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Como viver a crise e o platô estável

27 jul

Edgar Morin e Patrick Viveret escreveram em 2010 “Como viver em tempo de crise” (edição em português da Bertrand de 2013), e certamente não pensavam numa pandemia, porém já viam um horizonte difícil para humanidade, e certamente este horizonte foi agravado.

Assim filósofos e outros tipos de visionários que tentam ver um futuro tranquilo não tem um fundamento, ou até podem ter, mas baseados em filosofias e pensamentos já superados, a pandemia exigirá ainda mais dos grandes estrategistas e pensadores humanitários.

Na página 37 do livro mostra os sintomas da crise: “Wall Street conhece apenas dois sentimentos, a euforia e o pânico”, mesmo sem saber é assim que pensam os que prometem “felicidade”, mas é falsa e a ela se seguirá a depressão, uma análise mais sensata pode preparar o desafio que vem.

O platô estável chegou, em termos de mortes pois os dados de infecção são imprecisos, mostram estes picos, agora caminhando para um platô estável não só no Brasil, mas no mundo como um todo, isto porque o ciclo de infecção chegou a todo planeta, e no Brasil a todo país.

O ciclo pode ser realimentado porque não como isolar polos de infecção, mesmo países sem novos ciclos poderão ser afetados, mas observe-se que Nova Zelândia e Taiwan são ilhas, então com o isolamento por mar, são mais controláveis, porém o comércio também pode afetar estes países.

Edgar Morin e seu colaborador citam no livro “três mutações” importantes na crise e que valem para a situação social da pandemia, pois elas representam o mundo antigo, o mundo “estados-nação, da sociedade industrial, de uma organização segmentada (veja os conflitos EUA x China) … o desafio ecológico coloca a pergunta sobre o que vamos fazer com nosso planeta?” (pag. 57).

A revolução industrial colocou a vida num modo de viver frenético, “a sociedade industrial clássica se organizava em torno do sésamo clássico ´o que você faz da sua vida?´”, e que continua a ser uma pergunta que nos interroga a todos, o recém lançado em português “Tens de mudar sua vida” de Peter Sloterdijk coloca isto em torno da antropotécnica, trazendo ao debate a questão técnica.

Ambos apontam para a dupla face da crise: perigo e oportunidade, com respostas diferentes, no entanto o que devemos pensar indicam Morin e Viveret: “o que faremos do planeta, com nossa espécie e com nossa vida” (pagina 54), e dá uma resposta universal e possível: “na esfera de desenvolvimento da ordem do ser, mais que de um crescimento na ordem do ter” (pag. 55), enquanto Sloterdijk indaga se o humanismo não morreu.

O livro apesar da defasagem história é muito atual, e aponta para questão do além pandemia.

MORIN, E.; VIVERET, P. Como viver em tempo de crise? Tradução: Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Bertrand do Brasil, 2013.

 

O bem e o poder

23 jul

O bem é aquele que é um bem comum, é praticamente inconciliável com o poder temporal, aquele que submete o outro pela força, seja de que forma esta submissão, praticas coletivas de impor valores, modos sutis de fazer exclusão e principalmente o exercício da força bruta.

Vale uma definição de Max Weber: “como cada chance de impor, dentro de uma relação social, a vontade própria mesmo contra relutância, não importando em que essa chance se baseia” (Weber, 1922) está no primeiro capítulo do livro “Economia e Sociedade” cuja edição alemã é de 1922, outra definição interessante é a de Hanna Arendt: “Conceitualmente falando, isso significa: o Poder é, de fato, essencial a todos os estados, inclusive a todos os tipos de grupos organizados, ao passo que a violência não o é” no seu livro de 1960 que é sobre a “Vita Activa”, mas que na tradução para a língua portuguesa e inglesa tornou-se “A condição humana”.

Se é possível que o bem comum se estabeleça, aceitando a condição de Hanna Arendt, não será pela violência, e sim pelo poder não-violento, e um breve olhar pela história pode-se observar as consequências da violência como forma de poder, quase sempre novas formas de exclusão e de submissão de alguma parcelas da população, como a unanimidade é impossível, é preciso conviver com a diferença, eis a formula que precede a qualquer bem digno do nome e sustentável.

O ressurgimento do nacionalismo, da polarização ideológica, e principalmente o retorno a formas de violência que pareciam aos poucos banidas da sociedade, mostram a crise do humanismo, que não se iniciou hoje, mas no início do século passado e tendo como testemunha duas guerras.

Imaginar que algum bem comum possa se estabelecer pela força é portanto contraditório com o que legitima alguma forma de poder razoável e capaz de influenciar a parcela consciente da sociedade, toda outra forma é destrutiva e dificilmente poderá se sustentar, mas os limites da força são hoje assustadores: as possibilidades nucleares e o uso de máquina “inteligentes”.

Apostar no confronto e no conflito mostrou-se no passado de duas guerras e de várias guerras coloniais desastroso e insustentável, e num futuro mais próximo aquele que levou ao poder os líderes mais violentos e truculentos.

Em tempos de pandemia, e já com um futuro visível de uma vacina, poder-se-ia pensar um total desarmamento e quem sabe com os bilhões gastos em guerras teríamos fundos para reativar as economias e os perigos de um futuro sombrio poderiam ser afastados.

As lições sobre a não-violência e a solidariedade ainda não forma aprendidas, nem na luta comum contra a pandemia, embora sempre permaneça uma esperança por alertas tão claros e definitivos.

 

O mal e a crise do humanismo

22 jul

O idealismo continua a defender seu ideário de Estado, de Ética (moral e virtudes são outras coisas, por exemplo, acabar com as corrupções), agora defender as nações, um Estado mais forte (esquerda e direita no fundo desejam isto) e por isto pode-se falar do zoon politikon, o animal político de Aristóteles, é preciso então entender o que é o animal político.

Há duas condições que pode não tornar-se político: ser degredado (diríamos hoje excluído) ou ser sobre-humano (ou divino, assim de ordem superior as leis e regras humanas).

Esta é a primeira premissa para entender “Regras para o Parque Humano – uma resposta à Carta de Heidegger sobre o Humanismo”, não se trata por tanto de ver o homem como “bicho” do zoológico, mas como animal “natural” porém que seu humanismo encontra-se em cheque.

A polêmica que seguiu-se a sua palestra no castelo de Elmau, na Baviera, significava que a tentativa (desde as escolas de Platão e Aristóteles) de programar a história e o humanismo por meio de uma engenharia social faliu, outro tema importante é a questão da “domesticação”.

A domesticação também não é nova, o filósofo recebeu de uma influência direta de Nietzsche, e Foucault também tratou o tema, sua proposta na Conferência que depois virou livro, era a de inverter a prioridade de Heidegger da dimensão ontológica sobre a ôntica (Sloterdijk, 1999,).

A polêmica causa é porque o filósofo se perguntou se não passaríamos da fatalidade “do nascimento ao nascimento escolhido e seleção pré-natal” (Sloterdijk, 2000) que foi o ponto principal da polêmica tentando mostrar isto as ideias nazistas e fascistas do período da guerra.

As questões de manipulação genética, que na Alemanha sofreram restrições rigorosas até 2002 e a liderança da Escola de Frankfurt por Haberrmas foram o pano de fundo desta polêmica, porém o fundamental que é o humanismo de Heidegger e Levinas, tema da conferência de Elmau  é um aspecto principal, esquecido por muitos comentaristas, pois o humanismo está mesmo em crise.

Quanto a resposta de Sloterdijk, ele próprio retorna ao tema de em Esferas I de forma diferente ao falar de manifestação aórgica, o inorgânico sobre o orgânico, afinal o homem veio da Terra até mesmo pela metáfora bíblica, assim do inorgânico barro Deus “soprou” as narinas e introduziu o espírito, gostem ou não, o tema é metafísico e não religioso, e se algo aórgico acontecer.

Hora não será a primeira vez na história, o homem veio depois dos céus, da terra e das águas, novamente também nas diversas cosmogonias (mesmo não cristãs) e também a própria terra já teve outras manifestações, como a que eliminou os dinossauros, porque uma nova não pode ocorrer, e ela nos ajudar a enfrentar a crise de época (ou civilizatória) que enfrentamos.

O tempo é diferente do nosso, o cometa volta depois de 6.800 anos a nos visitar, nem registro dele tínhamos, e quando voltar depois de outros 6.800 anos o que encontra, só Deus sabe, afinal neowise significa “agora”.

 

SLOTERDIJK, P. Regras para o Parque Humano – resposta a Carta sobre o Humanismo de Heidegger, São Paulo: Estação Liberdade, 2000.

 

O mal civilizatório, além do simbólico

21 jul

Já comentamos em um post o “Mal simbólico”, obra de Paul Ricoeur que deve ser lida em conjunto com “O mal: um desafio à filosofia e a teologia e“, o mal simbólico existe e pode se tornar estrutural, porém numa boa leitura da filosofia significa tornar-se um vício pessoal ou social, assim como a virtude também.

O filósofo Aristóteles diz que a virtude se adquire pelo hábito, se pratica de novo e de novo, até que ela torna-se atitude natural ou social se muitas pessoas a praticam, quando os valores sociais e humanos se confundem o mal se difunde, e assim uma sociedade ou civilização entra em ruina.

Voltar as virtudes é voltar as nossas raízes como seres humanos, por isto não se trata de maniqueísmo, uma luta perene entre bem e mal, porém se o mal simbólico se instala é preciso que retornemos a nossa raiz mais profunda como seres humanos, o fato que quase toda a filosofia contemporânea reconhece um mal estar civilizatório, na psicologia Freud (Freud, 1969) e de Jung (JUNG, 1988), até contemporâneos como Sloterdijk e Byung Chull Han, quase todos também nesta pandemia alertam para atitudes numa crise civilizatória.

Numa leitura rápida de Freud, com a possibilidade de ser um tanto superficial, o mal estar da civilização está igualado ao da cultura, afirma o autor que existe uma dicotomia entre os impulsos pulsionais e a civilização, ou seja, os indivíduos e a sociedade, assim o bem da civilização o indivíduo manifesta em pulsões e vive um mal-estar.

Já Jung aponta para a massificação do homem ocidental, esmagado pelo Estado, e sobre a defesa que cada um tem buscando através da própria personalidade ou da atitude religiosa.

A obra de Morin desde a década de 70 está toda vinculada a ideia de um novo humanismo, e este texto específico sobre o assunto, ele aprofunda o que considera uma ética necessária a este retorno ao humanismo, sua obra essencialmente aponta para os fundamentos perdidos, a instituição do método complexo e uma visão de uma cidadania planetária, nesta texto sobre a responsabilidade pessoal de cada um.

O que Morin, Freud e Jung apontam é a responsabilidade pessoal não pode e não deve depositar nas estruturas sociais, sejam boas ou más, as responsabilidades de cada um.

FREUD, S. O mal-Estar na civilização (Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. 21). Rio de Janeiro: Imago, 1996.

JUNG, C.G. Presente e futuro. Petrópolis, Vozes, 1988 (tradução Márcia Cavalcanti).

MORIN, E. “A ética do sujeito responsável”. In: Ética, solidariedade e complexidade. São Paulo, Palas Athena, 1998.

 

A luta do bem contra o mal, fragilidades do bem

15 jul

O mal em Agostinho de Hipona no livro VII das Confissões, é ausência de bem, assim como todo o universo é ordenado, ainda que agora descobrimos um universo com energia e massa escura, buracos negros, seminovas e galáxias sumindo e aparecendo, e muitas leis novas na astrofísica, ainda assim, há uma hierarquia, onde algumas coisas sobressaem as outras, e é para isto que Agostinho chamou a atenção, e já havia em Agostinho a questão do livre-arbítrio.

Mas uma lição dura mesmo para religiosos como Agostinho, que abandonou a filosofia de maniqueu, é a luta do bem contra o mal, e isto ainda domina parte do dualismo filosófico, onde ser inferior não é ser do mal, há coisas boas inferiores e coisas más superiores, assim o importante é a perda de sentido do que é bom ou mal, aquilo que Hanna Arendt chamou de “A banalidade do mal” (Companhia das Letras, 1999), assim alguém pode fazer algo “inferior” sem ser “mal”.

Assim há dicotomia entre a “luta” pelo bem e a “guerra”, trabalhar e lutar pela vida, ou eliminar o adversário.

Aqueles que querem dar a vida o puro deleite, ou que afirmam que há sentido numa vida bem vivida é o de sermos “produtivos” e “ativos”, inspirados no mitos como um QI superior ou herança fortuita (fortuna no sentido grego é diferente, é destino), mesmo que isto seja feito por meios opressores, indo até o argumento racial, que é o mais repugnante de todos, mas de onde vem estes mitos da “guerra”, do “vencedor” que se confunde com o opressor? 

Um dos grandes mitos que surgem desde a antiguidade é Ulisses de Odisséia e Ilíada (cantos VIII da Odisseia e IX de Ilíada), que significam um símbolo da capacidade do homem de superar as adversidades, embora exista o personagem Odisseu (o nome em grego de Ulisses), seria nascido em Ítaca, filho do rei Laerte, que reinou em Anticléia.

Embora Ulisses de James Joyce escrito de 1914 a 1921, fala de um personagem Leopold Blum, considerado pelo autor um homem moderno que é ao mesmo tempo forte e fraco, cauteloso e precipitado, herói e covarde, numa tentativa de criar um ser humano representante da humanidade, no entanto, é na verdade o herói solitário moderno, um dom Quixote requintado.

A contextualização do herói épico grego e o “herói” moderno são, entretanto, diferentes, assim para ler Ulisses de Joyce é necessário quase um roteiro, que inclusive foram feitos alguns.

Foi o psicólogo Carl Jung que chamou a atenção para o aspecto de “monólogo” do Ulisses de Joyce, embora pareça um homem “comum”, é um homem só e sua “luta”, alertou Jung: “O que é tão assustador em Ulisses é o fato de, atrás de mil véus, nada ficar escondido; de não estar virado nem para a mente nem para o mundo, mas, tão frio quanto a lua vista do espaço cósmico, permite que o drama do crescimento, do ser e da decadência siga o seu curso”, eis um mito moderno.

Os heróis que apareceram na pandemia, não são heróis de “guerra” nem mitos imortais, eles próprios não estão imunes da pandemia e convivem com o medo, e até o isolamento familiar, o que deveriam pensar é a vida que vale a pena ser vivida por todos, pelo planeta e pela saúde.

JUNG, Carl Gustav. Ulysses: A Monologue, UK: Haskel House, 1977.

 

Uma pandemia com muitos focos

13 jul

Embora os grandes centros, São Paulo e Rio de Janeiro em especial, registrem quedas de número de infectados e de mortes, a pandemia se interiorizou e chega agora ao mais interior do país, que inclui pequenas cidades pobres, aldeias indígenas e regiões de pouco acesso sanitário.

O gráfico geral mostra uma estabilização em torno das 1200 mortes diárias, mas nem significa o controle da doença, nem qualquer indicativo de queda, já que a expansão para o interior e áreas carentes podem causar novas explosões, isto aliada a uma política de abre e fecha sem critério.

Apresentamos o gráfico geral acima apenas para indicar um gráfico geral, pois a política sob a responsabilidade dos governos regionais e prefeitos (foi determinada pelo STF) não permite dizer que haja uma política nacional de combate, embora as secretarias regionais de saúde se comuniquem e os governos façam leis estaduais, como a que obriga o uso de máscaras, havendo algum controle regional.

Um outro assunto polêmico é o uso de medicamentos, a hidroxicloquina, a polêmica inicial, e agora azitromicina, ivermectina e nitazoxanida não são recomendadas por critérios médicos, os medicamentos no fundo são ministrados caso a caso, por exemplo, para quadros infecciosos, sintomas depressivos ou os problemas respiratórios que são agudos, mas cada paciente pode ter ou não quadro que impeçam o uso de determinado medicamento.

No plano internacional algumas medidas sobre a debilidade econômica começam a ser pensadas, como socorrer os desempregados, como articular planos de ação conjunta entre países, que o grande bom exemplo é o da zona do euro.

As medidas preventivas devem continuar por longo tempo, que prefiro chamar de distanciamento social, porque a flexibilização já é crescente e pouco controlável, usar máscaras, manter uma certa distância em transportes, caminhadas mesmo considerando que são feitas em áreas arejadas são necessárias e fazem parte da chamada nova normalidade, basta ver os países saíram do pico.

No plano social medidas devem ser pensadas não apenas nacionalmente, mas mundialmente porque também as tensões de mercados podem se agravar e este enfrentamentos podem piorar as crises internas de cada país. 

 

O velamento do conhecimento, noite do pensamento

09 jul

A Carta da Transdisciplinaridade de Arrábida, escrita pelo físico Nicolescu Barsarabi, o serigrafista português Lima de Freitas e Edgar Morin, aponta o processo (anterior a Web), onde a excessiva especialização e um empobrecimento do Ser criaram um velamento do pensamento, diz a carta:

“ …a ruptura contemporânea entre um saber cada vez mais acumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido leva à ascensão de um novo obscurantismo, cujas consequências sobre o plano individual e social são incalculáveis.” (Arrábida, Portugal, 1994).

O problema então é como criar um saber que une e uma cosmovisão que amplie o espírito humano empobrecido e embrutecido, segundo a receita do próprio Morin: “é preciso substituir um pensamento que isola e separa por um pensamento que distingue e une”.

Toda a polarização e barreiras entre pensamentos distintos são a raiz onde o diálogo é ignorado, mesmo que as vezes afirmado, o fechamento semântico do pensamento, seja quais forem os princípios e muitos vezes morais, religiosos e até culturais são importantes, devem ultrapassar os pré-conceitos e ir ao encontro do positivo no Outro.

Diz a Carta de Arrábida no artigo 14: “A Abertura comporta a aceitação do desconhecimento, do inesperado e do imprevisível. A tolerância é o reconhecimento do direito às ideias e verdades contrárias as nossas”, este é o sentido de substituir um pensamento “que isola e separa” por outro que “distingue e une”, ter diferença não significa isolar ou mesmo separar.

É a ideia totalitária da verdade única, mesmo que religiosa, pragmática ou científica que muitas vezes isola e não une, em diálogos fundamentados sempre há elementos novos a serem considerados e poucas vezes eles são devidamente ouvidos e respeitados.

O físico Barsarab Nicolescu, um dos signatários da Carta de Arrábida, em seu próprio Manifesto da Transdisciplinaridade, a respeito da física quântica escreveu: “… de onde vem esta cegueira? De onde vem este desejo perpétuo de fazer o novo com o antigo? A novidade irredutível da visão quântica continua pertencendo a uma pequena elite de cientistas de ponta”, embora a realidade física a comprove e surpreenda.

Disse na referida carta sobre a “realidade”, “Em nosso século, Husserl e alguns outros pesquisadores, num esforço de questionamento a respeito dos fundamentos da ciência, descobriram a existência dos diferentes níveis de percepção da Realidade pelo sujeito observador”, mais do que isto o observador é parte do experimento, do todo, e não é neutro.

Toda a nossa lógica e as nossas ações se baseiam em três axiomas: O axioma da identidade: A é A, O axioma da não-contradição: A não é não-A;  e o terceiro é chamado axioma do terceiro excluído: não existe um terceiro termo T (T de “terceiro incluído”) que é ao mesmo tempo A e não-A.

O que Nicolescu afirma é o que aconteceria se tornássemos o terceiro incluído, foi o que fez Stefan Lupascu (1900-1988) ao criar a lógica do terceiro incluído (tertium non datur), incluindo o estado-T que não é nem “atual”  nem “potencial”, substituem a lógica clássica do “verdadeiro” ou “falso”, e cria um nível mais generalizado que inclui a física, a epistemologia e o que é “consciência”.

NICOLESCU, Basarab. O Manifesto da Transdisciplinaridade. Triom : São Paulo, 1999. PDF

 

Homenagem a Edgar Morin, 99 anos

08 jul

Dia 08 de julho de 2020 Edgar Morin completa 99 anos, com uma lucidez impressionante, descreveu recentemente a pandemia atual como: “Temos que aprender a aceitá-las e a viver com elas, enquanto nossa civilização instalou em nós a necessidade de certezas cada vez maiores sobre o futuro, muitas vezes ilusórias, às vezes frívolas”, a mesma frivolidade que afirma Peter Sloterdijk: “Nessa esfera frívola, pensávamos ser capazes de controlar a natureza com tecnologia sofisticada, mas o vírus nos deixou de joelhos. Nossa maneira de estar no mundo mudará?”.

De origem judaica sefardita (judeus que se estabeleceram na península ibérica), com o nome original de Edgar Nahoum, nasceu em 08 de julho de 1921 em Paris, seu pai Vidal Nahoum era comerciante originário da Salônica  (a antiga Tessalônica), e sua mãe Luna Beressi, faleceu quando tinha 10 anos, adotou o codinome Morin durante a luta da resistência francesa e permaneceu.

Casou-se em 1978 com Edwige Lannegrace, a quem dedicou o livro Edwige, a Inseparável (2009), após sua morte em 2008, sobre ele, ela dizia uma frase de Montaigne: “Era ele, era eu”.

É atualmente casado com a socióloga marroquina Sabah Abouessalam de 61 anos.

Escreveu 1956, Le Cinéma ou l´Homme Imaginaire, Minuit, Paris. Em português: O Cinema ou o Homem Imaginário. Lisboa: Relógio d’Água Editores, 1997, antes havia escrito Ano Zero da Alemanha (1946) e o Homem e a Morte (1951).

Entre outros livros, o segundo livro de grande impacto é O Paradigma Perdido – para uma nova Antropologia, Zahar, Brasil, 1979. (edição francesa de 1973).

Mas sua grande obra será os seis volumes do Método 1, o primeiro “A natureza da natureza” publicando em 1977, o segundo o Método 2, “A vida da vida” (1980), o Método 3 “O conhecimento do conhecimento” (1986), o Método 4 “As ideias: habitat, vida, costumes e organização” (1991), O Método 5 – a humanidade da humanidade: a identidade humana (2001) e o Método 6: a Ética (2004), os anos adotados são das edições originais francesas.

Publicou no total mais de 30 livros, em 1983 realizou um debate em Lisboa onde colocava “O problema epistemológico da complexidade” que tornou-se livro em 1985 publicado pela editora Europa América portuguesa.

Suas ideias centrais além do problema da complexidade são o retorno ao humano (que chamada de paradigma perdido), o pensamento transdisciplinar presente em quase toda sua obra e foi signatário da Carta da Transdisciplinaridade de Arrábida pelo pintor serigrafista Lima de Freitas, por ele, o físico Nicolescu Barsarabi, escrito em sintético 15 artigos, onde destaca-se:

“ …a ruptura contemporânea entre um saber cada vez mais acumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido leva à ascensão de um novo obscurantismo, cujas consequências sobre o plano individual e social são incalculáveis.” (Arrábida, Portugal, 1994).

Em 1985 escreveu “O problema epistemológico da complexidade” (Europa America, 1985) que foi pensado a partir de um debate realizado em Lisboa, em dezembro de 1983.

A essência de seu pensamento sobre a complexidade pode ser pensada em três conceitos novos, entre eles: o operador dialógico (entendido diferente do operador dialético), o operador recursivo (que significa entender as consequências dos atos, numa relação causa-efeito contínua porque o efeito produz nova causa) e o operador hologramáticos (a parte está no todo e o todo está na parte, então não separar a parte do todo).

Assim devemos unir coisas separadas, a saber: razão e emoção, sensível e inteligível, real e imaginário, razão e mitos, e, ciência e arte, outra coisa essencial é considerar que somos 100% natureza e 100% cultura, o velho paradigma natureza X cultura que a filosofia pergunta sobre o que somos, desde os contratualistas, passando pelos evolucionistas até os sócio-marxistas (escreveu A minha esquerda), Morin responde de maneira nova (de Pena-Veiga: O despertar ecológico: Edgar Morin e a ecologia complexa).

Sobre nosso futuro ele tem muitas indagações, a palestra a seguir explicar este momento dramático, que a pandemia pode demonstrar que é assim que devemos percebê-lo.

https://www.youtube.com/watch?v=V3t7UFTpDHE

 

Covid 19 no Brasil e o platô

29 jun

A análise a partir do número de casos infectados não é factível porque a testagem no Brasil ainda é pequena, feita pelas empresas ou pelos hospitais mas somente nos casos em que há suspeita de necessidade de hospitalização, e a estimativa que 5% das mortes corresponderiam ao número de infectados não é verdadeiro porque as medidas de isolamento são diferentes em várias regiões.

O platô que se iniciou do meio para o final de maio se alongou porque as regiões com maior número de infectados foi se alargando e no caso do Brasil indo para o interior, chamados de epicentro, o nome seria impróprio se houvesse isolamento, assim a contaminação se alastrou.

Além de não haver isolamento das regiões onde os casos de infecções começaram, o que foi feito em muitos países desde a China onde começou e a região de Wuhan foi epicentro, neste caso o nome se justifica, as medidas tanto locais como regiões de isolamento foram duras para conter a propagação.

A segunda questão é a forma de olhar o gráfico e os números, o gráfico que no início era uma exponencial e apesar ser necessário olhar fazendo uma escala logarítmica da curva para ver o grau de inclinação (por exemplo no início dobrava o número a cada dia e depois a cada dois dias, etc.), agora que a curva não tem mais um comportamento exponencial é necessário fazer o logaritmo.

Olhando a escala logarítmica da curva percebe-se claramente o platô (gráfico acima) e que os números estão girando um pouco acima dos mil casos diários de mortes, o grau de infecção como já se disse não é preciso, e assim percebe-se o platô que se prolonga já por um mês.

O motivo foi a análise inicial feita aqui, não havendo isolamento das regiões o vírus se propagou para regiões mais interiores e o novo “epicentro” é o interior do país, e assim deve se prolongar pelo mês de julho seja pela ineficácia das políticas de isolamento, seja pelo período de inverno.

 

Corona vírus: a flexibilização e a endemia

22 jun

Vários países no mundo se preparam para uma segunda onda do corona vírus, o Brasil não saiu da primeira e a parecer estacionado num platô em torno de mil mortes diárias, muitos analistas alegam que o Brasil é diferente por sua extensão territorial, desigualdade social e densidade populacional, muito bem, mas a Índia e China também e controlam a infecção com medidas duras.

Vários especialistas e infectologistas apontam que a política de flexibilização pode ser adotada se for admitido a possibilidade de reversão, isto é, onde o número de casos se agravar volta a quarentena, mas o esgotamento da população depois de mais de 100 dias não permite mais.

Aline Dayrell, professora e coordenadora do curso de Epidemiologia da UFMG, diz que só teremos segurança total se 70% tornar-se imune, veja que sãos os mesmos índices do isolamento social desejado, e o Prof. Carlos Fortaleza infectologista da UNESP-Botucatu diz a segunda onda é a possibilidade de qualquer doença transmissível, desde que a população não esteja imune.

A Índia com mais de 2 meses em abril, após o primeiro caso de infecção tinha 800 e 27 mil infectados, sendo mais populoso que o Brasil, porém os números se aceleraram e 4 dias atrás registrou 2 mil mortes diárias, mostrando que mesmo as medidas duras não foram suficientes.

China e Nova Zelândia que aparentemente tinham controlado o corona vírus, já admitem que é uma endemia, isto é, que não é possível erradicar totalmente a pandemia sem uma vacina.

“O risco de propagação da epidemia é muito alto, por isso devemos tomar medidas resolutas e decisivas”, disse Xu Hejian, porta-voz do governo da cidade de Pequim, epicentro da segunda onda do covid 19, na Nova Zelândia houve o caso de duas pessoas que vieram do Reino Unido para participar de um funeral, caso excepcional que o governo admite e que vai rever.