O ser, a clareira e o necessário
Somente através da linguagem possuimos uma habitação do ser, estando nela podemos ter acesso a clareira, e desdobrando-se neste ser-aí tomamos conta de nossas ex-sistência, e assim a clareira é o mundo e está no mundo, nesta verdade acreditou Heidegger e foi atrav+es dela que escreveu Cartas para o Humanismo, que recebeu a resposta de Sloterdijk que afirma que a clareira não seria o habitat e muito menos o que hoje chamamos de ambiente ou de “casa”, porque estamos em ruptura com a natureza, enquanto Heidegger considera o Ser humano pastor do ser, Sloterdijk afirma que sua tarefa +e saber guardar o Ser, ambos não eram religiosos, Heidegger o foi por um período, mas abandonou.
Muito antes da pandemia, Sloterdijk cria o termo co-imunidade, em alusão a tarefa de cuidar do ser “enfermo” aqui num sentido amplo que inclui o social, e tal tarefa emprega- se no ser, escolhendo-a livremente e impregnaodo-se dela ou não, assim independe da linguagem a qual é meio, enquanto o homem vive uma vida de exercícios, quase sempre vazios, ou com o termo que usava fazendo uma ascese (ascensão pelos exercícios) desespiritualizada, ou seja, sem cuidar-se como enfermo, mas aderindo a enfermidade.
Assim vivemos uma vida voltada a ação, à performance, a um conjunto de exercícios para auto-explorar-se, pena que Byung Chul Han foca excessivamente nas mídias sociais, elas também são meios enquanto linguagens, porém o consumismo, o ativismo e a busca de um ser ativo encontra apenas uma falsa ascese, mesmo que religiosa, pouco profunda porque não cuida do enfermo.
Para ambos, Heidegger e Sloterdijk, não se trata da alma, nem da elevação divina do homem, vê-se apenas o processo civilizatório, porém para os cristãos que entendem o quão profundo e importante é uma verdadeira ascese pessoal, trata-se da alma e da vida eterna.
A passagem bíblica que mais reflete isto, é aquela que nos recorda o que é essencial, diria até que só uma coisa é necessária, ouvir a voz do alto, da plena vida e da verdadeira luz da clareira, Lucas 10, 38-42, na qual Jesus visita a casa de Marta, “certa mulher” e Maria sua irmã, diz a leitura portanto não se tratam das mulheres conhecidas, como dizem alguns exegetas.
Marta está ocupada com os afazeres, certamente prepara algo para o mestre, e Marta se senta aos seus pés para ouvir o senhor, e Marta fica brava com a irmã que não a ajuda.
Mas o mestre a repreende e diz (Lc 10,41-42): “Marta, Marta! Tu te preocupas e andas agitada por muitas coisas. Porém, uma só coisa é necessária. Maria escolheu a melhor parte e esta não lhe será tirada”.
Só uma coisa é necessária, não se trata de alienação e sim da clareira da qual afastamo-nos.