “Intenciona Platão nada mais a não ser caracterizar o conflito entre theoría e política?” (p. 72), a resposta de Gadamer caminhará (de modo complexo) para uma areté coletiva, bem ao gosto de seu círculo hermenêutico, mas pensamos que uma verdadeira ideia do “Bem comum” ainda precisa ser explicitada com uma reforma de “incríveis dimensões”.
GADAMER, H.G. O bem entre Platão e Aristóteles. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.