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A narrativa do totalitarismo

06 abr

Não se trata apenas da guerra que é o ápice da ação totalitária,a tentativa de submeter povos e governos a uma verdade unilateral, a uma forma de ver o mundo que despreza outras e mais do que fazer uma história do autoritarismo é preciso entender suas origens e sua narrativa.

Foi assim que Hannah Arendt encarou a questão ao escrever em 1951 “As origens do totalitarismo”, ela parecia convencida que após o final da segunda guerra o problema não acabava ali, ali fala do inferno, do pesadelo, da Metamorfose de Kafka, da cebola e até da feiura de um omelete entre tantas outras coisas, quando chegavam às suas mãos as histórias de Auschwitz.

Ao tentar descrever a experiência totalitária o dilema que se deparava Arendt era que essa experiência não podia ser explicada, não pela filosofia política ou pelos conceitos tradicionais, não é como a culminação de um processo do desenvolvimento de algo a partir de um passado.

Lembro uma frase impactante de Lygia Fagundes Telles, falecida estes dias quando completaria 99 em 16 de abril, escreveu: “Não há coerência ao mistério nem peça lógica ao absurdo”, os ditadores e suas narrativas só tem lógica numa propaganda sistemática, e numa claque que de outros fanáticos que o apoiam e com ele se identificam.

Esta forma de narrativa que Arendt escreveu encontrou oposição em contemporâneo como Voegelin sobre o qual ela respondeu: “eu não escrevi uma história do totalitarismo, mas uma análise em termos históricos dos elementos que se cristalizaram no totalitarismo” (ARENDT, 2007, p. 403).

Escreveu também na “Crise da República”, que a primeira diferença fundamental entre o totalitarismo e as demais categorias presentes na história está no fato de que o terror totalitário “se volta não só contra os seus inimigos, mas também contra os seus amigos e defensores”; uma segunda diferença seria sua radicalidade, que o torna capaz de eliminar não somente a liberdade de ação dos indivíduos como faziam as tiranias através do isolamento político., eliminando não só opositores como também aliados pouco confiáveis, há um claro paralelo na guerra atual.

Em sua nota de número 81, Arendt escreveu: “O total de russos mortos durante os quatro anos de guerra é calculado entre 12 e 21 milhões. Num só ano, Stálin exterminou cerca de 8 milhões de pessoas somente na Ucrânia. Ver Communism in action, U. S. Government, Washington, 1946, House Document n o 754, pp. 140-1”, novamente a semelhança com a Guerra atual não é por acaso, e depois de Butcha estes dias Mariupol (foto) poderá ter drama semelhante.

O último tópico do livro de Arendt é: “Ideologia e terror: uma nova forma de governo”, quem tem interesse em evitar totalitarismo é só ler, é provável que alguém tome consciência deste terror.

ARENDT, H. Origens do Totalitarismo. Trad. Roberto Raposo. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

 

Agora os horrores da guerra

05 abr

A retirada de Kiev longe de ser pacífica e encaminhar para uma cessar-fogo parece ter colocado mais gasolina numa guerra que aos poucos retoma os horrores e a barbárie da 2ª. guerra mundial.

As fotos e os fatos de Butcha, um dos distritos em torno de Kiev revela cenas de mortes de civis com crueldade e genocídio, dirigentes de toda Europa já se pronunciaram, e o próprio presidente da Ucrania Zelensky foi verificar em loco as valas comuns e civis mortos com as mãos amarradas, além de casos de estupros delatados.

Enquanto agências internacionais falam em 280 corpos, a Ucrânia afirma ter encontrado 410 corpos de civis, em valas comuns ou abandonados nas ruas, muitos com as mãos amarradas, enquanto a Rússia nega estas atrocidades, o porta-voz do Kremlin Dmitry Peskov disse que houve “falsificação de vídeo”, no entanto não apresentou nenhuma evidência para comprovar.

Seguem acusações dos biolaboratórios na Ucrânia, também sem provas, se verdadeiro também são condenáveis, mas não servem para justificar a morte brutal de civis que deixa a guerra em outro patamar, onde os acordos ficam mais difíceis e distantes.

Há uma nova ordem mundial, ou pelo menos uma tentativa de implantá-la, os polos econômicos e políticos se deslocaram e uma grave crise econômica e alimentar se aproxima, como enfrentá-la?

Será preciso rever valores, se a barbárie não nos despertar as esperanças ficam mais difíceis, a própria pandemia já deveria ter nos alertado para uma nova onda de solidariedade e de preocupação, não se trata apenas de um vírus, mas de atitudes que seriam esperadas das lideranças e da população, quantas pequenas guerras ainda subsistem sem abertura ao diálogo.

Se em si já é horrorosa esta guerra e a pandemia, mais horrorosas são as atitudes de indiferença e descaso, até mesmo torcidas que se organizam ou que desprezam a desgraça que ocorre ao lado.

Que os horrores da guerra sirvam ao menos para despertar um humanismo sincero, a preocupação e a responsabilidade pelo Outro, o respeito mútuo e o diálogo, ou caminhamos para uma realidade ainda pior a qual não fizemos nada para tentar evitar, ou fizemos pouco.

Paz, paz e esperança, é o grito de quem olha com amor pela humanidade e para o Outro.

 

Covid 2.0: flexibilização e cuidados

04 abr

Exceto a China, que ainda faz lock-downs rigorosos, mesmo países que praticavam confinamentos, como Austrália, Nova Zelândia e Coreia do Sul, ao flexibilizarem as medidas de proteção tiveram nas últimas semanas significativo aumento de casos por covid, mesmo assim reabriram.

Chamo de Covid 2.0, porque a Web 2.0 significou a chegada da Web para todos, sim a maioria dos casos são poucos graves e há muitos casos assintomáticos, porém o vírus circula, e o número de mortes em torno de 200, que é o caso do Brasil, significa 1.400 por semana, isto não é pouco.

Na Europa muitos países, como Reino Unido, Dinamarca, França e Espanha, já tinham relaxado as medidas de políticas públicas de saúde, e lá já se verificam aumentos dos casos da Covid 2.0.

No mundo todo o número de casos vem caindo, e a própria OMS acena já com um cenário pós-Covid, o que preocupa é que não há uma política para casos de surtos em determinadas regiões e uma política clara de flexibilização, e o número de mortes pequeno, 1643 nas últimas horas, é contrastante com o número de infecções: 777 mil.

Aposta-se que as novas variantes serão menos graves (a China já descobriu nova variante), embora não menos infecciosas pois a BA.2 já é mais infecciosa que a ômicron original, que explica o número alto de infecções.

Seria recomendável verificar e isolar regiões com surtos e não deixar de ter alguma proteção social, por exemplo, distanciamento e máscaras que é possível mesmo com a flexibilização.

A esperança que as novas variantes sejam menos agressivas e que o número continue caindo é boa, mas não deixar de tomar cuidados é perigoso e agora depende só de atitudes individuais e dando apoio a regiões carentes que tem ainda baixo índice de vacinação.

A Irlanda flexibilizou os protocolos, agora o HSE (Health Service Executive) — serviço de saúde pública irlandês informou estes dias que o número de casos de internações por covid voltou a crescer e estuda aplicar a 4a. dose.

 

Errar é humano, perdoar é divino

01 abr

O erro de Will Smith no Oscar foi só um erro, e Chris Rock que levou o tapa faz bem em não falar.

A guerra é a ausência de diálogo, de perdão e de tolerância levada ao extremo, é a barbárie do gênero humano que a torna menor que as outras espécies vivas, é a crueldade nua.

O erro no pensamento é parte da busca da verdade, o erro nas palavras e ações é parte da má articulação do pensamento, é sempre possível retroceder se há disposição ao diálogo, a ouvir o que é contraditório e não querer submeter o Outro pela força bruta ou pela ofensa.

Ainda estamos no primitivo da humanidade porque não conseguimos resolver os problemas, que existem e precisam ser encarados, as diferenças, que levam ao preconceito e a intolerância, e a convivência onde pequenas coisas podem ser pensadas e feitas de modo diverso sem prejuízo a ninguém, é preciso um princípio essencial de humanidade, por isto o humanismo está em crise.

A pior maneira de resolver a guerra é fazer mais guerra, buscar a pax romana, a submissão do que é o “outro lado”, por isto o cessar-fogo e o diálogo são fundamentais para uma retomada da paz.

Muitos querem a paz sem de fato a promoveram, vejam o armamento contínuo de uma guerra.

O perdão é a semente original da paz, onde há perdão não se inicia uma pequena guerra, e todos nós errados e precisamos ser perdoados, mas precisamos também dar o perdão ao Outro.

Na origem do povo judaico uma adultera devia ser apedrejada em público, alguns povos árabes guardam esta barbárie, é famosa a passagem bíblica que apresentam uma mulher adultera a Jesus para lhe perguntarem se ela deveria ser “apedrejada”, e Jesus pergunta se alguém não tem pecado podia lhe atirar uma pedra e eles começaram a se afastar (Jo, 9-11):

“E eles, ouvindo o que Jesus falou, foram saindo um a um, a começar pelos mais velhos; e Jesus ficou sozinho, com a mulher que estava lá, no meio do povo. Então Jesus se levantou e disse: ‘Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou ?’ Ela respondeu: ‘Ninguém, Senhor.’ Então Jesus lhe disse: ‘Eu também não te condeno. Podes ir, e de agora em diante não peques mais’. 

 

Erro e procura da verdade

30 mar

A frase do escritor russo Mikhail Saltykov-Tcherdrine, que escreveu sobre o pseudônimo M. Nepanov (escreveu Contradições) sobre o erro: “quem nunca procurou a verdade com certeza nunca errou”, bem melhor que o adágio popular: “só não erra quem nunca tenta”, porque mesmo que seja de modo inocente sempre se tenta algo.

Completa este pensamento sua frase: “Há épocas em que a sociedade, tomada de pânico, se desvia da ciência e procura a salvação na ignorância”, algo que parece típico de nosso tempo: de início ignorar a pandemia e as vacinas, depois ignorar os perigos que dela decorrem e por fim tentar conviver como se a doença seja algo natural, e os remédios é vacinar quatro, cinco, … vezes, e esperamos que as cepas realmente sejam mais brandas.

Insensatez e frivolidade parecem ser reações a uma crise que se aprofunda, além da guerra, uma alta de preços e escassez de alimentos se avizinha, sim o que ocorre por enquanto parece contornável e quando não o for mais, o que seria sábio fazer, parece que poucos se preocupam.

Escolhi falar de um desconhecido autor literário do século XIX, ele não viveu o período da União Soviética, para atestar a ignorância de punir a cultura, a ciência e os esportes da Rússia, como uma punição de uma guerra, sem dúvida injusta, mas da qual também o povo russo é vítima.

Mesmo vendo os horrores acontecendo na Ucrânia, não podemos ignorar os horrores do Ocidente e a escalada bélica que poderá ter num futuro próximo outros capítulos tão dolorosos quanto os atuais, é uma escalada que parece não ter retorno.

Não se pode ignorar os erros da segunda guerra, os erros do período pós-guerra, as inúmeras intervenções no Oriente, na Ásia e na África que causaram guerras e mortes igualmente condenáveis.

É preciso reconhecer os erros, é preciso um doloroso perdão do período colonial, ainda em curso, e é preciso permitir aos povos que vivam sua cultura, seus ideais, como desenvolveu Raymond Aron (Guerra e Paz entre as nações) e em segurança, o autor cita Clausewitz em seu livro: “A “guerra é um ato de violência, e não há limites à manifestação desta violência” (Aron, p. 69).

É um momento difícil em que apenas apontamos aos outros nossos erros, sem olhar para os próprios.

 

A batalha de Kiev

29 mar

Com um exército e forças militares desproporcionais era possível de imaginar que a batalha dos russos em Kiev duraria pouco, mas revezes no ar e em terra, um tempo hostil de final de inverno e o heroísmo do povo ucraniano não estavam na conta de Putin.

Irpin (foto antes da guerra) é o último distrito antes de Kiev, as forças ucranianas informaram no dia de ontem que haviam retomado o distrito, assim as tropas russas ficam mais longes, há relatos que a tropa russa estaria em grande parte enferma devido o frio e desgaste de um mês em campo de batalha e com a moral muito baixa.

Assim como na segunda guerra a batalha de São Petersburgo (Leningrado na época) foi desastrosa para os nazistas, a batalha de Kiev onde foram enviadas grande parte das forças de combate (o famoso comboio de dezenas de quilômetros de extensão), e o apoio aéreo da temida aviação militar russa parecem ter encontrado uma resistência inesperada.

Acontecem nestes dias várias rodadas de negociação para a paz, neste momento é tão desejável para a Rússia quanto para a Ucrânia, que nas primeiras rodadas se via em posição de desvantagem com os fortes ataques e avanços russos, agora embora siga a sangrenta batalha de Mariupol e os ataques aéreos que parecem ser o último recurso dos russos, há um relativo “equilíbrio” militar, porém as vidas de inocentes civis continuam a ser sacrificadas.

Também Putin parece ter perdido muitos generais, não se sabe se só em combate ou porque se opuseram aos planos expansionistas de Putin, também a força militar russa começa a ser questionada quanto a sua real capacidade.

Permanece o medo do que é possível acontecer no caso de uma derrota humilhante na Ucrânia, a sangria econômica causada pelas sanções de empresas do ocidente e de uma reação intempestiva ou apelativa de usar armas letais nucleares ou outras proibidas por convenções internacionais.

Resta a esperança que as rodadas de negociação da paz destes dias possam dar frutos, Zelensky aceita a ideia de neutralidade e desarmamento de armas atômicas, talvez também uma redução em seu exército, porém a Rússia tem pretensões em relação aos territórios “tomados” além do Donbass (Donetsk e Lugansk) também Mariupol que é uma cidade tipicamente ucraniana.

A pressão interna em Putin pode também ajudar, porém seu temperamento parece ser bélico e acredita que pode ir além com suas pretensões, a esperança é que o bom senso prevaleça.

 

 

 

 

Por que a Pandemia não acabou

28 mar

As hipóteses que as vacinas são eficientes contra todas variantes da ômicron caem por terra quando observa-se que no oriente e na Europa a variante BA.2 já chamada de ômicron 2.0 tem um grau de infecção 1,5% maior que a cepa original e mesmo onde o número de mortes está caindo, o grau de infecção cede em velocidade mais lenta.

No Brasil o número de mortes está na média móvel em torno de 250, enquanto o número de infecções está numa média móvel que varia abaixo dos 40 mil e acima dos 32 mil, porém se observado pontualmente, o número de infecções da quinta feira foi de 47 mil e sexta de 36.176 no sábado, e ainda há casos não relatados de assintomáticos e não há uma política de testagem.

Imaginar que as próximas cepas podem ser menos letais pode ser pensado apenas no campo das hipóteses, embora existam estudos que até afirmam isto, na verdade, a explosão de casos na Europa e no Oriente desmentem esta possibilidade, pois já há mortes relatadas e baixa eficiência das vacinas.

A liberação dos protocolos, é verdade que não em todos os ambientes, alguns locais continuam sendo mais cuidadosos, porém a sinalização política de liberação leva a um menor cuidado.

Segundo a OMS a BA.2 está associado ao aumento de casos e Covid-19 em países da Europa e do Oriente, e enquanto no final de janeiro se observava uma queda nas infecções, no período de 14 a 20 deste mês o órgão mundial de saúde registra um aumento de 7% nas infecções, enquanto o número de mortes há uma redução de 23%, que significa menor letalidade da cepa.

A entidade registrou 12,3 milhões de novos casos e 32,9 mil mortes por Covid-19 no período.

Há uma queda sem dúvida, porém a maior disseminação da nova cepa deve ser vista com preocupação porque propicia a circulação do vírus e não elimina a possibilidade de mutações.

 

A paz desejável

25 mar

A paz entre os povos deve vir a partir de uma profunda reflexão sobre as diferenças e a tolerância entre valores que são extremamente diversos e que não significam necessariamente a impossibilidade da paz, e quanto há cicatrizes antigas é preciso cuidado ao evita-las, elas existem porque alguma paz foi estabelecida sem que a dignidade dos povos fosse respeitada.

Edgard Morin em seu recente ensaio “A beira do abismo” (já foi feito um post aqui), diz “um dos aspectos da tragédia é que não podemos fazer uso da fraqueza nem da força separadamente e que estamos obrigados a navegar entre as duas de maneira incerta”.

Raymond Aron escreveu “Paz e guerra entre as nações” (Martins-Fontes, 2018) elabora um pensamento sobre isto, refletindo que cada povo deve ser fiel ao seu ideal como nação, não ignorar uma história conflituosa, e, pensar e agir com determinação de fazer que a ausência de guerra se prolongue até o momento em que uma paz seja possível e durável, imaginando que esse dia chegará.

É preciso sobretudo perdão entre povos e nações que viveram conflitos, como foi o caso da Alemanha, Itália e Japão, que estiveram na segunda guerra e conseguiram superar as próprias cicatrizes e manter firme os ideais como nações fortes, que hoje são.

É preciso que se comportem como o filho pródigo que ao retornar a casa, neste caso ao próprio território e as raízes saudáveis de seus povos, conseguiram reerguer as nações sob um manto novo de pacifismo, tolerância e desenvolvimento de suas nações.

Também é preciso que as nações conflitantes estejam abertas a este recomeço, na parábola bíblica, o irmão mais velho não entende que o pai faça festa ao irmão que gastou todo dinheiro da herança desperdiçando em coisas fúteis e passageiras, e agora retorna a casa, em termos da guerra o retorno ao seu próprio território.

Assim nem é a Pax Romana, de submeter os povos vencidos, nem a Pax eterna do ideal liberal, que não levou a uma paz duradoura e sim a duas guerras mundiais.

 

A paz possível

24 mar

A pax romana significava a submissão dos povos dominados ao império romano e o fim da resistência, o que na verdade não é paz porque não há o fim da opressão de um povo e isto significa que de alguma forma irá persistir algo tipo de revolta que vai explodir em nova guerra.

Assim é necessário algum tipo de reconciliação em que ambas as partes não se sintam que a sua digna existência como povo ou nação, um povo dentro de limites territoriais e políticos, possa ir em frente gozando da liberdade de expressar seus costumes e valores.

O cessar-fogo é o fim, ainda que temporário, das hostilidades, é ele que abre caminho para um possível diálogo ou reconciliação, onde concessões serão analisadas de ambas as partes, quando não há uma possibilidade clara deste diálogo, a única forma de estabelecer a paz é uma terceira força que entra no conflito sem o desejo de hostilizar nenhuma das partes, mas detê-las.

O problema é complexo, porque numa polarização extrema não há uma força confiável de paz, e é muito difícil que os dois lados beligerantes a aceite, e isto pode não apenas alimentar mais ainda a guerra como pode acelerar um processo de torná-la extensiva a outros países fora do conflito.

Por razões humanitárias, mesmo que este risco exista, é a única paz possível, correndo o risco de extrapolar a guerra para fora de seus limites, no entanto colocá–la nos limites se torna imperativo quando há um risco de hostilidades tão amplas que possam afetar os mais caros princípios humanos.

A atual escalada que nos coloca a beira deste abismo é o caso, porque o risco de uma onda ainda maior de violência fora dos limites dos três países em conflito (a Bielorrússia está em guerra) não é só uma possibilidade, a Polônia começa a se envolver e as fronteiras da OTAN como a se preparar.

A ONU não tem força política suficiente para ser esta força, é preciso criar um bloco de certa forma “neutro” (numa guerra isto é quase impossível) que possa colocar forças militares enviadas para a região do conflito e força um cessar-fogo, esta é a paz possível.

A paz desejável é um acordo entre as partes conflitantes, isto parece a cada dia mais distante.

 

Nem a peste nem a guerra nos alertam

23 mar

Veio a pandemia era esperada uma grande solidariedade global, um recolhimento nos faria ir um pouco além do nosso próprio ego, rever muitas coisas, incluindo o nosso dia a dia sempre corrido e muitas vezes sem sentido.

A guerra deveria nos alertar para a brutalidade, a crueldade e o massacre que ela proporciona e nos tornar menos bélicos e mais empáticos no cotidiano e solidário com os inocentes que são os primeiros a morrer diante da brutalidade.

Gerações que viveram a guerra contaram e escreveram sobre seus horrores, incluindo as guerras contemporâneas da Coréia e do Vietnã, e muitas na África, é bom não esquecê-las, porém a grande revolução na década de 60 eram os hippies criticando o consumismo, a geração paz e amor, inspirada em Ghandi e em vários místicos, porém hoje algo insensível está no ar: a justificativa da crueldade que é paradoxal.

Paradoxal porque a justificativa é o contrário do que é feito: a paz, a libertação, o fim da opressão e outros slongans que são mera propaganda, pois o que se faz é visivelmente contrário ao que se prega, e isto está em todos os âmbitos sociais, da cultura ao pensamento bélico.

O secretário geral da ONU António Guterrez em pronunciamento pediu o fim da guerra “absurda” citando a conquista cidade a cidade feito na Ucrânia e o massacre em Mariupol, onde 100 mil pessoas tentavam sair e são impedidas, é como se fosse um campo de concentração sem muros.

Kiev tinha parques, igrejas e locais de passeio que são o oposto da imagem da guerra (na foto o parque Kalynovka próximo a Kiev).

A guerra econômica travada através de sanções do ocidente terá graves consequências de abastecimento, não apenas de combustível que já vinha sofrendo no mercado mesmo antes da guerra, mas a escassez de alimentos pode levar ao terceiro ponto da crise civilizatória: a fome.

Sempre é possível retomar o diálogo, a negociação, impedir a proliferação da indústria da guerra, que movimenta bilhões de dólares em um mercado perverso e que vai em escalada crescente no meio de uma guerra, isso sem falar no perigo nuclear que é realidade global.

Devemos cultivar a empatia e a solidariedade, a esperança e principalmente o amor que rompa a cadeia de ódio que circunda todo o planeta, comecemos nós no dia a dia a depor as armas.