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A sabedoria de pensamentos puros

01 out

O simplismo é o pensamento ingênuo, enquanto a simplicidade é o pensamento puro, a noesis pura.

Não está na capacidade de elaboração teórica, na cultura livresca que resiste a sabedoria, ela une simplicidade (que não é simplista) e complexidade no sentido de colocar tudo sob o manto da natureza e do universo, e entender que há saberes originários que não são simplistas, mas foram elaborados num contato real com a natureza, por isto rejeito a ideia de naturalização.

A culturalização é aquela que se apoderou do natural e o perverteu, disse o filósofo, escritor e líder indigenista Ailton Krenak sobre a atual crise pandêmica: “A Terra está falando para a humanidade: ‘silêncio’. Esse é também o significado do recolhimento”.

Grande parte da cultura ocidental está em crise, porque apoderou-se da natureza de maneira brutal e não quer entendê-la e tem dificuldade de ler nos sinais visíveis e claros, esta crise vem de antes da atual revolução tecnológica, muitos filósofos no início do século XX apontaram para ela, e o silêncio pedido por Krenak pode ser também aquilo que Theodor Adorno identifica como verdadeira contemplação: “A bem-aventurança da contemplação consiste no encanto desencantado.” Theodor Adorno, lembro que este filósofo não é místico, nem religioso.

Ailton Krenak escreveu “Ideias para adiar o fim do mundo” (Cia. da Letras, s/a), dentro de uma cosmovisão indígena, mas com consciência de que se trata de um problema planetário, disse numa entrevista ao Jornal Estado de Minas (03/04/2020): “Eu não percebo onde tem alguma coisa que não seja natureza. Tudo é natureza. O cosmos é natureza. Tudo em que eu consigo pensar é natureza”, denunciando que o modo que vivemos é artificial e não condiz com a natureza humana”.

Interpretando o livro de Davi Kapenawa, outro líder indígena, Viveiro de Castro e Danowski veem também que o nosso pensamento “culto” e ocidental está concentrado no mundo da mercadoria, e diz Kapenawa: “os brancos sonham muito, mas só sonham consigo mesmo”, ou seja, com sua própria cultura sem conseguir contemplar um mundo mais amplo, onde todos estão presentes.

Estas cosmovisões podem parecer ingênuas, mas significam que devemos sempre pensar além de nossa cultura, também a cosmovisão cristã pede este esforço, e depois dos ensinamentos aos seus apóstolos daquilo que o próprio mestre deveria passar, e eles ainda não entendem, Jesus vai fazer uso de uma nova metáfora para que eles pensem de modo mais puro e menos culturalizado (e não naturalizado).

No capítulo 10 do evangelho de Marcos, vendo que queriam afastar as crianças dele, Ele diz (Mc 10,14-15): “Deixai vir a mim as crianças. Não as proibais, porque o Reino de Deus é dos que são como elas. Em verdade vos digo: quem não receber o Reino de Deus como uma criança, não entrará nele”.

O mundo que há de vir, em diferentes cosmovisões, ainda que pareçam infantis, mostra a crise e o esgotamento do pensamento cultural de nosso tempo, e o esgotamento dos meios naturais.

 

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