RSS
 

Arquivo para a ‘Tecnologia Calma’ Categoria

Desoneração da violência e ira

12 set

Não foram as religiões abramicas (islamismo, judaísmo e cristianismo) que desoneram a violência, assim pensou Peter Sloterdijk em Ira e Tempo (Sloterdijk, 2012), na verdade foi a ideia do Iluminismo que fez da violência e domínio, desde o princípio da expansão do mercantilismo e que depois tornou-se colonial-imperialismo, que era anticlerical e pouco religioso, e depois foi sacralizado no “absoluto” de Hegel, cuja imagem do poder e do Estado se justapõe ao poder e dominação e nada tem ligado a Deus.

Assim esse poder é a desoneração da violência e sua captura e tutela pelo estado, assim pode-se desenvolver o plano colonial e imperialista, fundo da crise civilizatória de hoje, é um estado prepotente militar e autocrático, de liberal só o nome, não pode dar em outra coisa: a ira.

A constatação de Sloterdijk sobre a leveza e alívio, é particularmente clara supondo que o progresso iria numa jornada progressiva, nós pensaríamos numa resposta mais trivial que ele estaria levando as pessoas em condições melhores que as anteriores, e isto não é verdade.

O autor também fala da dor, lembra que até 1940 a ideia da dor era normal nos tratamentos centros cirúrgicos, não cita mas lembro que cicatrizes nos rostos masculinos indicavam virilidade e algumas era feitas de propósito, antecessores das atuais tatuagens, o autor lembra que os analgésicos aparecem na década de 40 e depois aos poucos os antidepressivos e estimulantes e finalmente as cirurgias plásticas que corrigiam o que deve ser corrigido em nós.

Diz o autor que o pensamento a direita é a disciplina e a esquerda é a salvação dos pobres, a disciplina cai em sonhos e leva ao mundo da lua, enquanto a pobreza na sua condição de caído, de perseguido por um sistema injusto se vê sempre vitimizado o que nem sempre é real, assim ambas narrativas escapam de um conceito de justiça, de paz e de equilíbrio e nos vemos em narrativas que justificam a ira e o desprezo pelo Outro,  vão em direção a ira.

Se o ser deve ser leve é ser alguém que não é sério, assim a leveza do ser é insustentável, ele deve ser em ambas narrativas “pesado”, transformando-se em balões de gás que estão em voos a esmo, o próprio voo não é razoável, embora o desejo final seja tudo pode, mas nada é.

Diz o cancioneiro popular brasileiro diria: “não há pecado do lado debaixo do equador”, mas já era o que havia na Europa pós-renascentista, na “divina comédia” de Dante que se transforma na comédia humana de Balzac,  foi ali que se fez a circum-navegação (na foto a armada de Jacob Hashimoto), sim a terra é redonda, então os povos deviam ser dominados e colonizados,  novamente a esferologia de Sloterdijk faz sentido.

O acontecimento fundamental de nosso tempo é sair deste fardo pesado do dogmatismo, do stress perfeccionista da sociedade do cansaço, sair das batalhas físicas, discursivas, políticas, projetistas e espaciais, a tecnologia para o homem e não do homem, robôs são máquinas.

É a agonia do pesado que tinha e que não tem mais uma narrativa coerente. a esferologia, parte do princípio de que uma espécie de “hermenêutica da existência” deve formar arte de figuras, sentidos e vocabulários de uma existência leve, digamos, descarregada do ódio pelo Outro que não é nosso espelho, claro o caminho reverso está aí, ele leva a ira e a violência.

SLOTERDIJK, P. Ira e tempo: ensaio político-psicológico. Estação Liberdade, 2012.

 

Novo holodomor, guerra e paz

07 ago

Enquanto há expectativas de novos encontros para a paz com em Jidá na Arábia Saudita, as perspectivas de um envolvimento maior de outros países na guerra crescem com o perigo de uma guerra em escala global.

No período duro da antiga União Soviética, já houvera um conflito entre a República Soviética Russa e a República Soviética da Ucrânia, o holodomor em 1931-32, em que o ditador Joseph Stalin confiscou a produção ucraniana matando um grande número de ucranianos de fome,  há um livro sobre o tema (pdf), os ucranianos conseguiram muitos anos após declarar este episódio de sua vida nacional como um genocídio.

A Rússia já havia minado as fontes de abastecimento da Ucrânia, agora realiza bombardeios sistemáticos em portos e locais de armazenamento de grãos e espalha minas em toda fronteira do território conquistado, a economia ucraniana já em ruinas, agora sofre um duro golpe e com isto há uma ameaça o abastecimento mundial de grãos.

O front de batalha interno continua duro, como pequenos avanços da contraofensiva, mas o polo agora se desloca para o mar Negro, onde os navios de exportação de grãos podem ser atingidos e já uma provocação com a Polônia, pelo grupo Wagner que está na Bielorrússia.

Alguns discursos e narrativas escondem os horrores da guerra, morte de civis, distribuição e desastres em rios e fontes energéticas, e violação de tratados de guerra, com mutilação e tortura de prisioneiros, e uso de armas de guerra proibidas por acordos internacionais tais como, minas terrestres, bombas de fósforo branco e bombas de fragmentação.

Um envolvimento da Polônia e Bielorrússia, seria a primeira escala de uma guerra mundial, faz lembrar a invasão da Alemanha em 1º. de setembro de 1939, que foi estopim do envolvimento de diversos países sendo os primeiros a declarar guerra foram a Inglaterra e França.

O envolvimento político e financeiro de outros países já está praticamente declarado, com forças ao lado da Ucrânia e da Rússia, porém a sensatez ainda faz alguns países e diplomatas mais cautelosos pensarem no desastre para a economia além do grave perigo de uso de força nuclear.

As forças pela paz iniciaram uma conferência em Altos funcionários de cerca de 40 países, incluindo EUA, China, África do Sul e Índia e estão participando das discussões na cidade costeira de Jeddah, no Mar Vermelho, sendo noticiários europeus, entre eles o alemão DW (Deutsche Welle), sem a participação da Rússia (foto).

 

Dialogo e diversidade

09 jun

O choque entre duas concepções hegelianas de estado e a ausência de diálogo e novos horizontes estão entre as causas da crise civilizatória.

Tanto os velhos hegelianos modernistas quanto os novos revolucionários apontam uma visão de estado com um discurso único, ausência de diálogo e tolerância, esta é a raiz da crise.

O que notamos é a superficialidade deste problema de fundo, cada qual criando verdade que pensam ser universais e as vezes são até mesmo bizarras, como elas estão apenas no nível das ideias e não correspondem ao real não contribuem para uma saída real da crise civilizatória.

Todo dia despontam “sábios” de algum tipo que já tem a saída para grandes problemas que envolvem lideres, nações e culturais que se desenvolveram, em general já criaram raízes e tem grande dificuldade de dialogar com outras visões de mundo.

A convivência na diversidade é fundamental para uma sociedade democrática, quando só uma visão de mundo e uma forma de administrar o estado é imposta uma parte da população está fora deste diálogo e não verá oura saída a não ser a rebelião, ao nível do estado significa guerra.

Vivemos duas guerras mundiais fruto de uma concepção colonialista de estado, entretanto a atual é mais grave porque se trata de uma visão de hegemonia imperialista de forças opostas.

É verdade que há forças sociais se esforçando para abrir um caminho de diálogo, porém no campo diplomático ela tem fracassado, não por falta de propostas, mas por alinharem-se de modo discreto a um dos lados em conflito.

No campo religioso isto também ocorre, a visão farisaica que não é possível dialogar e ver como importante a convivência com “pecadores” e “cobradores de impostos” (os que gerem mal o estado ou se corrompem hoje) está descrita em Mateus 9,11-13:

“Alguns fariseus viram isso e perguntaram aos discípulos: “Por que vosso mestre come com os cobradores de impostos e pecadores?” Jesus ouviu a pergunta e respondeu: “Aqueles que têm saúde não precisam de médico, mas sim os doentes. Aprendei, pois, o que significa: ‘Quero misericórdia e não sacrifício.’ De fato, eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores”.

O sacrifício de milhões de inocentes ocorre numa guerra porque não há força que dialogue com o pecado do conflito, do ódio e da guerra sem limites humanos e morais (na foto a explosão da barragem em Nova Kakhovka, região de Kherson).

Sem tolerância e diálogo nenhuma paz é possível, e neste momento a civilização vive a crise.

 

Dualismo e unidade

08 jun

O dualismo vem do idealismo de Parmênides e chega até Hegel, já postamos em suas categorias em-si, de-si e para-si, sendo para-si um certo retorno ao em si (posts da semana passada).

Existem dois tipos de dualismo: o dualismo de substância e o dualismo de propriedades.

Enquanto o dualismo de substância (ou dualismo cartesiano) argumenta que a mente é uma substância que existe de forma independente, já o de propriedade descreve uma categoria de posições em filosofia da mente que advogam que, apesar de o mundo ser constituído por apenas um tipo de substância, do tipo físico, existem dois tipos distintos de propriedades: propriedades físicas e propriedades mentais.

Esta briga no interior do dualismo continua em separação substância e mente, seja como substância ou propriedade.

A unidade é possível se pensarmos além da ontologia lógica de Parmênides onde o Ser é e o não ser não é, há um Ser que não é, que está presente na alma, e que no sentido trinitária é um Ser-para-si, isto é um para no sentido de além de, neste caso além da substância, e se pensarmos em Deus Absoluto (usando a categoria Hegeliana) o para-si é substância e se concretiza no “filho” da Trindade que é Jesus, ser-em -si homem e ser-para-si Deus.

Assim Deus entra na história e na substância como mente e propriedade, aquilo que o teólogo e paleontólogo francês Teilhard de Chardin chama de noosfera, que é subtítulo deste blog.

Deus mente e propriedade entra na história e se eterniza como substância no corpo e sangue, com as substâncias pão e vinho, que são artefatos humanos, o trigo feito pão pelo homem e a uva feito vinho pelo homem, assim substância humana, divinizada e eternizada na ceia de Jesus, esta é a festa do Corpo de Cristo realizada hoje por boa parte dos cristãos.

No raciocínio chardaniano Deus retirou o universo de sua sub-instância que também é Deus, do corpo de Cristo, assim todo universo é cristocêntrico e penetrado por sua divindade.

A tentativa humana de criar um “ser” inteligente e além-do-humano, é uma ex-machina incapaz do para-si.

Assim é que se realiza a unidade trinitária e humana, é preciso passar através do não-Ser que é Ser, é preciso superar contradições e ir além de si, entrar num para-si divino e eterno.

 

Duas utopias em conflito

27 abr

Não há espaço para a poesia, para o encanto, para a contemplação, a sociedade da eficiência e da performance transforma o pensamento em sentidos sensuais, comerciais e lucrativos, puro viver num egocentrismo ineficiente e vazio, o Ser se esvazia e busca desesperadamente o aroma e o gosto onde não só há um nada para ser plenificado.

Não há espaço até mesmo para o deificado pensamento, frases soltas arrancam suspiros, “a vaca não dá leite” diz um bom filósofo brasileiro, mas o que é o trabalho e dá sentido ao trabalhar para produzir um leite (veja Arendt no post anterior), que é modificado que e chega alterado nas prateleiras, e atualmente muito caro.

Outro pede professores e diz que “ser louco é a única possibilidade de ser sadio nesse mundo doente”, mas que de qual doença fala, se não houveram pessoas sãs e serenas em quem as pessoas simples podem se inspirar, é preciso ser são para poder falar do saudável e do louvável.

Não há ética sem seres éticos, é verdade que as grandes metanarrativas falharam, mas a polarização obriga os novos sofistas a se justificarem nas narrativas vencidas e datadas historicamente, nenhuma delas foi capaz de evitar a guerra, e qual ciência é capaz de evitá-la?

Li uma frase de Morin, e já postei aqui que a ideia de paz exige uma certa utopia, em entrevista no ano 2000 à Rede Cultura (abaixo), ele fala de duas utopias:  uma negativa que promete um mundo perfeito, em que todos se reconciliam e há uma perfeita harmonia, esse é impossível (e diria mentiroso) e a outra a positiva é realizar o mundo mais perfeito, não é “O admirável mundo novo” de Aldous Huxley (não por acaso, o chatGTP escolheu com um dos 10 maiores filmes), ela diz algo é impossível porém pode se realizar: um mundo de paz e um mundo sem fome, são realizáveis.

Sem liberdade e fraternidade a utopia humana não se realiza, autoritarismo é utopia negativa.

Tentar reduzir as desigualdades, aumentar a tolerância entre culturas diferentes, respeitar direitos dos povos, raças e gêneros, o que falta afirma Edgar Morin, é aumentar “o estado da consciência e do pensamento que permita a realização”

Sabe que existem forças extremamente negativas que ao ajudar um país que sofre de inanição a ajuda é desviada pela burocracia e pela corrução, ele explica que a fraternidade deve vir dos cidadãos e diria que a vigilância também, se justificamos a corrupção e a burocracia não ajudamos a resolver problemas essenciais a vida humana.

Há soluções utópicas possíveis, conforme afirma Morin que as chama de positivas.

 

https://youtu.be/op82x8u4ORI

 

O que é agir diante da contemplação

26 abr

Foi Hanna Arendt em sua análise da “Condição Humana” (1958 – original) que reagiu a ideia do “nivelamento da vita activa” (Han, 2016, p. 121), o “erro em crer que o primado da contemplação é responsável pela vita activa em trabalho” (idem) é que destruiu e hierarquizou o ser em função da substância.
Arendt define sua “vita activa” em três atividades humanas que não são iguais: trabalho (labor), obra (work) e ação (action) que compreende como fundamentais.
A primeira, aquela que a sociedade industrial consagrou e que tornou o homem aquilo que a autora chama de “homo laborans” é a pura atividade sem reflexão ou meditação, não é o mesmo que o trabalho porque ele é precedido do pensamento, não só o trabalho intelectual no qual o pensar é imanente, mas também tarefas diárias como cuidar da natureza ou cozinhar, por exemplo.
Sem a determinação do agir, o homem fica reduzido ao homo laborans e nisto Arendt tem razão, porém Byung-Chul a corrige: “mas Arendt, erroneamente, entende a contemplação como uma detenção (Stillegegung) de todos os movimentos e atividades, como uma tranquilidade passiva, que faz com que qualquer forma da vita activa se apresente como inquietação” (HAN, 2016, p. 122).
Byung-Chul reivindica Aristóteles que “descreve claramente a vita contemplativa (bios theoretikos) como uma vida ativa”, onde o pensar como Theoria é, com efeito uma energia – que significa literalmente “atividade em obra” ou “estar em obra” (en egô einai)” (idem) e assim a classificação de Arendt faz sentido, apesar do erro.
Assim deixamos para a parte final a importante ligação a ação (action) como parte da vita activa, que não se opõe, mas complementa a vita contemplativa, e põe Tomás de Aquino de acordo com Aristóteles: “os movimentos corpóreos externos opõe-se ao repouso da contemplação, que consiste em ser-se alheio a ocupações exteriores. Mas o movimento que as oeração da inteligência implicam faz arte do próprio repouso” (T. Aquino em Han, 2016, p. 122).
Assim, afirma embora Arendt perceba que a vida moderna se afasta cada vez mais da vita contemplativa, não se trata de abandonar o work nem o action, e sim pausar o tempo, a respiração e permitir espaço a contemplação, ao sabor, ao aroma e ao gosto da vida.

ARENDT, Hannah. A condição humana. Tradução de Roberto Raposo. 11a. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.
HAN, Byung-Chul. O aroma do tempo. Trad. Miguel Serras Pereira. Lisboa: Relógio d´Água, 2016.

 

Da lucidez à serenidade

15 mar

Se a clareza (ou claridade) é propriedade da lucidez, a lucidez precede a serenidade, ou seja, pode-se ter lucidez sem que se atinja a serenidade, este estado de espírito é algo muito atual, é uma busca do homem na modernidade.

A obra “Serenidade” de Heidegger, publicada em 1955, mas como meditação foi feita em 1949, por ocasião do centenário de morte de Conradin Kreutzer, compositor conterrâneo de Heidegger, ambos nascidos na cidade de Messkirch, porém em épocas diferentes.

Heidegger neste opúsculo vai diferenciar o pensamento reflexivo (ou meditativo) do pensamento calculador (ou maquínico) próprio de nosso tempo, assim vai comparar o pensamento de nosso tempo com a música, “limitamo-nos a ser entretidos por um discurso. Não é necessário pensar enquanto ouvimos a narração, isto é, meditar (besinnen) sobre algo que, na sua essência sobre algo que, na sua essência diz respeito a cada um de nós direta e continuamento” (p. 11)

Assim “A crescente ausência-de-pensamentos assenta, por isso, num processo que corrói o âmago mais profundo do homem atual: “o Homem atual ´está em fuga´ do pensamento” (p. 12)

Por outro lado, o pensamento maquínico assenta-se na técnica (veja que o texto é de 1955), onde “o pensamento que calcula não é um pensamento que medita, não é um pensamento que reflete sobre o sentido que reina em tudo que existe” (p. 13)

Heidegger sabe que um dos argumentos sobre a reflexão é que “a pura reflexão, a meditação persistente, é demasiado ´elevada´ para o entendimento comum” (p. 14), diz ao homenagear seu conterrâneo músico, que bastaria pensar no que significava naquele momento a sua terra natal, onde surgiu a música extraordinária de Kreutzer, lembro de um conto de conto de Leon Tostoi que falava desta dinâmica dos sentimentos justamente num conto chamado “Sonata a Kreutzer”.

Propõe assim aos presentes “o que nos sugere esta celebração, se estivermos dispostos a meditar? neste caso, atentamos que, do solo da terra natal medrou (gedieben) uma obra de arte. (p. 15)

Assim não é preciso um pensar elevado, mas apenas uma pequena pausa, um silêncio na alma.

HEIDEGGER, M. Serenidade. trad. Tradução de Maria Madalena Andrade e Olga Santos. Lisboa: Instituto Piaget, s/d.

 

O que há além do humano

03 mar

Certamente existente a natureza, os planetas e todo o universo, quando mais visto pelos engenhos humanos: as viagens interplanetárias e o megatelescópio James Webb, mais complexas e desafiando a inteligência humana.

Mas há algo no homem no além humano que está na sua consciência e nos seus sentimentos e afecções, há uma complexa centelha divina, diz o poeta que o faz procurar fora o que está dentro.

Imaginar que isto poderá estar numa máquina é apenas um dos aspectos do controle e da vontade de poder humano, cujo tema desenvolvemos na semana passada, o transumano cria uma ficção e uma fantasia humana de que o próprio homem criaria algo para ultrapassá-lo, a grande fantasia do desenvolvimento dos recursos da Inteligência Artificial atual, tudo que estiver lá o homem que pôs.

É o desejo humano de ser seu próprio criador e quem sabe atingir uma divindade terrena, porém ao contrário do que busca, a tecnologia não tem só a finalidade de destruir e também de auxiliar, pode por devaneio impelir forças extra-humanas de destruição.

Fomos criados pois o homem não existiu sempre na terra, e mesmo a hipótese de termos vindos de outros astros celestes, a fantasia dos alienígenas, que até podem existir, serão criados por algo que tem uma consciência infinita e maior que a nossa, teve que existir um princípio criador celeste e ontológico, com lógica do ser (onto).

Esta fantasia mística faz sentido, por que qualquer ciência, filosofia ou teologia que se preze vai especular sobre a criação humana, e qualquer escatologia vai pensar sobre o nosso destino.

Há um momento na vida terrena de Jesus, a figura histórica é incontestável, em que Ele se revela como divino aos seus discípulos, que ficam tão maravilhados que querem construir três tendas e ficarem ali, o evento chamado de “Monte Tabor” (foto), onde estavam com Jesus apenas três discípulos.

(Mt 17,1-3): “Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e os levou a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. E foi transfigurado diante deles; o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz. Nisto apareceram-lhe

 

Inteligência Artificial e planejamento

26 jan

Todos nós desejamos situações ideais e perfeitas, como diz Margaret Boden evidentemente isto não é restrito a IA, o nosso dia a dia, as nossas viagens e o futuro dependem deste planejamento, o simples voluntarismo, ou o simples desejo (está na moda mentalizar desejos) não resolvem nenhum problema e na maioria das vezes provocam ansiedade e frustração.

No caso da computação, “o planejamento possibilita que o programa – e/ou o usuário humano – descubra quais ações já foram realizadas e porquê. O ´por quê´ se refere à hierarquia do objetivo: esta ação foi realizada para satisfazer aquele pré-requisito, para alcançar tais e tais objetivos secundários” (Boden, 2020, p. 44), isto em alguns planejamentos de programas de computação é chamado de “engenharia de requisitos”.

No caso de IA, existe tanto um “encadeamento para a frente” como “encadeamento para trás”, que explicam e ajudam o programa a encontrar soluções, para isto existe também uma hierarquia, também existe uma hierarquia de tarefas e a autora acrescenta que tanto o planejamento como a hierarquia foi rejeitada por “roboticistas” da década de 1980, e hoje foi incorporada a área.

Existem vários condicionantes de IA que não são claramente expostos e que explicam melhor o que é a IA, por exemplo, “existe uma grande quantidade de hipóteses simplificadoras não matemáticas na IA que geralmente não são mencionadas. Uma delas é a hipótese (tácita) de que os problemas podem ser definidos sem levar em conta as emoções” (Boden, 2020, pg. 46) que é tratado no tópico seguinte e cujo assunto é apenas inicializado.

As redes neurais artificiais que auxiliaram muito o desenvolvimento da IA são bem diferentes de redes semânticas, uma vez que esta já são desenvolvidas a partir da experiência e da interação humana e só depois destes tópicos é que Capítulo 6 é que a autora faz a pergunta sobre o que é a Inteligência Artificial de verdade, como as perguntas capitais “Será que teriam egos, postural moral e livre-arbítrio? Seriam conscientes?” (Boden, 2020, p. 165), e esta pergunta não podemos fugir sem apresentar algum insight filosófico, teológico ou antropológico, talvez um síntese aprofundada dos três fosse mais interessante.

A pergunta em tempos de séria crise civilizatória e necessário uma pergunta anterior: a consciência humana o que seria? Como a tratamos? A ditadura do igual, do insensível e da padronização até mesmo do pensamento nos conduz a uma falsa impressão de que a máquina pode nos ultrapassar (o ponto de singularidade).

BODEN, Margaret A. Inteligência Artificial: uma brevíssima introdução. SP: Ed. UNESP, 2020.

 

O ser e a ação

15 jun

Ser não é inatividade, porque é o ser que determina sua ação, porém o puro projeto sobre a ação esvazia o ser, é o ativismo ou a “vita activa”, aquele que Husserl, Heidegger, Hannah Arendt, e mais recentemente Byung Chul Han questionam sobre a ausência de vita contemplativa, o interior.

Não se trata de subjetividade, porque é justamente a separação entre o ser objetivo e subjetivo o primeiro grande impulso para o esvaziamento do ser, não se trata também do ser social, ele é o que está projetado na consciência do homem, na intenção que se dirige ao objeto, à vida exterior.

A vita activa foi assim expressa por Hanna Arendt: “A expressão vita activa, compreendendo todas as atividades humanas e definida do ponto de vista da absoluta quietude da contemplação, corresponde, portanto, mais à askholia grega (ocupação, desassossego) com a qual Aristóteles [define] toda atividade, que ao bio politikos dos gregos. A expressão vita activa é perpassada e sobrecarregada de tradição. É tão velha quanto nossa tradição de pensamento político, mas não mais velha que ela. A própria expressão que, na filosofia medieval, é a tradução consagrada do bios politikos de Aristóteles, já ocorre em Agostinho onde, como vita negotiosa ou actuosa, reflete ainda o seu significado original: uma vida dedicada aos assuntos públicos e políticos” (Arendt, 2007, p.23), nesta explicação de Arendt está também uma completa tradução do animal político.

O que é a ação para Arendt, não é aquela do ativismo ou voluntarismo, mas a que ocorre “entre” os homens, depende da intersubjetividade (a relação de interioridades), dita por ela assim: “or fim, o último dos elementos da vita activa abordado por Arendt é a ação. A ação é o elemento da interpessoalidade e o ambiente da intersubjetividade, ou seja, ocorre entre os homens. Logo, em razão de ser desenvolvida entre pessoas, a ação é observada de forma destacada do labor e do trabalho, tais elementos não influenciam na mesma.

Então o que considera a condição humana da ação é a pluralidade, diz textualmente: “Considerando que a ação é uma atividade dos homens livres na esfera pública, ela é uma expressão da pluralidade humana. A sua concretização depende da convivência entre indivíduos diferentes. Todavia, visto que a ação exige uma diversidade interativa, ela particulariza os homens. Ela promove a aparição de individualidades e possibilita a construção de identidades. Ora, o homem jamais poderá manifestar a sua singularidade no isolamento. Ninguém mostra o que é na esfera pessoal da intimidade. Somente quando está com os outros o homem pode revelar o que é” (ARENDT, 2007, p.189).

Mas Hannah Arendt considera a modernidade em crise somente a partir do início do totalitarismo e os eventos das duas guerras mundiais, e ao nosso ver o problema surge já no pensamento racionalista/idealista.

ARENDT, Hannah. A Condição Humana. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.