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Arte, autonomia e ver

22 nov

O que permanece velado na arte recente e que está presente no discurso de Hegel e mais ainda naCamponesasJacob aparente ruptura com a saída do “plano” para as formas tridimensionais do “polido” é ainda uma arte idealista daquilo que Hegel chamou de “autonomia” e que devido ao este idealismo, Rancière chamou de “autonomização”.

Esclarece Rancière que é a autonomização: “um desses elementos, a ´ruptura dos fios de representação´que os atavam à reprodução de um modo de vida repetitivo. É a substituição desses objetos pela luz de sua aparição. A partir daí, o que acontece é uma epifania do visível, uma autonomia da presença pictural.” (RANCIÈRE, 2003, p. 87)

É em última instância esta autonomização a famosa “arte pela arte” ou no sentido oposto a “utilitarismo da arte”, mas ambas não podem negar nem o aspecto específico da arte e sua ligação com as palavras nem a sua utilidade “tão útil quanto o útil” diria o escritor Vitor Hugo, mas trata-se de aceitar a emancipação do espectador pela “interação”.

Ver em arte escreve Rancière: “quer se trate de uma Descida da cruz ou um Quadrado branco sobre fundo branco, significa ver duas coisas de uma só vez” (Rancière, 2003, p. 87), que é uma relação entre: “a exposição das formas e superfície de inscrição das palavras.” (idem), onde as presenças são “dois regimes do trançado de palavras e formas.” (ibidem)

Para entender o problema da visão Rancière lança mão do quadro de Gauguin Camponesas no campo, há um “primeiro quadro: camponesas num quadro olham os lutadores ao longe” (Ranciére, 2003, p. 95), a presença e a maneira como estão vestidas mostram que é outra coisa então surge um segundo quadro: “devem estar numa igreja” (idem), para dar sentido o lugar deveria ser menos grotesco e a pintura realista e regionalista não é encontrada, então há um terceiro quadro: “O espetáculo que ele representa não tem um lugar real.  É puramente ideal. As camponesas não veem uma cena realista de pregação e luta. Elas veem – e nós vemos – a Voz do pregador, isto é, a palavra do Verbo que passa por essa voz.  Essa voz fala de combate lendário de Jacó com o Anjo, da materialidade terrestre com a idealidade celestial.” (Ibidem)

Assim desse modo afirma Rancière, a descrição é uma substituição, a palavra pela imagem, e as substitui “por outra ´palavra viva´, a palavra das escrituras.” (RANCIÈRE, 2003,P. 96)

Faz ainda uma ligação com os quadros de Kandinsky, escrevendo: “No espaço da visibilidade que seu texto constrói o quadro de Gauguin já é um quadro como os que Kandinsky pintará e que justificará: uma superfície em que linhas e cores se tornam sinais mais expressivos obedecendo a coerção única da ´necessidade interior´ ” (Rancière, 2003, p. 97), e já explicamos anteriormente não se trata nem de subjetivismo puro pois faz uma ligação com tanto com o pensamento interior quanto ao pensamento sobre a descrição no quadro.

O importante é a simbiose entre a imagem, as palavras e a visão decorrente de um “desvelar” da imagem que pode ser traduzida em palavras.

 

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