Arquivo para junho, 2021
O ser em sua autenticidade
A incursão de Heidegger sobre o que é a vida social, é que ela é regida por uma noção obscura do que seja convivência, onde não há sujeitos e sim um império do impessoal, do império que a tradução para o português fica muito boa, império do “a gente”, é uma sociabilidade truncada, não é apenas o individualismo, mas um lugar onde nem o eu nem o nós se distinguem.
Este espaço individual é aquele que tudo nivela por baixo, uma perda do Dasein no espaço aberto da “opinião pública” (Öffentlichkeit]), uma sociabilidade truncada, até o nós não inclui o Outro.
Neste estar aí do Dasein em que medida ele lida com outras pessoas do seu meio ambiente cotidiano, para isto Heidegger dá um passo na determinação da analítica existencial, que é responder como o mundo se abre para o Dasein, independente se seja o mundo de coisas ou de homens, isto pode ser compreendido por como ele vê a abertura para o mundo.
A vê como como uma abertura primeira e fundamental de modo triplo: a disposição, a compreensão e a interpretação, entendendo que isto o torna envolvido com o mundo.
Então primeiro o ser humano é tomado por estados da alma que abrem para ele irrefletidamente o mundo, geralmente por meio de um certo desvio, uma disposição, compreende o mundo não como uma teoria ou conceitos, mas como o próprio Dasein está com-preendido numa situação.
Assim a disposição torna-se compreensão, mas não é o homem que compreende o mundo e sim o mundo compreende o homem de modo totalizante, onde o ser humano inteiro é compreendido e isto o remete ao conceito de projeto (Entwurf) num sentido essencial: ele é projetado no mundo.
Este projeto dá ao homem possibilidade de interpretação, e só então consegue traduzir o mundo no discurso e na linguagem, tendo em vista que a proposição e o enunciado sempre implicam em um momento posterior na existência do Dasein.
São estas aberturas ao mundo no discurso e na linguagem, porém que devem levar em conta a proposição e enunciado como implicando um momento, sempre posterior, na existência do Dasein, porém a tendência de encobrimento no Dasein é sempre forte para que se torne livre.
Este traço fundamental de encobrimento e de fuga de si mesmo se fazer valer e determinar o ser-no-mundo do ser-aí (Heidegger, 1989) põe a questão sobre a possibilidade do ser-aí sair de sua inautenticidade.
HEIDEGGER, M. Ser e Tempo. Tradução de Márcia de Sá Cavalcanti. Petrópolis: Vozes, 1989
De que humanismo falamos
É comum estabelecer uma conexão entre os estudos de ontologia e a questão da existência, o filósofo Paul Sartre o fez, porém nem a tradição ontológica da escolástica, nem Heidegger fazem esta conexão, este último ressaltou: “O enunciado principal do existencialismo não tem nada em comum com aquele enunciado de Ser e tempo” (HEIDEGGER, 1996a, p. 329).
Em sua Carta sobre o humanismo, de 1947, Heidegger vai afirmar que o que distingue o homem é a sua relação com o ser e o modo como ele resguarda o ser, e não na medida em que é definido como um ser dotado de razão, e ele próprio critica esse humanismo, pois para ele o que há é um esquecimento do ser, que é diagnosticado em toda tradição filosófica ocidental, começando em Platão e se estendendo até Nietzsche, com todas suas injunções políticas e epistemológicas.
O tema do ser caracterizado no pensamento ocidental que tem raízes incipientes nos pré-socráticos, são já que são anteriores a “episteme”, é novamente retomado a partir de Heidegger como uma “ontologia fundamental”, isto é, com a possibilidade de questionar o ser em sua essência, e como este questionamento o humanismo de todo homem, assim a essência é coexistente com o ser.
É preciso enquanto se discute a ontologia, entende que o Dasein, o ser-aí de Heidegger, está preocupado em examinar como se dá a primeira, a original compreensão do homem em sua essência mesma, até mesmo antes do momento de formular uma teoria ou de ter consciência, a teoria chegar num momento posterior e a consciência de dá após a abertura do homem ao Ser.
Para entender o que Heidegger caracteriza como existência pode-se ler: Que é metafísica? (1929), onde se lê: “A palavra existência designa um modo de ser e, sem dúvida, do ser daquele ente que está aberto para a abertura do ser, na qual se situa, enquanto a sustenta” (Heidegger, 1989b, p.59).
Deste modo o objetivo da ontologia fundamental de Ser e Tempo é o ser que que se colocado como ente privilegiado e que é capaz de questionar o ser, que possui compreensão do ser [Seinsverständni], e este ente é o homem, e a partir dele que pensamento o humanismo.
É certo que há uma crítica de Peter Sloterdijk em “Regras para o parque humano: uma resposta a cartas sobre o humanismo”, que questiona o antropocentrismo, nossa relação com a natureza.
Heidegger, M. Ser e Tempo Tradução de Márcia de Sá Cavalcanti. Petrópolis: Vozes, 1989a.
______. Que é metafisica? Tradução de Ernildo Stein. São Paulo: Abril Cultural, 1989b. (coleção Os Pensadores).
Curva e eficiência da vacinação
A curva mostra um avanço nas primeiras doses, mas as segundas doses ainda podem ser um problema, é preciso ter um protocolo para os vacinados de modo a incentivá-los a segunda dose.
Os estudos que envolvem o pós-vacinação e sua eficiência começam a ser divulgados, é chamada de fase quatro, como explica por exemplo, o professor Guilherme Werneck do Instituto de Estudos em Saúde coletiva da UFRJ.
A conclusão destas pesquisas pode levar até dois anos, os dados positivos são animadores, e afirmam o impacto positivo da vacinação, porém o problema da 2ª. dose está detectado e apontado, além do problema da imunidade também prejudica os resultados conclusivos da pesquisa.
Estes estudos são chamados de farmacovigilância (que investiga efeitos adversos da vacina) e a efetividade dos imunizantes na contenção da pandemia e redução da mortalidade, já postamos sobre o case de Serrana (SP), com a imunização de toda população, onde os casos de Covid-19 despencaram.
O número da vacinação no Brasil é para uma população total de 201.103.330, foram vacinadas na primeira dose 53.224.020 (26,5%), na segunda dose 23.534.567 (11,7%), dá um total de 37,17 doses para cada 100 pessoas, a média mundial é de 30,07 para cada 100 pessoas.
A vacina Janssen começa chegar ao Brasil (precisa só de uma dose) na terça-feira e a promessa é de 3 milhões de doses.
A reunião do G7 que acontece estes dias, segundo anúncio no Downing Street que doará 1 bilhão de vacinas com objetivo de colocar um fim na Pandemia até 2022, o número de pessoas vacinadas na primeira dose ainda não atingiu 1 bilhão de pessoas, para uma população mundial de 7 bilhões.
A metáfora e o inefável
O desafio epistemológico é apontado por Paul Ricoeur de aceitar o modelo da descoberta, pois rejeitá-lo “ou reduzi-lo a um experiente provisório, que substitua, na falta de um melhor, a dedução direta, é reduzir a própria lógica da descoberta a um procedimento dedutivo” (p. 369).
Neste contexto destacamos a função da parábola que cria uma cena que faz ponte entre o inefável e a realidade que ela re-descreve, ela introduz uma trama que produz algo além do cotidiano, o enunciado parabólico é também neste sentido, metafórico.
Como descrever uma realidade futura que ainda não aconteceu, a lógica tem sido re-descrever a realidade usando a retórica, que explora apenas a realidade presente e nega a utopia e a ficção.
Ricoeur define assim a parábola como a conjunção de uma forma narrativa e um processo metafórico e significa também a narrativa de uma pequena história fictícia com objetivo de interpretar uma outra coisa que segundo o narrador é preferível, para interpretá-la bem, deixá-la no sentido da metafórico.
Realidades futuras que não podem assim ser simplesmente descritas ou deduzidas porque de fato não aconteceram, o que será a nossa realidade pós-pandêmica, como será o futuro humano.
Muitos autores tentam desvendar esta realidade inefável, porém não é dedutível, é uma “ponte”.
Ao explicar as realidades divinas na Bíblia, porque Jesus dizia que ela era inefável, compara a diversas situações usando parábola, diz no Cap. 4 do Evangelho de Marcos (Mc 4:26-27: “Jesus disse à multidão: “O Reino de Deus é como quando alguém espalha a semente na terra. Ele vai dormir e acorda, noite e dia, e a semente vai germinando e crescendo, mas ele não sabe como isso acontece …”, compara com a colheita e uma pequenina semente que é a mostarda.
Assim descrever estas realidades apenas por lógica e dedução é desconhecer tanto a descoberta da própria realidade como falsificar, para um caminho científico, como as realidades divinas, uma minúscula semente torna-se uma árvore bela e frondosa, e isto acontece também na história.
RICOEUR, P. Metáfora Viva. São Paulo, trad. Dion Davi Macedo. 2ª ed, Ed. Loyola. 2005.
Metáfora-enunciado e outras figuras de linguagem
Paul Ricoeur faz uma profunda análise do que ele chama de “Rhétorique generale” como aquela que reserva apenas aos metalogismos aquela que incorpora os discursos, existe para além dela os metasememas, que é um tipo de figura de linguagem que modifica o significado de uma palavra.
Só para dar um exemplo dentro da filosofia de metasemema, a palavra eidos da cultura grega traduzida como ideia, tornou-se na modernidade outra coisa que era para os gregos.
A importância dessa metáfora-enunciado é dita pelo próprio Ricoeur: “a mais apta para mostrar o parentesco profundo, no plano dos enunciados, entre metáfora, alegoria, parábola e fábula e, por essa mesma razão, permite abrir, para todo este conjunto de figuras – metasememas e metalogismos” (Ricoeur, 205, p. 265), enquanto uma boa parte dos discursos (Ricoeur cita Retórique Generale) se reservam apenas aos metalogismos.
O metalogismos são as lógicas que estão além das figuras de linguagens por exemplo uma alegoria, assim Ricoeur cria para a primeira o conceito de um tropo, onde apenas muda o sentido das palavras enquanto a segunda entra em conflito com a própria realidade.
Usa para isto a figura do “barco ébrio” de Rimbaud, que usou a expressão “o barco ébrio juntou-se ao grande veleiro solitário” (p. 264), que “são alegorias de Malraux e de Gaulle, pois estes não são nem barcos nem veleiros”, explica Ricoeur: “a tensão não está na proposição, mas no contexto”.
O impacto desta análise, como aponta o próprio Ricoeur é que o “desvio” realizado da palavra pelo metassemema, o enunciado metafórico “restabelece o sentido” (p. 265).
Este impacto semântico “que concerne ao enunciado inteiro, então é necessário denominar metáfora o enunciado inteiro com seu novo sentido, e não somente o desvio paradigmático que focaliza sobre um apalavra a mutação de sentido de todo o enunciado” (p. 265), eis a explicação mais clara de sua metáfora-enunciado.
A longa análise feita por Ricoeur, por autores conhecidos como os clássicos (Aristóteles e Platão), Kant, Hegel e Heidegger, e razoavelmente conhecidos como J. Dubois, F. Edeline, e outros pouco conhecidos como Le Guern e Jean Cohen, torna sua obra complexa, mas muito importante.
O grande mérito e a importância da análise profunda e hermenêutica da metáfora como centro da questão sobre as narrativas atuais, que envolvem o uso linguístico de diversas figuras de linguagens como alegorias, parábolas e metonímias, faz um quadro na página 275, ilustrado acima, e para além deste discurso estabelecer uma meta alta como aquela que penetra o “inefável”.
RICOEUR, P. Metáfora Viva. São Paulo, trad. Dion Davi Macedo. 2ª ed, Ed. Loyola. 2005
Metáfora viva e narrativa
Ambos são temas de Paul Ricoeur, porém estabelecer a ligação clara entre estes dois conceitos não é tarefa simples, o próprio autor não vai dizer entre a metáfora e a narrativa, há tal conceito.
Isto porque conforme já fundamos em um post anterior, é quase uma refundação do eidos (aquilo que era ideia para os gregos), dando a ela (a metáfora) uma “ideologia do inefável”, que é no entanto atingível posto que está na consciência como um não dito.
Também neste post frisamos que a metáfora viva começa onde a linguística termina, e a narrativa está em estreita ligação com a linguística, mas seria ousado dizer que a narrativa não é também uma forma de metáfora, então nesta intersecção inesperada entre narrativa onde a metáfora vive.
A metáfora na leitura dos gregos, na poética e de retórica de Aristóteles a palavra ou o nome são unidades básica entre a poética e a retórica, enquanto a segunda é mais voltada a mimese.
A ideia que a linguagem tem uma outra função além da convencional, foi defendida por Heidegger dizendo que ela tem esta outra função é a poética, e ela nos remete tanto à metáfora como outras figuras de linguagem que estão além da chamada “licença poética”, pois tem uma função retórica.
Encontra-se na definição corrente de metáfora como aquela figura de linguagem em que se verifica uma comparação implícita, porém qual a relação entre uma comparação e a metáfora?
Ricoeur esclarece que no núcleo desta relação, há “um pequeno enigma” no discurso aristotélico, na origem desta questão, “porque esse tratado (da Retórica), que declara nada acrescentar à definição de metáfora dada pela Poética, empreende no capítulo IV um paralelo sem correspondente neste último tratado, entre metáfora e comparação?” (Ricoeur, 2005, p. 42).
A primeira resposta de Ricoeur é que ela é depende “no interior do corpus aristotélico” (p. 42), mas vai objetar o propósito que não é explícito, “Aristóteles assinala a subordinação da comparação à metáfora”, assim “não é explicar aqui a metáfora pela comparação, mas antes a comparação pela metáfora” (pag. 43).
Este enigma torna-se na teoria da metáfora-enunciado em Paul Ricoeur, mais que uma rica figura de linguagem, ela é desmembrada em duas partes: “sob o nome de ´parabole’, é ligada à teoria da ´prova´(Livro I da Retórica), que consiste na ilustração pelo exemplo, que subdivide, por sua vez, em exemplo histórico ou fictício,; a outra sob o nome de eikon, é vinculada a teoria da léxis e posta no domínio da metáfora” (p. 44).
Os recursos e argumentos de metáfora viva permitem não só compreender as narrativas, mas penetrar em seus elementos constitutivos como recursos de linguagem e de conhecimento.
RICOEUR, P. Metáfora Viva. São Paulo, trad. Dion Davi Macedo. 2ª ed, Ed. Loyola. 2005
A narrativa e seus contextos
A emergência de estudos para análises em metodologias não positivistas e interpretativas nas ciências humanas fez surgir no panorama cultural de nosso tempo uma crise do conhecimento (episteme) que tem atraído diversos estudiosos para o tema, entre eles: “as formas e gêneros da narrativa, especialmente, têm atraído atenção (Bamberg, 1997; L. P. Hinchman & S. K. Hinchman, 1997; Polkinghorne, 1987).
Bamber explora as três décadas da análise de narrativas, Hinchman e Hinchman organizam uma coletânea para discutir problemas de identidade e memória em comunidades, e, Polkinghorne estuda o conhecimento como narrativa nas ciências humanas, o sentido inverso da ordem cronológica dos estudos é aqui proposital indo do mais geral para o mais específico.
Porém do ponto de vista histórico o tema é bem antigo, podendo ser analisado na Retórica de Aristóteles, e mais contemporaneamente há uma longa tradição destes estudos na teoria literária e na linguística.
Há uma dificuldade reconhecida de definição da narrativa, primeiro pelas formas e estilos que são bastante variadas, e assim sua fenomenologia cultural não só é diversificada como aberta, e, em segundo lugar existem elementos estruturais nas narrativas que estão presentes em outros tipos de discursos com os textos jurídicos, científicos históricos ou religiosos.
Destaco os estudos de Paul Ricoeur, em seu clássico Tempo e Narrativa Histórica (1981-1983) onde a reflexão filosófica está precisamente na relação entre “tempo vivido” e “narração”, que dito de maneira mais profunda significam “experiência” e “consciência” que torna o conceito em contato mais estreito com a filosofia contemporânea onde tempo, vivência estão em conexão.
Confronta o conceito de historiografia estruturalizante desde 1945 e meados dos anos 1970, e desloca o discurso do historiador para pertencer antes de tudo à ordem das narrativas, embora um tipo especial de narrativa que não é a analítica.
Sua análise faz um diálogo com a obra Confissões de Agostinho e Poética de Aristóteles.
A sua frase “toda história é narrativa”, não é apenas o desprezo pela mera relação ao factual, ou ao biográfico, nem mesmo a agitada situação da histórica política, seu intento é dar sentido ao vivido, da sensibilidade e da ação humana a uma historiografia que parece abstrair do homem.
O que Paul Ricoeur destaca em sua “narrativa” como “História Mestra da Vida”, que está além dos grandes estadistas e políticos, e disponível para o ser humano cuja vivência cotidianamente o desafia.
Referências:
Bamberg, M. (Org.) Oral versions of personal experience: Three decades of narrative analysis. Journal of Narrative and Life History, 7, 1-4, 1997.
Hinchman, L. P. & Hinchman, S. K. (Orgs.) Memory, identity, community: The idea of narrative in the human sciences Albany, NY: State University of New York Press, 1997.
Polkinghorne, D. Narrative knowing and the human sciences Albany, NY: SUNY Press, 1987.
RICOEUR, Paul, Tempo e Narrativa Tomo I. Campinas. Papirus, 1994.
A terceira onda é atenuada no Brasil
Postamos aqui que era possível atingir números de vacinação próximos a 50% até o final de junho e que a primeira semana era decisiva, os dados indicam uma inversão da curva, mas é preciso não vacilar e continuar a vacinação, o Brasil recebeu novas doses da Pfizer (mais de 500 mil) e a vacinação da “nacionais” continua indo, e a previsão é de 40 milhões de doses até o final do mês.
Pode-se afirmar que neste momento há uma atenuação, o número de mortes da sexta-feira é 1689 enquanto de infecção acima de 66 mil, números que mostram a importância da vacinação pois o número de infecção ainda é muito alto e sem a vacinação o de óbitos continuaria alto.
A desaceleração da vacinação é apontada em algumas mídias, porém não fica clara se é a distribuição ou aplicação, pode ainda ser uma terceira coisa operacionalização o que seria muito lamentável já que o INSS e as secretarias de saúde possuem boa estrutura e distribuição.
Em porcentagens o número de vacinas distribuídas, o governo fala de um número acima de 100 milhões e os estados dizem ter recebido 90 milhões, sendo que há vacinas em estoque, em porcentagem seriam 52 milhões da AstraZeneca/Oxford/Fiocruz, 47,1 milhões da Coronavac e 3,5 milhões da vacina Pfizer/BioNtech, não deixa de ser interessante esta variação pela eficácia para diversas idades.
A distribuição realizada até o momento já permitir a aplicação de doses, ao menos a primeira dose, em 18 dos 28 grupos prioritários do PNO (Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19), que foi definido pela vulnerabilidade social e riscos maiores de comorbidades.
A etapa atual começa a priorizar comorbidades em diversas faixas etárias e profissionais da saúde, porém do comércio que seria extremamente importante não está incluído no plano.
Os números do mundo ainda são preocupantes, veja o gráfico, ainda há países com possibilidades de uma terceira onda e uma lição definitiva da Pandemia é que devemos nos preocupar com todos.
O Deus-Homo e a possibilidade da eternidade
É mais antigo do que se pensa a pretensão humana de chegar aos céus, Homo Deus é a atualização bem escrita e bem-feita desta história do homem de busca do “céu” aqui na terra, o paraíso perdido já deu vários ensaios e livros, a ideia de um Deus próximo acalenta muita gente.
Diz Harari, a mais digna atualização desta narrativa que os impérios, corporações, acumulação e riquezas desde a deificação dos Faraós e dos imperadores romanos, são as narrativas que por escrito: “a escrita também fez com que fosse mais fácil aos humanos acreditar na existência dessas entidades ficcionais porque habitou as pessoas a experimentar a realidade por meio da meditação e de símbolos abstratos” (Harari, p. 171).
Embora acredite que as religiões tenham cooperado no aspecto ético, ele afirma que “religiões apresentam a tendência irritante de transformar declarações factuais em juízos ético, criando com isso uma grande confusão e obscurecendo o que deveriam ser debates muito simples.” (p. 202).
As interpretações de Morin, Sloterdijk e Chul Han vão na direção contrária, Morin parte da complexidade: “O mundo torna-se cada vez mais um todo. Cada parte do mundo faz, mais e mais, parte do mundo e o mundo, como um todo”, Sloterdijk vai explorar na “Crítica da razão cínica” a ideologia como “falsa consciência”, como uma visão deturpada, e por isso, falsa, da realidade e vai por isto criticar o humanismo contemporâneo.
Chul Han penetra na alma humana, ao diagnosticar a ausência de conclusão, da busca pelo eficientismo e a incapacidade de morrer, num sentido figurado, mas que também é a busca pela eternidade, por aquilo que permanece e que cada conclusão adiada levaria a ela.
A fantasia divina de tornar o homem também eterno, foi na expressão de Jesus, divino humano e homem divino, o Deus-homo que Harari, como bom judeu, tem dificuldade de acreditar.
Na passagem em que Jesus começa a “abrir o verbo” em Mc 3,20 que diziam que “Ele está possuído por um espírito mau” e que até mesmo sua família foi repreendê-lo , Ele irá responder que são sua família (seus amigos) o que ouvem a palavra de Deus e as vive, para dizer que só os são capazes de viver a ética e a conduta humana de Amor ao Outro são de fato sua família.
O Deus-Outro nos convida a viver esta realidade já aqui na terra, sem deixar de ter problemas.
HARARI, Yuval Noah. Homo Deus: uma breve história do amanhã. Trad. Paulo Geiger. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
Favor fechar os olhos
Poderia ser o contrário, mas a realidade é tão assustadora que apenas será possível enxergar aqueles que tiverem a coragem em fazer aquilo que parece insano neste momento, olhar para dentro e ver até que ponto colabora com esta realidade tão dura.
O diagnóstico veio para mim de forma inesperada enquanto perguntava o que é a eternidade e para onde quero que a humanidade caminhe, tinha a intuição que tudo deveria mudar começando por mim, e ao conhecer o livro novo de Byung Chul Han algumas respostas estavam ali, recebi o livro em dois dias e já posso comentá-lo.
A intuição estava fundamentada no que muitos já sabem: as grandes utopias e os grandes discursos desmoronaram e a pergunta óbvia era então para onde iremos.
As pistas de Chul Han são inspiradoras, já no subtítulo do livro: “Favor fechas os olhos: em busca de um outro tempo”, edição agora de 2021 pela editora vozes, o ensaio é de 2013.
Pode-se pensar que vivemos um tempo de aceleração, mas Chul Han chama atenção que as “narrativas não se deixam acelerar arbitrariamente, a aceleração destrói as suas estruturas próprias de sentido e tempo, o inquietante na experiência do tempo atual não é a aceleração como tal, mas sim a conclusão do tempo faltante”, ou seja, a falta do ritmo e do compasso.
A conclusão das coisas da prática de novas vidas, os ritos que fazem com as coisas sejam feitos com ritmo e compasso para fazer as coisas bem-feitas e chegar a sua conclusão.
A aceleração tem a sua causa na incapacidade universal de encerrar, o tempo continua se lançando para frente, pois ele não chega em lugar nenhuma ao encerramento.” (p. 20)
Foi assim que inverti meu diagnóstico, do fim das utopias e dos grandes ideais (no sentido de eidos e não do idealismo), não aconteceram não por falta de discurso ou de “boas intenções” e sim por falta de conclusão.
Mas é importante coerente com o discurso de Chul Han, rever o impacto dentro das pessoas, na sua integridade interna de fazer uma experiência até o fim, e Chul Han vai tocar em outro termo
Vai tocar num tema tabú da morte, presente agora durante a pandemia, “e em um mundo no qual a conclusão e encerramento dão lugar a um avanço sem fim e sem direção, não é possível morrer pois também morrer significa pressupõe a capacidade de encerrar a vida” (p. 29-30), entender que a vida é um ciclo.
Ele fala também do sujeito do desempenho, aquele que busca o máximo “o sujeito do desempenho é incapaz de chegar a uma conclusão”, e isto leva a se cobrarem demais e não concluir.
Entender que estamos no fim de um ciclo e é preciso conclusões próprias ou se “tem que a-cabar [ver-ender] em uma hora inoportuna [Unzeit]” (p. 30), para isto não ocorra é preciso fechar os olhos e se examinar.
Han, Byung-Chul. Favor fechar os olhos: em busca de um outro tempo. trad. Lucas Machado, RJ, ed. Vozes, 2021.