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Dons e talentos

12 nov

Dons são coisas que fazemos e parece que nascemos com ela, por isso foi traduzido no português como “dádiva”, enquanto talento podemos ter uma aptidão mas ela precisa ser desenvolvida e aprimorada para se tornar realmente um dom, assim recebemos de alguém, de uma estrutura ou cultura e precisamos despendê-lo.

Algumas culturas trazem dons naturais, assim diz-se que aquela cultura tem bons cozinheiros, aqueles são trabalhadores natos, porém uma cultura nociva ou pouco natural pode não desenvolver os talentos e até dependendo de estruturas autoritárias, sufocá-la, mas também de modo branco uma cultura pode deteriorá-los.

Dons artísticos, estéticos e até mesmo morais dependem de uma cultura que propicie seu desenvolvimento e os tornem talentos que possam ser “doados” a população de um modo geral, qualquer cultura que sufoque dons naturais está em retrocesso e pode até mesmo perder suas raízes originárias, assim muitos povos que foram colonizados, marginalizados ou inferiorizados sofrem este tipo de mutilação, porém há sempre uma maneira de resistir.

Também estruturas sociais, educacionais e religiosas podem sufocar dons naturais, e com isto os talentos que devem ser desenvolvidos não afloram, percebem o processo de crise que vive, mas não percebem a raiz e o ponto focal da crise, matam os talentos e sufocam os dons naturais que em geral resistirão, a obra de Picasso “Guernica” (foto) é ícone da resistência espanhola ao autoritarismo, só voltou a Espanha quando a democracia se estabeleceu.

É a principal característica de um sistema autoritário, sufocar os talentos e tentar controlar os dons, assim poucos artistas sobreviveram tanto no stalinismo soviético como no nazismo e regimes totalitários que serviram de apoio, como o franquismo espanhol e o fascismo italiano, mas também a modernidade perece deste mal.

A arte é sempre um momento de resistência, Byung Chul Han desenvolveu o conceito de Jardim Secreto, onde é possível cheirar, apalpar e as coisas, sem mediação das mídias,     uma forma de recuperar o que ele chama de “beleza original”, o termo é bom, mas deveria ser conjugado com o conceito de dons originários.

Também Da Vinci afirmou que a “lei suprema da arte é a representação do belo”, já para Kandinsky: “É belo o que procede de uma necessidade interior da alma”.

Segundo Aristóteles “o belo é o esplendor da ordem”, porém por causa da associação desta palavra ao positivismo, faria uma paráfrase dizendo que o belo pode contribuir para uma harmonia originária que nos leve ao bom e belo como pretendia Platão, um diálogo que leva a alma para além do mundo físico, então ali se encontra o dom, a parte da cultura originária de cada pessoa e de cada povo.

Conjugando dom e talento, temos um dom natural que ao desenvolver-se dentro de uma cultura propícia torna-se um talento e nos eleva enquanto Ser.

 

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