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Arquivo para a ‘Ciência da Informação’ Categoria

O que a ontologia contemporânea não é

20 mar

Fundamentada nos trabalhos de psicologia social, onde Franz Brentano trabalhou duas sub-categorias do tomismo: consciência e intenção, a fenomenologia moderna foi se derivando em Husserl e depois em Heidegger, desvio para uma ontologia chamada continental, em Nicolai Hartmann e junto dela surge uma doutrina conhecida como realismo estrutural ôntico (OSR).

Aquilo que parecia um desvelar, termo apropriado usado por Heidegger para inferir sua clareira, vai ficando novamente confuso, porque a OSR não só ganhou destaque como se subdividiu em três doutrinas: OSR1, que é a visão de que as relações são ontologicamente primitivas, mas os objetos e propriedades não o são; OSR2, que é a visão de que objetos e relações são ontologicamente primitivos, mas propriedades não; OSR3, que é a visão de que propriedades e relações são ontologicamente primitivas, mas os objetos não (Ladyman, 1998).

Central para a ontologia de Heidegger, como dissemos no post anterior é a noção de diferença ontológica: a diferença entre ser como tal e entidades específicas, o erro da filosofia atual é além do esquecimento do ser, entender o ser como tal como uma espécie de entidade última, por exemplo, como “ideia, energia, substância, mônada ou vontade de poder”, as primeiras ligadas a filosofia “natural” contemporânea e as duas últimas a visão social e de poder.

Este erro teve que até mesmo ser retificado em sua “ontologia fundamental”, concentrando-se no sentido de ser, um projeto semelhante à meta-ontologia contemporânea, leia-se os trabalhos de Michael Inwood (ontologia fundamental) e Peter Van Inwagen, (meta-ontologia).

E tudo isto parece essencialmente teórico, mas não é, estamos discutindo as coisas e não-coisas ônticas (Byung Chul Han tem um ensaio) e estratégias e lógicas de poder, que esquecem o ser.

Nicolai Hartmann é um filósofo do século XX, embora sua perspectiva seja a “continental”, ele esclarece que as modalidades relativas dos sentidos dependem das modalidades absolutas e propõe esta realidade em quatro níveis: inanimado, biológica, psicológico e espiritual, que formam uma hierarquia, ainda que seu desenvolvimento seja excessivamente esquemático, há a questão do ser, da qual o homem contemporâneo escapa e não coloca apenas estes níveis em cheque, mas a própria civilização.

O esquecimento do ser é fundamental para compreender o destempero e a crise de sentido da vida que está em todas esferas humanas, da política, educacional até a espiritual.

Inwood, Michael. «Ontology and fundamental ontology»  A Heidegger Dictionary. [S.l.]: Wiley-Blackwell, 1999.

Inwagen, Peter Van. «Meta-Ontology». Erkenntnis. 48 (2–3): 233-50, 1998.

Ladyman, J. What is structural realism? Studies in the History and Philosophy of Science 1998.

 

A verdade ontológica

19 mar

Existe diferença entre a lógica que é fundamentada na razão puramente humana, e a ontológica fundamentada na realidade do Ser e sua existência, assim não é uma verdade final, mas escatológica, isto é, realiza tendo um início e um fim onde a existência se explica.

De modo meramente filosófico, a verdade ôntica e a ontológica sempre se referem de maneira diferente, ao ente em seu ser e ao ser do ente, e a relação entre elas é chamada diferença ontológica, pouco explorada na filosofia está embutida em qualquer teoria que trate do Ser.

A relação de latência entre ser e ente e entre presença e ser torna evidente que o fundamento da diferença ontológica é a presença, segundo Heidegger (pg. 102):

Desvelamento do ser é, porém, sempre verdade do ser do ente, seja este efetivamente real ou não. E vice-versa, no desvelamento do ente já sempre reside um desvelamento de seu ser. Verdade ôntica e verdade ontológica sempre se referem, de maneira diferente, ao ente em seu ser e ao ser do ente. Elas fazem essencialmente parte uma da outra em razão de sua relação com a diferença de ser e ente (diferença ontológica).

Trata-se de desvelamento porque re-velar é tirar uma camada do véu, porém encontrando outra que igualmente cobre a verdade, a razão humana e a própria ciência caminha assim, a princípio da falseabilidade de Karl Popper, ele alega que o fato de uma asserção poder ser mostrada falsa é um dos princípios para o estabelecimento de uma ciência segura.

Há uma relação circular entre verdade ôntica e verdade ontológica decorrente desta facticidade circular da presença [que é uma das traduções do Dasein de Heidegger] e esta relaciona-se com os entes compreendendo o ser, e relaciona-se com o ser compreendendo os entes.

“Com a diferenciação, que é em si mesma clara, entre ôntico e ontológico – verdade ôntica e verdade ontológica, temos efetivamente os elementos diferentes de uma diferença, mas não a própria diferença”, dito de maneira explicita a relação das coisas com os seres, é diferente da relação dos seres entre si, há uma verdade ontológica que deve ser desvelada para a relação.

Assim, como a verdade ontológica e ôntica, assim como a diferença ontológica, contribuem para mostrar o caráter relacional do eu? Conflitos e relacionamentos envolvem este Ser que é relacional, mas sua compreensão vista como instrumental, coisificada ou de interesse nada é.

HEIDEGGER, M. Sobre a essência do fundamento. In: Heidegger: conferências e escritos filosóficos. Trad. de Ernildo Stein. São Paulo: Abril Cultural, 1984 (Os Pensadores).

 

Infinito, paz e transformação

15 mar

A nossa de infinito, de até mesmo o paradoxo que representa a profunda mudança que ocorrem em fenômenos astronômicos como os buracos negros, onde até mesmo a física quântica é questionada, nos leva a uma nova cosmovisão de matéria e espiritualidade.

Edgar Morin fala em “resistência do espírito” em função do momento dramático que vivemos de crise civilizatória e ameaça de escalada nas guerras, sem um apelo realmente concreto pela paz o risco dos atuais conflitos escalarem e de surgirem novos é imenso.

Esta resistência requer tanto o posicionamento pessoal quanto o coletivo, defender de fato e viver a paz, praticá-la em nossos relacionamentos cotidianos, ao lado dos que passam por nossas vidas.

A paz depende de pessoas que plantem a paz, diz a leitura bíblica Jo 12,24: “em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas, se morre, então produz muito fruto”, assim é preciso que semeie a paz aqueles que de fato a desejam, porém não no discurso, mas nas atitudes do dia a dia.

Não significa que não desejamos as mudanças, e que elas não sejam necessárias, também neste aspecto o grão de trigo deve cair na terra e “morrer”, mas esta morte vista justamente com o que desejamos: transformação, não desaparecimento ou morte terminal.

O olhar para o infinito, para o divino e o eterno é ir além de nossa materialidade, de nossos impulsos cotidianos e humanos, reservar um tempo para leitura, contemplação, meditação e recarregar nossas energias, a atitude pacífica depende deste equilíbrio humano/divino.

Sem uma ascese verdadeira e humanamente correspondida, ficamos naquilo que Peter Sloterdijk chama de “vida de exercícios”, fazemos os exercícios para tal, mas não temos uma ascensão humana (uma verdadeira ascese).

Aumentar nossa vida interior, transmiti-la nos relacionamentos eis a verdadeira ascese.

 

Leitura, afeto e feridas

13 mar

Alberto Manguel é um escritor argentino bem conhecido nos meios universitários, tanto devido tanto a relação com Jorge Luis Borges, que conheceu na adolescência e lia livros para ele, como também como autor de vários livros antologias e romances, entre eles um livro que destaco como obrigatório é Uma história da leitura, no original A History of Reading (1996).

Homem-mundo, em 1971 morou em Paris e em Londres, em 1972 retorna a Argentina mas como editor estrangeiro da editora  italiana Franco Maria Ricci, em 1976 mudou-se para o Taiti, em 1982, Alberto se mudou para Toronto, no Canadá, onde morou até 2000. 

Não parou ai, mudou-se para a região de Poitou-Charentes, na França, onde comprou e reformou um mosteiro medieval junto de seu atual parceiro Craig Stephenson, uma das reformas feitas foi para acomodar sua biblioteca de 40 mil livros.

Em 2020 doou toda a biblioteca para o futuro Centro de Estudos da História da Leitura (CEHL), e passou a viver em Lisboa, é colunista da revista Geist canadense.

Uma de suas frases famosas é “a crença banal de que o tempo cura as feridas é um engano: nós nos acostumamos a elas, o que não é a mesma coisa”, porém sua frase sobre a leitura que mais parece uma forte influência de Borges para quem a biblioteca era um paraíso, é sobre a leitura:

“O amor pela leitura é algo que se aprende mas não se ensina.
Da mesma forma que ninguém nos pode obrigar a enamorar-nos, ninguém nos pode obrigar a amar um livro.
São coisas que ocorrem por razões misteriosas, mas estou convencido que há um livro que espera por cada um de nós.
Em algum lugar da biblioteca há uma página que foi escrita somente para nós”.

Também é sua a frase: “Ler sempre é um ato de poder. E é uma das razões pelas quais o leitor é temido em quase todas as sociedades”, há outras é claro, mas para isto convido meu leitor a ler: “Uma história da leitura”.

MANGUEL, A. Uma história da leitura. Tradução Pedro Maia Soares. 1a ed. São Paulo : Companhia de Bolso, 2021.

 

Fim da história ou retorno das potências

11 mar

Quando Francis Fukuyama escreveu sobre o “O fim da História” estava sob o impacto da queda do Muro de Berlim em 1989, três décadas após Jim Sciutto disse na CNN que quando a guerra na Ucrânia começou, estávamos vivendo um “momento de 1939”, de fato, há uma ligação entre a primeira e a segunda guerra, o fim da segunda e a possibilidade de uma terceira.

O livro de Jim Sciutto “The Return of Great Powers”, fala sobre isto, “A invasão da Ucrânia pela Rússia faz parte disso, mas, na realidade, esta luta pelo poder tem impacto em todos os cantos do nosso mundo – de Helsinque a Pequim, da Austrália ao Pólo Norte. Esta é uma batalha com muitas frentes: no Ártico, nos oceanos e nos céus, nas ilhas artificiais e nos mapas redesenhados, e na tecnologia e no ciberespaço”.

Em primeiro lugar detectamos este fator secundário, mas fundamental ver a tecnologia não sob o prisma da dominação das mentes, do capital ou do socialismo, mas seu uso negativo em função das guerras e da luta pelo poder.

O Retorno das Grandes Potências analisa esta nova condição histórica, analisa esta nova realidade pós-guerra fria e pós queda do muro de Berlim, os governos russo e chinês cada vez mais alinhados e o ponto crítico de uma nova corrida armamentista nuclear global, e nos coloca uma questão: ao considerarmos resultados incertos, até mesmo aterrorizantes, será possível ao Ocidente, à Rússia e à China evitar uma nova Guerra Mundial?

Não é tão importante a análise feita por Jim Sciutto quanto os fatos e realidades que trás a tona para novos questionamentos e preocupações com resultados externos desta nova realidade mundial, um momento de forte turbulência no qual as possibilidades de paz vão se esgotando com o passar do tempo e o envolvimento cada vez maior de diversas nações.

O quadro da última semana aponta para isto, a Rússia não descartando um enfrentamento com o Ocidente e os Estados Unidos se preparando para um cenário de confronto nuclear, o retorno ao bom senso e ao desarme de espíritos exaltados passa por perdas e danos a algumas nações, não se trata de rendição, mas aceitação do quadro atual de “novo equilíbrio” para a paz.

Conforme afirma Edgar Morin é preciso neste tempo um espírito de resistência para um retorno ao caminho da fraternidade universal e a paz.

 

Serenidade e luz

08 mar

Somente há luz quando há serenidade, embora o texto de Heidegger não esteja diretamente ligado ao seu conceito de “clareira”, ele está indiretamente ligado, pois pede a reflexão, o puro pensamento, aquele que “medita” e não apenas age.

Heidegger esclarece que: “o enraizamento (die Bodentändigkeit) do Homem actual está ameaçado na sua mais íntima essência. Mais: a perda do enraizamento não é provocada somente por circunstâncias externas e fatalidades do destino, nem é o efeito da negligência e do modo superficial dos Homens. A perda do enraizamento provém do espírito da época no qual todos nós nascemos” (p. 17), é assim portanto a ausência desta clareira.

A dominação por modelos ideais e que “calculam” levam a um compromisso maior com as engrenagens da razão, do que as engrenagens do ser e da dignidade humana, vão além da ética que é profundamente ligada ao “ethos” do modo de ser e do caráter.

Não se trata de um maniqueísmo puro, porque este também levou e leva ao dualismo social e político, mas aquele que exclui o outro, o diferente e esquece de sua dignidade humana, lembramos o discurso de Eduardo Galeano sobre a guerra e o mal que ela encerra (post).

O puro raciocínio da engrenagem calculista leva a cálculos precisos de negócios, gestões de empresas e até mesmo certa lógica educacional, mas esquecem os fundamentos da ética humana: o respeito a vida, a sociabilidade entre todos e o cuidado com o planeta.

O mal é assim visto como ausência de luz, impossibilidade de uma clareira que dignifique e mostre a verdade aos homens, e isto independe de qualquer lógica racional porque está na difusa lógica humana que une desiguais e iguala os diferentes.

Para os cristãos é fundamental lembra o princípio da luz que apaga toda escuridão, como uma pequena vela acesa num breu, a clareira cristã, assim afasta-se do erro e da discórdia (Jo 3,21): “Mas, quem age conforme a verdade, aproxima-se da luz, para que se manifeste que suas ações são realizadas em Deus” e não há nada mais divino que a verdade.

Se o enraizamento de Heidegger refere-se a sua perda no “espírito da época”, o enraizamento mais profundo é aquele que vem da origem humana, seja ela antropológica ou ontológica.

 

O não-pensamento na atualidade

07 mar

O texto de Heidegger sobre a Serenidade, feito em 1949 em cerimônia de comemoração do centenário de morte de Conradin Kreutzer, em sua cidade natal   Meßkirch,, que por ser também a cidade Natal de Martin Heidegger, este foi chamado a falar no evento, livro é parte desta seu discurso.

O texto da serenidade revela o quanto nós somos induzimos a um pensamento calcula que corre de oportunidade em oportunidade, é fundamental para se entender que isto que é atribuído ao mundo digital, já ocorria muito antes deste, e não está restrito ao universo digital: “este pensamento continua a ser um cálculo, mesmo que não opere com números, nem recorra á máquina de calcular, nem a um dispositivos para grandes cálculos” (pg. 13), mesmo muito anterior ao universo digital, fala dele e diz que não é dele que está falando.

A dinâmica, que muitos atribuem ao universo digital já era a muito presente no homem moderno: “o pensamento que calcula (rechnend Denken) nunca para, nunca chega a meditar. O pensamento que calcula não é um pensamento que medita (ein besinnliches Denken), não é um pensamento que reflecte (nachdenkt), não é o sentido que reina em tudo o que existe” (idem, pg. 13), isto é, do final da década de 40 e anterior aos computadores modernos.

Convém traduzir as palavras alemãs: ein besinnliches Denken (um pensamento contemplativo) e nachdenkt (pensar sobre) e das rechnend Denken (pensamento calculista).

Assim para o filósofo existem duas formas de pensamento: o que calcula e o que medita, e pode-se pensar que o segundo não se apercebe da realidade, “não contribui em nada para levar a cabo a práxis” (pg. 14), pode levar a pura reflexão, a meditação persistente ser “demasiada “elevada” para o entendimento comum” (idem).

O autor diz que a única coisa correta é que a verdade de um pensamento que medita surge tão pouco espontaneamente quanto o pensamento que calcula, ambos requerem esforços.

O fato que o homem contemporâneo está vinculado a uma forma de pensar é porque é esta a forma atual em que o pensamento foi elaborado e treinado, ligado a logos racional e ideal.

Porém pondera que cada um pode seguir os caminhos da reflexão dentro de seus limites e a sua maneira: “Não precisamos, portanto, de modo algum, de nos elevarmos às “regiões superiores” quando refletimos. Basta demorarmo-nos (verweilen) junto do que está perto e meditarmos sobre o que está mais próximo: aquilo que diz respeito a cada um de nós, aqui e agora; aqui, neste pedaço de terra natal; agora, na presente hora universal” (pg. 14).

Claro Heidegger refletia sobre a comemoração em sua cidade Natal, mas isto vale para todos os eventos que vivemos em nossas vidas.

Heidegger, M. Serenidade. Trad. de Maria Madalena Andrade e Olga Santos. Lisboa: Instituto Piaget, s/d.

 

Vozes solitárias pela paz

06 mar

O escritor uruguaio Eduardo Galeano se posicionou contra a guerra, famoso por ter escrito “As veias abertas da América Latina”, que foi autor de mais de 40 livros, destaco entre eles O livro dos Abraços, tem uma gravação que voltou a ser divulgado no youtube pelo impacto que tem.

Começa sua fala dizendo: “Nenhuma guerra tem a honestidade de confessar: eu mato para roubar” e depois vai desmascarar os vários falsos motivos pelos quais tentam justificar suas atitudes, “as guerras sempre invocam nobres motivos, matam em nome da Paz, em nome de Deus, em nome do progresso” e outros, mas se não conseguem tem as mídias para ajudar, e não se tratam apenas das novas mídias, falava em seu tempo da grande imprensa.

A cultura tóxica de que alguém tem a solução para os grandes problemas do mundo, que há algum grupo “iluminado” evita a abertura ao diálogo, a encontrar os caminhos da paz.

Os antigos modelos propostos: a pax romana que submete os povos, a paz eterna que é o modelo idealista, a paz que resolve os problemas de justiça social, todas elas invocam a guerra em última instância.

Houve um tempo que era possível os povos saírem as ruas e reivindicarem a paz, e chamarem as autoridades para a insanidade de suas posições provocativas e insufladoras da guerra, ainda que disfarçadas em promessas de paz como dizia Galeano, e todas elas escondem o roubo, a ganância por riqueza e a pilhéria dos povos e dos pobres.

Também de pouco vale os espíritos “elevados” que fazem belas frases românticas e ideais, que nada tem de realidade ou de serenidade, são apenas alienação consciente ou inconsciente, são vozes que fogem dos problemas reais que a humanidade enfrenta: uma crise civilizatória.

O papa é uma destas vozes, também não deixam de haver vozes solitárias na ONU, pequenos países que apesar de estarem em esferas de influência, tem a sabedoria e discernimento que também sofrerão se a guerra prospera.

Eduardo Galeano chama a atenção em seu vídeo, que os países que compõe o Conselho de Segurança da ONU são justamente aqueles que mais armas tem, e a indústria armamentista é também uma fonte econômica para quem a detém, mas gera riqueza de grupos isolados.

Faltam vozes inequívocas para a paz, vozes que não ignorem a conjuntura e as posições reais.

No youtube: Eduardo Galeano: “Todos que fazem guerra mentem, só destroem e matam. Até quando farão guerra?” (youtube.com)

 

Rússia acuada e Israel questionado

04 mar

O panorama das duas principais guerras que preocupam as lideranças mundiais continua tendo lances e episódios tristes no seu desenrolar, na Rússia a morte de um ativista em prisão da Sibéria e em Gaza as dificuldades de ajuda humanitária.

Enquanto vencem no campo de batalha, estas duas superpotências perdem no campo diplomático já que para muitas autoridades a situação é de desumanidade e ameaça a civis.

Na Rússia a morte de Alexei Navalny na prisão levou milhares de pessoas ao seu enterro (foto), o advogado, ativista e blogueiro tinha uma atividade intensa e era respeitado por grande parte da população, segundo fontes russas 67 pessoas foram presas no enterro, e também a entrada da Suécia para a OTAN expõe o enfrentamento a guerra.

Putin ameaça retaliação a Suécia enquanto aumenta o tom com o Ocidente afirmando que uma entrada de tropas ocidentais na guerra da Ucrânia levaria a um caos nuclear, em resposta ao presidente Macron da França que disse que não hesitaria enviar tropas, porém outros países refutaram esta ameaça afirmando que não o fariam.

O envio de apoio humanitário a faixa de Gaza cria polêmica com Israel que diz facilitar, porém a reação internacional pedindo o fim das hostilidades, sem deixar de exigir a liberação de reféns que ainda estão em controle do Hamas, aparece em destaque na imprensa mundial.

Quem subiu o tom com Israel foi o presidente da Turquia, Erdogan que afirmou que Israel comete uma “tentativa de genocídio” com a operação militar na faixa de Gaza.

Inúmeros países já se manifestaram pelo fim da guerra, também o papa já se pronunciou recentemente afirmando “carrego no meu coração todos os dias, com dor, o sofrimento da população na Palestina e em Israel, e pedindo acesso seguro para a ajuda humanitária.

A escalada perigosa destas duas guerras pode levar a uma tragédia civilizatória e é preciso sabedoria e serenidade das lideranças mundiais.

 

O próximo e o negócio

01 mar

A policrise que envolve a humanidade, na palavra de Edgar Morin que foi também adotada (em outra perspectiva) por Adam Tooze, professor de História da Universidade de Yale.

No livro Terra Pátria o autor já desenhou um quadro de um nacionalismo renascendo, está escrito no prefácio da edição brasileira feito por Juremir Machado da Silva:

“Terra-Pátria, no qual colaborou Anne-Brigitte Kern, é o livro fundamental para o exame do fenómeno nacionalista na atualidade. Tudo está nele: pátria, nação, universalismo, identidade, ecologia, política, comunidade, etc. Os mecanismos para a compreensão da complexa rede social contemporânea são fornecidos com a limpidez costumeira ao texto de Morin” (MORIN, 2003, 14).

Entretanto a história caminhou no sentido contrário, incapaz de dar um passo a frente, agora guerras, utopias antigas e modelos espirituais fundamentalistas (não confundir com a ortodoxia porque é ela o verdadeiro fundamento das religiões e culturas).

A relação social se deteriora, a culpa seria das técnicas, do individualismo ou mesmo de uma onda de possessões demoníacas, entretanto o que acontece é simplesmente uma falta de um modelo autentico de solidariedade e aqui as utopias e culturas religiosas devem ser analisadas.

As utopias porque retroagiram aos modelos do início do século XX, o nacionalismo de Adam Smith e o bolchevismo de Lenin, as culturas religiosas porque se refugiam no fundamentalismo.

Há pouca coisa fora destas perspectivas, mas elas existem, há esperança onde cada pessoa é tratada com dignidade, a empatia é modelo de convivência e a vida como um todo trata o homem como um todo e é possível reintegrá-lo nos padrões de solidariedade e respeito.

A relação com um próximo não é um negócio, nem pode dissolver-se numa “amizade social” que é apenas uma superfície daquilo que é realmente humano, a relação com o Outro.

Não poucos autores escreveram sobre isto, até mesmo Jürgen Habermas abordou o tema, porém se trata da relação efetiva entre duas pessoas e não a relação social genérica ou cultural, que em geral envolvem interesses e relações com as bolhas de pensamento.

A cantora paraense cristã Aymeê viralizou ao cantar a música “Evangelho dos fariseus” que fala da exploração infantil na ilha de Marajó, das queimadas e do fato que o dízimo importa mais que os corações em muitas igrejas que transformaram a mensagem de amor em negócio.

Houve quem a contestasse, porém, a mensagem é bíblica, a mensagem bíblica (Jo 2, 16) em que Jesus diz: “16 E disse aos que vendiam pombas: “Tirai isso daqui! Não façais da casa de meu Pai uma casa de comércio!” e isto dá muito o que pensar, “de graça recebestes, de graça dareis” (Mt 10,8).

MORIN, E. E KERN, A..B. Terra-Pátria. Trad. Paulo Azevedo Neves da Silva. Porto Alegre : Sulina, 2003.