Sobre a verdade, mas qual é o método ?
A verdade positiva, estabelecida pela ciência e pelo iluminismo tiveram dois alicerces: a ideia (idealismo) ligada a experiência (empirismo), cuja tentativa inglória foi criar uma enciclopédia universal do conhecimento, o “sapere audi” (ousar saber) de Kant, com grandes feitos da modernidade foram insuficientes para abolir a guerra, criou uma crise de valores, uma concentração de riquezas e uma visão de mundo com sinais de fragilidade.
O que a transdisciplinaridade e os educadores sóbrios estão exigindo, uma volta as ciências que deem sentido a vida, ao humanísticos perenes, a Carta sobre o Humanismo de Heidegger, em que bradava: “mas nisto não se deve esquecer que “sujeito e objeto” são expressões inadequadas da Metafísica que se apoderou, muito cedo, da interpretação da linguagem, na forma da “Lógica” e “Gramática” ocidentais.” (Heidegger, 2005, p. 8).
O que chamamos de interpretação, afirma Heidegger no parágrafo 32 de “Ser e Tempo” (é mencionado em “Verdade e Método”), é na verdade desenvolver “as possibilidades projetadas da compreensão”, significa um processo dialógico onde seja possível reaver os pré-conceitos e uma nova “fusão de horizontes”, neste sentido o hermético é contraposto ao hermenêutico.
O pré-conceito, visto como antecipação da experiência humana, atesta o nosso vínculo a tradição na qual estamos mergulhados, mas é preciso o que Gadamer chama de “consciência-da- história dos efeitos” (tradução possível de “Wirkungsgeschichtliches Bewusstsein”), conforme explicação em seu texto “determinada por um devir histórico real, de tal forma que ela não possui a liberdade de situar-se em face ao passado”, dai sua critica a Dilthey.
O nosso distanciamento da verdade, Gadamer começa pela estética, uma cultura das aparências- pela qual começa seu livro, recapitula nos idealistas as ideias de gosto e de vivência (“Erlebnis”), esta última posta sempre com mais enfase, ainda que de modos distintos em Dilthey e Husserl , se desenvolverá de modo a falsear as “ciências do espírito” (ver em sua obra “A Extensão da Questão da Verdade à Compreensão nas Ciências do Espírito”), num esforço analítico de concretizar a chamada consciência histórica, nisto fundamenta-se toda sua crítica à hermenêutica romântica de Schleiermacher, à “Aufklärung” (Ilustração) e ao historicismo de Droysen, Ranke, Dilthey e Hegel.
Sua crítica vai ao fundo da noção de estética de uma obra de arte, quando um pintor, com certa técnica ou estilo, vai a pintura com uma certa técnica, o que se lê no quadro não é a alma do pintor, mas uma técnica própria da época, claro salvo raras exceções, em geral, é isto.
Sua análise é também a partir da analítica hermenêutica, ao criticar Schleiermacher dá-lhe também razão ao dizer que na obra de um artista, de um poeta, um escritor seria fundação perceber a intenção autoral, assim o exegeta a conheceria mais de perto do que o seu próprio autor e não apenas sua letra ou pintura, conhecer o Evangelho de São João seria, antes de nada, conhecer São João, nisto Gadamer rejeita o postulado da escola romântica.
Mas aceitará a escola romântica no “Vamos aos fatos” da “Aufklärung”: “este lê o texto joanino como protestante, aquele como católico, um terceiro como historiador da Palestina. Se varrêssemos todas essas pressuposições, talvez nas linhas escritas pudesse assomar um sentido prístino”, ora o Aufklärung” desejava o encontro de uma interpretação não preconceituosa, que afastasse tanto a tradição da autoridade, como a autoridade da tradição (isto é idealismo!), nisto os românticos estavam certos.
Restam dois senões, a resposta de Sloterdijk a Heidegger (Regras para o Parque Humano) e a pergunta de Ricoeur (O conflito das interpretações): seria então Verdade ou Método (ou, e não e), isto é, verdadeiramente ontológica?
Heidegger, M. Carta sobre o humanismo 2 ed. rev. Tradução de Rubens Eduardo Frias. São Paulo: Centauro , 2005