Arquivo para janeiro, 2012
Redes, práticas associativas e um exemplo
Após contato com Breno Augusto Fontes, recebi o livro recém-lançado “Redes, Práticas Associativas e Poder local”, onde ele conceitua apoiado em outros autores que as associações voluntárias são “resultado de uma redes articulada de autores sociais, como afirma Melucci (1996:116) produzem solidariedade” … e depois desenvolve explicando que elas produzem “estruturações de sociabilidade particulares” e muito ricas.
Alberto Melucci discute em seu livro “Challenge codes: collective actions in the information age” (Cambridge University Press, 1996) como as ações coletivas podem estar em mudança na chamada “idade da informação”, afirmou no seu livro” A Invenção do presente: movimentos sociais nas sociedades complexas” a importância das diferenças para que a sociedade seja: “capaz de captar o impulso dos movimentos,através dos sistemas políticos de representação e tomada de decisão, pode fazer com que a complexidade e a diferença não sejam violentadas”. Os processos políticos que querem limitar a ação de redes, limitam também o impulso de movimentos sociais justos.
O livro faz um estudo de caso na comunidade Chão de Estrelas de Recife (com comunidades humildes como a foto ao lado) onde se encontram um número expressivo de organizações comunitárias: “horta comunitária, posto de saúde, grupo de dança, de cultura popular, ecológicos, etc.” e segundo o autor estas organizações “são relativamente bem conhecida de seus moradores”.
A análise da organização em rede desta comunidade, que é o capítulo 1 do livro, é concluída como tendo suas “redes, egocentradas e práticas associativas da comunidade” o que permitiu o trabalho “realizar uma abordagem bastante original dos processos de participação em associações voluntárias” conforme diz com autor com evidentes “lacunas a preencher”.
O exemplo prático é importante porque credencia o livro a discutir o tema proposto além das redes (que nos interessam particularmente), as práticas associativas e os poderes locais.
Redes Sociais e comunidades
Além da forte influência que as redes sociais organizadas na Web têm na literatura atual, uma rede pode formar-se, e existem muitas redes na historia da humanidade, independente do meio eletrônico que pode potencializá-la, desenvolvê-la e até mesmo subverte-la.
A rede pode ser vista como o conjunto de relações que uma organização ou comunidade tem que viabiliza uma determinada atividade associativa, e cada atividade pode ser vista como uma sub-rede que é estabelecida para aquela prática específica.
Assim redes sociais podem ser designadas, não exclusivamente, por diversos movimentos mesmo que institucionalizados que permitam os atores sociais viverem as suas diferenças culturais, religiosas e sociais sem que isto seja um empecilho para alguma ação comunitária, uma vez que os indivíduos e grupos de uma rede podem ter interesses e papéis dos atores variados, e estarem sujeitos tanto a limitações como opções em função dos limites que pesam sobre determinadas ações, por exemplo, limites que envolvam violência, crenças (crenças não envolvem apenas religiões, podem ser superstições, convicções partidárias e ideológicas exageradas ou até mesmo rejeição a determinada forma de ação antiecológica, por exemplo) . Os nós destas redes sociais podem ser indivíduos, grupos ou organizações, mas que tenham alguma dinâmica esteja voltada para a construção de ações, a sua consolidação em mudanças ou apenas o desenvolvimento das atividades dos seus membros.
Entre as iniciativas que motivam a formação de uma rede, muitas vezes estão intuições informais sobre determinado problema ou atividade, mas podem ser também a partir da tomada de consciência de uma comunidade sobre seus interesses ou apenas o compartilhamento de valores entre seus participantes.
A partir de um autor que mantive contato e estou lendo, vamos postar alguns tópicos relativos a estes temas que envolvem de forma mais ampla o assunto: “redes socais”.
Na tecnologia: blecaute anti-SOPA
Contra o Projeto de Lei americano intitulado Sopa (Stop Online Piracity Act) diverso sites importantes como a Wikipédia e o Reddit resolveram marcar um dia de luta contra o texto que censura a internet nos Estados Unidos, o dia marcado para um blecaute é dia 18 de janeiro.
Reddit encabeça este movimento e postou em seu blog que irá tirar do ar suas operações de compartilhamento em protesto ao Sopa e ao Pipa (Protect Ip Act), versão do Senado americano para o Sopa e que tem como objetivo fornecer ferramentas para obstruir a proliferação de sites dedicados a conteúdos considerados falsificados, mas de modo arbitrário.
No blecaute que irá durar 12 horas, o Reedit irá mostrar um video que ao vivo qu e exibirá uma declaração sobre sua posição contrária aos projetos de lei, e em matéria do Huffington Post citando uma pessoa do Reedit foi escrito que: "A liberdade, a inovação e as oportunidades econômicas que a internet permite estão em perigo", e acrescentou: "O Congresso está considerando uma legislação que irá mudar radicalmente a sua experiência na internet e colocar um fim ao Reddit e em muitos outros sites que você usa todos os dias."
Entre muitos sites e outros grupos, o Anonymous anunciou em seu perfil no Twitter que iria silenciar durante o apagão, também aderimos ao protesto, a Web é um espaço no qual um cidadao comum com poucos recursos pode manifestar-se e divulgar seus ideais e opiniões livremente, tolher é tolher o cidadão comum.
Conceitos, corporeidade e necessidade
Os conceitos partem dos fatos, por mais que abstraídos sempre encontramos resquícios dos fatos, reais ou psíquicos. Quando o ponto de partida é um fato real conserva corporeidade, explica Mario Ferreira dos Santos, mas da um exemplo surpreendente e interessante, amor.
Muitos conceitos ultrapassam o tempo e o espaço, explica o filósofo, e não tendo apoio destes podem apenas ser intuídos. Será assim a intuição que nos mostra que na realidade há fluidez, variação, mensurabilidade, finitude, condicionalidade.
Aqui penetramos no cerne da filosofia de Mario Ferreira dos Santos, pois ele mostra como a razão terá, “em regra geral“, formada por conceitos condicionantes, negativos, e terá dificuldade com absoluto, que define o incondicionado, átomo que significa parte e a alfa que significa não fragmento, o que não tem partes.
Assim, explica o filósofo, nao se deve confundir com conceitos negativos, os conceitos que tem conteudo empirico, como por exemplo: não-eu.
E segue, “não se deve pensar que aqueles conceitos, por conterem negação, sejam vazios de positividade”.
Para ele “há ainda os conceitos necessarios, grande problema da Metafisica: sao as categorias”, e assim Aristóteles, Kant, construiram categorias fundamentais como: quantidade, qualidade, relação, Modalidade, etc.; a tradição chama-a de conceitos universais, mas estao vinculadas a substancia e causa, os escolásticos entendiam que as categorias eram entes fundados na razão, através de abstrações, mas com fundamento nas coisas (cum fundamento in re).
Conceito, abstração e ontologias
Mario Ferreira dos Santos nos explica que para “distinguir os conceitos é necessário uma nota, ou mais que os individualize”, mas esclarece como dissemos no post anterior que “não devemos confundir o conceito com a palavra que o expressa” e também não se deve “confundi-lo com o fato”, pois eles fazem uma abstração do fato.
Explica “no conceito, já despojamos alguns elementos do fato, fazemos uma abstração mental (de abs trahere , do latim, trazer para o lado)”. E complete com um importante raciocínio: “o fato tem existência no tempo e no espaço; o conceito só existe quando pensamos”.
Assim conclui “intuímos o fato; pensamos o conceito”.
Nesta simples introdução podemos observar quantos equívocos, imaginar que uma abstração significa abarcar todos os fatos que abrangem um conceito, na verdade separamos uma parte, o “penso logo existo” quando seria mais coerente “penso o conceito, logo existe o pensamento sobre um fato que intuímos” ou algo assim.
Depois o filósofo vai penetrar nas maneiras como o homem estruturou os conceitos, explicando que será pela nota de distinção, de diferenciação e chega a uma questão filosófica importante “a percepção das diferenças”, as diferenças, depois a memória, e aqui a informação torna-se importante, pois a pintura, a escrita e agora as mídias digitais são recursos auxiliares a memória que nos ajudam ampliando a capacidade de abstração (recorte da realidade das semelhanças e diferenças) conforme dissemos anteriormente.
Por este raciocínio é possível compreender as ontologias que surgiram a partir da “especificação de uma conceptualização”, ou seja realizar um processo formal que vá por mecanismos de abstração dos fatos até os conceitos.
Quanto a noção de semelhante e diferente, Ferrreira dos Santos cita Queyrat e B. Perez que ao estudarem o tema, concluíram que as crianças até os 3 anos, fazem associação das ideias por semelhança e afirma também que a ideia de semelhança é fundamental também para os animais, mas esclarece “o semelhante não é uma categoria do idêntico”.
Mario Ferreira dos Santos na obra “Noologia Geral” esclarece a polarização da intelectualidade em intuição e razão, que é tão cara na história da filosofia.
Nome, fato e conceito
Mario Ferreira dos Santos nos ajuda a entender melhor como estruturamos nossos pensamentos e penetrar de modo simples em realidades filosóficas.
Distingue dois termos importantes para a filosofia e que todo mundo usa fato e idea, ou: o eidético e o fático. Eidético vem de eidos, palavra grega que significa ideia e fato vem do latim “factum” que significa feito, coisa ou ação feita, acontecimento”, explica nosso filósofo brasileiro.
O eidético é imutável e intemporalmente válido, “refere-se à forma intrínseca”; enquanto fático refere-se ao mutável, contingente e, portanto não necessário.
Isto não bem compreendido pode levar a equívocos, o nominalismo foi o primeiro na história como os nomes são estáveis foi o nominalismo (nome x real), pois eles não são a própria realidade que é fático, mas mutável, e o segundo foi o idealismo (sujeito x objeto).
Ao examinarmos um fato, lhes atribuímos: unidade, estabilidade e o delimitamos, Mario Ferreira dos Santos, prefere “o separamos do contorno”.
Mas isolamento e delimitação são “em parte, artificiosos” explica o filósofo, e “a unificação, a estabilização e a distinção são operações mentais que usamos para conhecermos o mundo real”, mas porque procedemos assim ? pergunta o filósofo.
E reponde: procede assim para dar ordem ao que intuímos, e como ordena estes fatos ? “Qual é o instrumento que se usa para alcançar esse domínio?” O conceito, responde nosso filósofo.
A filosofia da crise, economia e nihilismo
No seu livro “As filosofias da afirmação e da negação” (de 1959) Mario Ferreira dos Santos desenvolve que a crise atual da humanidade (ele falava isto em 1959), em que ele constata que “as inteligência deficitárias de nossa época, que cooperam, conscientemente ou não, na tentativa de destruir o que havia de mais positivo no pensamento humano”.
Ele dá a receita da crise do homem moderno o nihilismo e que tem suas raízes em dois fatôres importantes: “nos erros filosóficos dos sofistas modernos e na crise econômica”, portanto nada mais atual.
Nihilismo é uma palavra complicada para dizer a filosofia do “nada”, quando tudo deve tornar-se objetivo e assim negar-se tudo relativo ao sujeito e suas realidades (subjetivo, o que pertence ao sujeito enquanto ser consciente).
Ao analisar a economia ele desvenda-a mostrando-a mais humana: “não é ela uma obra animal, mas humana”, e coloca-a em relação direta com a inteligência, onde o fato econômico “é um fato cultural e não meramente físico”, ou seja, ele revela uma escolha, e a escolha que pensavamos que o homem moderno deve fazer é entre o “colaborativo” e o competitivo, coerente com o pensamento de Mario Ferreira dos Santos, pois ele fala da “invasão do nihilismo” e poderíamos falar hoje da invasão do egoísmo, do individualismo e do consumismo todos eles fundamentados no isolamento do “eu”.
A crise atual portanto é uma ruptura entre o sujeito e sua “subjetividade” que lhe é própria, e isto entre outros fatores levou ao nihilismo; entre sujeito e a economia, levou a supervalorização da economia em detrimento da pessoa, devemos salvar a “economia” das instituições ou as pessoas submetidas ao poder das “instituições economicas”?
Desembrulhar a filosofia, informação e técnica
Mas o que é a filosofia ?
O filósofo brasileiro Mario Ferreira dos Santos faz a pergunta: respondeu o homem porque interrogou, ou interrogou porque respondeu? Ele não viveu para conhecer aquela marca de biscoitos, portanto foi a marca de biscoitos que imitou ele.
Mas segundo nosso filósofo-guia: “ a pergunta não é descabida”, então supõe um homem primitivo diante da erupção de um vulcão: “ele se espanta, assusta-se. Aquele fato novo, insólito, espicaça-o, incita-se … todas as emoções que sente são um interrogar. Que é Isto?”
Assim, dentro de suas possibilidades contextuais, um mundo ainda provavelmente sem escrita, sem métodos, mas ainda assim tentará buscar explicações.
Mario Ferreira dos Santos escreve que ex-plicare, a origem latina de explicar, quer dizer desembrulhar, já que plicare significar fazer pregas ou criar rugas.
Assim é necessário para a filosofia saber “em que consiste”, e não podemos separar o homem primitivo de seu universo, o que chamaremos de “universo-do-discurso”, isto impõe uma determinada formação da explicação, assim um “in-formare” e segundo os dicionários de latim “a ação de formar matéria, tal como pedra, madeira, couro etc.” de onde esta está intimamente ligada à matéria.
A idéia de “formar a matéria” liga diretamente informação a técnica, as quais dificilmente pode ser vistas isoladas.
A filosofia é então “um conjunto de idéias que formamos, que nós construímos através dos tempos” segundo o nosso filósofo, mas necessitamos saber previamente o que seja esse nós de quem falamos acima.
Eis o primeiro problema importante para ligar filosofia, cibercultura e filosofia, “quem é nós e que idéia formamos de nos ? Quem pensamos que somos nós?” também é o primeiro problema filosófico proposto por Mario Ferreira dos Santos no seu livro: “Filosofia e Cosmovisão”, na 6ª. Edição de 1961.
A construção de um “nous” realmente coletivo é um problema fundamental para a filosofia hoje.
A filosofia, a cosmovisão e a “visão de mundo”
Poucas pessoas têm uma visão articulada e consciente de ideais e visões que usam no dia a dia quando usam expressões do tipo, “no seu lugar eu faria assim” ou “isto não é permitido na minha religião”, ou mesmo uma visão aparentemente livre e aberta “faço o que desejo porque sou livre”, em todas elas estão embutidas uma visão de mundo ou uma cosmovisão como diria o filósofo Mario Ferreira dos Santos.
Ou seja, todos têm uma cosmovisão, fruto da cultura e das ideais de nosso tempo, das influencias midiáticas e culturais que fortemente nos influenciam, de nossas opções religiosas e políticas e por fim das decisões pessoais que cada um toma.
Porém num plano mais amplo as pessoas sofrem forte influencia dos ciclos culturais que vivem, as possibilidades de acesso a informação e aos processos de “mundialização” da cultura, segundo Edgar Morin, como uma necessária “desmundialização”.
Assim se até bem pouco temo as culturais locais sobreviviam, o rádio, o cinema, depois a TV e agora a internet e a Web modificaram a “visão de mundo” ao mesmo tempo em que colocou em contato culturas muito diferentes e até certo ponto antagônicas, a urgência do diálogo, da tolerância e de uma “visão de mundo” que inclua o “outro” diferente é fundamental.
A filosofia, enquanto uma “visão articulada e consciência” desta realidade pode ajudar o passo antropológico para esta nova “visão de mundo”.
Foi Heidegger que aprofundou e desvendou esta “visão de mundo” a qual todos estamos vinculados e vinculam nossas ideias, convicções e atitudes.
A complexidade e universalidade deste conceito, é sintetizada a partir da palavra alemã Weltanschauung que deriva de welt (mundo) e Anschauung – visão, intuição. Geralmente traduzida por visão de mundo, ou visão da vida, e pode ser interpretada como a nossa posição no mundo e o modus do nosso agir, pois isto pensar e se informar é tão importante, pode mudar nossa “visão de mundo”.
Um físico e quatro filósofos
A física quântica e relativística moderna lançou luz sobre vários problemas filosóficos, éticos e políticos. O contribuiu para que os fundamentos dessa discussão sejam compreendidos pelo maior número possível de pessoas, conforme disse Heisenberg no prefácio do seu livro A parte e o todo (editora Contraponto, 2000), mas que tem um subtítulo mais sugestivo: “Encontros e conversas sobre física, filosofia, religião e política” feita com uma escrita bem original usando as recordações dos diálogos com Einstein, Planck, Bohr, Dirac, Fermi, Pauli, Sommerfeld, Rutherfod e outros colegas. Dois princípios são importantes a partir de Heisenberg: o da incerteza e o fim da neutralidade científica. Mas a ideia de totalidade ainda permaneceu.
O filósofo Emmanuel Lévinas, junto com Paul Ricoeur trabalharam a questão do “outro”, de prismas diferentes, mas convergentes.
Para Lévinas, em seu livro Totalidade e Infinito (Ed. 70, 2008) faz a crítica da idéia de “totalidade”, ao seu ver culto da filosofia ocidental junto com “mesmo” e o “neutro”, onde a ideia de um pensamento globalizante, e que procura demonstrar que a totalidade não preenche a verdade medida do ser, onde há um excedente exterior ao todo, e que o próprio saber remete a situações relativas ao ser expressão em si a transcendencia, ou o infinito produzidos no rosto de “outrem”.
Mas é Heidegger que retoma a ontologia de modo definitivo, para ele a história da Metafísica considerou a diferença entre os entes, e sofre forte influência da metodologia fenomenologica, cheando Husserl a dizer “a fenomenologia somos eu e Heidegger”.
Estas são algumas influências importantes nas postagens seguintes.