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A pandemia e a doxa

18 ago

A mera opinião sobre temas tão complexos quanto o tratamento da pandemia expôs o mundo da mera opinião ou da “doxa” como os gregos chamavam aquilo que era oposto a episteme, ou o conhecimento organizado e sistematizado.

O número de soluções curiosas no combate ao vírus é enorme: usar limão até ozônio, os remédios que são efetivos para outras doenças como o uso da cloroquina para malária, usos de chás e águas quentes, determinadas frutas e legumes, a FioCruz que acompanha o desenvolvimento da vacina de Oxford fez uma pesquisa, que dá como 73% falsas as notícias sobre curas do coronavírus no Whatsapp, em sua grande maioria são receitas caseiras sem efeito nenhum sobre a doença.

Toda a vida no tempo de Platão (428/427 a.C. – 348/347 a.C.) acontecia em torno da polis, onde já haviam então o cidadão da polis, o político, porém ainda dominavam os sofistas, que buscavam apenas argumentos para favorecer o poder, sem se preocupar com a justiça e a verdade.

No livro República de Platão o termo episteme, que antes suportava a possibilidade de ter habilidade para algo, agora adquire o conteúdo de saber pleno de certeza, um saber evidente que é ligado a realidade do Eidos (a Ideia para os antigos), com isto episteme é conhecimento verdadeiro e totalmente oposto a doxa, reduzida a simples opinião.

É na relação entre epistemologia e ética, que é possível considerar a ação sob um ponto de vista da doxa, embora não signifique um fundamento deste tipo de saber ético em Platão, pois ele aparecerá com Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.), em especial no seu livro “Ética a Nicômaco”.

O problema da determinação destes conceitos ligando-os a questões éticas aparecem nos primeiros diálogos até a República, que se mantém depois no diálogos sobre as Leis, tornando possível abordar esta questão em diálogos posteriores.

Platão usa os conceitos de nous (República VI 511d4) e noesis (República VI 511e1), a doxa está no mundo da realidade sensível, enquanto a episteme está no conhecimento dianoético (dianoia, é a forma de pensar menos elevado que a noesis) que tem por objetos os noeta, mas são inferiores a dialética (República VII 533d).

Aristóteles vai negar a existência de eide (pensamento puro) em termos platônicos, assim sua episteme vai designar para ele o conhecimento das causas necessárias (está desenvolvido nos primeiros analíticos) e consiste de na demonstração (apodeixis) e na sensação (aisthesis) tornam-se necessárias para a episteme.

Para não complicar muito, os gregos foram, é na Metafísica (E 1, 1025b-1026a) que o termo episteme vai designar uma organização sistemática dos conhecimentos racionais, chegando assim a apontar para o conhecimento teorético, em sua oposição ao conhecimento prático e poiético (Ética a Nicômaco VI 3, 1139b14-36).

Seja qual for a forma de conhecimento sistemático, a ciência tem seus caminhos e negá-los é colocar toda a humanidade a prova, nem receitas caseiras, nem vacinas sem as condições de testes são aceitáveis, é preciso prudência já pagamos um preço demasiado pelas mortes na pandemia, que a cura seja para eliminar as possibilidades de reinfecção e efeitos colaterais, é a dose do veneno que faz o remédio, porém o inverso é verdadeiro também.

 

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