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Amor, dor e lógica divina

26 mar

Somente aqueles que são capazes de ultrapassar os limites da dor, do ódio e do desprezo podem se aproximar de um amor divino, é preciso ultrapassar a lógica dualista da luta do bem contra o mal, a deo-lógica é aquela que sempre vai de encontro ao bem, o que os gregos chamavam de agathosyne, que vem de Agathon bondade num sentido de espírito elevado, e que é busca.

Há um terceiro incluído que caminha conosco. 

A dor é muitas vezes aquilo que mais fere a alma, mas pode ser também a que a alarga, nestes momentos de evolução da crise pandêmica no país enfrentamos a mais séria necessidade de buscar uma força além das medidas sanitárias, débeis é verdade, mas a defesa da vida deve continuar naqueles que se solidarizam com os que estão sendo afetados pelo vírus.

Só entendendo este sentido mais profundo da dor seremos capaz de abraça-la, de ter esperança e de olhar para um futuro onde não mais teremos que correr atrás do tempo perdido, mas nos preparemos e nos antecipemos para evitar crises humanitárias ainda piores, que poderão advir.

Há sempre uma terceira possibilidade e assim como a dor é uma passagem de um estado para outro, também o que pode surgir depois de muito sofrimento é uma novidade ainda maior, um salto de qualidade naquilo que somos como homens e como natureza, e superar o estágio atual.

Edgar Morin escreveu em seu livro recente É preciso mudar de via: lições do coronavírus, neste sentido também: “A utopia do melhor dos mundos deve dar lugar à esperança de um mundo melhor. Como toda grande crise, como toda grande infelicidade coletiva, nossa crise planetária desperta esperança.”

Pode-se assim entender melhor, tanto no sentido teológico quanto filosófico, numa passagem central da paixão de Jesus quando na cruz ele grita (Marcos 1,34): “Pelas três da tarde, Jesus gritou com voz forte:— “Eloi, Eloi, lamá sabactâni?”, que quer dizer: “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?”, porque é nesta dor que o humano e o divino se fundem, emergindo uma nova realidade de morte e ressurreição, sim Deus morreu dizem os filósofos, porém há um terceiro incluído: depois ressuscitou, assim pode-se entender a passagem da morte para a vida.

Toda esta dor, esta “grande infelicidade coletiva” diz Morin desperta esperança, porque ela é de fato uma passagem, talvez a mais dolorosa que a humanidade passou, ainda que tivemos guerras odiosas, ainda que tenhamos conflitos de natureza social, étnico e religioso, há um sentimento de dor.

Só fará sentido toda esta dor se encontrarmos logo ali na frente uma outra forma de olhar para ela.

 

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