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Arquivo para a ‘Noosfera’ Categoria

O fariseu e o pecador

21 out

Há pecados pessoais e públicos, porém a relação entre eles é clara, quem não é honesto e moralmente correto individualmente terá dificuldade em sê-lo em público, e isto é notório.

A falsa espiritualidade é aquela que esconde seus próprios interesses atrás da religiosidade sem uma adesão de fato aos valores da solidariedade e da fraternidade necessários a isto.

Cada cultura, religião ou grupo social desenvolve seus próprios ritos e linguagens, e as vezes, isto torna fácil a manipulação por aqueles que não conhecem a fundo o que está em cada cultura, como muitos possuem raízes ancestrai pode ser difícil entender sua origem social e seus valores, isto torna a manipulação mais fácil.

Porém o que revela de fato a verdadeira face de cada cultura é sua atitude pública porque nela se revela de fato o que se é.

Há uma fábula de Esopo na qual uma gata se torna a mulher mais bela de uma festa na corte e encanta a todos, no entanto ao aparecer um rato ela o devora, mostrando sua verdadeira face.

Na religião não é diferente, aqueles que não possuem verdadeira espiritualidade encontram certa dificuldade de vida pública com seus valores, não exercem o diálogo pois são intolerantes, não praticam a solidariedade porque são egoístas e não amam porque estão próximos da rigidez do ódio e isto dificuldade enxergar o diferente, o Outro.

Há diversas passagens bíblicas que se referem ao tema, como aquela que chama falsos religiosos de “sepulcros caiados”, outra que diz que louvam a Deus com palavras, mas o coração está longe, porém a passagem mais clara é a do pecador que se senta ao fundo porque teme a Deus e o fariseu que senta-se a frente para se engrandecer, ao final o texto diz (Lc 18,14): “Eu vos digo: este último voltou para casa justificado, o outro não. Pois quem se eleva será humilhado, e quem se humilha será elevado”.

 

Entre as faltas e os crimes

19 out

Diante de uma situação de perigo ou de pressão todos podemos cometer faltas e equívocos, porém os crimes mais punidos socialmente são aqueles que são cometidos intencionalmente ou pior ainda premeditados, planejados cuidadosamente e com requintes de maldades.

Também há crimes que são tolerados e não deveriam, são os casos de preconceitos ou roubos sistemáticos, mesmo que de coisas de pequeno valor, a sociedade pode e deve se defender nestes casos para evitar que o que é mal não se propague, e se a justiça é conivente ela também é cumplice destes crimes.

Porém a sociedade moderna não sabe como tratar faltas e deslizes humanos cometidos e que a pessoa tenha direito de se corrigir ou reparar possíveis danos, diante da mensagem religiosa estas pessoas são passíveis de reparação, porém devem reconhecer as faltas.

Pode acontecer também que faltas graves sejam cometidas por pessoas que tem certo respeito social, administradores, homens públicos e autoridades religiosas e elas não reconheçam que suas faltas são igualmente graves e este tipo de hipocrisia ou farisaísmo ocorre com certa frequência.

São particularmente graves porque estão sendo praticados por aqueles que deveriam fazer o papel justamente oposto ao que fazem e o poder de propagar culturalmente o mal é maior.

Isto precisa estar exposto socialmente para que a sociedade tenha defesa também destes crimes, eles são potencialmente maiores porque vão além do próprio crime e espalham falsos valores.

A sociedade que não os combate vai moralmente ficando perversa e pode chegar ao ponto de uma ruptura civilizatória, as guerras em geral estão nestes limites e só por isto são perigosos.

Uma cultura de paz deve incluir em valores cotidianos mensagens referentes a valores da paz.

 

O Teocídio e a comunidade dos eleitos

18 out

Já conceituamos em outro post o Teocídio numa linha de diálogo com O pós-Deus de Peter Sloterdijk, conceituamos ali, de certa forma também de Nietzsche, como uma tentativa de matar Deus, porque se não existe não se pode matá-lo e se existe é imortal, então podemos apenas apagá-lo de nossa mente temporariamente e voltará intuitivamente.

Porém a reação ao Teocídio hegeliano, aquele de Feuerbach, em que Deus só existe na mente e assim é um algo pensamento ideal e só com a “transcendência” idealista o alcançamos, há a reação religiosa de se fechar na “comunidade dos eleitos”, os prediletos de Deus, os escolhidos por critérios que uma certa comunidade determina e o restante são leprosos, pecadores públicos e indignos do “reino”.

Já fizemos um longo percurso sobre a questão do erro, parte da realidade humana, e cuja leitura pode ser finalizada na passagem bíblica que diz que o médico deve ir aos enfermos e não aos sãos.

De certa forma a reação a este Deus elevado, distante dos homens “todo poderoso” não passa de um poder também mundano e temporário e de uma forma de ascese desespiritualizada, a vida de “exercícios” como preconiza Peter Sloterdijk.

Fundada no perfeccionismo e no moralismo extremado, a moral é importante e não se deve negá-la, porém, levada ao extremo torna o “vício” muito mais próximo e passível de cair nele, ou seja, são na verdade falso moralistas porque não conseguem pôr em prática o que defendem, e muitas vezes são estes falsos exercícios que levam a uma prática de desvios e aberrações morais.

A união destes conceitos com a política leva a uma forma de moralismo político insustentável, não se trata de defender o roubo ou a corrupção, mas de entender que é preciso um equilíbrio, por exemplo, os políticos devem desejar benefícios para a sua região, a sua base eleitoral e a força econômica local.

Tudo tem que ser pensado de um modo equilibrado, outro exemplo é o tamanho do estado, o estado grande é um paquiderme, o estado mínimo é incapaz de executar políticas públicas necessárias.

O que é então de fato religiosidade ou espiritualidade, difícil de encontrar na modernidade, o equilíbrio entre as práticas sociais que devem ter doses de fraternidade e as práticas espirituais que devem ter doses de verdadeiras asceses e que seja reflexo daquilo que é vivido na vida “mundana”.

O homem tem sede de verdadeira justiça, verdadeira espiritualidade e está farto de hipocrisias.

 

A crise, a falsidade e a clareira

14 out

Hoje vale bem pouco aquilo que se é de verdade, importa mais o marketing pessoal, a maquiagem que esconde os defeitos do aquilo que o o homem de fato é, isto é consequência da oculta do Ser.  

Assim a ocultação da verdade é resultado desta ocultação do Ser, não sua causa, o pensamento vai nesta direção porque no interior de cada Ser há espaço para a falsificação, a mentira e a hipocrisia.

Assim não é o caso de quem mente mais, é a ausência de uma clareira onde a consciência de cada Ser se apresenta, e o fermento dos mentirosos cresceu, como a passagem bíblica de Lc 12,1=2 “tomai cuidado com o fermento dos fariseus que é a hipocrisia, não há nada de escondido que não venha a ser revelado, e não há nada oculto que não venha a ser conhecido”.

É certo que a categoria da “clareira” de Heidegger tem um sentido mais geral, envolve o todo que é oculto dentro de um Ser, porém para quem crê este todo se oculta em Deus, aquilo que somos no coração divino, e mesmo não crendo isto parece próprio a modernidade que não vê o todo.

A fragmentação do saber, a divisão social, a ausência de um pensamento transdisciplinar levou a um novo tipo de ocultismo, aquele que especializado só vê a parte e não vê o todo, ainda que a física quântica, a busca pelo universo infinito ou finito (procura-se sua borda) visto pelo James Webb, é a natureza e no interior do Ser que este todo habita e onde se esconde a verdade.

Como ela se ocultou foi a fragmentação social, a ausência de comunhão, onde o Todo se completa, a ausência de Amor transcendente (não é aquele da subjetividade idealista), onde somos capazes de enxergar o outro.

Formamos assim uma geração (no sentido de várias desde o século passado) se tornou má, egoísta e individualista, autofágica e excludente e com incapacidade de enxergar o Todo com clareza.

É certo que a justiça divina é superior a humana, porém ela não a ignora, Jesus contou uma parábola de uma viúva que vai a um juiz injusto que depois te tanto perturbá-lo, ele decide resolver para não ter mais o importuno dela e “não venha me agredir” .

E jesus explica a parábola aos discípulos (Lc 18,6-7): “E o Senhor acrescentou: “Escutai o que diz este juiz injusto. E Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai fazê-los esperar?”, assim podemos ter esperança também numa justiça terrena.

 

 

A crise civilizatória e o pensamento

13 out

Não é um tempo propício para o pensamento, disse Peter Sloterdijk, dito de outro modo Edgar Morin pedia uma revolução no pensamento passando pela educação, o que se observa são correntes cada vez mais dogmáticas (é diferente de ortodoxas) em duelo, sem que uma compreenda ou argumente em função do universo da outra.

O contorno desta crise tem origem na incapacidade de caminhar para frente, os modelos propostos dão sinais de exaustão, a mídia e o senso comum apelam para argumentos superficiais, sem referencial claro e por vezes apelativos, isto chegou ao corpo social e a política.

Culpam as novas mídias, elas são apenas veículos do pensamento, a sua base cognitiva está na educação e no que é digerido no dia-a-dia das pessoas, e desde o início do século passado já dava sinais de exaustão, não poucos pensadores sérios comentam isto, de Nietsche a Freud, passando por escritores conservadores à direita e à esquerda, porque ambos retornaram as suas origens.

Há uma crise social, sem dúvida,, mas ela existe por ausência de respostas consistentes que mobilize a todos, o pensamento é segmentado, os grandes modelos e teorias faliram e o sinal disto é a sua radicalização a níveis irracionais, e o horizonte de guerra se desponta.

Em A cabeça bem feita, livro de Edgar Morin, ele afirma que a reforma do pensamento permitiria o pleno emprego da inteligência para responder a estes desafios e uma ligação entre culturas que estão dissociadas, trata-se de uma reforma não programática, mas paradigmática, ou seja, no que concerne a nossa aptidão para organizar o conhecimento.

Colocar tudo junto, exercer uma transdisciplinaridade, como aquela foi descrita nas considerações iniciais carta de Arrábida (Morin, Barsarab Nicolescu e Lima de Freitas a subscreveram): “Considerando que a ruptura contemporânea entre um saber cada vez mais cumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido leva à ascensão de um novo obscurantismo, cujas conseqüências, no plano individual e social, são incalculáveis.”(Feitas, Nicolescu, Morin, 1994).

Esta carta estabelece uma ética nova: “A ética transdisciplinar recusa toda e qualquer atitude que rejeite o diálogo e a discussão, qualquer que seja a sua origem – de ordem ideológica, científica, religiosa, econômica, política, filosófica” (Freitass, Nicolescu, Morin, 1994).

Freitas, Lima; Morin, Edgar; Nicolescu, Basarab . Carta da Transdisciplinaridade de Arrábida, Portugal Convento de Arrábida, 1994.

 

Pós-Deus ou a tentativa de Teocídio

11 out

Mais do que a leitura de Nietzsche sobre a “morte de Deus”, entender o radicalismo religioso, além do evangélica, há o semita, o islâmico e correntes neopentecostais, a leitura de Pós-Deus, é na verdade uma releitura da questão do mal ou de modo mais correto “Deus está morto, e fomos nós que o matamos”, aquilo que chamo de tentativa de Teocídio, impossível, quer ele exista ou não.

Se Deus existe não poderá ser morto apenas apagado da mente humana, na lógica do hegelianismo de Ludwig Feuerbach ele existe apenas na mente humana e neste caso não existiria de fato e caso exista não poderemos mata-lo já que é imortal e precede a todos e a tudo.

Peter Sloterdijk em parte da proposição e claro da hipótese que ele só exista na mente humana, uma fantasia delirante dos homens, dizem muitos ateus convictos, já que os gnósticos não consideram a hipótese, o mais importante filósofo alemão vivo (considero o papa emérito também importante), vai analisar além de Nietzsche e de Cioran, o intermezzo de Lutero.

Lutero é particularmente importante porque é a raiz não declarada do pensamento de Nietszche, filho de pais e parentes luteranos, alguns pastores, a reforma protestante é fundamental para se intender o fenômeno religioso ou a chamada “revanche do sagrado”, ela entrou na cena política.

O livro, com este nome atrairá poucos cristãos, tem um interessante percurso de diálogo que passa por Hans Jonas (The Gnostic Religion), Harold Bloom (Presságios do milênio), Franco Volpi (O niilismo), Sergio Givone (Storia della nulla), Ioan Culianu (The Tree of Gnosis) e Sylvie Jaudeau (Cioran ou le deernier homme), todos autores e exegetas de Cioran, que teve uma experiência mística “desfigurada” de natureza ateia, desencantadora e niilista.

Quem foi Emil  Cioran (1911-1995), autor que escreveu a partir de Nag Hammadi, uma série de manuscritos encontrados após a Segunda Guerra que matou mais de 40 milhões de vidas, na África a 50 km de Luxor, num grande recipiente de barro, numerosos códices de papiro escritos em língua copta e em grande estado de conservação.

A grande biblioteca “gnóstica” rapidamente se espalhou entre os intelectuais, data de cerca de mil e setecentos anos atrás, portanto durante a emergência ocidental do cristianismo, o autor projeta uma mensagem mística para o nosso estado atual.

Permanece até hoje está aura de “descoberta” de Nag Hammadi, na verdade dava asas ao que chamo de Teocídio, tirá-lo não só das mentes e sim construir uma “mística” niilista sem Deus, porém ela não escapa do que é, um niilismo exótico.

Sloterdijk fala da ascese desespiralizada, Cioran também o é, a busca de uma ascese sem toda esta falsa radicalidade difusa, não resiste a mínima ideia de princípios praticados, confunde a todos, e a política também está contaminada por ela, o único caminho possível para todos parece ser o ódio.

O ódio é o Teocídio mais veemente e eficiente, onde ele entrou, qualquer ascese possível saiu.

SLOTERDIJK, Peter. Pós-Deus. Trad. de Markus A. Hediger. Petrópolis: Vozes, 2019.

 

Arrependimento, graça e gratidão

07 out

Quando conseguimos nos encontrar com o Outro, perdoá-lo e também arrepender naquilo que não foi bem neste encontro, encontramos espaço na vida para a graça e a gratidão, não por acaso um é derivativo do outro.

A gratidão não exclui mas supera sentimentos ruins de nossas vidas, também o excesso de positividade pode levar as exigências e aos perfeccionismos que não levam a um encontro, mas a exclusão do Outro, tolerar pequenas faltas, que muitas vezes são só diferenças, é necessário para alcançar a graça, e a graça quando chega até nós deve encontrar a gratidão.]

Muitos lembram de pedir graças, quando não pedem a Deus, pedem a alguma forma de falsa mística ou falsos deuses, encontrar energias cósmicas, que de fato existem, mas só terão uma ex-sistência se estiver diante do Ser, aquele que é e aquele que sempre foi, afinal a teoria mais atual da física é que antes do Big Bang já havia algo, então algo além desta ex-sisência, um puro Ser.

Assim uma verdadeira filosofia da graça deve levar a gratidão, não é apenas o Universo e a sorte que conspiram, ou mesmo algum “segredo” que seria a pura positividade, ela pode ser ilusória.

Assim a gratidão afasta os sentimentos de maldade e intolerância de nossas vidas, inclui as pessoas que de fato são boas e aumentam nossa potencialidade para as boas virtudes.

Na passagem bíblica em que 10 leprosos são curados, somente um volta para agradecer a Jesus,

Ao vê-lo Jesus pergunta onde estão os outros (Lc 17,17-19): “Não foram dez os curados? E os outros nove, onde estão? 18Não houve quem voltasse para dar glória a Deus, a não ser este estrangeiro?” 19E disse-lhe: “Levanta-te e vai! Tua fé te salvou”.

A ingratidão não apenas afasta a graça, mas explica sua ausência e a dificuldade de conviver em ambientes de harmonia, sinceridade e paz.

 

Arrepender, recomeçar e graça

06 out

Arrependimento não é o mesmo que remorso, este fica vinculado ao passado e impede um recomeço positivo, não há consciência da culpa e não se alcança novo estado de graça.

A graça é viver a vida em plenitude, com os limites que a vida impõe a todos, porém arrependidos, pode comprimir o passado estritamente ao que foi: um erro, e viver bem o presente e o futuro através da superação de uma angústia que é inalienável a responsabilidade da falta ou erro cometido.

Arrepender-se é viver intensamente e verdadeiramente o presente, ainda que algum sofrimento ou marca fique do passado, quem deu um passo após isto conseguiu recomeçar.

Ludwig Feuerbach, mais conhecido pelas Teses de Marx contra o hegelianismo dele, chamado de velho hegelianismo, na sua maturidade escreveu sobre o remorso, sua leitura é importante pelo confronto que faz tanto com Schopenhauer como com Kant.

Feuerbach reconhece a originalidade do sujeito e o propõe num âmbito mais amplo de liberdade, exame o remorso e o arrependimento como condições de imputabilidade de um ato,

Em oposição a Schopenhauer, Feuerbach vai afirmar que o caráter de um homem não é inato, nem imodificável, por isso é equivocada a pena de morte, e também aqui cabe a discussão sobre o direito do Estado Moderno sobre a vida humana, tema sempre polêmico e importante.

Contra Schopenhauer, Feuerbach afirma que o caráter do homem não é inato, nem imodificável, por isso é equivocada a pena de morte. 

O fundamento da liberdade é o eu que age no jogo das paixões e é essencialmente a relação com o Outro, o que é amplamente explorado na literatura moderna por Paul Ricoeur, Lèvinas e outros autores, há uma retomada fenomenológica desta questão.

As sugestões no campo da moral e jurídico é essencialmente em relação esta relação com os outros, e as sugestões nestes campos são particularmente interessantes, mas permanecem as questões éticas, como aquela do fundamento absoluto da obrigação moral, que está posta em Kant na explicação do que é consciência moral.

Esta discussão se amplia em alguns autores para o campo da sensibilidade (SERRÃO, 2007) e da mística (TOMASONI, 2010), onde se pode incluir de modo mais amplo a questão da graça, acrescentaria o reconhecimento da graça onde há arrependimento e recomeço.

Referencia:

SERRÃO, Adriana Veríssimo. Pensar  a sensibilidade.  Baumgarten  –  Kant  –  Feuerbach,  Lisboa,  Centro  de  Filosofia  da  Universidade  de  Lisboa 2007.

TOMASONI, Francesco. Tra  misticismo  e  scienza:  l’uomo  e  la  sua  ‘sensibilità’  nell’Eklektik,  in: L’umanesimo scientifico dal Rinascimento all’Illuminismo, a cura di Lorenzo Bianchi e Gianni Paganini, Napoli,   Liguori   2010,  

 

Sabedoria do alto, mal estar civilizatório

30 set

A Sociedade do Cansaço é também uma sociedade que levou adultos, jovens e adolescentes aos psiquiatras ou a métodos alternativos, àqueles que tem pouco recursos levou a grupos fechados e de consciência social as vezes duvidosa.

Não por acaso Freud escreveu no início do século passado sobre este “Mal estar da civilização”  (Freud, 1930) o autor não vai discutir a questão psíquica em si, mas a distante entre os impulsos pulsionais e a civilização, ou seja a cultura contemporânea que leva o homem ao seu oposto tanto quanto a natureza quanto ao seu bem estar.

A intolerância aos erros, equivoco até mesmo científico, a exigência de eficácia em todos os campos, a falta de empatia e amor na vida cotidiana e em especial, de valores que são naturais e levam a uma verdadeira ascese humana, leva aos conflitos emocionais e sociais a limites perigosos.

Ao detectar este mal, o próprio Freud fundador da psiquiatria não levou a humanidade ao divã, e sinto apontou que há males culturais e estes sim devem ser sanados primeiro, não é o que foi feito, neste sentido Sloterdijk tem razão não é possível a “domesticação” humana.

Ainda que as próprias religiões vivam sobre este mal civilizatório, a verdadeira ascese que é subir a montanha da sabedoria tendo sobre os pés valores que sustentam esta ascese é necessário para alcançar um verdadeiro estágio civilizatório, é preciso “amar na ausência” é preciso pretender os verdadeiros valores que levam a plenitude e ao verdadeiro e único conforto, empatia e amor.

Quando retiramos isto da sociedade, ela começa a caminhar para o isolamento, o ódio e os conflitos e o “mal estar” são apenas as consequências da ausência deste estado “natural”, porém uma planta só evolui se cuidada em suas condições naturais: adubo, água e sol adequados.

Quando os discípulos vão pedir a Jesus que eles queriam acreditar mais e fazer uma verdadeira ascese ele lembra do grão de mostarda, minúscula semente que se transforma numa frondosa arvore, (Lc, 1,6): “se vós tiverdes fé do tamanho de um grão de mostarda, , poderíeis dizer a esta amoreira arranca-te daqui e planta-te no mar: e ela vos obedeceria”, como o amor na ausência, a fé é crer sem ver e caminhar na direção de uma verdadeira ascese.

FREUD, S. O mal-estar na civilização (1930 [1929]). In: ______. O futuro de uma ilusão, o mal-estar na civilização e outros trabalhos (1927-1931). Direção geral da tradução: Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1974. p. 73-171. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, 21) 

 

Os médicos são para os doentes

09 set

A sociedade dos primórdios do cristianismo, não apenas o farisaísmo religioso como também toda a cultura era que a sociedade era para os sãos, o próprio ditado grego “mente sã em corpo são” é uma forma de expressar isto, os doentes deviam viver a margem da sociedade, muitas vezes fora dos muros da cidade.

As doenças eram pouco conhecidas e a medicina da época muito cara para quem não tivesse poder aquisitivo, até mesmo o fato que um paralítico foi colocado na presença de Jesus descendo pelo teto,  tem uma interpretação equivocada, não deixariam ele passar.

É fato que já temos cadeiras e lugares nas filas para anciãos, mulheres gestantes e doentes, mas ainda há uma mentalidade de comunidade dos puros, dos santos ou dos perfeitos, afinal a eficiência não pode vir de quem não está fisicamente preparado para ela e vivemos na sociedade da eficiência.

Assim foi o trato com a pandemia, muitos diziam que o doente se isole e a sociedade vai continuar seu ritmo, mas o que vimos foi a sociedade como um todo perder seu ritmo, e o resultado desta pressão aos poucos se transformou em muitas doenças psíquicas, até mesmo para quem as fez.

Tratar e trabalhar com a imperfeição, com a doença e com a pureza não é se não promover a integração social das pessoas, a ideia de ser um “modelo” para os outros é uma ideia kantiana de ética, que pode levar a uma ética e uma visão parcial da sociabilidade e do que é imperfeito.

Em termos da cultura religiosa leva a um isolamento, a formação de uma bolha na qual os valores são reafirmados, porém muitos são excluídos e não são convidados a participar e conviver com as diferenças, este é um dos principais paradigmas religiosos que Jesus quebrou em seu tempo.

Ao falar com as mulheres, deixar espaço para as crianças, curar leprosos e alejados quebrou o conceito farisaico do que era considerado “impuro”, ia de encontro aos pecadores e aos doentes.

É verdade não é um cego que pode guiar outro cego, porém os médicos são para os doentes, diz a passagem bíblica (Lc 15,1-3): “Naquele tempo, 1os publicanos e pecadores aproximavam-se de Jesus para o escutar. Os fariseus, porém, e os mestres da Lei criticavam Jesus. “Este homem acolhe os pecadores e faz refeição com eles”. , então Jesus conta a parábola da ovelha perdida e depois do filho pródigo.

A mentalidade farisaica não apenas não cura doentes, mas se torna ela própria uma doença social.