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O mal estrutural e simbólico

17 jul

Estando claro que não se trata da luta do bem contra o mal, mas a ausência do bem ou a banalidade do mal, existe então uma noite no ocidente que não pode ser desvelada se ficamos na superficialidade ou na “frivolidade” como apontam alguns autores, o bem é frágil, mas não frívolo.

Para entender o problema do “mal simbólico” tratado por Paul Ricoeur, deve-se olhar suas bases na fenomenologia eidética de Husserl e na filosofia existencialista de Gabriel Marcel, sua busca é o que dá sentido à liberdade (a visão moderna do livre-arbítrio) e a relação de reciprocidade entre a experiência voluntária e involuntária humana, isto é essencial para entender o mal simbólico.

A aparição original da questão da consciência (de algo) vem da ligação que Franz Brentano faz ao retomar a subcategoria intencionalidade, que rompia a identificação cartesiana entre consciência e autoconsciência, onde intencionalidade revela-se primeiro voltada ao exterior e assim está projetada para fora com orientações objetivas que vão desde a percepção e imaginação até a vontade, a afetividade e a apreensão de valores (destaca-se a empatia).

O que é voluntário e involuntário depende desta “grande tese”, enquanto Husserl operava na consciência à análise da percepção e dos atos “representativos”, Ricoeur  alargou para as esferas do afeto e da vontade.

Assim o que é voluntário está na alternância entre o impulso vibrante da emoção e o ponto de vista do hábito, enquanto o involuntário “absoluto” (simbólico ou estrutural) fica sob aquilo que chamou de caráter (não no sentido moral, mas no de “característica”).

O ponto de apoio que tem na filosofia existencialista de Gabriel Marcel, sem abandona a “análise eidética” é a problemática de um sujeito capaz de distanciar de desejos e poderes, dono de suas ações (e assim voluntárias) e servo das necessidades do inconsciente, o caráter, zona não revelada na consciência real e na vida, embora pareça fica fora das competência do concreto, do histórico, ou do que chama de ocasião, é o reino empírico da vontade,  vista em três momentos.

A primeira é a decisão humana resultado de um projeto para o mundo (aquilo que Heidegger mudará para visão de mundo), a ação comporta tanto a dimensão de um projeto com os outros no mundo, como pessoal ou subjetiva, entretanto não as separada e chama-as de corpo, e o corpo é visto tanto como voluntário quanto involuntário, mas há um “consentimento”.

Assim Ricoeur mostra os exageros do idealismo, e torna o “hábito” de tal forma a habitá-lo e torná-lo habitável, e o que o autor aponta que o homem pode falhar (sua obra O homem falível, da década de 60), e a culpa constituída e à consciência dela são expressas nos símbolos da cultura.

Afirma importância da linguagem mítica para tratar esta simbólica, assim a parábola do joio e do trigo (Mt 13,24-29), que afirma que a semente “boa” do trigo floresce junto com o joio (que deverá depois ser descartado), há três situações: a semente que cresce, a que é sufocada pelo joio (simbolismo do mal) e a que cai entre as pedras e não tem raízes (o caráter de Ricoeur seria isto).

RICOEUR, Paul. A simbólica do mal (H. Barros & G. Marcelo, Trad.). Lisboa: Edições 70, 2013 (Original publicado em 1960).

 

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