Arquivo para a ‘Redes Sociais’ Categoria
O poder e os dons
É possível que alguém que tenha dons muito especiais tenha também poder, mas apenas como um serviço a determinado grupo e em certo contexto, as duas coisas pouco se confundem, e confundi-las é quase sempre um artificio demagógico.
Pessoas sabias receberão cargos ou estarão em estruturas de poder apenas por mérito, ou porque há uma necessidade de seus dons para aquela estrutura ou centro de poder, porém se são pessoas que desejam o poder a todo custo, raramente terão os dons necessários para aquilo para a qual são designados.
O poder já foi estudado na filosofia de diversas formas, na polis grega ele era um convite a cidadania, porém quase todos os filósofos (é claro depois de Socrátes e dos sofistas) deveriam se formar em valores e ter virtudes que contribuiriam para um cargo dentro da polis grega.
Entre os filósofos contemporâneos Max Weber definiu poder como a imposição da vontade de uma pessoa ou instituição sobre os indivíduos, enquanto para Marx o poder reside naquele que possui os meios materiais de produção de capital, que na sua época era as fábricas e as terras, mas hoje seriam as grandes corporações, os donos das mídias verticais (TVs, Radios, etc.) enquanto para Michel Foucault o poder na contemporaneidade não se encontra centralizado, mas dissolvido na sociedade, também criou o conceito de biopoder, enquanto as práticas pelas quais os estados modernos procuram regular os sujeitos e “obter a subjugação dos corpos e controle de populações”.
Peter Sloterdijk escreveu sobre a situação “timótica” de nosso tempo, o termo “thymós” está na base da teoria de Platão para designar os “órgãos” de onde nascem os impulsos, as excitações, as afecções mais inflamadas, parecem de fato algo comum em nossos tempo, não reagimos com reflexão as situações de poder e de comando para quase sempre emocionalmente, por impulso.
Byung Chul Han, que foi aluno de Sloterdijk escreveu sobre o psicopoder, influenciado pelas mídias verticais e claro também presentes nas mídias de redes sociais, onde o estado de alta tensão timótica é instaurado pelas sucessivas e repetitivas notícias que garantem este estado.
Os dons pessoais, coletivos ou sociais de cada pessoa ficam submersos a estas estruturas de poder e propaganda, semelhantes ao fascínio que exerceram os discursos de ditadores e populistas no período da guerra e posteriormente, e não podemos imaginar que isto esteja longe da realidade atual.
Quais são os dons daqueles que poderiam servir a população se não estiverem subjugados a este ou aquele grupo de pressão, é cada vez menos plausível, então o palco para demagogos e populistas está em aberto, e os ditadores estão a espreita.
Pandemia e suas segundas ondas
Na história houveram oito pandemias deste tipo desde 1700, vamos notar que pelo menos sete tiveram uma segunda onda em alguma parte do mundo, conta os registros de infectologistas, porém temos na memória a Gripe Russa (de 1889 a 1890), com a Gripe Espanhola (de 1918 a 1919), a Gripe Asiática (de 1957 a 1958), a de Hong Kong (1968 e 1969) e mais recentemente a Gripe Suína (de 2009).
A segunda onda da covid-19 na Europa está se espalhando de modo mais rápido do que a primeira, afirmou o infectologista Arnaud Fontanet, conselheiro científico do governo francês par ao combate a pandemia, enquanto a mutação do vírus se espalhou a partir da Espanha é já é 80% dos novos casos registrados.
A segunda onda pode ocorrer por vários motivos, entre eles o comportamento humano, que significa como lidamos com o vírus e sua sazonalidade, também o número de pessoas suscetíveis, duração de imunidade e mutações (como a da segunda onda na Europa) são outras possíveis explicações para esta onda.
O comportamento é fácil de explicar, dificilmente em países mais liberais as pessoas estarão menos propícias a aceitar as privações do isolamento, já a sazonalidade pode ser entendida como picos em diferentes estações do ano, na Europa os picos são o outono e o inverno que acontece agora, enquanto no Brasil varia de acordo com a região: o Norte e Nordeste tem períodos mais chuvosos, no Sudeste e no Sul que se iniciará em março de 2021.
A promessa de uma vacina “mais rápida” é temerosa, os especialistas que respeitam o período de testes entendem que será muito difícil uma vacina antes de julho do ano que vem, e devemos respeitar e ser prudente com o período de testagem, equívocos de uma vacina podem ser mais graves que a própria pandemia.
Se a segunda onda ocorrer, a intensidade e a gravidade vão depender de nossa capacidade de aplicar medidas de intervenção e coordenação das medidas em um mundo que polarizou até mesmo questões básicas como saúde, alimentação e seguridade social, disto dependerá se a segunda onda seja mais grave que a anterior.
A principal função de esclarecer a segunda onda, o processo regulamentar de testagem das vacinas e as medidas preventivas é mantar a calma e a confiança da população de que está havendo um combate aos estragos provocados pela pandemia, é difícil, porém sem isto teremos um caos social cada vez maior.
Uma cidadania planetária
A crise pandêmica mostrou que nossos problemas mais sérios são globais, afetam todo planeta, a segunda onda que já está na Europa não tardará a chegar nos diversos continentes, se é que já não chegou em pequenas doses, elas nos levam a pensar planetariamente o que parece difícil com a polarização política.
O que é preciso é abandonar velhas propostas, e tornar possível a convivência da liberdade privada com as fortes urgências sociais, a proposta do banqueiro dos pobres Mohanmmad Yunus vai nesta direção, eliminar a pobreza, a emissão de carbono e garantir empregos para todos, tornou-se na pandemia mais urgentes.
Não é a proposta única, é claro, outra como economia solidária, criativa, grupos de cooperativas de pequenos agricultores, podem compor uma ecossistema produtivo capaz de se adaptar a interesses e vocações locais de produção e de vida humana, é preciso sobretudo sair do excesso de consumo e do stress social.
Não é menor nem desprezível os aspectos culturais nos quais se incluem as religiões e crenças (no sentido lato da palavra) dos povos e nações, faço distinção porque muitas nações já tem em seu interior povos de origens culturais diferentes, o que aqui se chama de cultura originária, nas quais incluem-se também as indígenas.
Não há um concerto claro de como isto pode ocorrer, um amplo diálogo pan-nacional (o que dissemos a pouco de “povos”) é fundamental para organizar um novo ecossistema social aonde o fundamento da seguridade social aliado a liberdade pessoal esteja como premissa para traçar este futuro.
Por enquanto, como uma família que desorganizou as contas da casa, e colhe muitos dissabores desta desorganização, ainda há ditaduras de diversas ideologias no planeta, guerras como tentativas de submissão cultural, novos tipos de colonialismo, embora tenha surgido uma forte corrente de decolonização (o termo é esse), o que acontece no planeta pode ser uma ruptura em situações graves e própria “casa comum” pode reagir, o que já chamamos de mutação aórgica.
Uma passagem bíblica fala sobre a sabedoria e os que a procuram, ela é um estágio acima da simples inteligência, é preciso estar aberto ao novo e deixar também o que ela “entre”, diz o livro da Sabedoria (Sb 6,13-15): “Ela até se antecipa, dando-se a conhecer aos que a desejam. Quem por ela madruga não se cansará, pois a encontrará sentada à sua porta. Meditar sobre ela é a perfeição da prudência; e quem ficar acordado por causa dela, em breve há de viver despreocupado”.
Assim a sabedoria está aliada ao dom da “prudência”, e meditar sobre ela é “a perfeição da prudência”, a ignorância cria apenas fanatismos e crueldades.
A morte e a vida
Pablo Picasso tem razão ao dizer que “a morte não é a maior perda da vida. A maior perda da vida é o que morre dentro de nós enquanto vivemos”, porém diante de uma pandemia que ameaça a todos, diante de uma segunda onda que promete ser ainda pior, Makron e outros governantes da Europa já o disseram, devemos encarar o tema.
Onde foi Dia de Finados, lembrar de mais pais e algumas pessoas que já não estão mais aqui sempre me fizeram um acalanto diante da vida e da morte, o que viemos fazer aqui nesta curta passagem, deveria ser a questão destes dias.
A pandemia poderia ter ensinado mais, ao menos conseguiu frear o vida frenética da Sociedade do Cansaço, mas a grande maioria das pessoas se comporta como se não houvessem muitas pessoas morrendo e que também elas podem estar de repente diante de uma encruzilhada, que assim penso, não será pessoal apenas, mas todo o planeta.
Li num dos últimos livros de Edgar Morin: “em vez de ser terra de ninguém, poderíamos ser terra de todos”, não é o ainda acontece, hoje é dia de eleições nos EUA, sem polarizar pode-se dizer se ganhou a vida ou a morte, não falo de políticas governamentais também, mas as ameaças de guerra que sempre pairam sobre a humanidade em tempos de guerra.
Todos um dia abandonaremos nossos sonhos, promessas e as coisas boas que fizemos, será hora de prestar contas se não a Deus, aos que creem, as gerações futuras sobre o legado que deixamos.
Viver a vida e ser feliz deve ter sempre como complemento também a felicidade dos outros, se não sou causa de felicidade a minha volta, a minha própria pode estar comprometida, e no fim da jornada ficará apenas aquilo que fizemos de bom e que os que ficam terão prazer em recordar.
A relação com o Outro e com a Natureza que é também um outro, deve ser modificada para que tenhamos esperança num futuro promissor para os que nascem.
Ainda o amor em Santo Agostinho
O que fez Hannah Arendt chegar a conclusão que uma civilização do Amor não era possível, além de sua experiência pessoal como judia que não voltaria a sua “casa” em Israel, ainda tem que tivesse feito planos para isto, é a incompreensão do Caritas Agápico, o verdadeiro amor.
A filósofa Julia Kristeva divulgou um relatório reservado do orientador Karl Jaspers sobre sua orientanda Hannah Arendt, parecia-lhe que sua aluna que sua aluna na época “[…] estava apta a sublinhar o essencial, mas que ela, simplesmente, não reuniu tudo o que Agostinho disse sobre o amor. […] Alguns erros surgem nas citações. […] O método exerce alguma violência sobre o texto. […] A autora quer, através de um trabalho filosófico de ideias, justificar sua liberdade com relação às possibilidades cristãs, que, no entanto, a atraem. […] Não merece, infelizmente, a mais alta menção [cum laude]. Efetivamente, Arendt parece privilegiar, em Agostinho, o filósofo, em detrimento do teólogo.” (KRISTEVA, 2002, p. 41).
A filósofa Kristeva assinala o ponto essencial indo mais a fundo no pensamento de Agostinho, e questiona que tipo de amor o filósofo se referia e se existiria mais de um tipo de amor, além dos já conhecidos filia, ágape e Eros: “Numerosos termos declinam o conceito de amor em Agostinho: amor, desejo (com suas duas variantes, appetitus e libido), caridade, concupiscência, formando uma verdadeira ‘constelação do amor’ (…)”. (KRISTEVA, 2002, p. 42).
O que havia de revolucionário na forte mensagem cristã de Agostinho, além de sua capacidade intelectual e teológica, era a noção de libertação das leis antigas, o que alguns chamam incorretamente de legalismo (não se trata de leis “humanas”), centrando no amor a base da religião era possível superar a filiação anterior de Agostinho do dualismo maniqueísta, ao qual ainda boa parte da teologia e da filosofia estão presos, esta última porém mais ligada ao racional-idealismo atual.
Será impossível pensar em uma civilização que supere o ódio, a violência e a divisão dualista da sociedade sem haver caridade verdadeira, aquela que se estende a todos, aquela que admite a diversidade, e aquela que almeja a justiça, conforme pensava Agostinho: “onde não há caridade não pode haver justiça”, e assim o desejo maior de justiça deve ter como pressuposto a caridade, ainda que ela pareça altruísta demais, ou piegas, basta ver o que o ódio construiu senão guerras e violência.
O conjunto de volumes do “Gênio Feminino” de Julia Kristeva (1941- ) é analisar e prestar uma homenagem a três pensadoras do século XX, talvez a mais conhecida Hannah Arendt (1906-1975), Melanie Klein (1882-1960) e Colette (1873-1954).
Julia Kristeva é considerada uma estruturalista (ou pós), junto a Gérard Genette, Lévi Strauss, Jacques:Marie Lacan, Michel Foucault e Althusser, tem ainda um importante trabalho sobre semiótica Introdução à semanálise (2005), onde diz frases contundentes como: “todo texto se constrói como um mosaico de citações” (Kristeva, 2005, p. 68) e ainda: “O texto não denomina nem determina um exterior” (KRISTEVA, 2005, p. 12), afirmando assim que a literatura não dá conta do real.
KRISTEVA, Julia. O gênio feminino: a vida, a loucura e as palavras. Rio de Janeiro: Rocco, 2002.
KRISTEVA, Julia. Introdução à semanálise. Tradução de Lúcia Helena França Ferraz. 2 ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.
Transformação digital além da Buzzword
Alertamos e problematizamos nos 10 anos deste blog a transformação que estava sendo encaminhada pelas mudanças digitais, aspectos sociais, educacionais, industriais e até mesmo comportamentais, boa parte dos céticos reagiam, ironizavam ou desprezavam uma mudança real que estava acontecendo.
A pandemia mostrou que as ferramentas mais do que necessárias podem construir pontes, estabelecer relações novas, dinamizar empresas e evitar desperdícios de tempo, dinheiro e principalmente nestes tempos por em perigo a saúde.
Agora todos vivem a realidade digital, empresas sobreviveram por serviços online, famílias, grupos sociais, serviços públicos e reuniões de diversos tipos dependem das ferramentas digitais, os espetáculos dependem de lives, de meetings ou postagens em ferramentas de mídias sociais.
Uma buzzword surgiu muito forte a chamada “transformação digital”, porém o perigo do oportunismo é grande de empresas e sites que exploram e mistificam estes serviços e cobram caro por ele, assim alguns conceitos são necessários, primeiro o que acontece diferente na geração Z da anterior chamada de millennials, os que são nascidos no início do milênio, portanto antes do ano 2000, que agora tem de 22 a 37 anos.
Os millenials acompanharam a evolução a Web (as páginas, sites e blogs), nasceram numa realidade em que os computadores eram uma eletrodoméstico, assim só eram usados em casa e opcionalmente na escola, enquanto a geração Z através do celular levou o mundo digital a todo lugar, criam os grupos de chats e tem um comportamento diferente com a credibilidade dos sites, blogs e mídias de redes, criam suas próprias relações e ídolos, em geral diferente do tudo que é conhecido.
Embora mais fechados e com tendência a pouca relação social, são mais críticos que os millenials, mais ansiosos, são mais eficientes e são mais exigentes.
Assim as relações com o mercado são muito diferentes, voltam a preferir as compras em lojas físicas e selecionam bem o que compram, menos impulsivos e já tem a tecnologia com um excelente apoio, embora muito conectados já conhecem os limites da tecnologia.
Grandes revistas de economia como a Forbes e a Fortune fizeram análises da geração Z para entender a transformação de mercado necessária, a Forbes diz que ela representa 25% da população mundial atual, o meio digital é parte natural da vida deles, como a TV e o rádio das gerações passadas, enquanto a Fortune afirma que 32 da geração Z se esforça para um trabalho dos seus sonhos e descartam assumirem qualquer trabalho, embora temporariamente aceite para alçar o futuro.
Assim os CRMs ( Customer Relationship Management) antigos não funcionam e muitas críticas e análises feitas para a geração millenials estão ultrapassadas.
Segundo Kasey Panetta, pesquisadora da Gartner, 5 conceitos novos são emergentes: Composite architectures, arquiteturas ágeis e responsivas, Algorithmic trust, produtos, links, sites e transações confiáveis, Beyond silicon, os limites da lei de Moore da evolução dos computadores, agora tecnologias menores e mais ágeis são procuradas, Formative Artificial Intelligence (AI) adaptação ao cliente, customização dos serviços, tempos e localização, e o conceito Digital Me, uma espécie de passaporte para o mundo digital, ferramentas e sites que já conhecem o cliente e suas necessidades, formas de comportamento e preferencias.
Portanto todo o universo digital que parecia estável também vai desmoronar e muito do que se chama “transformação digital” é só uma mistificação digital, cuidado com oportunistas.
Panetta, Kasey. 5 Trends Drive the Gartner Hyper Cycle for Emerging Technologies, 2020. Disponível em: https://www.gartner.com/smarterwithgartner/5-trends-drive-the-gartner-hype-cycle-for-emerging-technologies-2020 , Acesso em: 15 de setembro de 2020.
Politização da vacina e cuidados
Na quarta feira passada (14/10) o Ministério da Saúde do Brasil apresentou aos secretários de saúde dos estados um cronograma de vacinação contra a covid-19 que teria início em abril de 2021, a previsão é para a vacina AstraZeneca, desenvolvida em parceria com a Universidade de Oxford, que está na terceira fase de testes e deve ser produzida no Brasil pela FioCruz, em Manguinhos, no estado do Rio de Janeiro.
Alguns governadores, em especial o governo do estado de São Paulo tem interesses na empresa chinesa Sinovac, embora a China também aposte na vacina de Oxford, esta vacina está em teste feito pelo Instituto Butantan da Universidade de São Paulo, e o secretário da Saúde de São Paulo Jean Gorinchteyn afirmou a jornais paulistas que “as vacinas não estão sendo tratadas de forma republicana pelo Ministério da Saúde, pois a vacina chinesa pode ter disponível 46 milhões de doses em dezembro e mais 14 milhões até fevereiro de 2021 e 40 milhões até junho de 2021.
Mas a disputa não para aí, a gigante americana Pfizer anunciou na sexta feira (16/10) que pode solicitar uma autorização de “emergência” para sua vacina contra a covid-19 até o final de novembro, disse Albert Bourla, CEO do grupo em carta publicada nas redes sociais: “Permitam que seja claro, supondo que os dados sejam positivos, a Pfizer solicitará uma autorização de uso de emergência nos Estados Unidos pouco depois da etapa de segurança, na terceira semana de novembro, o que indica que também quer participar da disputa, embora inicie a vacinação nos EUA.
Por causa de um pedido da parceira alemã BioNTech, havia um pedido de espera de 2 meses para a segunda dose da vacina (esta vacina é em duas doses) , mas Albert Bourla mostra a politização ao afirmar que “poderíamos saber se nossa vacina é efetiva ou não no final de outubro”, lembro que as eleições americanas acontecem em 3 de novembro, e isto seria um trunfo de Donald Trumph.
Segundo a organização Mundial da Saúde, e o infectologista Claudio Stadnik da Santa Casa, apenas 10 vacinas estão na fase III, e a previsão se o cronograma for seguido, apenas as vacinas da AstraZeneca/Oxford, Sinopharm (China)/Wuhan Institute of Biological Products (China) e Sinopharm (China)/ Beijing Institute of Biological Products (China) estariam prontas em julho de 2021 enquanto a Moderna (EUA) e Sinovac/Biotech (China) em outubro de 2021.
Portanto política a parte, este seria o quadro real seguindo os preceitos sanitários e médicos, antecipar é dar possibilidade ao erro e vidas estão em jogo.
Veja o gráfico acima: Fonte: Organização Mundial da Saúde e Cláudio Stadnik, infectologista da Santa Casa.
Política e religião
Hannah Arendt vai argumentar contra a confusão entre política e religião, e esclarece a diferença entre um local de reunião (sendo pública) com diferenças do que chama de aparência e manifestação. Diz a autora:
“A política cristã sempre esteve diante da dupla tarefa de, por um lado, assegurar-se através da influência sobre a política secular, de que o local de reunião não político dos fiéis esteja protegido de fora, e, por outro lado, impedir que um local de reunião se torne um espaço de aparição, e com isso que a Igreja se torne um poder secular-mundano, entre outros. Daí, verificou-se que a vinculação com o mundo correspondente a tudo espacial e o faz aparecer e parecer, é muito mais difícil de se combater do que a reivindicação de poder do secular, que se apresenta de fora para dentro. Quando a Reforma conseguiu afastar da Igreja tudo aquilo que tem a ver com aparência e manifestação, transformando-a de novo em local de reunião para aqueles que, no sentido dos Evangelhos, viviam no recolhimento, desapareceu também o caráter público desses espaços da Igreja. “
A autora não viveu até nossos dias para ver as consequências disto, ou seja, que a negação do caráter público desses espaços da igreja, transformou-a no oposto, isto é, num oportunismo político para ganhar os fiéis que vão ali buscar uma mensagem divina, um conforto para a alma, e muitas vezes a mudança de vida (conversão).
O que aconteceu foram duas apostasias, a religiosa que é negar o poder divino de Deus, “meu reino não é deste mundo” e a segunda muito pior, que é afirmá-la como poder humano ao qual a política pública deve se submeter e assim tornar os fiéis religiosos vinculados a alguma corrente política, ideológica ou cultural.
Mesmo Jesus sabendo que os judeus viviam sobre um império romano opressor e injusto, isto pode ser observado quando diz, entre muitas passagens: “os publicanos e as prostitutas vos precederão no reino dos céus” (Mt 21,31), que os aproxima como pecadores, e os publicanos eram os responsáveis pela província perante o Império Romano, inclusive a renda e os impostos.
Isto é necessário para compreender o sentido da política e da religião no trecho em que Jesus é questionado sobre a justiça de pagar o tributo ao imperador, ao que ele responde: «Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus.» (Mt 22,21) portanto logo após o trecho anterior, onde é questionado o direito (e o poder) de perdoar os pecados, qual era de fato sua autoridade e depois irá compará-la ao poder temporal (e espacial conforme Arendt) do que é “fora” da reunião.
Em termos específicos do religioso a apostasia de apostar em partidos e ideologias, quase sempre com duplicidade de propósitos e fundamentos, ora favorecem a vida, ora a desfavorecem (o aborto e a eutanásia, por exemplo), ora defendem os pobres, ora justificam a corrupção, e assim por diante, não deve ser comparado ao infinito poder divino, claro para aqueles que acreditam, e para os que não creem a busca de uma diretriz para a sociedade e para o mundo implicam em valores.
O sentido da política e as redes
A desconfiança da política (e dos políticos) é tão antiga quanto a tradição da filosofia política, escreve Hannah Arendt e é através desta questão que pode-se entender o sentido da política.
Logo em seguida na introdução ao fragmento 3b escreve: “A política, assim aprendemos, é algo como uma necessidade imperiosa para a vida humana e, na verdade, tanto para a vida do indivíduo como da sociedade”, e acrescenta pouco a diante a: “Tarefa e objetivo da política é a garantia da vida no sentido mais amplo”.
Em seguida vai esclarecer um equívoco antigo, presente em toda cultura ocidental, já dissemos em outro post do zoon politikon, diz a autora que não é: “uma designação qualquer para o convívio humano, não achava, de maneira nenhuma, que todos os homens fossem políticos ou que a política, ou seja, uma polis, houvesse em toda parte onde viviam homens”, ele julgava “ser apenas uma característica do homem o fato de poder viver numa polis e que essa organização da polis representava a forma mais elevada do convívio humano”, mas sabia que estava longe de ser uma sociedade de anjos e ela estava restrita a um grupo de pessoas.
Esclarece a autora que o que distingue o convívio dos homens na política das outras formas de convívio humano era a liberdade, para uma classe de pessoas.
O sentido da política para os gregos esclarece Arendt no parágrafo 3c: “E o objetivo não era pura e simplesmente a liberdade tal como ela se realizava na polis, mas sim a libertação pré-po-lítica para a liberdade na polis. O sentido da coisa política aqui, mas não seu objetivo, é os homens terem relações entre si em liberdade, para além da força, da coação e do domínio. Iguais com iguais que só em caso de necessidade, ou seja, em tempos de guerra, davam ordens e obedeciam uns aos outros; porém, exceto isso, regulamentavam todos os assuntos por meio da conversa mútua e do convencimento recíproco.”
Assim tal como surgiu na polis grega o que é “… decisivo nesse contexto não é tanto o conflito entre a polis e os filósofos — nos quais mais tarde teremos de entrar em detalhes* — mas sim não poder persistir a simples indiferença de um âmbito em relação ao outro, na qual o conflito pareceu solucionado por um momento, porquanto impossível o espaço da minoria e sua liberdade — se bem que era também um âmbito público e não-pri-vado — desempenhar as duas funções, assim como a política incluía todos os que estavam aptos para a liberdade”.
A nota* (número 17 no texto) segundo a compiladora dos fragmentos é que pode se tratar de um capítulo não escrito sobre “A posição Socrática”, o que a autora está tratado aqui é a diferença entre o que foi aprofundado por muitos autores mais tarde entre o espaço público e o espaço privado, que deveriam estar aptos a liberdade.
O que acontece no mundo contemporâneo com a mídias de redes sociais, nunca é demais diferenciar mídias das próprias redes que são o conjunto das relações sociais que Hannah Arendt recupera, é de suma importância porque vai possuir propriedades diferentes daquelas que estão entre os “privilegiados” políticos, tal como os gregos os estabeleceram e como diz a autora, que muitas vezes rejeitamos por não sermos políticos profissionais.
O conjunto do convívio humano não era possível de ser pensado antes da comunicação global e das mídias de redes sociais, a polis grega foi uma experiência social de pequenas cidades-estados onde uma parte da população que era livre podia estabelecer a democracia nela, porém o conjunto da sociedade não era livre.
As novas emergentes realidades criam um maior espaço de convívio humano e denotam as fragilidades civilizatórias, e colocam a própria democracia em cheque, ainda há cidadãos que são livres apenas para votar e a política é dominada por minorias que tomam o poder para estabelecer seus privilégios.
(English) Politics and the crisis of human thought
A ideia que há um juízo do gosto, sobre o qual sentenciou também Kant, que não se pode “discutir”, mas sim brigar e chegar a um acordo, nós o conhecemos bem na vida cotidiana, e Hannah Arendt já apontava isto nos anos 50, numa situação ainda desconhecida, opinamos que este ou aquele teria julgado a situação correta ou erradamente, assim não é assunto de hoje, mas desde que o relativismo, a ausência de valores e de parâmetros se instalou no conjunto da sociedade.
Se a função do preconceito é defender o homem julgante tanto da liberdade de fazê-lo como de não se expor abertamente diante de cada realidade encontrada e daí ter de defrontá-la pensando, assim as visões de mundo e ideologias parecem cumprir esta tarefa, uma vez que as protegem de toda experiência,, pois supostamente todo o real estaria nelas previsto de alguma maneira, mais isto era o que defendia a neutralidade científica e que é possível achar soluções “científicas” em cada caso.
Essa falta de parâmetro do mundo moderno, a impossibilidade de se julgar o que aconteceu e acontece todos dias segundo critérios fixos e aceitos por todos, de submetê-los a um esquema geral conhecida, é porque há uma dificuldade estreitamente ligada a isso, de indicar princípios da ação para o vai acontecer, é incerto.
O que há de brilhante em Hannah Arendt, e também encontramos em muitos outros humanistas contemporâneos como Edgar Morin e Hans Georg Gadamer, é que ela entende por mundo (humano-social) não o mundo natural (da vida, dos animais, por exemplo), nem do universo (o mundo físico), o que ela está tentando definido é um novo “social” (entrelaçados, diríamos em termos atuais em rede), e para ela este humano, nesse sentido é um ente social.
O espaço entre os homens que é o mundo não faria sentido sem os próprios homens, assim como o universo ou a natureza sem homens, seria uma contradição em si, sem isso significar que o mundo e as catástrofes que nele ocorrem seriam reduzidos a um acontecer puramente humano, muito menos ainda que fosse algo que reduzidos a algo que acontecesse com “o homem” ou com a natureza do homem.
Se poderia objetar com facilidade ser o mundo do qual é falado com apenas um mundo dos homens, isto é o resultado do fazer e do agir humano, como queiram, estas capacidades pertencem à natureza do homem, e quando falham não se deveria mudar a natureza do homem, antes de se poder pensar numa mudança do mundo ?
É a partir desta visão que Hannah Arendt vai pensar o sentido da política, esta pergunta é muito antigo, muito mais do que se pensa, Platão censurava Péricles ao dizer que os atenienses não seriam melhor depois que morressem, e será este o assunto de Hannah Arendt no fragmento 3b.
ARENDT, Hannah, (1998) “O que é política” (1950), obras póstumas 1992, compiladas por Ursula Ludz. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.