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Posts Tagged ‘God’

A sociedade que vem

01 dez

Este é o título do último capítulo do livro de Chul Han “Vita contemplativa”, nele analise a crise religiosa e suas consequências para a cultura, o ser e a sociedade atual.

Inicia afirmando: “a atual crise da religião não se pode deixar reduzir simplesmente a que perdemos a fé em Deus ou que nos tornamos desconfiados de certos dogmas” (pg. 153), ela reside no fato que perdemos a capacidade contemplativa, uma crescente coação tanto da comunicação como da produção dificulta o “demorar contemplativo”, não há como “parar”.

Cita Malebranche (1638- 1715) que dizia que a atenção é como uma “prece natural da alma”, a nossa hiperatividade pode ser responsabilizada pela religiosa, “a crise da religião é uma crise da atenção” (pg. 154), e o pior que o autor não aponta, o fanatismo dominou a “atenção”.

Diz o autor “escutar é o verbo para religião”, mas também é para meditação, estudo, contemplação e reflexão, seja qual for o princípio do limiar de um pensamento ele requer uma parada, uma inatividade. 

No pensamento atual do romantismo, “a liberdade é desacoplada do si mesmo”, a ação dá lugar ao escutar: “somente a tendência a intuição, quando direcionada ao infinito, põe em mente a liberdade ilimitada” (pag. 159) diz o autor agora citando Schleiermacher.

Ainda citando Schleiermacher, escreve que as lágrimas interrompem o “feitiço que o sujeito coloca na natureza” (pag. 160), dissolvido em lágrimas, o sujeito se entrega à Terra.

Agora citando Agamben em “A comunidade que vem” afirma sobre o reino vindouro do Messias que Walter Benjamim teria contado a Ernest Block e está citando em Han:

“um rabino, um verdadeiro cabalista, disse uma vez: para instaurar o reino da paz, não é necessário destruir tudo e dar início a um mundo completamente novo; bastaria deslocar um pouquinho essa taça ou esse arbusto ou aquela pedra, e do mesmo modo todas as coisas. Mas esse pouquinho é tão difícil de realizar e a sua medida tão difícil de encontrar que, no que diz respeito ao mundo, os homens não o conseguem e é necessário que chegue o messias” (Aganbem apud Han, 2023, pg. 171).

É esta chegada, chamada parusia (uma nova vinda para os cristãos) que também se celebra no Natal (na segunda semana do advento).

HAN, Byung-Chul. Vita Contemplativa. Trad. Lucas Machado, Brazil, RJ: Petropolis, 2023.

 

A parábola das virgens prudentes

10 nov

A parábola é uma parábola, portanto não deve ser vista ao pé da letra, pode parecer referente a sexualidade, o fato que 5 virgens tem óleo para a noite toda e outras 5 não tem óleo suficiente, indica que devemos nos preparar bem quando o “noivo” chegar, no caso bíblico é o encontro com Deus, e o óleo significa o “hábito” que desenvolvemos na vida para chegar lá.

Discorremos vários aspectos da prudência, e diferenciamos uma “boa vida” (felicidade num sentido mais amplo) da felicidade passageira (eudaimonia) que não mantém as lâmpadas acesas, e aqui não só para a vida eterna, mas para o decorrer de nossas vidas.

De certa forma tem algo haver já que é prudente entender que deve haver prudência também neste ponto, relações tóxicas, machistas, sexistas, etc., porque também estas podem nos preparar para uma vida futura, mesmo que ainda terrena, equilibrada e sensata, lembra-se que tanto Aristóteles quanto Tomás de Aquino, veem também motivos racionais para o exercício da prudência.

Assim uma sociedade que age pelo impulso, pelo domínio das paixões sobre a razão, e uma longa e duradoura boa vida (no sentido grego) depende do exercício das virtudes, e evitar muitas situações de risco e irracionalidade depende do exercício de virtudes.

Para quem não conhece, a parábola das virgens prudentes é esta, onde o noivo é o encontro com a vida eterna (Mt 25,1-7):

“O Reino dos Céus é como a história das dez jovens que pegaram suas lâmpadas de óleo e saíram ao encontro do noivo. Cinco delas eram imprevidentes e as outras cinco eram previdentes. As imprevidentes pegaram as suas lâmpadas, mas não levaram óleo consigo. As previdentes, porém, levaram vasilhas com óleo junto com as lâmpadas.  O noivo estava demorando, e todas elas acabaram cochilando e dormindo. No meio da noite, ouviu-se um grito: ‘O noivo está chegando. Ide ao seu encontro!’  Então as dez jovens se levantaram e prepararam as lâmpadas”.

A prudência não limita nossa felicidade, mas nos prepara para a vida futura, já aqui no plano terreno.

 

Os vossos pais rejeitaram os profetas

20 out

Terminado o período dos Juízes, que foi um período realmente teocrático, o povo de Israel começa a pedir Reis (Samuel 8,6-8), os reis governaram de 928 a.C. até a destruição do primeiro templo de Jerusalém (586 a.C.), porém o povo já havia ido para o cativeiro da Babilônia em 722 a.C., mais de 100 anos depois foi destruído o reino de Judá.

Já no último período dos juízes, Samuel que foi também profeta, via o povo se desviando, e até mesmo seus filhos não seguiam mais as leis divinas, a própria divisão entre Israel e Judá (é preciso dizer que é aí que aparecem o nome de judeus), e foi o segundo rei de Israel, Davi que uniu os dois reinos e nomeia a capital Jerusalém, ali seu filho Salomão, fará o primeiro templo.

Foi o profeta Ezequiel que viveu no exílio babilônico, entre 593 a.C. a 571 a.C. que profetizou a destruição do templo e falava das infidelidades do povo hebreu, também o profeta Isaías havia pregando que o pecado chegara de tal modo a Israel e Judá, que a maldição atingiria o povo hebreu, a maior delas é claro, foi o exílio da Babilônia.

Quando Ciro se torna rei da Pérsia e toma Babilônia em 538 a.C. permite ao povo hebreu retornar à sua terra e a possibilidade de reconstruírem o seu templo, o segundo, porém os desvios do povo continuam a ocorrer até o último e maior dos profetas João Batista, aquele que Herodes pediu a cabeça em troca da dança de Salomé, que pede por sugestão da mãe.

Jesus era rejeitado por contestar os fariseus e mestres da lei de seu tempo, também haviam aquele que queriam uma posição de líder na guerra contra o império romano, após a morte e ressurreição de Jesus no ano 70 d.C., o segundo templo foi destruído pelo general romano Tito e dele restou somente o muro das lamentações (foto).

Jerusalém foi incendiada e o povo judeu disperso, os judeus que se estabeleceram no leste europeu foram chamados de Ashkenazi e os da Península Ibérica de Sefarditas.

A posição de Jesus sobre o império romano era clara, uma vez que os romanos também o temiam, Herodes especialmente, e Pilatos lavou as mãos em sua crucificação, quando os fariseus preparam uma cilada perguntando se era justo pagar impostos, Jesus pega uma moeda e ao ver a figura de Cesar sentencia: “Dai a Cesar o que é de Cesar e a Deus o que é de Deus” (Mt 22,34-40) esta cilada permanece no meio religioso até os dias de hoje.

 

Então o que é crer ?

25 ago

Já acreditamos em muitas coisas que não eram verdadeiras, o sol não é o centro  do nossa galáxia, no centro está um Buraco Negro, e tanto a matéria como a energia escura parecem desafiar as leis atuais chamada de Física Padrão, um cientista disse que Deus fez a divisão por 0 e tudo pode ter surgido milagrosamente do Nada.

Se examinamos de perto as crenças, em todas existe a regra de ouro: não faças ao outro o que não gostaria que fosse feito a você, em especial disse Jesus sobre o maior mandamento(Mt 22, 37-40): “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento!’ Esse é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante a esse: ‘Amarás ao teu próximo como a ti mesmo’. Toda a Lei e os profetas dependem desses dois mandamentos”.

Sem isto caímos no olho por olho dente por dente, disse o filósofo Byung Chul Han sobre um dos livros inaugurais de nossa era, o poema Ilíada (séc. VIII a.C.) (na imagem acima de Pablo Delgado), sua primeira palavra é “menin, a saber a cólera [Zorn]: “cantem, deusas, a cólera de Aquiles filho de Peleus” (pg. 22), assim a cultura humana, em especial a ocidental está fundada na violência e o filósofo aponta que ‘a desintegração da sociedade de hoje não deixa de existir a energia épica da cólera.” (pg. 23).

A oposição divina do pacifismo não é apenas uma inversão história, é neste momento de crise civilizatória a possibilidade real que o processo avance e a que a humanidade não se massacre.

É verdade que nem mesmo sobre o Deus Homo Jesus existe uma visão correta, não era um guerreiro, um fazedor de milagres e se os fazia pedia sempre discrição, jamais o fez por um ato exibicionista ou triunfalista, não estimulou nenhum tipo de cólera, ainda que a falsidade de muitos religiosos o irritasse, e sempre pergunta aos discípulos: “quem dizem que Eu sou”.

Em Mateus 16, 14 após indagar isto: eles responderam: “Alguns dizem que é João Batista; outros, que é Elias; outros ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas”.

E depois perguntam a eles, porque só os verdadeiros discípulos reconhecem o Homo Deus amor e misericórdia (Mt 16,16) e Pedro responde: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”.

Como no tempo de Jesus e em toda história sempre houveram falsos profetas e discípulos, porém Jesus alerta é só da boa árvore que brotam bons frutos, então a distinção é simples.

HAN, Byung-Chul. No enxame: Perspectivas do digital”, trad. Lucas Machado, Petrópolis: Vozes, 2018.

 

Deus e o tempo não existem

24 ago

Nem bem explicamos direitos a física quântica e a relatividade geral e a física parece estar em crise, filósofos e físicos parecem ter encontrado paradigmas e fenômenos estranhos em observações do universo e da física das partículas, qual a relação com Deus, mas há algo além do espaço-tempo e Deus é (existir é no espaço-tempo).

Não se trata da descoberta da partícula de Higgs ou partícula de Deus, comprovada sua existência, mas de uma especulação ontológica que agora se leva a sério, sempre afirmamos um princípio da dualidade, ou seja, A é falso ou Verdadeiro e não podendo ser os dois ao mesmo tempo e também se formos de A para B devemos passar por B intermediário, esta é a ontologia tradicional.

Assim desde os pré-socráticos até Kant o tempo era absoluto e esta física se comprovava, entretanto da descoberta física do terceiro incluído, este chamado “nível de realidade” traz o questionamento contemporâneo do questionamento do que é existência e Ser, uma nova abordagem científica, social e espiritual sob um método chamado de Transdisciplinaridade.

Não foram religiosos que o proclamaram, mas físico como Barsarab Nicolescu, educadores e filósofos como Edgar Morin e artistas como Lima de Freitas, um serigrafista e pintor português, que assinaram a Carta da Transdisciplinaridade de Arrábida.

Para teólogos e místicos que estão de acordo com este princípio, Deus existe uma vez que entrou na história através do “Deus Homo” Jesus, Deus é através do Ser divino eterno e Deus é comunicação através do Espírito Santo, a hipótese trinitária parece perfeita.

Se existiram manifestações divinas, Teofanias quase sempre sujeitas a contestação apesar de inúmeras contestações, tanto teoricamente quanto praticamente parece cada vez mais perto um momento de grande abertura da “clareira” de uma consciência geral.

Claro que há falsificadores, como sempre houveram na filosofia, nas ciências e nas religiões, onde a fantasia e o imaginário podem ter asas, porém há gente séria e que sabe que o fenômeno existe pelo menos na consciência de bilhões de crentes no mundo todo, em todas culturas e também cientistas, filósofos e psicólogos sérios tem suas crenças.

A realidade presente ao mesmo tempo que aumentaram falsificadores e falsos profetas, parece aproximar-se daquele momento em que o Homo Deus histórico Jesus afirmou (Jo 1,51): E Jesus continuou: “Em verdade, em verdade, eu vos digo: Vereis o céu aberto e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do Homem”, que era como Jesus curiosamente se referia a sua própria existência para dizer que se fez homem.

Os eventos em vários aspectos parecem convergir para isto e é grande esperança para uma humanidade confusa, uma civilização em crise e uma realidade dura.

 

A eclipse de Deus

23 ago

O livro de Martin Buber com este nome trata como podemos encontrar na filosofia e na história da religião, desde os filósofos pré-socráticos até pensadores do século XX uma interpretação das crenças ocidentais, com ênfase na relação entre religião e filosofia, com a ética e a psicologia junguiana, o que valeu uma réplica de Jung e uma tréplica de Buber.

Vivemos como diz Buber num tempo da eclipse de Deus, como ao ver a Lua passar na frente do Sol, parece que ele não existe mais, quando de fato está encoberto, isto é curioso, porque a polêmica com Jung é causada por uma pergunta em uma entrevista sobre a existência de Deus, Jung respondeu: “Eu não preciso acreditar, eu sei” (Jung, 1977, p. 428).

Isto causou furor na época e até hoje livros como Deus: um Delírio (o titulo em inglês é The God delusion) encontramos uma citação na página 51, num livro que mostra as desilusões de Dawkins mais que os delírios dos que creem, principalmente aquilo que na filosofia se refere ao Absoluto, cujo auge da elaboração ocidental é o conceito abstrato do absoluto de Hegel.

O absoluto de Hegel que é uma articulação entre o objetivo e subjetivo dualista do idealismo, é uma singularidade de uma potência substancial, própria da subjetividade e do conceito como havendo uma substância universal, que através da abstração se efetiva na consciência de si e torna-se igual a essência, uma espécie eu eu-mesmo essencial.

O comentário posterior de Jung, expresso principalmente em uma carta a uma amiga que foi publicada, ele explica: “o que quer que eu percebo de fora ou de dentro é uma representação ou imagem … causada, como eu com ou sem razão suponho, por um objeto “real” correspondente. Mas eu tenho que admitir que a minha imagem subjetiva só é grosso modo idêntica ao objeto … nossas imagens são, em regra, de alguma coisa … a imagem-Deus é a expressão de uma experiência subjacente de algo que não posso alcançar por meios intelectuais …” (Jung, 1959).

A resposta de Jung, sem que a articule de modo implicitamente filosófico é uma resposta ao subjetivismo idealista, ela não se alcança por meio da razão, é um objeto de fé, de crença e quem a tem a possui dentro e fora sendo ao mesmo tempo subjetiva e objetiva.

A passagem bíblica que melhor ilustra este sentimento é aquela (Jo 15, 45-46): “O Reino dos Céus também é como um comprador que procura perolas preciosas. Quando encontra uma perola de grande valor, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquela perola”.

Jung, C.G. The Face do Face entrevista in C.G. Jung Speaking: Interviews and Encounters, Princeton, Belligen paperbacks, 1977, p. 424-439.

Jung, C.G. (1959), Letter to Valentine Brooke in C.G. Jung Letters, Volume 2, 1951-1961, edited by Gerhard Adler, (London: Routledge and Kegan Paul), pp. 525-526, 1959.

 

A clareira, o desvelar e Ser

04 ago

A clareira é um pequeno espaço com luz que se abre no meio da floresta, Heidegger faz a definição no sentido filosófico assim: “O destino se apropria como a clareira do ser, que é, enquanto clareira. É a clareira que outorga a proximidade do ser. Nessa proximidade, na clareira do dar lugar, mora o homem como ex-sistente, sem que ele já possa hoje experimentar e assumir esse morar” (Heidegger, 1979), neste sentido o ser se apropria de um “morar” verdadeiro e eterno.

A clareira é então o lugar do desvelar do Ser, em sua temporalidade de ex-sistente ele experimenta, por sua condição finita, um morar agradável e sensível, quase eterno, no entanto temporário como ente.

Então a clareira parte da condição humana, e não é apenas a Teofania divina, entretanto a narrativa bíblica dá ao Jesus humano e temporal em um momento específico no monte Tabor, já postamos algo sobre o tema, mas no sentido da ascese da alma, aqui deseja-se completá-la num desvelar.  

Conforme postamos anteriormente, é possível tanto um revelar quanto um desvelar humano, no primeiro caso uma compreensão temporária que se re-vela (esclarece, mas permanecem dúvidas novas) e o desvelar, muitas vezes parcialmente incompreensível ao ser humano por sua finitude cognitiva ou uma ascese mística cujos detalhes são muitas vezes de difícil comunicação pela ausência de palavras ou metáforas apropriadas, como uma obra de arte.

Na narrativa bíblica é no Monte Tabor onde ocorre uma Teofania, não foi no batismo de Jesus e nem nos milagres que ela aconteceu, ao subir o monte Jesus leva três discípulos mais próximos: João, Pedro e Tiago e diante dos olhos deles se transfigura e aparece ao lado de Moisés e Elias, diz a narrativa (Mt 17. 2-3):

“E foi transfigurado diante deles; o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz. 3Nisto apareceram-lhes Moisés e Elias, conversando com Jesus”. 

Os apóstolos sentem a “clareira” e querem ficar ali e construir três tendas, depois uma nuvem os cobrem, como no tabernáculo de Moisés, ouvem uma locução divina e prostram o rosto por terra, Jesus os acalma e quando levantam os olhos veem apenas Jesus e descem a montanha.

Para os que não creem a narrativa bíblica é imaginária, mas ajuda a entender o desvelar.

 

HEIDEGGER, Martin. “O fim da filosofia e a tarefa do pensamento”. In: Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 79.

 

Teofania existiu, existe ?

03 ago

Quando temos uma clarificação ou um insight, podemos dizer que há uma re-velação, algo novo desponta, mas não temos ainda uma ideia finalista ou total sobre determinado mistério, então é velado de novo.

Não se pode confundir com sentimentalismo ou mesmo uma fortíssima emoção, ela pode ser re-veladora (no sentido de velar de novo) porém as consequências e o fim último daquela emoção vão depender de outras novas re-velações, pois são só afetos e emoções temporais.

Desvelar é algo bem mais profundo, significa tirar o véu, a própria ciência tem uma evolução ao longo da história, as chamadas “estruturas da revolução científica” do físico e filósofo da ciência Thomas Kuhn, noutra linha, Karl Popper desenvolveu a ideia do método científico da falseabilidade, que é sempre estar atento as limitações das teorias científicas.

Desvelar significa não se restringir aos aspectos materiais, empíricos e quantitativos da realidade, almeja entender racionalmente o ente real como um todo a partir de suas causas últimas, assim as causas e afetos temporais não estão em jogo, ou seja, não é re-velação.

É possível desvelar mistérios por caminhos científicos, as ideias quânticas desde Werner Heisenberg (A parte e o todo. 2008), passando por Einstein (Teoria da Relatividade) e Neils Bohr que escreveu sobre a teoria de correspondência (átomos e radiação): “parece ser possível lançar uma luz nas imensas dificuldades, pela tentativa de traçar uma analogia entre a teoria quântica e a teoria ordinária da radiação, da maneira mais próxima possível”, depois o modelo avançou.

No desvelar da narrativa bíblica ocorre uma Teofania, uma manifestação divina onde nenhuma explicação humana é razoável e há nelas alguma verdade “eterna” que a confirma.

No caminho bíblico-histórico que percorremos do êxodo, há uma passagem da Teofania (Ex 40:34-35):  “Então a nuvem cobriu a Tenda da Reunião e a glória do Senhor encheu o santuário. Moisés não podia entrar na Tenda da Reunião, porque a nuvem permanecia sobre ela, e a glória do Senhor tomava todo o santuário”.

Isto ocorre também hoje, há manifestações e Teofanias? Sim e até mesmo instituições religiosas duvidam, e elas não tem a ver com as falsas profecias com interesses particulares.

Li um livro na juventude de um iogue e guru indiano Paramahansa Yogananda, em que ele descrevia uma pessoa que conheceu na Alemanha que comia apenas uma “hóstia” consagrada e não tinha uma aparência débil ou doentia, também um herói da unificação da Suíça, Nicolau de Flüe (1417- 1487) viveu o final de vida assim, com permissão da família e da esposa.

O fotografo judeu Judah Ruah do noticiário “O século”, de uma família tradicional judaico-portuguesa, publicou uma foto para o jornal Illustração Portugueza, em 29-09-1917, fotos do chamado milagre de Fatima prometido aos 3 pastorinhos videntes, ocorrido em 13 de outubro de 1917 e que foi anunciado anteriormente por eles como prova de que os sinais místicos que recebiam eram verdadeiros, foram para lá quase 100 mil pessoas (foto), as pessoas todas viram o Sol dançar no céu.

Claro que depois houveram várias explicações científicas para o fenômeno, porém é interessante os 3 pastorinhos anteciparem o dia exato em que o fenômeno ocorreu e por isto a multidão presente, numa aldeia que ainda hoje é pequena e distante de grandes centros.

No caso da Teofania portuguesa é importante notar que antecede a 1ª. Guerra mundial e pede orações pelo futuro da humanidade, com o perigo de guerra poderia acontecer hoje também?

BOHR, Neils. O Postulado Quântico e o Recente Desenvolvimento da Teoria Atômica. Trad. Osvaldo Pessoa Jr. In: Fundamentos de Física I – Simpósio David Bohm. Org. O. Pessoa Jr. São Paulo: Livraria da Física, 2000. p. 135-159, 1928.

HEISENBERG, Werner. A Parte e o Todo: Encontros e Conversas sobre Física, Filosofia, Religião e Política. 4. reimpr. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008.

 

A lógica da narrativa bíblica

02 ago

A narrativa histórica quase sempre mostra a mudança de mentalidade e da lógica da guerra, do poder e da conquista de bens e imposição de uma cultura sobre a outra, a narrativa mística, na maioria das vezes procura avançar a mentalidade do processo civilizatório tanto pela ação humana como pela intervenção divina.

Sempre que um povo promove a opressão humana, material e espiritual tende a decadência e a ruptura civilizatória, assim aconteceu com a cultura semítica, a cultura egípcia nos primórdios da civilização humana.

A narrativa mística e espiritual dos povos analisa estes ciclos de outro ponto de vista, há uma promessa divina não apenas no plano divino, mas também humana, assim para Abraão era a terra prometida e o nascimento de seu filho, onde acontece uma teofania, uma manifestação (ou aparição) divina e finalmente uma aliança.

A promessa a Abraão era não apenas o nascimento de seu filho, mas após nascer Isaac a teofania acontece com a promessa de ele herdar tantos filhos quanto as estrelas do céu e a aliança se cumpre pois Abraão é considerado de pai da fé para três grandes religiões monoteístas: cristãos, judeus e cristãos de hoje.

De Isaac nascem as doze tribos de Israel através de seu filho Isaac, porém por inveja os irmãos vendem José ao Egito, que tinha dons e em sonhos lhe é revelada a promessa que ele seria líder das tribos, mas de inveja os irmãos o vendem ao Egito e a promessa divina se cumpre com o período de escassez em que os irmãos vão ao Egito comprar alimentos.

Não há uma Teofania explícita devido a maldade que fizeram com José, mas Jacó depois de lugar com o anjo consegue o perdão divino e depois o perdão do irmão Esaú.

O Êxodo os hebreus recebem a promessa do retorno a sua terra Canaã, porém a Teofania não se realiza nem na sarça ardente quando ocorre a promessa, nem na Tábua da Lei (os dez mandamentos) e sim quando Moisés realiza uma sala de reunião para o contato divino.

Na narrativa de Êxodo podemos ler que Moisés havia armado uma tenda ao longe (Ex. 33:7) “ fora do acampamento, e deu-lhe o nome de Tenda da Reunião. Assim, todo aquele que quisesse consultar o Senhor, saía pra a Tenda da Reunião, que estava fora do acampamento” e será após esta Teofania e ter recebido as Tábuas da Lei, que será constituída a “arca da Aliança” onde serão colocados o cajado de Arão, um vaso com o Maná que alimentou o povo no deserto e as tábuas da Lei.

Há sempre nas narrativas uma teofania ou uma teogonia (Hesíodo, por exemplo), como no caso da filosofia grega, que é um deus antropomorfo e diverso, entretanto, a teogonia pela sua característica é só a manifestação de crenças e desejos humanos.

 

O final Êxodo semítico-judaico e a vida plena

28 jul

Durante todo o caminho a compreensão semítico-judaico está ligada a posse de uma determinada terra, e até mesmo as lutas imperiais de nosso tempo não refletem outra coisa a tentativa de colonizar povos e escravizá-los,  ou seja, evoluímos na tecnologia usada para a guerra, mas não nas intenções de perpetuar o poder e adquirir bens dos povos e nações.

No final do êxodo judaico-semítico, Moisés envia Josué e Calebe e mais 10 homens escolhidos, um de cada tribo, para espiar a terra de Canaã para saber as condições da região, mas ele próprio não chegará lá e morre antes.

Estes espias que vão até lá constatam uma terra boa e bela, contudo havia “gigantes” nela e o povo era poderoso, apesar de todos 40 anos no deserto, muitos hebreus se perguntavam se não era melhor ter voltado e pensavam que Deus os havia abandonado.

Contudo, o relatório contrário de Josué e Calebe a terra era muito boa e se o Senhor havia prometido a posse de Israel tinha que prosseguir até tomar a posse e apesar de muitas lutas chegaram lá, depois vieram os juízes segundo a narrativa bíblica, mas o povo pediu reis “como os outros povos” e então veio Saul.

A compreensão deste tempo, além da interpretação da inevitável influência dos egípcios e do espírito messiânico do povo hebreu, deve levar em conta que agricultores e pastores precisam de terras, e ainda que a mensagem divina fosse clara, as teofanias instituíam alianças e isto também significava um comportamento de justiça e fraternidade, ainda era compreendido como sendo eles “um povo eleito” isto não valeria a outros povos.

Mesmo um milênio depois, conforme dissemos este período do início da decadência egípcia é em torno do ano 931 a.C., o tempo que nasce Jesus isto precisa ser corrigido e a dificuldade didática de ensinar ao povo os verdadeiros ensinamentos, e Jesus traz apenas um “novo” mandamento (não significa que os 10 da aliança estevam errados) “que vos ameis uns aos outros” (João 13,24) e eu quero misericórdia e não sacrifício (Mateus 9,13).

Ainda assim os discípulos demoram a entender, não compreender o sacrifício de Jesus na cruz, e a recusa deste sacrifício implicou em toda história maiores ainda: guerras, exilio, pestes e fome, porém o espírito de domínio e colonização de povos permanece.

Ao explicar a seus contemporâneos em parábolas Jesus diz como é o reino divino é como alguém que encontra um tesouro (Mt 13,46): “ quando encontra uma pérola de grande valor, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquela pérola” e isto deveria significar um bem maior não apenas em valor humano, mas em valores eternos e definitivos.

O pairo de Ipuwer encontrado no Egito no início de sua decadência fala que as moças “ficavam se olhando horas no espelho” e que as mulheres que antes guardavam coisas em caixotes “agora desejavam móveis trabalhados” para guardar suas coisas.

O que são nossos “tesouros” e o que buscamos como valores eternos?