A guerra fria vai esquentando
Parece um paradoxo, mas não é, pois fato é que a Europa e todo hemisférico norte caminha para o Outono e depois inverno e em pleno frio os limites da polarização ideológica parecem extrapolar, novas armas, narrativas de vitórias em campos de batalha, etc.
Nem a tragédia do Marrocos (foto), apesar das condolências, parecem despertar um sentimento maior de solidariedade entre os povos, a própria África subsaariana ao lado esquenta com golpes e novas ditaduras militares.
A ampliação do bloco econômico dos Brics também fortalece esta polarização, apesar da reunião do G20, um bloco mais diversificado, a possível criação de uma nova moeda e a nova geopolítica apontam para um conflito que já se instalou em golpes e regimes autoritários, não significa que esta diversificação de moedas e novas forças económicas e políticas não devam existir, mas elas deveriam favorecer o campo diplomático e ao estabelecimento da paz.
No front da batalha mais declarada, a Rússia anuncia uma imponente arma, não por acaso chamada de Satã II, capaz de transportar vários misseis ao mesmo sem se incomodar com nomes demoníacos, no front da guerra foi enviado um general chamado de Armageddon, Sergey Surovikin, que atuou na Síria e contra manifestações na Rússia, está agora no front.
Do lado da Ucrânia, cuja contraofensiva é mais lenta do que o esperado, novas armas com uranio enfraquecido foram recebidas dos EUA, enquanto treina pilotos dos novos caças de seus aliados, uma mudança de tática mais agressiva deve acontecer antes do inverno.
Há um front da paz enfraquecido, o presidente da Turquia tentou um novo acordo para liberar os grãos que saem da ucrânia pelo mar negro, mas aparentemente sem sucesso e um grande produtor de grãos da Ucrânia faleceu com sua família, quando um míssil atingiu sua casa em Odessa, Olesky Vadatursky.
Também crescem na Web propagandas de feitos na guerra, a paz parece distante e os espíritos e vozes do equilíbrio e do bom senso parecem sufocadas, sempre há esperança e pacíficos.
Urgente: terremoto no Marrocos
As noticias começaram a surgir na madrugada do Brasil, um terremoto de 6.8 na escala Richter atingiu o centro do Marrocos aproximadamente ao meio do caminho entre as cidades históricas de Agadir e Marrakech, a região chama-se Adassil, segundo o ministério do interior do país já se contou 820 mortos (o número subiu acima de 2 mil na madrugada de domingo), 672 pessoas feridas e 205 em estado grave, são as últimas informações.
As pessoas correram para as ruas e o terremoto foi sentido em Portugal, Espanha e na Argélia, um tremor secundário de magnitude 4,9 foi sentido 19 minutos depois.
Segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos, o epicentro foi nas montanhas conhecidas com Alto Atlas, a 71 km de Marrakech, a uma profundidade de 18,5 km, a cidade foi fortemente atingida e tem um centro histórico declarado como patrimônio mundial, ocorreu no meio da noite, mas os jornais on-line não informam a hora precisa.
Diversos governos declararam solidariedade e prometeram ajuda, a dor é dura, mas desperta solidariedade, até mesmo Zelesnky da Ucrânia e Putin da Rússia declaram pesar.
Toda solidariedade ao povo marroquino, a seleção sub-20 do Brasil está lá e não houve feridos.
Erro, correção e paz
A primeira coisa que morre numa guerra é a verdade, e isto é bilateral, porque o oprimido em revide vai fazer coisas que condena no agressor.
A correção coletiva é possível se houverem órgãos reguladores capazes de serem imparciais, quando também eles não conseguem sair do erro bilateral a paz fica cada vez mais distante, quando toma medidas de punição unilateral são também agentes de agressão, não significa que não devem impor sanções e até mesmo tribunais onde crimes de guerra são julgados.
Por isto tratamos nesta semana sobre a verdade filosófica, jurídica e moral, o maio e mais grave erro se comete quando tribunais e órgãos de moralidade pública se corrompem, é um prenuncio de um caos estabelecido e pode levar a uma escalada da guerra.
No âmbito da moral não se pode esquecer e deixar de expressar os erros pessoais, mas a punição deve passar por etapas ou rodadas de negociação e contornar os problemas mais grandes de uma contenda, é difícil, mas somente órgãos e pessoais imparciais podem obter este resultado.
Assim conforme discorremos no post anterior a verdade é ontológica, se realiza com a existência do Ser, mas ela também é Ser, e não se trata da argumento ontológico de Anselmo da Cantuária: “a verdade é a retidão do objeto percebida pela mente. E o que é a retidão? É algo ser o que é”, claro e este Ser que é sendo necessário “prova” a existência de Deus.
Anselmo na verdade era de Aosta, Itália, ficou chamado da Cantuária, porque sendo monge beneditino foi chamado a ser arcebispo da Cantuária, na Inglaterra onde falece, o que é pouco conhecido e deveria ser melhor entendido dentro da história da ciência é a influência de Boécio, famoso pela “querela dos universais” e uma verdadeira gênese dos conceitos da ciência.
Toda estas verdades temporárias são importantes, o argumento da falseabilidade da ciência de Karl Popper, assim como a estrutura das revoluções científicas de Thomas Kuhn apenas ajudam a tender que há verdades ex-sistentes e aquelas que são eternas, que Boécio vai propor como “universais”, porém não se trata de uma relação entre sujeito e objeto, mas é puro Ser, o próprio universo se não houve Big Bang, as descobertas do James Webb parecem ir nesta direção, não invalidade o Ser que é, aquele que sempre foi e sempre será, mas ajuda-a.
O profeta Miquéias que anunciou a vinda daquele que é, e disse que nasceria na pequenina Belém, afirmou assim (Mq 5,1): “Tu, Belém de Éfrata, pequenina entre os mil povoados de Judá, de ti há de sair aquele que dominará em Israel; sua origem vem de tempos remotos, desde os dias da eternidade”, Miquéias viveu aproximadamente entre 750 a 690 a.C.
Sobre a correção pessoal, a proposta bíblica vale para todos (Mt 18,15-16): “Se o teu irmão pecar contra ti, vai corrigi-lo, mas em particular, a sós contigo! Se ele te ouvir, tu ganhaste o teu irmão. Se ele não te ouvir, toma contigo mais uma ou duas pessoas, para que toda a questão seja decidida sob a palavra de duas ou três testemunhas”.
Miquéias lembra no texto ainda que “Ele mesmo será a paz” (Mq 5,4) ela também é ontológica, sem o reconhecimento do Ser, da dignidade de cada pessoa (Boécio foi o primeiro a levantar esta questão) não há paz, não há verdade e não justiça, embora usem-na contra a paz, nada mais injusto e equivocado.
Linguagem, verdade e erro
O mais comum é entender-se verdade como a tautologia lógica que deriva da concepção do empirismo científico e do silogismo matemático,
A filosofia moderna desenvolveu diversas concepções de verdade, atualmente busca-se a adequação da verdade aos sistemas ideológicos que vieram do Hegelianismo e de uma concepção da História, sobre estes equívocos está a elaboração de Hans-Georg Gadamer, que por sua vez vem da concepção de verdade enquanto Ser de Heidegger.
Do silogismo e do logicismo vem os conceitos idealistas de julgamento e o direito positivista.
A verdade é para Descartes: “Jamais aceitar coisa alguma como verdadeira que não a conhecesse evidentemente como tal” (Descartes, Discurso do Método), é assim oposta ao falso, muito próxima da verdade formal.
O pragmatismo utilitário de Stuart Mill é o extremo oposto disto (é ilógico), e está próximo a concepção de Hegel e Nietzsche, é a verdade relativista que dominam muitos discursos atuais.
Nietzsche também refaz o conceito hegeliano de verdade histórica para o conceito de existência, embora o conceito positivo pareça simples de ser refutado, a dificuldade é estabelecer o que é o verdade e real, que na realidade seriam a mesma coisa, mas o que é real? Muitas vezes esta adequação é feita de modo ideológico, assim surgem as narrativas.
É por causa desta dificuldade que surge o verdadeiro conjugado ao moral, ele tem sentido no contexto do realismo moral. Por exemplo, “A opressão e a exploração são malévolos” é uma verdade moral dentro de uma moralidade humanista, e “A impiedade é pecaminosa” é uma verdade moral numa moralidade religiosa e esta conjugação é resolvida em relação ao Ser e a linguagem, e pode-se retirar o véu, a ocultação através da a-lethéia, o desvelar.
A concepção ocidental de verdade, é assim difícil de ter uma única definição pode estar conjugada no caso ocidental de três raízes, a grega “aletheia” (a- não lethe oculto), que vem do que vem da definição do que é o ser: “a linguagem é a casa do Ser” (Heidegger), Veritas, o conceito latino conjugado entre lógica/linguagem (verdadeiro e falso) e Emunah (o conceito ético-moral) verdade/fidelidade e sua negação infidelidade, Agostinho de Hipona: “no interior de todo ser habita a verdade”.
Missa sobre o mundo
O escrito de Teilhard Chardin completou 100 anos no dia 03 de setembro de 2023, finalizou no deserto de Ordos na Mongólia, iniciado o escrito em 1919 quando trabalhava de maqueiro na primeira guerra mundial, foi lembrado pelo papa que estava na Mongólia nesta data.
Durante anos os escritos de Teilhard Chardin estiveram proibidos, mas aos poucos foram removidos e foram sendo publicados revelando uma espiritualidade e uma visão de mundo atualizada e real, foi Chardin que popularizou a palavra Noosfera de Volodymyr Vernasky.
Lê-se nesta missa: “Senhor, já que uma vez ainda, não mais nas florestas da França, mas nas estepes da Ásia, não tenho pão, nem vinho, nem altar, eu me elevarei acima dos símbolos até à pura majestade do Real, e vos oferecerei, eu, vosso sacerdote, sobre o altar da terra inteira, o trabalho e o sofrimento do mundo”.
Chardin havia completado sua tese sobre paleontologia e estava na Mongólia para coletar fósseis quando finalizou a obra, já que estava ali sem condições de realizar uma missa convencional (na foto com Émile Licent, no deserto de Ordos, Mongólia).
Sua obra mais conhecida é “O fenômeno humano” polêmica porque desenvolve sua teologia dentro de uma concepção evolucionista o que enfureceu os teólogos da época e que ainda hoje é combatida em setores cristãos mais fundamentalistas, é bom lembrar que Jesus usou de parábolas para explicar coisas complexas e que as provas da existência do homem em períodos primitivos já é um fato e muitas alegorias bíblicas são claras, como as usadas no Apocalipse.
Na missa escrita por Chardin está o desejo de uma humanidade una, presa ao amor da encarnação e revisitada na Hóstia santa de cada missa: “Recebei, Senhor, esta Hóstia total que a Criação, movida pelo Vosso apelo, Vos apresenta na nova aurora. Este pão do nosso esforço não é, por si próprio, bem o sei, mais do que uma imensa desagregação. Este vinho da nossa dor não é ainda, por desgraça, mais do que uma bebida dissolvente. Mas, no fundo desta massa informe, Vós pusestes — tenho a certeza, porque o sinto — um desejo irresistível e santificador que nos faz gritar a todos, do ímpio ao fiel: «Senhor, fazei-nos um!» “.
O desejo de ver toda criação uma e ligada a vida e ao Amor é o desejo mais profundo do Criador.
CHARDIN, P.T. La Messe sur le Monde. (em português), 1923.
Uma outra crítica a Hegel
Já delineamos aqui diversas críticas ao hegelianismo, com seus vícios do idealismo alemão, que ao nosso ver atinge também o chamados jovens hegelianos como Marx, porém há uma outra releitura possível que é a de Sören Kieerkegaard (1813-1855) que é mais contemporâneo de Marx e talvez por isto pouco lido, já que os grandes embates filosóficos se davam no idealismo alemão deste período.
Porém é possível uma leitura hegeliana de Kierkegaard e quem me chamou a atenção para isto, é uma doutora “millenium” brasileira, Natália Mendes que além de fazer uma premiada tese de doutorado do autor, fala cm desenvoltura e propriedade do filósofo.
Primeiro é importante que ele escreve e estuda sobre a metafísica grega, e a autora chama a atenção para a questão de ser “pai do existencialismo”, rotulações que atrapalham o estudo e a percepção de grandes problemáticas que os filósofos trouxeram.
A autora vê a profundidade de Kierkegaard em três eixos fundamentais: o ontológico, o epistêmico e o psicológico sem negar e perceber a origem teológica de algumas de suas inquietações, esclarece o tema da angústia, que deve ser entendida como “angústia filosófica” que é ter as questões certas e para elas respostas certas.
Aqui exploro um ângulo pouco explorado e não secundário que é um pós-positivismo, e pós logicismo filosófico, talvez uma das grandes angústias de Kierkegaard sobre a teologia.
Antes de prosseguir, destaco uma frase do filosofo sobre a oração: “A função da oração não é influenciar Deus, mas especialmente mudar a natureza daquele que ora”, me parece profunda.
Voltando a lógica de Kierkegaard que acredito que seja própria para nosso milênio, além de não se considerar filósofo, que significaria passar por uma crítica severa autores que criticava, ele constrói sua própria perspectiva e nela não abandona a literatura, a psicologia e a teologia.
Para não fazer um tratado sobre sua verdade, faço duas citações suas: “Não há verdade verdadeira que não seja subjetiva, isto é apropriada” e outra: “Há duas maneiras de ser enganado. Uma é acreditar no que não é verdade; a outra é recusar a acreditar no que é verdade”.
Kierkegaard, S. Textos selecionados. Seleção e tradução por Ernani Reichmann. Curitiba: Editora Universidade Federal do Pará, 1886.
Temores de uma 3G
Uma terceira guerra mundial (3G), que seria a maior crise civilizatória já ocorrida, parece chegar junto com a proximidade do outono europeu, entrevistas de um repórter da BBC em Moscou dão conta que há um clima de patriotismo e apoio a guerra na Ucrânia, ainda que seja chamada pelo eufemismo de “operação militar especial”.
O repórter entrevistou o blogueiro Andrei Afanasiev, pró-Kremlin e professor universitário, e também ouviu o outro lado de analistas militares que dizem que a propaganda estatal esconde os fracassos e perdas militares na guerra, entrevistou ainda atividades anti-guerra embora a maior tenha deixado a Rússia ou esteja presa.
O cenário apesar de uma boa quantidade da população manter certa indiferença é de um clima crescente de guerra, algum medo do futuro e nenhuma esperança de paz a vista.
O envolvimento da OTAN cada vez mais declarado e ostensivo cria um clima ainda pior, na semana passada houve um ataque ao aeroporto russo de Pskov, e na Ucrânia ameaça de bombas nas escolas que estão retornando as aulas, desde o início da guerra 3.750 escolas foram parciais ou totalmente destruídas por mísseis e bombas, segundo a Ucrânia.
Noutro front que começa a se desenha uma guerra, após as eleições houve um golpe militar no Gabão, país de língua e influencia francesa, o presidente reeleito Ali Bongo Ondimba, cuja família governa o país a 56 anos, encontra-se preso e as eleições foram consideradas fraudulentas.
Países da União Centro-Africana condenaram o golpe, agora cresce o número de países que não se alinham ao Ocidente e uma guerra pode se iniciar na região que já assisti a outros golpes e juntas militares governando os países, recentemente houve em Níger com apoio da Rússia (Mali, Guiné, Burkina Faso, Chade e Tunísia são ex-colônias francesas) (veja o mapa).
Na famosa crise dos mísseis em Cuba, três generais da Marinha Soviética deveriam aprovar o disparo de mísseis segundo protocolo russo, mas um deles Vasili Alexandrovich Arkhipov era contra, e isto evitou um holocausto nuclear trágico, a esperança é que existam outros Vasilis que impeçam a guerra 3G.
Religiao, Filosofia e Humanismo
Nem é religioso aquele que simplesmente proclama uma fé sem conhece-la, nem aquele que segue uma série de preceitos sem entender os fundamentos. No cristianismo o que é Amor, a filósofa Hannah Arendt, por exemplo, estudou como seu doutorado “O amor em Santo Agostinho” enquanto Edith Stein descobre a partir da filosofia e de Santa Tereza d´Ávila um caminho religioso e tornou-se freira e mártir (morreu em Auschwitz).
Há muita apologia a superstições e crendices no meio religioso, porém elas não eram desconhecidas por Jesus, é famosa a questão do sábado, que Jesus pergunta se é justo salvar alguém de uma doença no sábado (Mateus 12,10), chama os fariseus de “sepulcros caiados” (1Jo,2,27) e por fim termina por último revelando aos apóstolos que deverá sofrer muito da parte dos anciãos, dos sumos sacerdotes e mestres da lei (Mateus 16,21-22), ao que Pedro se assusta e pede que isto não aconteça, e Jesus o repreende e o chama dizendo que ele não tinha uma inspiração divina.
Assim não é o modelo de vida pública de muitos religiosos nominais, falsos profetas e gente com pouca profundidade de fé que podemos entender o que é religião, mas há um sentido antropológico, filosófico e claro teológico que dão base aos ensinamentos do amor, do suportar a cruz, de não construir ódio, vingança ou rancor a moda daqueles que não creem.
Agostinho superou o dualismo maniqueísta do bem contra o mal, trata-se do Amor que é muito superior a tudo e o mal é apenas sua ausência, Boécio e depois Tomás de Aquino instituíram a questão da pessoa e do Ser, que é parte da polis, mas inseparável dela.
A importância de Severino Boécio, venerado como santo pela igreja católica (sua data é 23 de outubro) para a história da ciência e da filosofia, da “querela dos universais” e da importância da razão, de Tomas de Aquino e de figuras atuais como Edith Stein não separam a fé do pensamento humano e do humanismo contemporâneo.
O humanismo antropocêntrico do período renascentista, a questão da perspectiva foi central na pintura e nas artes, mas é também deste período A Utopia de Thomas Morus.
Disto nasceu a modernidade e seus dualismos (objetivo x subjetivo, corpo x mente, espiritual x material) parte do dualismo ontológico: o ser é e o não ser não é, entretanto, há agora o princípio do terceiro incluído vindo de Stéphane Lupasco e Barsarab Nicolescu, é físico e real.
É tempo de rever o humanismo e nenhuma face da realidade humana pode ficar sem uma necessária revisão: o que é o Ser, o que é a ideia (o eîdos grego ligado ao Ser) e o que significam os mitos e cosmogonias modernos diante de um olhar mais profundo ao sagrado com diálogo e profundidade.
A ética, o humanismo e a filosofia
Peter Sloterdijk disse ao jornal El país: “ a vida atual não convida a pensar” (em 03/05/2019) e a “era do humanismo está terminando” disse Achille Mbembe historiador e pensador pós-colonial camaronês: o humanismo hoje é uma questão de estado e portanto de poder, como sua base é o economicismo impera um humanismo de tipo materialista nem sempre considerado os valores humanos.
A filosofia virou justificativa ideológica do poder, a polarização levou a extremos até mesmo a negação de autores cujo autores juram defender, o epistemicídio eurocêntrico esquece seus fundamentos mais básicos e se entregam a polarização política.
O que significou a ética spinoziana? Qual a crítica da razão atual? Sloterdijk aponta o cinismo.
A guerra era inevitável em uma crescente polarização política e nova ordem econômica pelo avanço da economia chinesa.
A filosofia atual já pensa em alternativas de humanismo, Edith Stein fenomenóloga e aluna de Husserl explorou a questão da Empatia, Heidegger outro aluno de Husserl a questão do Ser, Emmanuel Lévinas sobre influência hermenêutica husserliana e Heidegger define o humanismo como além da essência ou seja, o humanismo do outro homem, que pode ser um ponto de partida para o novo humanismo, e também Habermas (A inclusão do Outro) e Byung Chul Han (A exclusão do Outro) tocam o tema.
A religião se confunde entre ritualismo, fundamentalismo e ausência de valores humanísticos básicos: amor, solidariedade e fraternidade, assim a leitura bíblica é manipulada e parcial, o secularismo avança em campo minado pela ausência de valores humanitários da fé.
Espera-se que nesta crise e fragmentação do desenvolvimento civilizatório os lideres e homens influentes possam encontrar serenidade, diálogo e equilíbrio para possíveis saídas.
A filosofia não pode ser outra coisa que não coopere com a paz, com o avanço civilizatório.
Religião, antropologia e filosofia
O iluminismo e a filosofia moderna no pressuposto de abolir toda “superstição” instaurar uma época do conhecimento e da razão, dividiu o sistema de conhecimento em sujeito e objetos, a filosofia medieval não era muito distante disto haviam realista e nominalistas e nenhum venceu, tudo se modificou, e tudo que era considerado “metafísico” incluindo o Ser ficou de lado.
Porém as ideias de conceitos, estruturas que deviam desenvolver o conhecimento já estava presente num autor pouco lido, mas importante: Boécio (400 – 524 d.C.), um filósofo, poeta, estadista e teólogo romano, cujas obras tiveram uma profunda influência na filosofia cristã do Medievo.
Sua obra principal é a “Consolação da Filosofia”, porém é dele a “roda da fortuna” e um fragmento encontra que ficou conhecido como “querela dos universais”, se os universais (conceitos seriam hoje) seriam hoje “se os universais são coisas ou meramente palavras”, daqui pode se entender a divisão entre realistas que veem as coisas e nominalistas que defenderam os “nomes”, as palavras.
Porém tanto Boécio, como mais tarde Tomas de Aquino que estudaram e traduziram as obras gregas, com interpretações próprias, a questão do Ser era presente e a questão da história e da verdade também.
Sua contribuição humanística está na concepção do que hoje chamamos de “dignidade humana”, para sua Antropologia Filosófica a pessoa humana no horizonte da racionalidade considerando o seu dado de singularidade, um novo humanismo não pode prescindir de seu prisma novo e ainda pouco entendido, para os cristãos Boécio foi defensor contundente da fé e para os humanistas sua De Consolationes Philosophiae traz colaborações imprescindíveis.
Mesmo hoje suas ideias podem parecer polêmicas, ao defender que o homem é também natureza, mas dela deve subsistir e alcançar como extensão de “natureza”, diz em outra obra:
“Ou, se ‘pessoa’ não se iguala a ‘natureza’, mas se ‘pessoa’ subsiste sob o alcance e a extensão de ‘natureza’, é difícil dizer a que naturezas ela sempre ocorre, isto é, a quais naturezas convém conter ‘pessoa’ e quais delas não convém afastar do vocábulo ‘pessoa’. Com efeito, isto é manifesto: ‘natureza’ é subjacente a ‘pessoa’ e não se pode predicar ‘pessoa’ para além de ‘natureza’” (Boécio, Contra Êutiques e Nestório, 2005, p. 163).
Num momento em que o antropocentrismo é questionado e a relação com a natureza é revista é importante ler este filósofo, teólogo e humanista medievo.
BOÉCIO. Escritos (OPUSCULA SACRA). Tradução, introdução, estudos introdutórios e notas Juvenal Savian Filho. Prefácio de Marilena Chauí. São Paulo: Martins Fontes, 2005.