Religião, antropologia e filosofia
O iluminismo e a filosofia moderna no pressuposto de abolir toda “superstição” instaurar uma época do conhecimento e da razão, dividiu o sistema de conhecimento em sujeito e objetos, a filosofia medieval não era muito distante disto haviam realista e nominalistas e nenhum venceu, tudo se modificou, e tudo que era considerado “metafísico” incluindo o Ser ficou de lado.
Porém as ideias de conceitos, estruturas que deviam desenvolver o conhecimento já estava presente num autor pouco lido, mas importante: Boécio (400 – 524 d.C.), um filósofo, poeta, estadista e teólogo romano, cujas obras tiveram uma profunda influência na filosofia cristã do Medievo.
Sua obra principal é a “Consolação da Filosofia”, porém é dele a “roda da fortuna” e um fragmento encontra que ficou conhecido como “querela dos universais”, se os universais (conceitos seriam hoje) seriam hoje “se os universais são coisas ou meramente palavras”, daqui pode se entender a divisão entre realistas que veem as coisas e nominalistas que defenderam os “nomes”, as palavras.
Porém tanto Boécio, como mais tarde Tomas de Aquino que estudaram e traduziram as obras gregas, com interpretações próprias, a questão do Ser era presente e a questão da história e da verdade também.
Sua contribuição humanística está na concepção do que hoje chamamos de “dignidade humana”, para sua Antropologia Filosófica a pessoa humana no horizonte da racionalidade considerando o seu dado de singularidade, um novo humanismo não pode prescindir de seu prisma novo e ainda pouco entendido, para os cristãos Boécio foi defensor contundente da fé e para os humanistas sua De Consolationes Philosophiae traz colaborações imprescindíveis.
Mesmo hoje suas ideias podem parecer polêmicas, ao defender que o homem é também natureza, mas dela deve subsistir e alcançar como extensão de “natureza”, diz em outra obra:
“Ou, se ‘pessoa’ não se iguala a ‘natureza’, mas se ‘pessoa’ subsiste sob o alcance e a extensão de ‘natureza’, é difícil dizer a que naturezas ela sempre ocorre, isto é, a quais naturezas convém conter ‘pessoa’ e quais delas não convém afastar do vocábulo ‘pessoa’. Com efeito, isto é manifesto: ‘natureza’ é subjacente a ‘pessoa’ e não se pode predicar ‘pessoa’ para além de ‘natureza’” (Boécio, Contra Êutiques e Nestório, 2005, p. 163).
Num momento em que o antropocentrismo é questionado e a relação com a natureza é revista é importante ler este filósofo, teólogo e humanista medievo.
BOÉCIO. Escritos (OPUSCULA SACRA). Tradução, introdução, estudos introdutórios e notas Juvenal Savian Filho. Prefácio de Marilena Chauí. São Paulo: Martins Fontes, 2005.