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Arquivo para a ‘Antropotécnica’ Categoria

Entre a filosofia e os mistérios

09 jun

A relação entre teologia e filosofia já fazem mais de 5 séculos se perdem, quando algum teólogo sério resolve falar de filosofia é para criticá-la ou para admiti-la acriticamente e então perde a fé.

Li o testemunho de ex pastor metodista americano, que escreveu: “Desisti do cristianismo porque afirma muito e explica muito pouco. Sabemos tão pouco sobre o Cosmos em que estamos flutuando – nossa casa é um sistema solar entre trilhões -, mas os teólogos se gabam e postulam sobre Deus, como se tivessem alguma maneira de saber tudo isto”, David Madison, Final Sermon in a Pandemic Time.

São indagações que muitos fazem, a minha experiência espiritual sempre envolveu algo que me tirava os pés da terra, embora eu me esforce para mantê-los ali, gosto de críticos da religiosidade de nossos dias, como Sloterdijk porque me acordam, e sua descrença no humanismo de nosso tempo é um guia para minhas questões atuais, como na pandemia e os problemas que a envolve.

Quando penso em conversão penso primeiro na minha e depois naqueles que estão comigo na caminhada e depois nos cristãos “adormecidos”. mergulhamos na pericorese, emprestei o texto a alguns amigos e eles me devolveram com comentários, fiz minha própria pericorese, minha fusão de horizontes.

E tive algumas respostas que não imaginava, uma delas sobre o que será o futuro do humanismo, descobrimos em meio a pandemia a solidariedade como também o racismo, a violência doméstica e a insensibilidade de alguns diante do flagelo, na figura acima A cruz nas montanhas de Caspar David Friedrich ( ca 1812).

A resposta e nova questão que encontrei foi na leitura de um texto de Sloterdijk, que ele chama de relação aórgica, está no Matrix in grêmio: um capricho mariológico, ele não é um teólogo, alias afirma que religiões não existem.

Minha questão ela a relação do orgânico, toda a natureza e humanidade e dela a pericorese divina, mas fundada na relação humana, e como se fosse um teólogo, Sloterdijk responde na Digressão 10 do primeiro volume da Trilogia Esferas:

Matris in gremio: Um capricho mariológico” (pag. 556) em que a interpenetração aórgica se alia à orgânica na gravidez, em Maria, do Filho de Deus, no qual os dois partilham do mesmo espírito e o mesmo sangue, e ambos na Trindade e no útero da Virgem, a interpenetração é surreal, além da pericorese.

Minha questão o que aconteceria se houvesse uma relação aórgica, o orgânico num fenômeno inorgânico real, duradouro, visível a todo ser humano e não apenas aos místicos ? Claro isto num ocorreu, mas se ocorresse ?

SLOTERDIJK, P. Esferas I: bolhas. São Paulo: Estação Liberdade, 2016.

 

Translatio studiorum e as técnicas da escrita

03 jun

O longo período que foi desde o início da escrita registrada, a scriptura, até o surgimento dos copistas, chamado de oralidade mista, é chamado de translatio studiorum, onde a própria escrita vai passar por muitas variações técnicas, e nelas se destacam São Jerônimo que compilou e elaborou a primeira versão da Bíblia.

Neste período se destacam os chamados padres capadócios, Gregorio de Nissa (335, morto em 394), seu irmão Basílio, o Grande, e Gregório de Nazianzeno, cuja escrita é importante para o que tanto Hannah Arendt quanto Byung Chull Han vão analisar na vita activa, e aqui liga-se a informação em tempos de novas mídias, mas será feito no decorrer da semana.

Translation Studiorum, período de transferência de saberes, de uma época para outra quando as técnicas da cultura estão variando, e assim sua antropotécnica, entre diferentes culturas e religiões, sobretudo no Ocidente e no Oriente Médio, onde há a cultura do originária do livro das três grandes religiões abraamicas (vem do Pai Abraão), o Alcorão, a Torah e a Bíblia.

O translatio corresponde assim ao período de auge e decadência do pensamento greco-cristão, que possui mais enlaces do que é aparente, e que seria preservado e teria continuidade no mundo ocidental sob a forma de uma doutrina filosófica dominante e influente a trinitária e neoplatônica.

De Trinitate de Santo Agostinho é tão revelador quanto seu popular livro Confissões, e a influência de Plotino tanto não pode ser negada, como não pode ser supervalorizada, não é negada porque a concepção de Uno da alma em Plotino é essencial, e supervalorizada porque a conversão de Agostinho o desloca do centro deontológico de Platão, o Sumo Bem, para o ontológico: o Ser pessoa e trinitário do pensamento cristão.

Porém os padres capadócios trazem conceitos que podem ser explorados a luz do pensamento atual, Ousía (οὐσία, pronúncia correta é “ussía”), é traduzida um substantivo da língua grega dando origem a essência e substância, mas sendo feminina e conjugação no particípio presente do verbo “ser”, a interpretação heideggeriana é “presente” ou presentidade (ser-presente).

Também exploraremos o sentido da palavra hypostasis, do grego prosopon, vem da teologia grega com o significado de pessoa, e em articulação com o ousia dá um sentido ao trinitário.

 

A retomada ontológica e o esquecimento trinitário

29 mai

A ideia de uma substância espiritual absoluta, infinita, única e eterna (veja o post) longe de ser uma ideia de Deus, longe de ser o desvelamento da Trindade Santa, é um esquema idealista da racionalidade para um Deus abstrato, porém compatível com o hegelianismo, o deus idealista.

A crítica severa de Sloterdijk ao humanismo faz sentido agora ainda mais com as perspectiva do pós-pandemia, colocando a “vontade de poder” das duas guerras e um possível cenário futuro, como “síntese do humanismo e do bestialismo” (Sloterdijk, 2000), é claro temos outras possibilidades, as variadas teses ideológicas que muitos apostam ou uma terceira excluída: a fraternidade planetária e uma via solidária.

Assim como a retomada ontológica propôs uma lógica e uma epistemologia nova, que vem da epoché (colocar todos conceitos entre parêntesis) husserliana, junto a uma teologia nova, esta sim trinitária, onde existe uma terceira pessoa na Trindade, que é o Espírito Santo, mas não é simples.

O teólogo cristão e católico Karl Rahner escrevia sobre o “esquecimento trinitário” (Rahner, 1961), mesmo antes do Concílio Vaticano II (1962-1965), que marcou uma virada no pensamento católico, primeiro concílio ecumênico que gerou algumas polêmicas e que até hoje não é bem aplicado,

O Concílio Vaticano II marcou uma profunda mudança na relação da igreja com a sociedade, devia abrir uma nova perspectiva da participação dos popular (dos leigos), uma nova visão da missão da igreja e em especial apresentação da atualização e inserção da igreja no seu tempo com vários aspectos litúrgicos e pastorais.

Muitos cristãos em geral entendem bem o Pai e o Filho, mas o Espírito Santo é um mistério, não síntese e nem apenas a relação com Deus Pai (Aquele que ninguém viu) e nem o Jesus (O Deus visível), o Deus vivo, histórico, mas sem deixar de divino e o Espírito Santo.

A teologia clássica tratava o “mistério” da Trindade com a ideia de uma “substância espiritual absoluta, infinita, única e eterna”, assim Deus seria uma única substância, essência ou natureza, explicado como três subsistemas e pessoas distintas: Pai, Filho e Espírito Santo, nestas ideias do sistema hegeliano (e de Feuerbach) se encaixam bem.

Já a compreensão do Ser como ato e potência (própria de Tomás de Aquino), e potência assemelha-se ao virtual, coloca as pessoas divinas como relação e se integram numa nova síntese que vê Deus como comunhão pericorética* de amor, teólogos de diferentes tendências como von Balthasar, Rahner e Kasper caminharam nesta direção e a questão ontológica é um viés comum. (* mais que relacionamento, interpenetração)

 O Concílio Vaticano segunda já refletia já a virada de uma perspectiva metafísica de uma teologia que prioriza uma compreensão mais histórica, fenomenológica, hermenêutica e existencial da realidade, mais em sintonia com a cosmovisão e a cultura atual. 

A compreensão do ser como ato (tão própria do Aquinate) e das pessoas divinas como relação, se integram numa nova síntese que entende Deus como comunhão pericorética de amor.

A compreensão por outro lado de potência como virtus, possibilidade virtuosa do Amor que é essencial para entender que o pecado é não-amor e não mera oposição maniqueísta do mal.

RAHNER, K. Advertencias sobre el tratado dogmático “de Trinitate”. In: Escritos de Telogía IV, Madrid: Taurus, 1961.

 

LockDown e frivolidade

11 mai

Enquanto o vírus se expande e começa a chegar mais no interior do Brasil e em muitos lugares a vida continua “normal”, enquanto a Europa tenta aos poucos voltar a nova normalidade, isto é, voltar ao comércio e o consumismo e a vida agitada anterior, que Sloterdijk chama de frivolidade (El país).

São dois cenários, o caso brasileiro enquanto alguns apostam que a curva chegou no platô, os novos dados apontam para uma expansão ainda maior do vírus, apostar que podemos conter a grave situação pandêmica com medidas pouco radicais vai se mostrando ineficiente.

A razão da pressão para abertura do comércio, mais que econômica, é claro que ela atinge a economia de todo o planeta, o motivo real na cabeça de muitas pessoas é voltar ao dia a dia de um elevado stress, de correria e de consumismo para aqueles que dispõe de recursos para isto.

Atingimos, no Brasil, o patamar de 10 mil mortes, tanto na vida pessoal quanto na vida social, se chegamos a uma gravidade de uma doença ou tomamos medidas radicais ou assistimos ao total agravamento da doença, no caso social, a expansão virótica e o agravamento da pandemia.

Na reflexão de Sloterdijk, que escreveu ao meu ver, dois livros emblemáticos Esferas e Crítica da Razão Cínica, ele apresenta dois conceitos-chave que são a coimunidade e a antropotécnica.

O primeiro conceito de coimunidade significa que podemos estabelecer um compromisso individual voltado à proteção mútua, que marcaria uma nova maneira mundial de enfrentar os problemas e o conceito de antropotécnica significa entender que as técnicas, neste caso e é o principal conceito usado por Sloterdijk, a biotecnologia, ou seja, o que inclui a manipulação genética.

Quando lançado gerou muita polêmica na Europa, devido a manipulação de genes por exemplo, porém agora que as principais pesquisas de defesa do coronavirus mostram a importância do uso de anticorpos para a produção da vacina, e a primeira coisa foi a foi a sequenciação genética.

O agravamento da crise brasileira exigirá um confinamento mais sério, ou veremos os números extrapolarem e o Sistema de Saúde já praticamente esgotado.

O confinamento é necessário e a volta a frivolidade deve ser repensada como forma não apenas de evitar uma crise econômica maior, mas principalmente a distribuição de bens mais justa.

 

A crise cultural e a pandemia

15 abr

A segunda grande cegueira da crise do ocidente é a cultura, o livro Qualquer Coisa Serve de Theodore Dalrymple, pseudônimo de Anthony Daniels, psiquiatra inglês que tratou de presos perigosos, é uma antologia de contos escritos de 2006 a 2009, e chamou seus estudos de declinologia (veja o vídeo abaixo) porém no livro citado há belas passagens de como ler uma cultura.
Desde os primórdios da cultura humana, a descoberta da Caverna de Chauvet (datada de 32 mil a.C.) prova isto, o homem constrói e registra sua cultura, e aqui um paralelo com o #StayAtHome esta é feita numa caverna, provavelmente local de encontro e proteção de famílias.
Pode parecer demasiado o termo usado por Peter Sloterdijk, mas a domesticação humana não é outra coisa que não a estruturação da vida “doméstica”, e também a origem grega da palavra oikos-nomicus (já fizemos um post) significa oikos – casa.
Acrescentamos aqui o diálogo de socrático de Xenofonte, que se refere ao termo como ser um bom cavalheiro, o Kalokagathos (bom em belo, em grego), que é assim referência a cultura.
Byung Chul Han, que escreveu a Salvação do Belo, onde critica a cultura do liso e em particular a de Jeff Koon e suas esculturas de “baloons” (figura) que muito ou nada dizem, o desejo de uma total imunidade, sem procurar a co-imunidade, conceito de seu mestre Sloterdijk, que pode ser aplicado a pandemia atual.
Um artigo duro, mesmo para mim como apreciador de Byung Chul Han, sobre a atual crise pandêmica, publicado no El País, afirma que: “parece que a Ásia controla melhor a epidemia do que a Europa”, cita os dados de 20 de março quando a epidemia ainda não tinha atingido o auge na Europa e dá como razão a estrutura disciplinada e ancestral do oriente.
Mais cedo do que nós eles apostaram no Big Data afirma o autor, e “suspeitam que o big data pode ter um enorme potencial para se defender da pandemia” diz no artigo de El País, porém alerta que isto pode caminhar para uma ditadura digital, como na China e isto não é mudança.
Sobre a cultura atual autor afirma “hoje não só se volta o polido ao belo, mas também o feio” na obra A Salvação do Belo (pag. 19), esperamos que o flagelo do vírus nos comova os coração e nos faça ir da descoberta da interdependência, como diz Morin, para a solidariedade.
Porém esta solidariedade exercida em conjunto, numa co-imunidade, necessita de um novo conceito do doméstico, da religação, além da conexão digital e do “isolamento” social.

Uma aula de “decliniologia”, com Theodore Dalrymple

 

Não querer curar-se

26 mar

Um sistema em crise, seja por razão social, econômica ou política, ele tende a tornar-se mais confuso e tóxico até que encontre um caminho onde possa sanar-se, quando a razão é uma catástrofe natural ou uma doença não é muito diferente, porém estas afetam a vida diretamente.
Não querer curar-se e defender a vida é uma atitude de autossabotagem sejam por razões conscientes ou inconsciência explica a psicologia, é aquela atitude de criar obstáculos e empecilhos que atrapalham as tarefas para encontrar caminhos, neste caso a cura e a preservação das vidas, e assim acha que não há como atingir os objetivos de cura ou de co-imunidade, a imunidade conseguida pelas ações conjuntas.
Do ponto de vista cultural é ignorância, e neste caso a visão dos especialistas e agentes de saúde devem ser a visão “técnica” que prevaleça, sobre inclusive a econômica, trata-se assim de uma cegueira, dizer é só uma gripe ou estamos sem saída (autossabotagem inconsciente) é um fenômeno de dirigir a mente a pensamentos equivocados, e isto existem culturalmente.
Conta a narrativa bíblica que um homem ficou 38 anos numa cama e não conseguia chegar a uma piscina natural chamada de Siloé (em hebraico significa enviado) e preciso da intervenção de Jesus para dizer-lhe toma sua cama e anda (João 5:7-9), milagre mas também ruptura com a paralisia e neste sentido é também uma metáfora.
Mas há aqueles que julgavam enxergar e não enxergam, o cego de nascença que é curado na bíblia é alguém que não tinha um sistema cognitivo preparado para enxergar, e o fato que ele passa a ver é um milagre mas também uma outra metáfora, a que por cegueira cultural e contextual não é possível enxergar, ao sair deste contexto é possível que se possa ver.
Agora querer curar-se ou não é uma atitude psíquica, querer ver e tendo o sistema fisiológico para enxergar é preciso esforço e superar a autossabotagem que faz da cegueira uma zona de conforto.

 

O Big Bang pode ser outra coisa

17 mar

E a Teoria da física padrão, cuja descoberta da partícula de Higgs recentemente no colisor de Hádrions fez os físicos vibrarem, agora tudo parece ter outro sentido e uma nova visão desta.
Haviam duas fortes evidencias sobre o Big Bang e a expansão do universo desde a primeira bolinha da qual saiu tudo (a constante de Hubble H0 e a medida de supernovas distantes), e agora que agora que o universo estaria numa bolha de 250 milhões de anos luz.

Nesta “bolha” onde a densidade da matéria é metade de todo o resto do universo concilia as medidas anteriores, a hipótese é de Lucas Lombriser, físico teórico da universidade de Genebra (UNIGE) e responde em qual velocidade o universo se expande.
A abordagem publica na revista “Physics Letter B”, resolve a divergência entre dois métodos de cálculos independentes que chegavam a valores diferentes em cerca de 10%, um desvio estatístico que é irreconciliável, e não precisa de nenhum novo modelo físico.
Pela teoria do Big Bang ocorreu a 13,8 bilhões de anos atrás, a proposta foi feita pela primeira vez pelo físico e presbítero belga Georges Lemaître (1894-1966) e demonstrada pela primeira vez pelo astrônomo americano Edwin Hubble (1889-1953) , observando que galáxias distantes estavam se afastando e recolocando-as junto podia-se calcular o tempo da primeira explosão.
A constante de expansão chamada de H0 foi medita num valor de 67,4 segundo dados fornecidos pela missão espacial Planck, que tem como hipótese que o universo é homogêneo e isotrópico, mas agora pode-se pensá-lo com uma bolha com densidade de matéria metade de todo o universo, ou seja, a 13,8 bilhões de luz ela explodiu dentro de um “outro” universo menos denso.
Afirmou Lombriser: “Se estivéssemos em uma espécie de gigantesca “bolha”, onde a densidade da matéria fosse significativamente menor que a densidade conhecida para todo o universo, isso teria consequências nas distâncias das supernovas e, finalmente, na determinação o H0”.
Assim a constante de 250 milhões de anos para a bolha concilia os valores da constante H0 para o Big Bang com a constante com o cálculo do afastamento das supernovas que tem influência de todo o universo incluindo a parte fora da bolha com metade de densidade, conciliando as medidas.

Lombriser, Lucas. Consistency of the local Hubble constant with the cosmic microwave background. Physics Letters B. Volume 803, 10 April 2020, Disponível em:
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0370269320301076?via%3Dihub

 

As mudanças do século XX

13 mar

As mudanças do século passado, mas cujas estruturas sociais e econômicas ainda estão presentes, foi marcado pelo fim liberalismo econômico mas que era sustentado por grandes impérios, além dos coloniais na Africa e Asia (o fim do império na India, por exemplo), também os costumes sociais e econômicos foram mudando e ainda encontram-se presente no século XIX.
Seria mais oportuno falar do econômico, num momento que os impérios financeiros parecem estar derretendo nas Bolsas de Valores, o chamado mercado do Urso, do medo gerindo os negócios, mas pelo dia 8 de março que foi dia da mulher, optamos por falar da questão.
Desde o romance de Ibsen no século XIX, a Casa de Bonecas, onde por trás da estrutura afável e liberal de um casamento se escondia o machismo do marido, por sinal o momento em que ele assume um Banco de Investimentos, se escondia a opressão da esposa.
Também apontamos o desenvolvimento da questão feminina através de Doris Lessing premio Nobel da Literatura e que tinha uma posição equilibrada mas dura, longe de modismos e do politicamente correto, ela viveu e apontou a questão da mulher, mesmo branca sofreu na Africa do Sul com a questão do racismo por defender os negros.
Chegamos a economia dos “Commons” de Elinor Ostrom, ignorada pela esquerda por não ser contra o capital, e ignorada pela direita porque afirmava que a governança dos bens comuns pode ser produtiva e bem gerenciada, ao contrário do que prevê o “Tragedy of Commons”.
A mudança de postura e de cultura, é verdade que precisamos de leis e politicas para combater o machismo, porém a mudança cultural defende do olhar sobre a mulher, hoje independente, no mercado de trabalho porém ainda sofrendo as consequências de sua emancipação.
Ainda que se afirme que a visão religiosa seja machista, e muitas vezes o é, não é o que a Bibilia apresenta no novo testamento, lembrando que a cultura judaica da época era machista e o velho testamento reflete isto, entretanto a posição de Jesus sobre as mulheres era diferente.
Assim aparece no texto de João (Jo 4, 8-9): “Os discípulos tinham ido a cidade para comprar alimento. A mulher samaritana disse então a Jesus: “Como é que tu, sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou uma mulher samaritana? “, e o texto esclarece que os judeus não se davam com os samaritanos, e a posição da mulher era inferior, aceita por elas.
Não é verdade a exegese que diz que ela sequer era religiosa, pois vejam o texto (Jo 4,19b-20): “Senhor vejo que é um profeta! Os nossos pais adoraram neste monte, mas vós dizeis que em Jerusalém é que se deve adorar”, o machismo vem, portanto, das instituições e não da Bíblia.

 

Identidade e fazer a diferença

06 fev

Parecem contraditórios identidade e diferença,  já colocamos nossa posição que o problema não é lógico, mas onto-lógico, isto relativo ao Ser, e na ontologia moderna a contradição é possível e então não-Ser também pode Ser, e isto dá origem ao Devir, rompendo barreiras estáticas.-
A capacidade e integridade do Ser significa que nos conhecemos como somos, entendemos nossa visão de mundo e as limitações que ela tem, mesmo a ciência mais avançada tem limites, o conhecimento absoluto é possível com um a verdadeira espiritualidade, onde está a alma.
Dizemos de maneira imprópria que onde está o coração, nossos anseios, desejos e projeções sobre o que somos, a maioria das enfermidades, em especial as psicológicas, vem destas projeções quando são falsas, irreais ou experiência reais que nos machucaram.
O não Ser significa que entendemos o que somos e estão preparados para não Ser, para receber o Outro, o diferente e a diversidade cultural e política do mundo, o radicalismo de defender a própria identidade e apegar-se em demasia a própria visão de mundo, já dissemos não é identidade, mas auto-identidade, muitos que criticam o individualismo cultuam a auto-identidade.
Não ser é a abertura ao outro ao diálogo, de onde surge o devir passa necessariamente por um não Ser, boa parte do extremismo do mundo atual, com péssimos reflexos na política é o exercício do culto da “identidade” coletivamente, falsos coletivos e falsos “nós” que são estruturas fechadas e autoritárias.
Dentro deste radicalismo existe uma semente do Outro, do acolhimento da diferença e da verdadeira espiritualidade, é preciso que esta identidade “exacerbada” se abra ao diferente, ou contraditório e principalmente modifique sua forma de “pensamento”, e sua “cultura” fechada.
Do pensamento surgem duas tendências o simplismo que reforça a autoidentidade e a complexidade, conforme propõe Edgar Morin, que facilita e amplia a visão de mundo e de Ser.

 

Uma releitura dos reis magos

03 jan

Em tempos de fundamentalismo e intolerância religiosa, uma releitura dos reis magos que foram adotar e também “contemplar” o nascimento de Jesus é essencial para o diálogo entre religiões.

A primeira necessária é que Deus se comunicou com os “magos” do oriente, ela pode reabrir corações fechados para re-ligações (religião do verbo em latim religare que é religar), pois eles não eram sequer religiosos no sentido convencional, mas magos e Deus os religou.

A segunda é que a comunicação divina foi através de astros, que significa que eles podiam entender esta linguagem e que Deus falou na língua humana deles, ou seja, há formas além das dogmáticas de comunicação entre Deus e os homens, mesmo não crentes.

A cosmologia é uma parte antiga e fundamental da filosofia, sua evolução e composição estuda o universo, e vem desde a antiguidade, os pré-socráticos a estudavam, buscam também a explicação da origem e da transformação da natureza e do universo e constroem mitos e divindades, criando uma relação entre seres mortais e imortais.

Então Deus não é tão indiferente a isto, uma proposta universal não deve desconsiderar a cosmologia, e se deseja construir uma cosmogonia, isto é princípio e fim de toda a vida, então uma escatologia é também construída, e a escatologia cristã pode estar relacionada a esta, não é afinal Deus princípio e fim de tudo ?

Esta segunda releitura, a questão dos astros, de fato ainda hoje se buscam evidencias cosmológicas da estrela que os Reis Magos seguiam, um astro, um cometa, isto poderia ajudar a datar o natal de uma data mais precisa.

Teólogos como Teilhard Chardin não deixaram de considerar a hipótese cosmológica, a noção de um universo cristocêntrico ajuda a uma interpretação não fundamentalista de uma escatologia mais complexa, e por isso recorremos (no post de 3/4/2019) a São Gregório de Nazianzeno (a igreja católica o comemora dia 2 de janeiro).

A terceira é que os reis magos foram “contemplar” o menino-Deus, além da vita activa, Hannah Arendt também falou dela em A condição Humana (publicado em 1956, com edição brasileira de 2009), que vem da conferencia Trabalho, Obra e Ação (publicação brasileira de 2006), mas já falavam desta questão Aristóteles no bios politikos e a vita negotiosa ou actuosa em Agostinho, e, recentemente Byung Chull Han em A sociedade do cansaço.

Mas não vieram adorar apenas, onde o elemento oferecido incenso é essencialmente isto, mas também trouxeram ouro no sentido de riqueza e mirra no sentido de sacrifícios oferecidos.

Os reis magos deveriam significar a abertura do cristianismo a outras linguagens e outras culturas que também são uma expressão do infinito, do universo e da vida construída de modo sagrado em todos e em tudo.

Primeira publicação: janeiro 2019