O sentido da política e as redes
A desconfiança da política (e dos políticos) é tão antiga quanto a tradição da filosofia política, escreve Hannah Arendt e é através desta questão que pode-se entender o sentido da política.
Logo em seguida na introdução ao fragmento 3b escreve: “A política, assim aprendemos, é algo como uma necessidade imperiosa para a vida humana e, na verdade, tanto para a vida do indivíduo como da sociedade”, e acrescenta pouco a diante a: “Tarefa e objetivo da política é a garantia da vida no sentido mais amplo”.
Em seguida vai esclarecer um equívoco antigo, presente em toda cultura ocidental, já dissemos em outro post do zoon politikon, diz a autora que não é: “uma designação qualquer para o convívio humano, não achava, de maneira nenhuma, que todos os homens fossem políticos ou que a política, ou seja, uma polis, houvesse em toda parte onde viviam homens”, ele julgava “ser apenas uma característica do homem o fato de poder viver numa polis e que essa organização da polis representava a forma mais elevada do convívio humano”, mas sabia que estava longe de ser uma sociedade de anjos e ela estava restrita a um grupo de pessoas.
Esclarece a autora que o que distingue o convívio dos homens na política das outras formas de convívio humano era a liberdade, para uma classe de pessoas.
O sentido da política para os gregos esclarece Arendt no parágrafo 3c: “E o objetivo não era pura e simplesmente a liberdade tal como ela se realizava na polis, mas sim a libertação pré-po-lítica para a liberdade na polis. O sentido da coisa política aqui, mas não seu objetivo, é os homens terem relações entre si em liberdade, para além da força, da coação e do domínio. Iguais com iguais que só em caso de necessidade, ou seja, em tempos de guerra, davam ordens e obedeciam uns aos outros; porém, exceto isso, regulamentavam todos os assuntos por meio da conversa mútua e do convencimento recíproco.”
Assim tal como surgiu na polis grega o que é “… decisivo nesse contexto não é tanto o conflito entre a polis e os filósofos — nos quais mais tarde teremos de entrar em detalhes* — mas sim não poder persistir a simples indiferença de um âmbito em relação ao outro, na qual o conflito pareceu solucionado por um momento, porquanto impossível o espaço da minoria e sua liberdade — se bem que era também um âmbito público e não-pri-vado — desempenhar as duas funções, assim como a política incluía todos os que estavam aptos para a liberdade”.
A nota* (número 17 no texto) segundo a compiladora dos fragmentos é que pode se tratar de um capítulo não escrito sobre “A posição Socrática”, o que a autora está tratado aqui é a diferença entre o que foi aprofundado por muitos autores mais tarde entre o espaço público e o espaço privado, que deveriam estar aptos a liberdade.
O que acontece no mundo contemporâneo com a mídias de redes sociais, nunca é demais diferenciar mídias das próprias redes que são o conjunto das relações sociais que Hannah Arendt recupera, é de suma importância porque vai possuir propriedades diferentes daquelas que estão entre os “privilegiados” políticos, tal como os gregos os estabeleceram e como diz a autora, que muitas vezes rejeitamos por não sermos políticos profissionais.
O conjunto do convívio humano não era possível de ser pensado antes da comunicação global e das mídias de redes sociais, a polis grega foi uma experiência social de pequenas cidades-estados onde uma parte da população que era livre podia estabelecer a democracia nela, porém o conjunto da sociedade não era livre.
As novas emergentes realidades criam um maior espaço de convívio humano e denotam as fragilidades civilizatórias, e colocam a própria democracia em cheque, ainda há cidadãos que são livres apenas para votar e a política é dominada por minorias que tomam o poder para estabelecer seus privilégios.