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A morte e a vida
Pablo Picasso tem razão ao dizer que “a morte não é a maior perda da vida. A maior perda da vida é o que morre dentro de nós enquanto vivemos”, porém diante de uma pandemia que ameaça a todos, diante de uma segunda onda que promete ser ainda pior, Makron e outros governantes da Europa já o disseram, devemos encarar o tema.
Onde foi Dia de Finados, lembrar de mais pais e algumas pessoas que já não estão mais aqui sempre me fizeram um acalanto diante da vida e da morte, o que viemos fazer aqui nesta curta passagem, deveria ser a questão destes dias.
A pandemia poderia ter ensinado mais, ao menos conseguiu frear o vida frenética da Sociedade do Cansaço, mas a grande maioria das pessoas se comporta como se não houvessem muitas pessoas morrendo e que também elas podem estar de repente diante de uma encruzilhada, que assim penso, não será pessoal apenas, mas todo o planeta.
Li num dos últimos livros de Edgar Morin: “em vez de ser terra de ninguém, poderíamos ser terra de todos”, não é o ainda acontece, hoje é dia de eleições nos EUA, sem polarizar pode-se dizer se ganhou a vida ou a morte, não falo de políticas governamentais também, mas as ameaças de guerra que sempre pairam sobre a humanidade em tempos de guerra.
Todos um dia abandonaremos nossos sonhos, promessas e as coisas boas que fizemos, será hora de prestar contas se não a Deus, aos que creem, as gerações futuras sobre o legado que deixamos.
Viver a vida e ser feliz deve ter sempre como complemento também a felicidade dos outros, se não sou causa de felicidade a minha volta, a minha própria pode estar comprometida, e no fim da jornada ficará apenas aquilo que fizemos de bom e que os que ficam terão prazer em recordar.
A relação com o Outro e com a Natureza que é também um outro, deve ser modificada para que tenhamos esperança num futuro promissor para os que nascem.
Segunda onda ou é outro Cov-2
Em artigo recente “Emergence and spread of a SARS-CoV-2 variant through Europe in the summer of 2020” publicado em 28 de outubro no site da medRxiv, informam a disseminação, presumivelmente a partir da Espanha, de uma variante do vírus da Covid-19, que já seriam 80% das infecções recentes, o artigo ainda terá a revisão por pares, mas já disparou o alarme da comunidade científica, o artigo ainda terá revisão por pares.
Desde o início de setembro a Europa já verificava um aumento nos casos de infecção e retomava as medidas de distanciamento, era o final do verão, agora em outubro as medidas se tornaram irreversíveis, e o presidente da França chegou a declarar: “o vírus circula numa velocidade não prevista nem pelas previsões mais pessimistas … estamos todos na mesma posição: invadidos por uma segunda onda que será sem dúvidas mais difícil e mais mortal que a primeira”, a Inglaterra já decretou lock-down e ainda estamos no outono, o inverso deste ano promete ser rigoroso.
A Alemanha, a primeira-ministra Angela Merkel fez acordo com os governadores locais para fazer um “lockdown light”, mas até o final de novembro bares, restaurantes, teatros e academias terão que fechar as portas, será um Natal doméstico e com muitas restrições na Europa.
Na Itália o governo do primeiro-ministro Giuseppe Conte determinou que neste início de novembro bares e restaurantes de todo país só poderão ficar abertos até as 18h, academias, piscinas, teatros e cinemas não podem abrir.
As medidas impactaram as bolsas que tiveram uma forte queda, de 2% a 4% na Europa, e mais de 4% no Brasil, hoje feriado aqui, as bolsas no exterior se recuperam, mas a apreensão agora se volta para as eleições americanas marcadas para amanhã, porém muitos votos já foram antecipados e haverá record de eleitores, porque nos EUA o voto não é obrigatório.
As empresas que desenvolvem as vacinas prometem acelerar, mas especialistas apontam que isto não é possível e para esta variante também deve ser testada.
As vacinas estão na fase de testes
Todas as vacinas estão na fase de testes, apenas a vacina russa com seu mega imperador Putin aprovou vacinas, mas ninguém confia nelas.
O grupo americano de biotecnologia Moderna, um dos que estão conduzindo testes na fase 3 nos Estados Unidos prometendo resultados para dezembro foi solicitado em setembro dar mais transparência em seus relatórios, quase sempre entregues ao governo em caráter “confidencial” revela as pressões sobre o FDA (Agência americana de Medicamentos) pois a eleição está próxima e poderia favorecer o governo, mas a própria empresa não acredita em prazos curtos.
Outro laboratório a Pfizer, uma das vacinas mais promissoras rendeu polêmicas esta semana devido a infecção e morte de uma das pessoas recrutadas para testes, um voluntário brasileiro que faleceu, mas segundo o site Bloomberg o rapaz estava no grupo dos placebos dos testes e não recebeu a dose ativa da vacina.
Esclarecendo os testes são chamados de duplo cego, isto é nem os médicos nem os pacientes sabem que versão foi aplicada, é aplicado em alguns um placebo e em outros a própria vacina, sendo esta uma das formas mais confiáveis de testagem, somente em casos como este da morte de um voluntário a dose é revelada.
A polêmica da vacina chinesa, que ainda está sem aprovação e com prazo para outubro de 2021, teve uma crescente politização da vacina como já alertamos no post da semana passada, mais uma polarização social agora neste assunto, que deveria ser uma preocupação de todos independentemente da ideologia.
O problema da obrigatoriedade da vacina deve ser tratado de forma democrática, e a polêmica não ajuda o consenso público que neste caso já é improvável, é de se lamentar a politização do tema, a judicialização é ainda mais lamentável, lembro o caso dos drogados cuja internação involuntária não foi aprovada.
A fase de testes, segundo especialistas e a própria OMS, deve se prolongar ainda por 2021, qualquer antecipação prematura da vacina será tão grave quanto a própria pandemia, e o resultado pode ser desastroso e sujeito a processos judiciais.
Esperamos que a vacina venha, que seja um consenso mundial a sua validade, que a politização do tema diminua e que possamos sair menos polarizados da pandemia, é um tema altruísta, mas precisamos ter esperança de uma humanidade melhor, senão tanto sofrimento num ano desastroso de nada valeu.
Transformação digital além da Buzzword
Alertamos e problematizamos nos 10 anos deste blog a transformação que estava sendo encaminhada pelas mudanças digitais, aspectos sociais, educacionais, industriais e até mesmo comportamentais, boa parte dos céticos reagiam, ironizavam ou desprezavam uma mudança real que estava acontecendo.
A pandemia mostrou que as ferramentas mais do que necessárias podem construir pontes, estabelecer relações novas, dinamizar empresas e evitar desperdícios de tempo, dinheiro e principalmente nestes tempos por em perigo a saúde.
Agora todos vivem a realidade digital, empresas sobreviveram por serviços online, famílias, grupos sociais, serviços públicos e reuniões de diversos tipos dependem das ferramentas digitais, os espetáculos dependem de lives, de meetings ou postagens em ferramentas de mídias sociais.
Uma buzzword surgiu muito forte a chamada “transformação digital”, porém o perigo do oportunismo é grande de empresas e sites que exploram e mistificam estes serviços e cobram caro por ele, assim alguns conceitos são necessários, primeiro o que acontece diferente na geração Z da anterior chamada de millennials, os que são nascidos no início do milênio, portanto antes do ano 2000, que agora tem de 22 a 37 anos.
Os millenials acompanharam a evolução a Web (as páginas, sites e blogs), nasceram numa realidade em que os computadores eram uma eletrodoméstico, assim só eram usados em casa e opcionalmente na escola, enquanto a geração Z através do celular levou o mundo digital a todo lugar, criam os grupos de chats e tem um comportamento diferente com a credibilidade dos sites, blogs e mídias de redes, criam suas próprias relações e ídolos, em geral diferente do tudo que é conhecido.
Embora mais fechados e com tendência a pouca relação social, são mais críticos que os millenials, mais ansiosos, são mais eficientes e são mais exigentes.
Assim as relações com o mercado são muito diferentes, voltam a preferir as compras em lojas físicas e selecionam bem o que compram, menos impulsivos e já tem a tecnologia com um excelente apoio, embora muito conectados já conhecem os limites da tecnologia.
Grandes revistas de economia como a Forbes e a Fortune fizeram análises da geração Z para entender a transformação de mercado necessária, a Forbes diz que ela representa 25% da população mundial atual, o meio digital é parte natural da vida deles, como a TV e o rádio das gerações passadas, enquanto a Fortune afirma que 32 da geração Z se esforça para um trabalho dos seus sonhos e descartam assumirem qualquer trabalho, embora temporariamente aceite para alçar o futuro.
Assim os CRMs ( Customer Relationship Management) antigos não funcionam e muitas críticas e análises feitas para a geração millenials estão ultrapassadas.
Segundo Kasey Panetta, pesquisadora da Gartner, 5 conceitos novos são emergentes: Composite architectures, arquiteturas ágeis e responsivas, Algorithmic trust, produtos, links, sites e transações confiáveis, Beyond silicon, os limites da lei de Moore da evolução dos computadores, agora tecnologias menores e mais ágeis são procuradas, Formative Artificial Intelligence (AI) adaptação ao cliente, customização dos serviços, tempos e localização, e o conceito Digital Me, uma espécie de passaporte para o mundo digital, ferramentas e sites que já conhecem o cliente e suas necessidades, formas de comportamento e preferencias.
Portanto todo o universo digital que parecia estável também vai desmoronar e muito do que se chama “transformação digital” é só uma mistificação digital, cuidado com oportunistas.
Panetta, Kasey. 5 Trends Drive the Gartner Hyper Cycle for Emerging Technologies, 2020. Disponível em: https://www.gartner.com/smarterwithgartner/5-trends-drive-the-gartner-hype-cycle-for-emerging-technologies-2020 , Acesso em: 15 de setembro de 2020.
Politização da vacina e cuidados
Na quarta feira passada (14/10) o Ministério da Saúde do Brasil apresentou aos secretários de saúde dos estados um cronograma de vacinação contra a covid-19 que teria início em abril de 2021, a previsão é para a vacina AstraZeneca, desenvolvida em parceria com a Universidade de Oxford, que está na terceira fase de testes e deve ser produzida no Brasil pela FioCruz, em Manguinhos, no estado do Rio de Janeiro.
Alguns governadores, em especial o governo do estado de São Paulo tem interesses na empresa chinesa Sinovac, embora a China também aposte na vacina de Oxford, esta vacina está em teste feito pelo Instituto Butantan da Universidade de São Paulo, e o secretário da Saúde de São Paulo Jean Gorinchteyn afirmou a jornais paulistas que “as vacinas não estão sendo tratadas de forma republicana pelo Ministério da Saúde, pois a vacina chinesa pode ter disponível 46 milhões de doses em dezembro e mais 14 milhões até fevereiro de 2021 e 40 milhões até junho de 2021.
Mas a disputa não para aí, a gigante americana Pfizer anunciou na sexta feira (16/10) que pode solicitar uma autorização de “emergência” para sua vacina contra a covid-19 até o final de novembro, disse Albert Bourla, CEO do grupo em carta publicada nas redes sociais: “Permitam que seja claro, supondo que os dados sejam positivos, a Pfizer solicitará uma autorização de uso de emergência nos Estados Unidos pouco depois da etapa de segurança, na terceira semana de novembro, o que indica que também quer participar da disputa, embora inicie a vacinação nos EUA.
Por causa de um pedido da parceira alemã BioNTech, havia um pedido de espera de 2 meses para a segunda dose da vacina (esta vacina é em duas doses) , mas Albert Bourla mostra a politização ao afirmar que “poderíamos saber se nossa vacina é efetiva ou não no final de outubro”, lembro que as eleições americanas acontecem em 3 de novembro, e isto seria um trunfo de Donald Trumph.
Segundo a organização Mundial da Saúde, e o infectologista Claudio Stadnik da Santa Casa, apenas 10 vacinas estão na fase III, e a previsão se o cronograma for seguido, apenas as vacinas da AstraZeneca/Oxford, Sinopharm (China)/Wuhan Institute of Biological Products (China) e Sinopharm (China)/ Beijing Institute of Biological Products (China) estariam prontas em julho de 2021 enquanto a Moderna (EUA) e Sinovac/Biotech (China) em outubro de 2021.
Portanto política a parte, este seria o quadro real seguindo os preceitos sanitários e médicos, antecipar é dar possibilidade ao erro e vidas estão em jogo.
Veja o gráfico acima: Fonte: Organização Mundial da Saúde e Cláudio Stadnik, infectologista da Santa Casa.
A fadiga da pandemia e a pressa da vacina
A OMS em seu escritório da Europa lançou um documento que explica a “fadiga da pandemia” estimando que 60% da população já esteja neste estágio.
O médio Hans Henri Kluge, diretor regional da OMS para Europa, diz que o cansaço já era esperado nesta fase da crise: “desde que o vírus chegou ao continente europeu, há oito meses, os cidadãos fizeram enormes sacrifícios para conter a covid-19, o custo foi altíssimo, algo que esgotou todos nós, independentemente do que vivemos ou do que façamos. Nessas circunstâncias é fácil e natural sentir-se apático, desmotivado, sentir cansaço”, afirmou.
As medidas que aponta para continuar os esforços encontram um centro comum de buscar o senso comunitário na solução da questão: compreender o que as pessoas estão fazendo regularmente e envolver a comunidades em debates e decisões, permitir que as pessoas vivam suas vidas, mas reduzindo riscos e buscando soluções criativas, como tem sido as reuniões virtuais, as entregas de alimentos e produtos de consumo, em especial, para pessoas vulneráveis.
O outro polo preocupante é a corrida para a vacina, que deveria seguir rumos exclusivamente médicos, mas já apontam para uma competição visando o lucro com as pessoas, assim a primeira vacina a chegar no mercado não será necessariamente a melhor, e para piorar os políticos tentam tirar proveito desta corrida.
Médicos brasileiros são cautelosos, como o dr. Álvaro Furtado costa, médico infectologia da HC-FMUSP: “está todo mundo muito otimista, mas o estudo da vacina é algo muito complicado, a maioria deles para na fase 3, de testes clínicos, pelos problemas que aparecem. É importante discutir essa possibilidade (de não se ter uma vacina)”, e chegar na fase 3 não significa que está perto do final, pois a maioria das vacinas param nesta fase, como são os casos de HIV e chikungunya.
O que deve-se fazer neste caso é continuar a busca por medicações que diminuam a taxa de mortalidade e, portanto, recuperam os infectados, por exemplo, pelo vírus SARS-Cov-2, e o ensaio clínico é desenvolvido também no Brasil pela FioCruz, que faz parceria com o International Solidarity, da OMS, e no país estão em 18 hospitais de 12 estados, com pesquisa de diferentes medicações.
O estágio final da fase 3 é bem mais difícil de ser atingido e não é a propaganda política que o resolve, mas os órgãos de controle sanitário dos medicamentos.
A festa e os convidados
A festa de Babette é uma alegoria a uma festa divina, e a misteriosa cozinheira que humildemente vai trabalhar durante muito tempo em uma casa até poder anunciar e realizar a festa, os convidados apesar de desconfiados aceitam e sentem suas vidas renovadas.
O que vivemos em tempos de pandemia é a ausência da festa, mas a verdadeira festa para a qual todos fomos convidados a da fraternidade para todos e de um maior equilíbrio na distribuição de rendas, no tratamento das diversas culturas e do respeito a dignidade humana está longe de ser uma festa.
Quem foram os convidados, primeiramente aqueles que dizem ter estes princípios e que nem sempre são os praticados, ou seja, participam mais das festas das riquezas, do poder e de suas benesses do que promovem a festa que todos poderiam participar.
A pandemia deveria ser uma tomada de consciência, privados da festa, deveríamos pensar naqueles que sempre foram privados, e não procurar promover mesmo na pandemia nossa festa particular onde os amigos participam.
A parábola bíblica (Mt 22, 1-14) da festa de casamento na qual um rei chama os convidados e eles dão desculpas para não comparecerem, é uma boa explicação para o que acontece aos que foram convidados e não foram e aos excluídos que são chamados para a festa e eles vão, é diríamos uma última tomada de consciência.
Os convidados, diríamos em termos bíblicos os eleitos, não foram, então o rei manda seus empregados irem as praças, as encruzilhadas dos caminhos e chamarem a quantos encontrarem para a festa, porém na festa nota ainda alguém que não está com trajes adequados (na foto gravura de Jan Luyken).
A alegoria bíblica é para dizer que também entre os não convidados há aqueles que também não são dignos de participar da divina festa.
E se a pandemia se prolongar
Fredric Jameson chamou atenção anos atrás sobre a possibilidade de uma catástrofe cósmico (um asteróide que ameaça a vida na terra ou um vírus que matéria a humanidade), e a ameaça despertaria uma solidariedade global, pequenas diferenças são superadas e todos trabalham juntos para encontrar uma solução na vida real, agora a pandemia mostra se isto será possível ou não, se a questão fosse colocada hoje a resposta clara seria não, estamos divididos e pouco solidários.
As especulações sobre o novo normal se esgotaram, na polarização política curiosamente os dois polos erram gravemente, um ao afirmar que a pandemia é o sinal de esgotamento da sociedade que vivemos e assim iremos para uma utópica mudança, e a outra que insiste em dizer que a pandemia não existe, falta realismo a ambas.
Um exemplo desta mudança utópica está na “Sopa de Wuhan” na qual vários autores famosos da esquerda européia apontaram para um “colapso do capitalismo” devido a pandemia.
A lógica de Jameson é de compreender a pós-modernidade como uma “lógica cultural” e que esta seria uma terceira fase de expansão do capitalismo, o chamado capitalismo tardio, o que ele procura é por trás das manifestações culturais de nosso tempo entender que tipo de “lógica” elas tem, sem a necessária crítica a elas.
A discussão de Daniel Bell e Jean-François Lyotard são pontos de referência nesta discussão a partir dos anos 1970, Bell porque colocou a posição de entender que a nova fase econômica colocou a noção de capitalismo industrial no passado, e Lyotard desvendou uma modificação no estatuto de ciência e de tecnologia a partir do cenário de informatização nas sociedades desenvolvidas, porém a crítica convencional ficou presa a uma crítica superficial da chamada “tecno-ciência”.
O que ambos advogam e aqui dão força a uma terceira via de mudança, nem capitalismo nem socialismo, é uma cisão com o pensamento moderno e com a própria experiência da modernidade, algo que se vinculada tanto ao impacto das revoluções científicas e tecnológicas a partir dos anos 1960, e que colocou em colapso todas as narrativas modernas, que estão situadas historicamente em um ponto do passado da história recente e não apontam para um futuro claro.
Assim é a pandemia, a ausência de um futuro claro, ela nos desafia a repensar o futuro sem as narrativas convencionais, e o segundo ciclo da crise pandêmica já é a lógica que aponta para um futuro, sem mudar de atitudes e comportamentos sociais o futuro não será promissor, independente do surgimento da vacina, outros vírus poderão vir e não aceitaremos momento de pausa, de isolamento e de menos pressa no cotidiano, estamos presos a lógica da produção industrial e do consumo.
Há uma lógica mais profunda que é a relação aórgica, o inorgânico sobre o orgânico, que Sloterdijk defende e que Hölderling falava, alguns místicos também.
Redes e Bolhas
Uma sociedade que já vivia em bolhas, sejam elas culturais, políticos ou religiosas, se viu ainda mais presa as suas folhas com a pandemia e o isolamento social, ainda que isto tivesse um aspecto positivo de recuperar as relações intra-bolhas, porém as extra-bolhas parecem que terminaram por serem prejudicadas.
A pandemia mostrou que é impossível viver num isolamento, ainda que em muitos lugares foram tomadas medidas rígidas, e defendo-as como necessárias em muitos casos, o vírus não tem fronteiras, raça ou limites que não possa atingir, e o fim do isolamento social pode não ser tão benéfico como se imagina, os riscos no aspecto sanitário e também os problemas sociais agravados pela pandemia criam um cenário complexo.
É preciso rever o pensamento intra-bolha, aquele que provoca um isolamento social, voluntário ou involuntário, como é o caso das discriminações de todos tipos e não excluo as religiosas, e é preciso sanar o relacionamento extra-bolha, aquele que saindo do nosso grupo de segurança, nos leva ao encontro do Outro.
As redes sociais são um alento, sempre lembrando que não são as mídias de redes sociais exclusivamente, o conceito é mais amplo, é justamente na análise destes contornos fora das bolhas, que a potencialidade das redes se manifestam: a importância dos elos fracos, a análise dos “mundos pequenos” e até mesmo a pandemia pode ser olhada sob um prisma de redes sociais ajudando a análise dos contágios e auxiliando planos de controle.
Olhando a história foram pessoas e situações de contorno que criaram situações e soluções novas, aquelas condições que estão no limite ou fora das bolhas, que s]ao importantes e que via de regra a sociedade e o pensamento conservador as exclui, porque de alguma forma desestabilizam a “bolha”.
Profetas e oráculos na antiguidade foram rejeitados, inclusive pelas bolhas a qual pertenciam, são os casos icônicos de Jesus e Sócrates, por exemplo, mas na história são muitos casos que estão neste limite, e deve-se identificar quem são estes casos no presente, para estar a atento a soluções novas e realmente criativas.
É simbólica para explicar esta situação a parábola evangélica do vinhateiro que chegada a época da colheita manda empregados a sua vinha para receber o que lhe cabia que está em Mateus (Mt 21,33-43), os empregados são espancados, apedrejados e mortos, depois de dois envios o dono da vinha resolve mandar o próprio filho, e ele desperta uma cobiça ainda maior e é morto, e então estes maus vinhateiros tiveram a lição que mereciam.
É importante notar que são os que cuidam da vinha que fazem estas atitudes perversas, isto é, estão dentro das bolhas, assim as primeiras contradições nascem dentro das bolhas e depois se refletem fora, ter uma atitude de abertura ajuda a resolver problemas e prevenir situações limite.
Um trabalho sobre análise de redes da pandemia
Cientistas chineses propuseram um método de mostrar visualmente, de maneira simples, o risco de pandemia em regiões com diferentes graus de conexão, a partir das bases de dados dos casos de infecção (relatados e confirmados do COVID-19) usando análise de redes, em artigo publicado pela Elsevier em Jornal da Desastres de Infecções.
As análises de redes já têm sido utilizadas em pesquisas médicas para estudos de co-expressão gênica, co-ocorrência de doença e topologias das dinâmicas de propagação de doenças infecciosas.
O estudo pesquisou os casos de COVID-19 confirmados na China desde o final Janeiro até março de 2020 e estes casos foram divididos em 9 períodos de tempos.
Os gráficos de redes construídos com base na correlação das mudanças no número de casos confirmados entre duas áreas geográficas (por exemplo, nas provinciais da China), se a correlação dava maior que 0,5 significava que as áreas conectadas estavam em uma rede.
O risco de pandemia era analisado com base nas frequências em diferentes regiões conectados nos gráficos de redes, com isto foi possível avaliar os níveis de co-evolução entre as regiões e com isto tomar medidas conforme cada caso.
O que o estudo demonstrou foi não basta confiar em casos relatados e confirmados da COVID-19, a análise de rede fornece dados para uma visualização poderosa e clara do risco de pandemia e a análise de rede pode complementar as técnicas de modelagem tradicionais, e segundos os autores estes dados podem fornecer evidências mais oportunas para informar futuros planos de preparação.
Futuros trabalhos quantificando a conexão da rede devem ser considerados em pesquisas e planos de pandemia.
Soa, M.P.K; Tiwarib, Agnes; Chud, Amanda M.Y.; Tsangd , Jenny T.Y.; Chan, Jacky N. L.. Visualizing COVID-19 pandemic risk through network connectedness Mike. International Journal of Infectious Diseases, 96, 2020, p. 558-561. Disponível em: https://www.ijidonline.com/article/S1201-9712(20)30317-9/fulltext , Acesso em: 29 de setembro de 2020.