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Vacinas em teste e a disputa econômica
Mesmo reconhecendo falhas nos teses, a vacina da Pfizer contra a covid-19 deve estar aprovada dentro de alguns dias, informou neste domingo o jornal Financial Times, assim o Reino Unido se o primeiro país do ocidente a ter uma vacina, e a vacinação pode começar já em 7 de dezembro, no Brasil a corrida é do Coronavac, não importa muito qual é mais segura, por trás das vacinas há acordos econômicos e investimentos feitos a maneira de apostas e não de critérios realmente científicos.
No Brasil a autorização é feita pela Anvisa, na Europa pela Agencia Europeia de Medicamentos e a saída do Reino Unido da União Europeia, a transição final do Brexit é para 31 de dezembro, mas a Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos de Saúde do Reino Unido tem poder para autorizar temporariamente os produtos, e há um óbvio interesse do Reino Unido ainda que seja em parceira com a BioNTech alemã.
O mesmo processo poderia ser aplicado à vacina desenvolvida pela AstraZeneca e Universidade de Oxford (o Brasil participa pela FioCruz), no entanto na sexta-feira (27) o governo solicitou ao regulador que revisse a vacina AstraZeneca-Oxford, mostrando assim o interesse de fato.
Os dados atuais da eficácia da Coronavac, vacina produzida pela empresa chinesa Sinovac e que tem parceria com o Instituto Butantan, deve ser anunciada no início de dezembro, e uma aprovação em tempo recorde seria para janeiro, entretanto a eficácia é diferente dos testes que verificam efeitos colaterais, contraindicações e eficiência a longo prazo, também a Pfizer foi questionada recentemente devido aos testes.
Os estudos sobre efeitos de longo prazo indicaram que talvez uma única vacina não resolva o problema da pandemia, um artigo foi publicado em outubro no The Lancet Infectious Diseases, que acendia um sinal de alerta sobre as vacinas, e acrescentava que não se sabia até aquela data se as vacinas candidatas eram eficazes em formas graves da doença, o sinal de alerta fica no aceso.
Escatologia e o ser-para-a-morte
De onde viemos e para onde vamos, cada cultura tem uma escatologia própria, a modernidade e em especial o idealismo se caracteriza por desprezar a ideia de infinito, de mistério e consequentemente da morte, vista como fatalidade ou simples finitude da vida, aos que veem pessimismo em Heidegger é preciso analisar se há coerência escatológica (origem, vida e fim).
Da filosofia de Lévinas (Totalidade e Infinito) à poesia de Goethe (Fausto), do romance de Tolstói (A morte de Ivan Ilitch) à ontologia de Heidegger (Ser e Tempo) a morte é mais que um conceito ou um tema, é a própria indagação do ser, em Lévinas o infinito é próprio do ser transcendente enquanto transcendente, o infinito é o absolutamente outro, assim não se podem pensar o infinito, o transcendente, o Estrangeiro (em Lévinas) como sendo objeto, mas como Outro que não é outra coisa senão Ser.
O idealismo ao querer viver sempre acima do real, deseja ignorar ou “transcender” a morte (no sentido falso de objeto) e por isso tergiversa sobre ela, mas diante das tragédias de uma pandemia, de uma crise que pode tornar-se civilizatória, ele imobiliza-se ou parte para o psicologismo, neste campo também há um tratamento fenomenológico adequado, afinal Franz Brentano pai da psicologia social reinaugura na modernidade a fenomenologia, a psiquiatra Kübler-Ross (Sobre a morte e o morrer, Martins Fontes, 2002) estudou aquele estágio da doença em que o paciente se pergunta “Porque eu” e aprofundou o tema.
A análise em Heidegger, para não ser superficial, deve abordar três temas correlatos: Cuidado, Impessoalidade e silêncio, senão é a análise que chamamos de epistemologia ou escatologia incompletas, uma vez que elas se deparam apenas com o pessimismo diante da morte, nem a boa psicologia a vê assim.
Antes um esclarecimento, o termo ontológico se refere ao questionar o fato de existir, o Dasein (ser-aí) não apenas é, mas tem percepção que é, para a fenomenologia assim não se pensa primeiro em si e depois no mundo, pois as duas coisas são indissociáveis, e assim é uma epistemologia ontológica.
Para ajudar o que é este ser-aí, precisamos aprofundar o que Heidegger chama de superação do mundo fático, e assim quanto ao super o mundo da impessoalidade, ele consegue se desvencilhar de uma razão estruturada dotada de sentido, de uma maneira já dada do existir e do Ser.
Safranski, um biografo autorizado de Heidegger, a interpreta assim: “A angústia não tolera outro deus além de si, e isola em dois sentidos. Ela rompe a relação com o outro, e faz o indivíduo isolado cair fora das relações de familiaridade com o mundo”, ela é sentida pela “queda”, pelo horizonte sombrio.
Assim na impessoalidade abandona a ideia de “todos morrem”, que em vida esquiva-se do ser-para-a-morte, para o seu pensar em sua morte solitária, cai naquela angústia descrita em Ivan Ilitch de Tolstói.
Sobre o Cuidado, Heidegger se apropria da fábula grega na qual Jupiter e Cuidado que está dando forma a argila brigam pelo nome que será dado a figura criada, e chamado Saturno como juiz ele diz que a Júpiter pertencerá o espírito pois foi ele que o deu a forma, enquanto Cuidado terá a terra, já que a formou, o filósofo alemão usará este sentido, muito engenhoso, para dizer o ser-para-a-morte para assim encontrar algo além da finitude da forma.
Por último o aspecto do silêncio e da solidão são invocados para descobrir o si-mesmo, e posteriormente voltar ao mundo já senhor de si-próprio, e aberto a relação com os outros, que já não é mais utilitária (tão própria dos idealistas) e nem por meio de diretrizes fixas (tão própria das escatologias incompletas), há assim um Ser além do finito e aberto ao infinito, não há pessimismo algum, que o diz é má leitura.
Culturas originárias, redes e pós-colonialismo
As pesquisas arqueológicas e paleontológicas indicam que a África é o provável continente que surgiu a espécie humana, fósseis de hominídeos encontrados na África (por exemplo, na Tanzânia e no Quênia) indicam que a espécie primitiva habitou aquela região cerca de cinco milhões de anos atrás.
Porém. na literatura histórica, quando de fala de culturas originárias fala-se principalmente de culturas antigas como os maias no México, os Incas na região andina, os indígenas principalmente da região amazônica brasileira, na Colômbia a população é de quase dois milhões de habitantes, 4,4% que tem a Organização Indígena da Colômbia (ONIC), que estão se organizando em função da covid-19.
Na Amazônia, a comunidade indígena Sahu-Apé, está a somente 80 km de Manaus, e dados de organização (como a Terra Viva) dão conta que 65% da população indígena está na pobreza e 30% na pobreza extrema.
No Perú, um grande número de culturas originárias indígenas está retornando para as montanhas devido a escassez de alimentos e o medo da covid-19, muitas vezes apenas com a roupa do corpo, no Chile e na Bolívia a influência da cultura originária indígena é muito forte chegando a dominar a colonialista, no Perú 27% são quíchua, 3% aymara e mestiços 59,5%.
Assim estes povos formam redes de comunicação para preservação de sua cultura e autodefesa de seus valores culturais, e é preciso pensar num desenvolvimento sustentável que não os massacres como fez o colonialismo selvagem, não apenas com a violência, mas também com seus valores culturais.
As modernas redes eletrônicas, que são mídias de redes sociais, não eliminam nem se sobrepõe as redes culturais já existentes, é preciso não as ignorar e respeitar seus valores e cultura.
A questão do Ser envolve também a sociabilidade e o funcionamento em rede de culturas originárias, boa parte da cultura contemporânea em crise ignora ou tergiversam sobre os valores ontológicos que estão na raiz de muitos trabalhos em torno das culturas originárias, é preciso um pensamento pós-colonial que não veja o processo civilizatório apenas do ponto de vista eurocêntrico e colonial.
Dei uma entrevista alguns anos atrás abordando a questão das redes e ontologias em culturas originárias na rádio USP, o programa estará no ar hoje as 13 h (hora de Brasília, 16h horário de Londres e 10h horário de Nova York), o link para acesso online é: www.radio.usp.br/?page_id=5404 , ou na frequencia 93.7 MHz.
Uma epistemologia e escatologia incompletas
Aquilo que a fenomenologia e a filosofia ontológica procura está no centro da crise científica e do pensamento que vive o ocidente, e cujo epicentro é europeu, no dizer iluminado de Peter Sloterdijk a Europa se recente de não ser mais o centro como no período colonial (chama-a de Império do Centro) e procura outras formas de colonialismo para levar o idealismo avante, aquilo que na literatura tem-se chamado de epistemicídio.
Ao negar as culturas originárias de outros povos, pensa estar encontrando a própria difusa entre o barbarismo e a antiguidade clássica, tenta um novo renascentismo explorando de maneira difusa a cultura grega clássica.
No plano religioso o desastre é maior, Slavov Zizek escreveu recentemente sobre o conceito religioso em Hegel, e este último dos pensadores que tentar reavivar o marxismo clássico, reelaborou a religião hegeliana, mas que já era presente em Feuerbach e o próprio Marx criticou, no fundo é uma teologia atéia, uma escatologia morta.
Morta porque este é na verdade o grande equívoco da escatologia idealista, não há transcendente para ela sem a separação de sujeito e objeto, precisa negar a substancialidade para afirmar sua “subjetividade” onde o sujeito precisa sempre estar morto, nega o ser-para-a-morte mote de Heidegger, mas afirma a morte em vida (e isto não é o epoché fenomenológico).
Toda forma de cultura originária, é obvio que inclui aquelas culturas não-cristãs, tem uma origem (o próprio nome o diz), a vida e o fim escatológico, que não é para onde se caminha, e neste ponto esta teologia incompleta tergiversa sobre o que de fato é a morte, em tempos de pandemia poder-se-ia dizer que a doença que pode matar, e aqui é idêntica aos negacionistas.
Por isto mesmo que apele para a fenomenologia será incompleta, levará os que as incorporam a exaustão, ao desprezo pela vida, que até mesmo no sentido religioso é algo profundamente sagrado, sua “biós”, sua substancialidade, para ser claro para os idealistas, sua objetividade, caem no abstracionismo teórico.
A única substancialidade desta escatologia incompleta é negar a religião para torna-la idealista e pedir o que é desumano, aquilo que em termos bíblicos chama de “colocam fardos pesados nos ombros dos outros” e que eles próprios se recusam a carregar, em tempos de pandemia nem entram e nem deixam os outros entrarem.
O exame final será substancial: “eu tive fome e me destes de comer, eu tive sede e me deste de beber …” e não será questionado se elaborou uma boa epistemologia ou teologia, aquela que fez do colonialismo o terror das culturas originárias.
Crise civilizatória e morte
Retomando o pensamento de Pablo Picasso que o pior perda da vida não é morrer, mas morrer enquanto vivemos é a que melhor explica o estado civilizatório, mesmo os que devem a fraternidade, o diálogo, o planeta como casa comum parecem sem esperança e por isso cansados, não aquele da Sociedade do Cansaço que é parte uma crise, mas aquele de quem deixou de encontrar o que une, o positivo e o verdadeiro na vida.
Dir-se da pós-verdade, o sofisma é pré-socrático, e a mentira pública também já foi veiculada por jornais e meios televisivos, conforme o lado político que tomam, no fundo todos acabam concordando que se não está do lado politicamente correto, não é verdade, então ficamos no relativismo e no dualismo, mesmo aos que pregam contra, Edgar Morin tem razão é uma crise do pensamento, e Peter Sloterdijk também “não é um tempo favorável ao pensamento”, é mais fácil tomar um lado, embora hajam erros e acertos em vários lados, porque não são apenas dois.
Vi no Instagram que dois vídeos muito populares são de uma jovem artista que faz fantoches com esqueletos, pássaros e figuras fúnebres e outro de uma menina cujo cabelo foi decorado como um cemitério (figura acima), é uma triste realidade os pós-góticos parecem dominar a fantasia juvenil.
Em reportagem a BBC do dia 31 de outubro, o banqueiro dos pobres Muhammad Yunus declarou: “Precisamos redesenhar o sistema garantindo uma nova economia de três zeros: zero pobreza, zero desemprego e zero emissões líquidas de carbono. E sabemos como fazer. O problema é que somos muito preguiçosos e estamos muito confortáveis no sistema que temos, não queremos sair da nossa zona de conforto”, é um novo pensar pode não dar certo, mas sem dúvida as pessoas, os pobres e o planeta precisa de respostas, as velhas criam mais polarização e equívocos, além de pós-verdades, neste caso com um novo sentido, do ponto de vista ideológico elas foram verdades um dia, hoje são pós-verdadeiras.
Há situações e penso que o próprio planeta poderá reagir, uma reação aórgica, o inorgânico sobre o orgânico, afinal viemos do pó, de alguma reação química e com certeza se não mudarmos a rota iremos voltar ao pó, não aquela fatalidade da vida, a morte pessoal física, mas o morrer em vida.
A pergunta que fica é se esta reação do inorgânico planeta poderia mudar algo no orgânico humano, a sua mente, o seu ser, para algo melhor.
Como prestar contas de nossas faltas
Todos cometemos faltas, se é verdade que não podemos enganar a vida com a morte, dizia o poeta Goethe, não podemos deixar de reconhecer a fatalidade da vida que é seu ocaso final.
Não há nenhuma contestação a fazer, ninguém ficou para semente diz um ditado popular brasileiro, e não sabemos o que há do outro, exceto para os que creem.
Durante anos da vida caminhamos desatentos com pequenas e grandes faltas, a maioria delas empurramos para debaixo do tapete, outras vezes justificamos nem sempre de maneira justa e convivente as faltas que tivemos, atribuindo a culpa ao Outro, porém o que fazer diante de um momento que devemos reconhecer aquilo que não fizemos bem e que podemos ter prejudicado muitas pessoas.
Leon Tolstói descreve em “A morte de Ivan Ilitch” um homem diante da morte, que vê os parentes mais preocupados com a herança do que com a própria vida dele, descreve no livro: “Chorou como uma criança. Chorou por causa do seu enorme enfraquecimento, e terrível abandono em que a família o deixava e pela crueldade e ausência de Deus.”
Claro que nem todos se lembrarão da ausência de Deus, é uma espécie de sacramento da ignorância, mas há também aqueles que mesmo tendo “praticado” uma religião terão dificuldades de perceber suas faltas e assim terão dificuldades de prestar contas delas.
Mesmo as alegrias da vida parecem distantes num momento e que todos estaremos muitos frágeis, descreve Tolstoi no seu conto: “Quanto mais se afastava da infância e se aproximava do presente, mais insignificantes, mais duvidosas eram as alegrias.”
Seria bom que por um evento sobrenatural pudéssemos ter clareza de nossas fraquezas e tempo para redimi-las, mas nem todos terão, talvez algo possa acontecer.
Seria uma grande prova da existência e Deus e a ideia que é possível a humanidade ter salvação, a crise pandêmica é maior porque existe uma crise civilizatória.
A morte e a vida
Pablo Picasso tem razão ao dizer que “a morte não é a maior perda da vida. A maior perda da vida é o que morre dentro de nós enquanto vivemos”, porém diante de uma pandemia que ameaça a todos, diante de uma segunda onda que promete ser ainda pior, Makron e outros governantes da Europa já o disseram, devemos encarar o tema.
Onde foi Dia de Finados, lembrar de mais pais e algumas pessoas que já não estão mais aqui sempre me fizeram um acalanto diante da vida e da morte, o que viemos fazer aqui nesta curta passagem, deveria ser a questão destes dias.
A pandemia poderia ter ensinado mais, ao menos conseguiu frear o vida frenética da Sociedade do Cansaço, mas a grande maioria das pessoas se comporta como se não houvessem muitas pessoas morrendo e que também elas podem estar de repente diante de uma encruzilhada, que assim penso, não será pessoal apenas, mas todo o planeta.
Li num dos últimos livros de Edgar Morin: “em vez de ser terra de ninguém, poderíamos ser terra de todos”, não é o ainda acontece, hoje é dia de eleições nos EUA, sem polarizar pode-se dizer se ganhou a vida ou a morte, não falo de políticas governamentais também, mas as ameaças de guerra que sempre pairam sobre a humanidade em tempos de guerra.
Todos um dia abandonaremos nossos sonhos, promessas e as coisas boas que fizemos, será hora de prestar contas se não a Deus, aos que creem, as gerações futuras sobre o legado que deixamos.
Viver a vida e ser feliz deve ter sempre como complemento também a felicidade dos outros, se não sou causa de felicidade a minha volta, a minha própria pode estar comprometida, e no fim da jornada ficará apenas aquilo que fizemos de bom e que os que ficam terão prazer em recordar.
A relação com o Outro e com a Natureza que é também um outro, deve ser modificada para que tenhamos esperança num futuro promissor para os que nascem.
Segunda onda ou é outro Cov-2
Em artigo recente “Emergence and spread of a SARS-CoV-2 variant through Europe in the summer of 2020” publicado em 28 de outubro no site da medRxiv, informam a disseminação, presumivelmente a partir da Espanha, de uma variante do vírus da Covid-19, que já seriam 80% das infecções recentes, o artigo ainda terá a revisão por pares, mas já disparou o alarme da comunidade científica, o artigo ainda terá revisão por pares.
Desde o início de setembro a Europa já verificava um aumento nos casos de infecção e retomava as medidas de distanciamento, era o final do verão, agora em outubro as medidas se tornaram irreversíveis, e o presidente da França chegou a declarar: “o vírus circula numa velocidade não prevista nem pelas previsões mais pessimistas … estamos todos na mesma posição: invadidos por uma segunda onda que será sem dúvidas mais difícil e mais mortal que a primeira”, a Inglaterra já decretou lock-down e ainda estamos no outono, o inverso deste ano promete ser rigoroso.
A Alemanha, a primeira-ministra Angela Merkel fez acordo com os governadores locais para fazer um “lockdown light”, mas até o final de novembro bares, restaurantes, teatros e academias terão que fechar as portas, será um Natal doméstico e com muitas restrições na Europa.
Na Itália o governo do primeiro-ministro Giuseppe Conte determinou que neste início de novembro bares e restaurantes de todo país só poderão ficar abertos até as 18h, academias, piscinas, teatros e cinemas não podem abrir.
As medidas impactaram as bolsas que tiveram uma forte queda, de 2% a 4% na Europa, e mais de 4% no Brasil, hoje feriado aqui, as bolsas no exterior se recuperam, mas a apreensão agora se volta para as eleições americanas marcadas para amanhã, porém muitos votos já foram antecipados e haverá record de eleitores, porque nos EUA o voto não é obrigatório.
As empresas que desenvolvem as vacinas prometem acelerar, mas especialistas apontam que isto não é possível e para esta variante também deve ser testada.
Aflição e angústia
Os que leram atentos O Ser e o tempo, sabem que uma das respostas importantes de Heidegger é o aquilo que deve ser lido em Kierkgaard e que está ligado a raiz filosófica de seu pensamento, e isto está ligado a angústia e discorremos aqui o que a diferencia da aflição que é a angústia pessoal e ligada ao problema do mal.
É, pois, o próprio Heidegger quem Kierkegaard separando-o em ensinamentos ditos “edificantes” que seriam mais importantes do que os “teóricos”, exceto em um caso que é o da angústia, em seu tratado O conceito de angústia, e que o filósofo da floresta faz questão de dizer que “do ponto de vista ontológico” permanece ainda “inteiramente tributário de Hegel e da filosofia antiga vista através deste”. (HEIDEGGER, 2012, p. 651, n. 6).
O que Heidegger viu neste livro de 1844, cuja autoria é atribuída a Vigilius Haufniensis, pseudônimo kierkegaardiano que se traduz como “Vigia de Copenhague”, já que Kierkegaard era dinamarquês e sua primeira intenção é retornar a sabedoria socrática, que para ele se conjugava entre o saber contemplativo (theoría) com o saber prático (phrónesis), a maneira da antiguidade grega.
Apesar dele ter chamado Sócrates de “filósofo prático, justamente queria centrar o penso da “angústia” na vivência do que era refletido pela alma e isto significou uma aproximação da psicologia, era “a doutrina do espírito subjetivo” (Kierkegaard, 2010, p. 25), era um dos ramos da Filosofia, e de uma filosofia realmente dialética no sentido grego-socrático já que a filosofia moderna se fixou no dualismo kantiano tese x antítese com uma improvável síntese
O filósofo usa a expressão “pecado hereditário”, usada pelo autor ao longo da obra, mas como aquela que correspondo o que os teólogos, por ele chamados de “dogmáticos”, denominam como de pecado original, nomenclatura a parte, é o aspecto que aproxima o seu tema da angústia daquela aflição “de alma”, que pode ter o contorno filosófico e psicológico, mas que é no fundo aquela aflição de quem se sente fora de um centro, de uma perspectiva clara de superação da angústia.
Nela não há o sentido portanto de pecado original, nem da noção de pecado, mas se confunde como tal como a sua possibilidade enquanto ideia, ou seja, uma categoria conceitual capaz de nos ajudar a pensar sobre algum mal praticado, e o que levaria a este “mal” é o conceito de liberdade para muitos pensadores.
O que conduz o existir a um modo singular, a um modo de agir de tal forma ? É aí que as noções de liberdade e de angústia emergem enquanto “conceitos” convergem para esta “angústia”, mas sem ter um locus, nem na Estética, nem na Metafísica e sequer na Psicologia, assim o autor não o diz, mas há algo de aflito e de trágico neste caminhar nesta “angústia”.
Paul Ricoeur refletindo sobre estas expressões de Kierkegaard, estabelece que o mal é “o que há de mais oposto ao sistema”, justamente porque é absurdo e escandaloso, irracional e incompreensível, situado à margem da moral e da razão, lembra Ricoeur (1996, p. 16), referindo-se às reflexões kierkegaardianas, o mal é “o que há de mais oposto ao sistema”, justamente porque é absurdo e escandaloso, irracional e incompreensível, situado à margem da moral e da razão.
Ricoeur diferencia assim o mal estrutural (já fizemos um post), ligado a angústia e o pecado e o livre-arbítrio ligado a decisões pessoais perante a angústia.
O ponto que considero essencial no pensamento de Kierkegaard sobre este aspecto existencial é que “só o que atravessou a angústia da possibilidade, só este está plenamente formado para não se angustiar, não porque se esquive dos horrores da vida, mas porque esses sempre ficam fracos em comparação com os da possibilidade” (Kierkegaard, 2010, p. 165-166), é aqui que a aflição pode encontrar o seu oposto e podemos entender que há uma fonte de consolo nela.
Assim angústia e aflição não são propriamente maldições ou estados pecaminosos ou doenças da “alma” ou dos pensamentos, são fases de ruptura ou transição para outras fases mais maduras quanto esta etapa envolve reflexão e superação.
HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Campinas: Editora da Unicamp, 2012. (Multilíngues de Filosofia Unicamp). JOLIVET, Régis. As doutrinas existencialistas: de Kierkegaard a Sartre. Porto: Tavares Martins, 1957.
KIERKEGAARD, Sören. O conceito de angústia: uma simples reflexão psicológico-demonstrativa direcionada ao problema dogmático do pecado hereditário de Vigilius Haufniensis. Tradução e notas Álvaro Luiz Montenegro Valls. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.
A felicidade em Tomás de Aquino
Para analisar a beatitude, que já esclarecemos que é também um tema da Grécia antiga para a felicidade, Tomás de Aquino aprendeu com o filósofo grego a distinguir entre duas formas diferentes de felicidade: as riquezas naturais que são aquelas pelas quais o homem é ajudado a compensar as deficiências naturais como a comida, a bebida, as vestes, a habitação, etc., e as artificiais aquela não auxiliam a natureza mas a submetem, como o dinheiro, mas a arte humana inventou para facilitar as trocas, para que fossem como medidas para coisas veniais, e influenciado por Boécio vai questionar se a riqueza é de fato a que dá posso a todos bens:
“A bem-aventurança é o estado perfeito da junção de todos os bens’. Ora, parece que pelo dinheiro poderão se adquirir todas as coisas, porque o Filósofo, no livro V da Ética, o dinheiro se inventou para ser a fiança de tudo aquilo que o homem quisesse possuir. Logo, a bem-aventurança consiste nas riquezas” (Tomás de Aquino, Suma teológica. Parte III).
Mesmo com a posse de uma ideia mais ampla de riqueza, a riqueza natural que Aristóteles previu, e a riqueza artificial também, em nenhuma delas o Aquinate vai reconhecer como fonte de felicidade, pelo fato que não tem um fim em si mesma, e as pessoas que as possuem tornam-na o fim último, torna-se fiança de algo.
E que valor pode possuir esta fiança em si mesma, Tomás de Aquino examina a honra, e diz neste sentido: “é impossível que a bem-aventurança consista na honra. A honra é prestada a alguém devido alguma sua excelência: e assim, é um sinal e testemunho daquela excelência que está no honrado”, pode também ser a fama ou glória, o poder, e os bens do corpo, porém todos estes bens em si mesmo também não traduzem em felicidade, mas apenas em falso conhecimento.
Assim é ela própria a bem aventurança, diz textualmente: “a bem-aventurança é o mais estável dos bens”, assim a falta de estabilidade da fama ocorre pelo fato de ela derivar, exclusivamente, do conhecimento humano, que, por sua vez, é limitado, e muitas vezes é mesmo falso.
De modo parecido argumentava Boécio: “o poder humano não pode evitar o tormento das preocupações, nem o aguilhão do medo”.
Quanto ao corpo, argumenta o filósofo cristão: “a bem-aventurança do homem é superior em todos os sentidos à dos animais, embora muitos animais superem os homens nos bens do corpo”, assim se a beatitude vem daí o homem estaria se igualando aos animais, e quão verdade é isto muitas vezes.
Mas o que é então a felicidade para o Doutor Angélico, que faz o mesmo questionamento de Boécio: “‘é necessário confessar que Deus é a própria bem-aventurança?” e concluirá que “a bem-aventurança é o último fim, para o qual naturalmente tende a vontade humana” e “para nenhuma outra coisa deve tender a vontade como para o último fim, a não ser para Deus, pois ele deve ser objeto de gozo, como diz Agostinho” (AQUINO, 2003, p. 62).
Pode-se aqui ter a síntese do que é a felicidade para os três grandes pensadores cristãos do período medieval.
Para alguns autores, como Luiz Alberto De Boni, a filosofia de Tomás de Aquino nestes moldes: “o bem e o fim se identificam”, possui assim uma escatologia, e se entendemos que o fim é apenas esta vida terrena limitada a um período temporal sua argumentação não é validade, porém se admitimos a eternidade, a felicidade como bem último é aquela que conquistamos já aqui mas que deve se prolongar além da vida temporal, fora disto é claro, somente os prazeres temporais.
No quadro acima, de autor anônimo, O homem rico e Lázaro, (cerca de 1610, Amsterdam).
AQUINO, Tomás de. Suma teológica. Vol III São Paulo: Loyola, 2003.