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Arquivo para a ‘Filosofia da Informação’ Categoria

Hermenêutica e fanatismo

29 mai

Desde a filosofia platônica, que foi uma superação do discurso dos sofistas queComunicaçãoNãoViolenta serviam unicamente a retórica de poder, o dualismo do conhecimento entre a Doxa que é a opinião e a Episteme que seria o conhecimento verdadeiro, mas alguns autores veem a Doxa como primeiro conhecimento.

Todo o discurso e a lógica Socrática, que Platão a usa abundantemente, não é senão o diálogo entre o conhecimento como se apresenta e a sua elaboração através de perguntas.

O fato que caímos num labirinto de dúvidas e crises na modernidade, mesmo com o conhecimento sistematizado não é senão o retorno ao que de fato é a episteme, como a vida muda, a lógica da vida também seria de se esperar, deve mudar e assim muda o método de investiga-la.

Chamo a esta exigência de nosso tempo de “abertura epistemológica”, permitir que novos sistemas e novas formas de pensar sejam possíveis e passíveis de análise, assim a doxa ou a simples opinião pode não ser apenas uma forma moderna de sofisma, mas um “desvelar”.

O fanatismo é de modo geral a recusa a uma “abertura epistemológica”, é o fechamento em um esquema “que deu certo” por um período, mas pode não mais servir a lógica da vida hoje.

Claro que há diversos níveis de fanatismo, mas em essência é um fechamento ao discurso do Outro, ao circulo hermenêutico onde é possível alguma forma de fusão de horizontes, como o chama o filósofo Gadamer.

Por assim dizer é a comunicação de que outro discurso diferente ao do meu circulo epistêmico não é aceito, não é tolerável e deve ser banido, daí a chegar-se a formas violentas de comunicação não é um passo, mas é um caminho quase inevitável.

Não é um fechamento epistêmico, uma ajuda é o livro de Marshall Rosenberg “Comunicação não-violenta” vai desde a autoajuda para libertar-se de condicionamentos e experiências negativas, até os esquemas filosóficos e problemas de posicionamentos políticos tão comuns em todas esferas de nossa vida hoje.

 

O espírito da Verdade no idealismo

16 mai

O idealismo moderno iniciado com Fichte (1762-1814) e Schelling IdealismTruth(1775-1854), como certa oposição a filosofia kantiana que é também idealista, terá seu ápice com Hegel (1770-1831), que afirma existir um “espírito absoluto” e que é ele com o qual o homem se relaciona mais profundamente, podendo se conhecer e que pode ser desdobrado em três níveis relevantes: a arte, a religião e a filosofia.

Parece forte e até verdadeiro, mas há críticos severos que dizem que a morte da arte acontece com Hegel, Marx de certa forma tenta anunciar o fim da filosofia ao afirmar que “os filósofos agora devem transformar o mundo”, e por último, a religião de Hegel não é senão a mais pura filosofia de Deus, não podendo alcançar o mundo e o homem concreto.

Claro a culpa não é exclusiva de Hegel, mas filosofia, arte e religião estão decididamente em crise atestam quase todos filósofos e teólogos, lendo o “último testamento de Bento XVI”, ele afirma que desde 1956 já ocorre um processo de “desmundialização” da religião, ou seja, a perda de sua universalidade.

Sobre o objeto da arte, lembro o texto de Heidegger sobre a questão da técnica, mas cuja crítica mais profunda é a da arte ao afirmar questionando-se sobre verdade, liberdade e acontecimento do ser e do ente, afirmará que “a arte é histórica no sentido essencial [… visto que] deixa a verdade brotar.  A arte, enquanto um conservar que funda, deixa brotar a verdade do ente na obra”, mas vê que ela hoje necessita de um desvelar.

A filosofia idealista expressa o “espírito absoluto” assim em Hegel: “O espírito só é espírito, na medida em que é para o espírito; e na religião absoluta é o espírito absoluto que se manifesta, não mais seus momentos abstratos, mas a si mesmo”. (HEGEL, 1980, p.346).

È um fechamento do espírito em si em um puro espiritualismo, sem uma para si que seja a abertura ao outro, esta é a religião contemporânea que quando manifesta-se em relação ao objeto externo não o vê dentro de si em sua subjetividade, Hegel expressa isto assim: “A filosofia se determina de modo a ser um conhecimento da necessidade do conteúdo da representação absoluta, como também da necessidade das duas formas: de um lado, da intuição imediata e de sua poesia, e da representação, que pressupõe da revelação objetiva e exterior; de outro lado, primeiro, do adentrar em si subjetivo, depois do movimento para fora subjetivo e do identificar da com a pressuposição.” (HEGEL, 1980, p.351).

A filosofia contemporânea, a partir de Heidegger com Gadamer, Paul Ricoeur e Emmanuel Lévinas, abre-a com a hermenêutica presente na Questão da consciência da história de Gadamer, no Outro de Paul Ricoeur e em Totalidade e Infinito de Emmanuel Lévinas.

 

HEGEL, G.W.F.  Fenomenologia do Espírito. Tradução Henrique Cláudio de Lima Vaz, Orlando Vitorino, Antônio Pinto de Carvalho. 2. ed. São Paulo: Vozes, 1980.

Nectarios G. Limnatis, German Idealism and the Problem of Knowledge: Kant, Fichte, Schelling, and Hegel, Springer, 2008.

 

Consciência histórica efeitual, a dor e o Outro

12 abr

Nesse sentido, fala-se numa inversão da consciência, mas a consciência em Hegel e Ooutroem todo iluminismo, segue como sendo a experiência se traduz num movimento dialético da consciência consigo mesma., ou seja em última instância, no saber absoluto percebe-se uma identidade de sujeito e objeto, mas na lógica da fusão e não da distinção entre sujeito e objeto. Isso retira toda a possibilidade e a legitimidade da experiência, já que o homem tem de estar no próprio conteúdo para aceitá-lo e a consciência adquirir certeza de si mesma;

Na lógica de Gadamer, “a essência da experiência é pensada aqui, desde o princípio, a partir de algo no qual a experiência já está superada. Pois a própria experiência jamais pode ser ciência“, ademais, Heidegger adverte que Hegel não pensa a experiência como dialética; pelo contrário, visualiza a dialética a partir da experiência, dir-se-ia não é a consciência do mundo, mas o mundo da consciência.

Se da experiência jamais se faz ciência por haver “uma oposição insuperável com o saber e com aquele ensinamento que flui de um saber teórico ou téncico”, objeto de vários estudos nossos, pois fica-se sempre diante de uma abertura para outras experiências. Deve-se aceitar o fato de que certezas e dogmas não perduram eternamente e são passíveis de alteração. A única certeza plausível é impossibilidade de se conhecer tudo. Quanto mais experimentado é um indivíduo, mais consciência tem das infinitas possibilidades do ser humano e mais tem consciência do seu Ser.   

Assim o caminho feito Gadamer possui elementos para concluir que a experiência é a consciência da própria finitude humana e das limitações, uma referência a filosofia clássica, em Ésquilo é bastante ilustrativa: “aprender com o sofrer”, ou seja, de forma dolorosa, o homem torna-se ciente da sua separação da divindade e da temporalidade de sua existência.  

Toda experiência, por mais que se pense consumada ou exaurida, constitui sempre abertura. Nem mesmo o próprio homem possui uma essência. O ser significa um poder ser si mesmo, pois tem por características a indefinição e as infinitas possibilidades. Dessa forma, torna-se incoerente falar da experiência no sentido teleológico, à semelhança de Husserl e Bacon, e da forma descaracterizada de Hegel.

A tradição precisa alcançar a experiência, assim como linguagem é complementar e dela vem à fala, que é um tu, deve-se diferenciar a experiência do tu da experiência verdadeiramente hermenêutica, vejam-se trabalhos de Paul Ricoeur e Emmanuel Lévinas, enquanto a primeira pode se dar sob a forma de conhecimento de pessoas, tornando o tu um objeto de análise, ou reconhecendo-o como pessoa, porém ainda permanece com referência ao próprio intérprete, a hermenêutica permite o outro como interprete é portanto um passo a frente no conhecimento da verdade.

A experiência hermenêutica é aquela que assume a consciência da história efeitual. A tradição precisa ser compreendida verdadeiramente como um tu. Toda alteridade tem algo a dizer e deve ser respeitada sua condição de outro. Não se pode impor pretensões ou concepções prévias. A abertura se dá de forma mútua, isto é, entre quem “escuta” e aquele que “fala algo”, inclusive com a possibilidade de que seja contrário ao intérprete, conforme Gadamer:

“A consciência hermenêutica tem sua consumação não na certeza metodológica sobre si mesma, mas na pronta disposição do homem experimentado ao que está preso dogmaticamente. É isto que caracteriza a consciência da história efeitual, como poderemos pronunciar mais detalhadamente a partir do conceito de experiência”.

 

 A consciência efeitual e a questão da experiência

11 abr

A consciência efeitual é o reconhecimento de que ela se estrutura sob a forma de Conscienciaefeitualexperiência em Gadamer, mas é preciso compreender a experiência hermenêutica, especialmente por se tratar de um conceito de difícil entendimento, pois a supervalorização do conhecimento científico, notadamente no século XIX, levou a uma distorção do seu real valor.    

Na ótica científica, experiência é tudo aquilo que pode ser repetido por quem quer que deseje a qualquer tempo, ou seja, liga-se fundamentalmente a um “caminho” objetivador do conhecimento, as vezes chamado de prática, mas qual prática ? . Gadamer foi revisitar justamente os que diversos matizes filosóficos entendem por verdade científico e método, não é uma conclusão apenas um “desvelar”.

Para Francis Bacon, todo conhecimento deveria vir da experiência.  Foi deste modo de certa forma despretensioso de encarar a experiência que depois chegou a uma generalização válida até que seja contraposta, propondo a interpretatio natura, via de acesso “gradual as generalidades verdadeiras e sustentáveis“ e que depois mais tarde foi sistematizado e tornado “método” por Hume, considerado o pai (talvez o avô) do empirismo, assim por meio da observação da natureza, o método indutivo permite o acesso ao geral, elevado a essa categoria após a organização racional dos dados obtidos e a comprovação das hipóteses, mas o empirismo também gerou contradições.

Husserl tentou livrar-se desta experiência parcialidade da vinculação com a ciência de toda experimentação, alegando que esta ocorre no mundo da vida, portanto, é anterior à sua idealização. Aqui no sentido da Crítica da Razão Pura de Kant, que tentou conciliar racionalismo e empirismo. Como se sabe, inspirado por Descartes, o fenômeno era algo que demonstrava “repúdio pelas ciências empíricas”, o que denota a falta de apreço pelas experiências tentando fazer toda interpretação pela “razão”. Se só pode ser verdadeiro aquilo que se torna evidente na consciência, certamente os sentidos levam a enganos. Contudo, Husserl permaneceu preso àquilo de que queria se libertar, mas Heidegger e Gadamer deram os passos necessários.

Gadamer se opusesse a objeção de simplificar o processo de produção da experiência, focando-se em sua relação com a ciência e com a formação dos conceitos. O processo de experiência verdadeiramente se dá em seu lado negativo, ou seja, desconstrói generalidades e tipicidades, não corresponde às expectativas, conforme afirma em Verdade e Método “a negatividade da experiência possui, por conseguinte, um particular sentido produtivo. Não é simplesmente um engano que se torna visível e, por consequência, uma correção, mas o que se adquire é um saber abrangente ”. 

O sentido negativo da experiência e a abertura constante a novas possibilidades remetem à dialética, questionamento este elaborado por Hegel, para quem a experiência representa uma manifestação do ceticismo, j amais se refaz uma experiência conforme a máxima de Heráclito de Éfeso: “não podes passar o mesmo rio duas vezes, as águas correm sobre ti”.

 

O problema da consciência histórica

15 mar

Em 1957 Hans-Georg Gadamer foi convidado a lecionar por um trimestre na HermeneuticaRomantica2Universidade de Louvain, em 1963 apareceu em francês com o título Le probleme de la conscience historique, e ainda não havia a obra maior do filósofo hermeneuta “Verdade e Método”.

Depois dela apareceu em 1969 uma versão italiana do texto, mas foi na versão inglesa de 1975, que conforme afirma Gadamer ele se “reencontrou consigo mesmo” revendo o texto original para publicação em inglês, desta edição foi feita a tradução para o português, como primeira edição em 1998, e a edição que leio é de 2006, 3ª. edição feita pela FGV.

O livro é, portanto um poderoso preâmbulo para quem deseja ler Verdade e Método, onde o problema da consciência histórica e sua relação com o método remonta a Schleiermacher e sua releitura feita por Dilthey, sendo Gadamer “seu ideal é decodificar o Livro da História” (Gadamer, 2006, p. 11).

As conferências de Gadamer que foram base a este opúsculo, refletem o “problema de introduzir o problema hermenêutico a partir da perspectiva de Husserl e Heidegger” (pag. 10), problema que foi portanto tratado de modo especial na Alemanha, onde graças a Wilhelm Dilthey e ao que se chama sua Lebensphilosophie” (idem), a filosofia da vida.

O problema da interpretação conforme as leis da natureza, em alemão Geisteswissenschaften*, Gadamer esclarece que em Verdade e Método ele começou deliberadamente a invocar outro exemplo, “representado pela experiência da arte e a dimensão hermenêutica, que intervém, com toda certeza, no estudo científico da arte, mas antes de tudo na própria experiência da arte.” (pag. 10)

Ele vai com isto se distanciar de Dilthey, que se propôs a construir uma base epistêmica para as Geiteswissenchaften, mas não se via como o filólogo, esclarece, mas como “um teórico do método de uma escola história que não via “a compreensão de textos e outros fragmentos do passado como seu objetivo último”, escreveu Gadamer citando Dilthey.

O que Dilthey esperava era conciliar as ciências interpretativas com sua objetividade científica, a ideia inicial era dar a hermenêutica um método universal.

Gadamer esclarece qual é sua posição: “mostrar que a autocompreensão com relação às ciências não é verdadeiramente consoante com a sua posição fundamental em termos da Lebensphilosophie” (pag. 12), e esclarece que a possibilidade humana do pensamento reflexivo, “não coincide em verdade com a objetivação do reconhecimento através do método científico.” (idem)

Vai esclarecer que a conexão entre a “vida” quando se fala de consciência e reflexividade e “ciência” (ele pôs entre parêntesis), desenvolver-se a partir da vida é uma das possibilidades.

*A tradução segundo o próprio Gadamer é “Ciências Humanas”, no Brasil “Humanidades”.

 

Dois achados: tecnologia e religião

13 fev

Devemos ler a história do momento presente para trás, ou seja, no sentido inverso, embora ChaveautStonehengesempre seja importante uma dose de “desantropomorfização”, ou seja, atribuir todo o fundamento dos conceitos estudados unicamente ao homem, sem considerar seu meio em volta, e com isto o uso de tecnologia para seu manuseio.

Isto significa que o homem é o que ele faz com a natureza e com os seus semelhantes a sua volta, a importante relação com o Outro que a filosofia atual enfatiza.

Dando um salto na história, voltando a 7 mil antes de Cristo, encontramos o monumento Stonehenge no centro da Inglaterra, e recentemente (nos anos 90) foi encontrada uma caverna com pinturas datadas de 30 mil antes de Cristo, a Caverna de Chauvet.

Diversos estudos de arqueologia, Stonehenge está mais avançado, apontam dois fatos interessantes: a importância tecnológica, as pedras de Stonehenge foram movimentada pela Inglaterra vindas do Pais de Gales, e o aspecto religioso: sabe-se que aquele circulo é parte de círculos maiores de onde vinham diversos habitantes para algum tipo de rito “religioso”.

A segunda descoberta é mais intrigante, uma verdadeira galeria de arte foi encontrada em Chauvet, mostrando uma técnica já refinada de pintura e aquilo que Werner Herzog chamou de “homo spiritualis”, em seu filme “A Caverna dos sonhos esquecidos”, única filmagem permitida até hoje desta galeria de arte pré-histórica.

É importante saber que tanto os pesquisadores e arqueólogos ingleses que pesquisa Stonehenge  (veja nosso post) quanto Werner Herzog que filmou Chauvet não são pessoas religiosas, mas a constatação que havia algo de “espiritual” em ambos os monumentos nos faz pensar.

O homem sempre viveu mergulhado numa esfera espiritual, que Teilhard Chardin chamou de Noosfera e usou tecnologia, portanto o princípio antropomórfico é falso, somos natureza.

 

Traduzir em coisas simples, pode complicar

10 fev

As redes são simples, mas qualquer análise mesmo usando conceitos simplesSimples como “elos fracos”, “pontes”, “centralidade” e “graus de separação” poderá na medida que o número de atores de uma rede aumenta, aumentar exponencialmente sua complexidade.

Diversos são os raciocínios cotidianos que levam a este pensamento equivocado, a simples ideia que a vida, a sua origem no universo, o que fazemos e o que somos, tem respostas simples leva a um raciocínio simplista equivocado, desde o científico até o religioso.

A ideia que Deus exista ou não por exemplo é complexa, pois seus três elementos estruturantes não são simples: fé que é a crença no que não é evidente (porisso não tão simples), esperança cujo elemento muitas vezes pode chegar ao absurdo que é te-la mesmo em situações de desespero, guerra ou qualquer extrema gravidade; e por último: a caridade (no sentido de amor ágape) que é talvez a coisa mais impossível de se codificar, embora fácil de sentir quanto realmente está na presença dela.

Mas o raciocínio científico é o mais complexo, pois vem de formulas reducionistas como a de Wilhem Ockham, nominalista inglês do século XI que criou a famosa Navalha de Ockham, que se estiver entre duas explicações de determinado objeto, fico com o mais simples, mas fica a pergunta: quem garante que a explicação correta não é a complexa.

O nominalismo foi combatido pelos realistas, e o problema de fundo é saber se existem ou não universais, que são realidades em si, e transcendentes em relação aos particulares, ou seja, as qualidades (Platão enunciou a formula universais ante rem*), ou as propriedades uma vez que são coisas imanentes as qualidades (para Aristóteles: universidade in re**). (* antes do existente), (**universalidade na coisa).

A partir de Duns Scoto, que chamava a navalha de princípio da economia (de raciocínio?) e posteriormente Descartes e Kant, ainda que a obra prima de Kant fosse uma crítica a Descartes: A crítica a razão pura, mas o que está na base desta discursão, é por vezes esquecido, ou negligenciado: a subjetividade, o transcendentes e a fé.

Duns Scoto que está na origem deste pensamento, curiosamente afirma que as verdades da fé não poderiam ser compreendidas pela razão, o contrário que tinha dito Tomás de Aquino, que era realista, e o que Kant deseja ao criticar a “razão pura” é o fato que ela não pode subsistir por si própria, precisa “transcender” até o objeto, cria um subjetivismo próprio ao qual alguma correntes fundamentalista se associarão, Kant era descendente de protestantes puritanos.

Sua tarefa no nível epistemológico era tentar fazer uma síntese entre o racionalismo de Descartes e Leibniz e o empirismo de Hume, Locke e Berkeley, mas ele será especialmente útil ao liberalismo nascente, embora esta ligação seja complexa, pode-se simplifica-la ao gosto do simplismo: separar sujeito e objeto.

Sim não é só isto, mas Hegel finalizará a tarefa do idealismo liberal: construir uma ideia eterna de Estado, organizar a religião de modo conveniente ao “subjetivismo” retirando-a das coisas concretas e objetivas, e finalmente criar uma “Fenomenologia do Espírito”.

Os que desejam fazer desta compreensão uma tarefa reducionista e simplista, lerão a história como aqueles que desejaram escrevê-la o fizeram, separar o subjetivo: religioso, histórico, política e até religioso, da consciência histórica concreta: os fatos, as misérias e corrupções.

A apologia da ignorância, da ausência de um pensamento profundo, servem a quem ? A pós-verdade.

 

Consciência histórica ausente

07 fev

Há duas concepções que marcam as ideias sobre a história contemporânea:NoEspelho uma de fundamentação positivista que devemos a Karl Popper, que a empresta erroneamente a Karl Marx, mas também ele escreveu contra o “determinismo histórico” ainda que quisesse fazer de sua teoria um “socialismo científico”, a outra pior, que a coloca como visão positivista e cética, quanto a possíveis mudanças e transformações no interior da consciência histórica, como por exemplo, o fim da história.

Há quem chame tudo isto de “prática” em oposição também incorreta à teoria, pois nada mais teórico que uma má prática e nada mais prático e presente na vida que uma boa teoria.

A importância de repensar a consciência histórica, não instrumentalizada e em profundo diálogo com a humanidade, vem de Hans-Georg Gadamer, ainda que os defensores das correntes “científico-históricas” acima, digam que isto é apenas uma reflexão teórica da história, por isto a prática deles é tão ruim e de pouca fertilidade.

Existe o ser histórico ? nós nos concebemos com este ser? claro quem está disposto a alguma reflexão, a resposta de Gadamer é direta e simples: “Ser histórico quer dizer não se esgotar nunca no saber-se” (Gadamer, 2007, p. 307), assim pode-se ver quanta teoria e vida que não há reflexão histórica.

O que seria este ser no tempo? Tomando emprestada a reflexão de Heidegger da qual Gadamer é também um herdeiro, a resposta é muito simples também: “a tradição é essencialmente conservação e como tal sempre está atuante nas mudanças históricas” (Gadamer, 2007, p. 373), ou seja, somos impelidos a não mudar, ainda que pensemos e desejamos a mudança, hoje quanta coisa para mudar !

Podemos pensar e porque não muda, com tantas tentativas e hoje podemos dizer a quase dois séculos se pensamos na grande crise dos séculos XVII e XVIII, mercantilismo e revolução industrial, com graves consequências em guerras europeias e depois mundiais, mas na raiz desta crise está o pensamento (teoria?), sobre o que pensamos sobre democracia, vida social e concepções de economia.

O sucessivo pensamento autor referenciado de diversas correntes, crenças e teorias é o problema da ‘tradição”, assim descrito por Gadamer: “Na verdade, não é a história que nos pertence, mas somos nós que pertencemos à história” (Gadamer, 2007, p. 367), ou seja, somos frutos de nosso tempo, da maneira “teórica” do pensar e de seus instrumentos.

GADAMER, H-G. Verdade e Método: Traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Petrópolis: Vozes; Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2007.

 

Hermenêutica, ontologia e dialogia

02 fev

A palavra hermenêutica vem do grego hermènêus, hermèneutik ou hermènêia, numHermeneuticaDialogoPort sentido dado por Filón de Alexandria como “hermènêia é logos expresso em palavras, manifestação do pensamento pela palavra”, assim está associada ao deus Hermes.

Este deus na mitologia grega era um mediador, patrono da comunicação e do entendimento humano cuja função era tornar inteligível aos homens, a mensagem divina, sendo atribuída tanto a origem da linguagem oral como a da escrita.

A hermenêutica ontológica foi desenvolvida na idade média, estava fundada na ideia que haveriam formas normativas que permitiam a partir de técnicas interpretativas de textos, fazer interpretações únicas, mas desde o início se dividiu em hermenêutica teológica (sacra) e hermenêutica filosófica (profana), e mais recentemente surgiu uma hermenêutica jurídica.

Platão foi o primeiro a utilizá-la, com o objetivo claro de superar o relativismo dos sofistas, mas a compreensão desta como linguagem deve-se ao já citado Filón e Clemente de Alexandria, e mais tarde Agostinho (354-430) desenvolveu-a como “doctrina christiana”, que seja qual for a leitura, é reconhecidamente a mais eficaz do mundo antigo.

Platão (427 a.c) o primeiro a utilizá-la. Filón e Clemente de Alexandria vão entendê-la como a manifestação do pensamento pela linguagem. Agostinho (354-430), que desenvolveu na sua “Doctrina christiana” a teoria hermenêutica reconhecidamente mais eficaz do “mundo antigo”, irá utilizá-la como doutrina da interpretação, em especial, das passagens obscuras da Sagrada Escritura, o método pode ajudar também uma visão universal de usar a linguagem na interpretação de textos filosóficos e até mesmo científicos.  

Schleimacher irá emprestar esta leitura, a ideia que deve-se sobretudo em passagens obscuras da Bíblia buscar a “verdade viva” porque, segunda afirma, isto é uma busca de entendimento, ou conforme afirma: “compreender significa, de princípio, entender-se uns com os outros” e que a compreensão é, de princípio, entendimento.

Entendimento e dialogia são correlatos, porque implica que não apenas uma visão interpretativa é válida, mas pode-se pensar em vistas por ângulos ou aspectos distintos de tal forma que a verdade emerge diante de um discurso que não seja fechado, curiosamente aqui pode-se também de chama-lo de hermético e pode estar havendo o diálogo, no sentido que não se eleva o tom, mas não a dialógica no sentido da “fusão de horizontes”, conceito caro a Gadamer.

Entendendo compreensão como um fenômeno, e não como raciocínio lógico-dedutivo, só neste caso pode-se entender como diria Dilthey que “compreender é compreender uma expressão”, diferenciando as relações do mundo espiritual das relações causais no nexo da natureza, como por exemplo: planta-se uma semente que brotará e crescerá uma árvore.

Para Gadamer (1997),  há uma fundamentação própria das ciências do espírito, assim o que na  hermenêutica de Dilthey mais do que um instrumento, ela pode tornar-se válida como o médium universal da consciência histórica, para a qual não existe nenhum outro conhecimento da verdade do que compreender a expressão e, e isto depende do outro, não da instrumentalização do outro, neste sentido o diálogo pode, em alguns casos não promover a dialogia, compreensão mútua e aceitação mútua.

 

Nem sol e nem trevas

01 fev

O que vemos com Trump, o pensamento conservador britânico (BRExit) e francêsComandar (eleições este ano com chances até mesmo da extrema direita chegar ao poder), pode no plano econômico significar uma volta ao período das Riquezas das Nações (obra clássica de Adam Smith no ano de 1776), mas há outras análises possíveis e Sloterdijk é uma delas.

Li e tive que paralisar a leitura da Crítica da Razão Cínica pela contundência da obra, mas aos poucos retornei compreendendo que seu principal empreendimento era uma crítica a “falsa consciência esclarecida” da teoria habermasiana, e também vejo-o agora como o melhor dos pós-frankfurtianos, escola pós-marxista nascida nos EUA que influenciou os anos 60, também anos de chumbo não só no Brasil, mas nas manifestações contra as guerras no oriente e em boa parte da Europa, como as manifestações de Paris de 68.

No final dos anos 80 Peter Sloterdijk lançou Crítica da Razão Cínica, duas décadas depois de ir para a Índia estudar filosofia oriental, seguiu de forma atualizada os passos de Schopenhauer (1788-1640) e Niezstche (1844-1900) que fora também para lá, e com obras filosóficas igualmente “pós-iluministas” e críticos do racionalismo moderno.

Agora interesse dos seus leitores estão em seus livros sobre política e globalização em sua trilogia das já está publicado em português Esferas I: Bolhas, obra de 1998; e os próximos lançamentos serão Esferas II: Globos e Esferas III: Espumas de 2004.

Em Neither Sun nor Death (Nem sol nem a morte, mas sem tradução para o português), Sloterdijk responde ao seu compatriota escritor alemão Hans-Jürgen Heinrichs, comentando sobre questões como a mutação tecnológica, desenvolvimento de meios de comunicação, tecnologias de comunicação, questões bastantes presentes em seu percurso intelectual, como a relevante questão antropotécnica.

Neither Sun nor Death é uma boa introdução a teoria filosófica de Sloterdijk sobre a globalização, e uma boa crítica as correntes francesas representadas neo-iluminisas de Giles Deleuze, Paul Virilio e Gabriel Tarde, e também faz conexões com Heidegger e o místico indiano Osho Rajneesh.