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Deserto ou nihilismo
Dito de forma simplista, o nihilismo é a ausência de sentido das coisas que parece refletir nos dias de hoje, isto faz o homem não desejar o sentimento de vazio, de contemplação e de deserto que ao contrário busca captar o sentido mais profundo das coisas fazendo um “silêncio interior” e não um “vazio interior” nihilista.
Para Nietzsche foi a crença nas categorias da razão que nos fizeram acreditar num mundo que foi construído por meio de falsas referências, e mesmo os críticos na modernidade, em sua maioria quando não percebem este ´estado psicológico´ idealista e vazio, estão presos a ele e ficam andando em círculos procurando respostas ora num falso subjetivismo de diversas formas (religioso, ideológico e até poético), ora num falso objetivismo da “vita activa” preconizada por Hanna Arendt, mas que o filósofo Byung-Chul completa com a “vita contemplativa”.
Sobre o nihilismo, segundo Giacóia Junior (2007), “Nietzsche tematiza três formas do niilismo, considerado como ‘estado psicológico’, ou seja, como conteúdo da consciência reflexiva. Em cada um deles, trata-se sempre de uma categoria da razão, que dá apoio a uma interpretação do vir-a-ser e do e do valor da existência humana na corrente do devir”, este cai no desalento do “foi tudo em vão”.
A segunda é uma necessidade de totalidade, o que hoje se diz como a ausência de um discurso único, aquilo que comenta Giacóia como : “forma do niilismo como estado psicológico é presidida pela categoria de “totalidade” – enquanto suporte de uma interpretação global do vir-a-ser. A representação de uma unidade, de uma organização e sistematização globais conectaria a multiplicidade caótica dos seres individuais, contingentes e efêmeros, a uma totalidade integrada e orgânica – a um todo racional, de infinito valor (panteísmo, monismo, etc.), promovendo a reconciliação entre a finitude aleatória e o infinito necessário”, como é um discurso completo cai no simplismo.
A terceira forma, que nada mais é que uma conjunção das duas anteriores comenta Giacóia, é uma “forma do niilismo surge como consciência da mendacidade do mundo metafísico, e como descrença na categoria de verdade – com a descoberta de que o vir-a-ser é a única realidade – uma realidade, contudo, que não conseguimos suportar.”, em geral volta-se a um subjetivismo puro idealista ou a um ativismo desenfreado do “fazer”.
O deserto visto com busca do Ser, abertura ao estado de atividade de contemplação, ou contemplação da atividade, é uma reviravolta ontológica, penetração no subjetivo do Ser, para encontrar o objetivo de nossas atividades, nada foi em vão, o que menos serviu, foi útil como aprendizado, ou serviu para servir a nossa experiência, mas um deserto é necessário para esta retomada, senão cairemos nos mesmos vícios e erros, os caminhos já trilhados, é preciso “ir para o deserto”, como fez o profeta João Batista, Jesus e muitos outros místicos.
GIACOIA JR, Oswaldo. “Nietzsche: fim da metafísica e os pós-modernos.” In: Metafísica Contemporânea, Cap. 1, por Guido Imaguire, Custódio Luis S. Almeida,Manfredo Araújo de Oliveira (Org), p. 13-39. Rio de Janeiro, RJ: Vozes, 2007
Compreensão e Hermenêutica
A compreensão leva a sabedoria e certamente sabedoria é o oposto de ignorância, mas é possível uma sabedoria que brote da tradição e da vivência sábia, porém mesmo estas deverão ter presentes interlocutores que mergulharam em pensamentos e reflexões de outros, e que estes leram em algum lugar a tradição e os problemas da humanidade.
A ideia que apenas em um livro exista toda sabedoria é refutada até mesmo pelo filósofo cristão Tomás de Aquino com sua famosa máxima; “desconfie do homem de um livro só”, também Marx foi ler a economia “capitalista” de Adam Smith e Ricardo para escrever seu famoso “O capital”, mas é preciso dizer que poucos leem a Bíblia, o Capital, ou qualquer outro livro de referência básica ao pensamento de “tradição” que afirmam ter.
Edmund Husserl, Martin Heidegger, Hans-Georg Gadamer, Emmanuel Lévinas, Paul Ricoeur, Edgar Morin e muitos outros atestam que há uma crise no pensamento, ao menos no pensamento ocidental, pois há pouca leitura e aprofundamento no pensamento do mundo árabe e do oriental, o africano é quase incógnito.
Outra ideia é a de reduzir a cultura a ideologias, sendo que o exercício delas é na maioria das vezes submeter as culturas ao seu esquema de pensamento, Paul Ricoeur escreveu “a ideologia é esse menosprezo que nos faz tomar a imagem pelo real, o reflexo pelo original” (Ricoeur, 2013, pag. 84) e esta talvez seja o maior confucionismo de nosso tempo.
Sabedoria envolve compreensão, e a hermenêutica é a ciência da compreensão, porque envolve interpretação, superação de pré-conceitos, compreensão e diálogo e revisão d conceitos, o assim chamado círculo hermenêutico, cuja elucidação é feita por Gadamer.
Ainda que Gadamer o veja como preso a um historicismo romântico, Dilthey identificou três classes de compreensão: a primeira que ele chama de “juízos e as formações do pensamento maiores”, relacionada a ciência que inclui tanto as naturais como as ciências humanas, são exemplos um livro texto de biologia ou de matemática, mas também pode incluir conceitos como gravidade e outros presentes no senso comum; o segundo é a experiência vivida e são estas que levam as ações mas deveriam passar pelas primeiras, chama isto de nexo vital.
Exprime sobre a segunda como “tirando a elucidação de como uma situação, um propósito, um meio e um nexo vital se interseccionam numa ação, ela não permite nenhuma determinação inclusiva da vida externa da qual surgiu”.
A terceira a mais essencial são as expressões da experiência vivida, dita assim por Dilthey: “Uma expressão da experiência vivida pode conter mais nexo de vida psíquica do que qualquer introspecção pode perceber”, assim em parte ocorre devido a aspecto da compreensão que ainda não se percebe, penetrar nisto leva a um círculo hermenêutico voltando a juízos e formações maiores, embora Dilthey não tenha formulado assim, seria o círculo hermenêutico.
DILTHEY, W. Obras escolhidas – vol. 3 A fundação do mundo histórico nas ciências humanas, 2002.
RICOEUR, P. Hermenêutica and Ideologias, 3ª. Edition, São Paulo: Vozes, 2013.
Conhecimento e compreensão
Quando a informação está em nossa mente ela se torna conhecimento, mas nem sempre isto significa compreensão, repetir máximas (ditados, belas frases, etc.) não significa que temos conhecimento, porque a informação não passou pela etapa da compreensão.
Isto não é uma patologia moderna, ou simplesmente que a TV, a Internet ou algum vírus invadiu nossa mente e nos prejudicou a capacidade de conhecer, ainda que algumas pessoas possam ter dificuldades, alguém com Alzheimer ou uma criança dispersiva, porém tenho a impressão que o chamado “déficit de atenção” foi longe demais, e é um fator social que torna algo difícil de compreender, na Alemanha e a na França, há sempre um assistente social de plantão e não um médico ou farmacêutico para ministrar remédios às crianças.
Um dos problemas graves de nosso tempo, alerta Edgar Morin, é que estamos acostumamos a acreditar que pensamento e prática são compartimentos distintos da vida, ou de maneira mais grave ao pensamento já estruturado, o mundo da teoria e o da prática.
Assim para ideólogos significa que quem pensa o mundo não faz o mundo e vice-versa.
Porém se olharmos ao longo da história houve um tempo em que os sábios, eventualmente chamados de cientistas ou artistas, circulavam por diversos campos da cultura. Matemática, física, arquitetura, pintura, escultura eram matéria-prima do pensamento e da ação, também relembrou Morin em uma palestra em 2015 no Brasil, no Programa Milênio.
A revolução industrial derrubou a ideia do saber renascentista e, desde o século 19, a especialização foi ganhando força e nos esquecemos de religar os saberes, um apelo de Morin para a educação.
Perguntado como ensinar e o que é conhecimento, Edgar Morin respondeu: “Eu proponho, no ensino, a introdução de temas fundamentais que ainda não existem. Quer dizer, proponho introduzir o tema do conhecimento, pois damos conhecimento sem nunca saber o que é o conhecimento. Mas, como todo conhecimento é uma tradução seguida de uma reconstrução, sempre existe o risco do erro, o risco de alucinações, sempre.”
Quantas nas áreas das ciências, das tecnologias e que é mais lamentável na área das patologias, nunca se viu tantas patologias, classificar as pessoas segundo patologias não é senão a forma patológica mais grave, vê-se só o mundo cinzento, não há luz e nem esperança.
Questionado sobre as ferramentas que surgiram nas últimas décadas, entre elas o mundo digital, Morin respondeu: “Antes de mais nada, é verdade que informação não é conhecimento. Conhecimento é a organização das informações. Então, estamos imersos em informações e como elas se sucedem dia a dia, de certa forma, não temos como ter consciência disso. De outra parte, os conhecimentos, como eu disse, estão dispersos. É preciso uni-los, mas falta esse pensamento complexo.”
O simplismo é a forma mais desorganizada de conhecimento, é o reducionismo, é ver a vida e os homens sem toda beleza que há neles … portanto, não é simples assim (expressão muito usada).
Complexidade, simplificidade e pureza
Parecem contraditórios em tempos de crise, mas não é, na verdade o reducionismo é a tentativa de reduzir o humano, o natural e toda a complexidade da vida em verdades dogmáticas e por isso nada simples e nada puras, porque simples não é simplificidade por desconhecimento ou preconceito.
O Complexo é justamente entender que cada pessoa, o conjunto da sociedade, cada ser da natureza e o conjunto do universo se relacionam, interagem num todo complexo e que tudo isto é simples se estiver abertos ao Outro, à Natureza e a TodosUniverso que nos rodeia.
Encontramos nas pessoas mais simples, a complexidade da vida e a sabedoria que penetra nas revelações mais profundas da Natureza e do Universo,
Mahatma Gandhi afirmava que se toda literatura ocidental se perdesse e restasse só o Sermão da Montanha, nada se teria perdido, e ele não era cristão.
Einstein afirmava que era mais fácil quebrar um átomo que um preconceito, pois é na complexidade da formação e do pensamento humano que encontramos muitos problemas, maiores em tempos em que a modernidade quer se afirmar diante de valores já decadentes: sua moral, seu modelo de estado, de harmonia social e de visão de mundos estão em cheque.
Dentre as bem-aventuras que nada mais são narradas no texto bíblico de Mateus , todas bem-aventuranças são importantes, porém duas nos remetem diretamente ao centro da revelação que são: Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a face e Deus e Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus, pois ambas nos colocam diante de Deus: de sua face e como sua filiação.
Em momentos de tanta malícia, de confianças cada vez maiores que geram divisões e confrontos, a pureza (que não é ingenuidade reducionista) é um valor essencial, reclamou Adorno em Minima Moralia, “que mundo é este em que até uma criança desconfia de um presente”, e diríamos do mundo que nem mesmo a justiça a qual deveríamos ter respeito parece não merecê-lo.
Que tipo de paz queremos, que tipo de mansidão queremos (Feliz os mansos porque herdarão a terra), eis a questão que nos é interpelada pelos tempos sombrios que vivemos.
Diversas imagens podemos lembrar de bem-aventuranças na bíblia: o samaritano (que socorre alguém que foi ultrajado), Zaqueu (que era um usurpador e se arrependeu), cegos, viúvas e tantos outros personagens, mas talvez a maior bem-aventurança esteja diante de Madalena, a ex-prostituta que muda radicalmente de vida e torna-se uma das mais fiéis no seguimento de Jesus.
A imagem dela diante da bem-aventurança de ter encontrado seu perdão é a figura (desenho) mais essencial para uma sociedade corrompida e com dificuldades de retomar seu caminho.
Duas palestras abrem o EBICC
“A base da auto/não distinção na vida e na mente”
Esta será a palestra de Terrence Deacon na abertura do evento Encontro Brasileiro Internacional de Ciências Cognitivas, Deacon é professor da BerKeley US e um antropólogo e biosemiótico sobre o qual já escrevemos alguns posts.
Resumo:
Deacon irá descrever uma organização dinâmica comum que subjazia a sensibilidade vegetativa auto conservadora característica de todos os organismos vivos e mostra como isso é relevante para a neurologia da sensibilidade subjetiva; isto é, a consciência. A dinâmica básica envolve processos auto organizados que se restringem reciprocamente e se preservam mutuamente e, assim, criam uma descontinuidade autossustentável.
Seu argumento que a diferença entre a sensibilidade vegetativa e subjetiva é devido ao modo como a sensibilidade subjetiva é constituída por uma relação entre a sensação vegetativa neurológica de ordem superior e a sensação vegetativa somática da ordem inferior. Uma vez que cada um depende do outro, mas de maneiras hierarquicamente assimétricas, isso cria o que Hoffstadter descreve como um “loop estranho” emaranhando esses dois níveis de sensibilidade. Ele fornecer exemplos dessa organização dinâmica em contextos orgânicos e neurológicos.
“Conhecimento e incerteza na física – Fundamentos e aplicações”
A segunda palestra na abertura do EBICC será proferida por Constantino Tsallis, físico de renome internacional que generalizou os resultados da constante de Boltzmann, importante para os fundamentos da entropia.
Resumo da palestra
Os pilares da física contemporânea são considerados a mecânica estatística newtoniana, relativista e quântica, o electromagnetismo de Maxwell e a mecânica estatística Boltzmann-Gibbs (BG). É dentro desse domínio que surgem as quatro constantes físicas universais, a saber, a constante gravitacional de Newton G, a velocidade da luz c, a constante de Planck h e a constante de Boltzmann k. A teoria das probabilidades e a noção de incerteza entram em todas essas teorias de uma maneira ou de outra. No entanto, nas estatísticas BG e, consequentemente, na termodinâmica, eles desempenham um papel absolutamente crucial através do conceito de entropia. Entropy foi introduzida por Clausius por volta de 1865 e sua conexão com o mundo microscópico (átomos e outros) foi introduzida pela primeira vez por Boltzmann, e mais tarde por Gibbs, na década de 1870. Desde então, tornou-se habitual em física e em outros lugares considerar que a expressão BG é a única entropia fisicamente admissível. No entanto, foi avançado em 1988 (C. Tsallis, Journal of Statistical Physics 52, 479) que não é assim. As motivações históricas, os fundamentos epistemológicos e as aplicações ilustrativas em sistemas complexos naturais, artificiais e sociais, desta teoria serão brevemente apresentados e discutidos
A Biosemiótica e Terence Deacon
Natureza Incompleta: Como a Mente emerge da Matéria é um livro de Terrence Deacon, antropólogo e biosemiótico, que aborda as origens da vida e o filosofia da mente, com novas tentativas de resposta de como a natureza emergiu.
O livro procura explicar conceitos como intencionalidade e normatividade em um propósito diferente ao da fenomenologia, mas considerando-os com um propósito mais funcionalista, chama entenacionais (no sentido ontológico de entes), mas agrupados e por isso “nacionais”.
O livro explora as propriedades da vida, o surgimento da consciência e a relação entre processos evolutivos e semióticos.
O livro especula sobre como propriedades como informação, valor, propósito, significado e comportamento direcionado final surgiram da física e da química.
Os críticos do livro argumentam que Deacon atraiu fortemente as obras de Alicia Juarrero e Evan Thompson sem fornecer citações completas ou referências ao autor, mas uma investigação da UC Berkeley inocentou Deacon que é professor lá.
Em contraste com os argumentos apresentados por Juarrero em Dynamics of Action (1999, MIT Press) e por Thompson in Mind in Life (2007, Belknap Press e Harvard University Press), Deacon rejeita explicitamente as afirmações de que fenômenos vivos ou mentais podem ser explicados por dinâmicas abordagens de sistemas.
Em vez disso, Deacon argumenta que as propriedades da vida ou da mente só emergem de uma relação recíproca de ordem superior entre processos auto-organizados.
Terence Deacon estará em São Paulo, no evento de Ciências Cognitivas EBICC.
Complexidade, consciência e AI
Já afirmamos que tanto a complexidade como a consciência são fenômenos que pertencem a natureza biológica, e foram emprestados as chamadas ciências “exatas”, mas a AI (Artificial Inteligente) continua tendo avanços, quais seriam então os equívocos de noções equivocadas deste campo ?
A resposta do professor de tecnologia do MIT Rodney Brooks, que trabalha com a robótica para a Panasonic é que há 7 pecados capitais, e ele cita a lei de Amara ao dizer que as pessoas tendem a subestimar tanto o efeito a curto prazo quanto ao de longo prazo da tecnologia ao examinar uma tecnologia inexistente, enquanto um outro fatos é confundir hipóteses onde a AI teria uma igual competência para resolver o problema de uma tecnologia inexistente.
Um terceiro fator apontado por Brooks é que a suposição frequentemente de praticar uma tarefa é frequentemente confundida com uma tarefa realizada por AI igual a competência.
Brooks também diz que as pessoas são propensas a paralelizar o progresso AI na aprendizagem de uma determinada tarefa para o mesmo processo em seres humanos, por isto sempre aparece a ideia de híbridos humano/máquinas.
Brooks afirma também que as pessoas não devem esperar que AI continue a progredir constantemente em um caminho de desempenho exponencial, mas sim em ajustes e reavaliações, e não devemos acreditar em cenários feitos pela mídia com situações inesperadas na AI.
É disto que tratava a ficção científica de Odisseia 2001, onde o computador que tomava decisões diabólicos jamais existiu e assitir o filme hoje mostra a irrealidade daquela ficção, já Blade Runner se atualizou em 2049 e pergunta se máquinas tem almas, a pergunta do escritor que inspirou o filme é se as máquinas sonham com ovelhas elétricas (no romance de Philip K. Dick_, e porque máquinas dormiriam ? e porque máquinas dormiriam ?
Aliás a figura do cachorro do velho caçador de Androides, também chamar Harrison Ford para o papel foi interessante em referência ao romance que inspirou o filme.
O artigo completo de Rooney Brooks publicado na Technology Review da semana passada é bastante interessante e separa 7 falácias sobre a AI.
O caçador de Androides é replicante
O replicante significa uma máquina com feições humanoides e em poucas coisas além da feição se aproxima do humano, no caso dos androides de Blade Runner 2049, o olho ou melhor o fundo da íris que tem um tom alaranjado é o grande diferencial, porém sendo máquina possui características que são super-humanas, por exemplo, a força, a velocidade e muitas outras características poderão ser humanas, mas robôs teriam alma ?
Ou fazer a pergunta mais comum na mídia, robôs dormem contando carneirinhos que são máquinas, entretanto a pergunta mais forte desde o início da primeira versão do filme de 1982, é se Rick Deckard (Harrison Ford), o caçador de androides é um também androide, e lógica diz isto porque caçar “máquinas” só mesmo para máquinas.
Uma pergunta que o diretor já respondeu afirmativamente, mas há uma dica no filme quando ele conta que sonhou com um unicórnio (a referência já é pela nossa classificação um replicante, pois tem coisas supra-humanas como um chifre), e alguém já sabia do seu sonho, isto é, os replicantes tem até mesmo seus sonhos projetados, mas porque o “criador” o preservou, uma pergunta que ele próprio se faz.
Ou outro diálogo de Rick Deckard esclarece: “Replicantes são como qualquer outra máquina – eles são um benefício ou um perigo. Se eles são um benefício, não é meu problema”, ou seja, interessa construir uma máquina que ela cuide do perigo que oferecem as outras.
Mas isto é esclarecedor em outro ponto também, há humanos preocupados com as máquinas e isto significa que sem saber que existem perigos, no diálogo Deckard diz como qualquer outra não deveria ser um empecilho para sua existência, o empecilho no fundo é o medo, por isso ao meu ver existe sempre este tom meio sombrio na primeira e segunda versão, chamado pelo refinamento cult de “noir”.
As máquinas e os avanços sempre trazem problemas, desalojam as coisas do lugar de conforto, mas não há como fazer omelete sem quebrar os ovos, é preciso ver os que estão podres, os computadores “sombrios” da Odisséia 2001 já passaram, os androides passarão, o futuro nos pertence, o homem é protagonista de seu futuro, ou ao menos deve desejar sê-lo.
O futuro de máquinas pensantes
Fizemos questão de fazer as classificações entre cyborgues, androides e humanoides (post), mostrando que os híbridos ainda são uma ficção para alguns e um delírio para outros, como a nosso ver é o ponto de singularidade de Raymond Kurzweil.
Pontos de singularidade m(é bom dizer tecnológico, pois existem outros) seria aquele ponto onde haveria uma superação do humano biológico para um pós-humano tecnológico, de silício ou ainda algo mais futurista, fotônico ou neo-biológico (chips biológicos, por exemplo).
As definições de Raymond Kurzweil são mais claras e precisas sobre tal singularidade, escreveu em 1987 A idade das máquinas inteligentes (The Age of Intelligent Machines ) e depois num delírio ainda maior uma atualização para The Age of Spiritual Machines, onde ele procura encontrar onde estaria o chamado Transcedent Man (documentário de 2009), e ai podemos delinear suas ideias.
Pode-se delinear suas ideias em 4 pontos: a evolução tecnológica até a sua definição de singularidade é um dos objetivos tangíveis da humanidade (será?) pela progressão exponencial, a funcionalidade do cérebro humano é quantificável em termos de tecnologia e poderá ser construída num futuro próximo (mas é só funcional); os avanços médicos podem manter uma quantidade significativa de sua geração viva o suficiente para que o aumento da tecnologia passe o processamento do cérebro humano (uma coisa não implica na outra, poderia ser feito com gerações futuras), e um ponto que é socialmente interessante que a teoria das evoluções aceleradas.
Esta teoria diz que a teoria das mudanças aceleradas diz respeito ao aumento na taxa de inovação tecnológica (e às vezes pode ser acompanhada de evolução social e cultural) e sempre este presente na história, o que pode sugerir a mudança mais rápida e mais profunda no futuro, embora isto seja verdade o quão acelerado depende da perspectiva histórica.
Definimos esta evolução como noosfera, uma esfera da mente ou do espírito, fundamentada na ideia de John Searle, que o mental “real e ontologicamente irredutível” ao físico, e que as tecnologias evoluem e aceleram o crescimento humano mas estão separadas por aquilo que Juergen Schmidhuber chama de “singularidade do ômega”, algo ao mesmo tempo parecido e diferente do ômega de Gregory Chaitin, pois não é um número ou um metanúmero, mas aquilo que Teilhard Chadin (1916) define em sua noosfera como o princípio e fim do humano, mas envolto numa conexão de mentes e espíritos como se fossem vasos comunicantes.
Para Juergen Schmidhuber, o próximo Omega – 2040 (não havia o filme Blade Runner 2049) a partir de sua série Omega – 2^n vidas humanas (n < 10; uma vida – 80 anos) cerca de etapas mais importantes de acontecimentos aconteceriam na história humana.
Ele questionou a validade de tais mudanças, sugerindo que apenas refletem uma regra geral para “tanto a memória individual do ser humano único e da memória coletiva de sociedades inteiras e seus livros de história: quantidades constantes de espaço de memória alocado para obter exponencialmente maior, adjacente intervalos de tempo cada vez mais para o passado”, e trata-se de memória e não a lei de Moore que fala do crescimento de memórias digitais.
Sua sugestão é que a “razão porque nunca houve uma escassez de profetas prevendo que o fim está próximo – os eventos importantes de acordo com sua própria visão do passado sempre parece se acelerarem de forma exponencial”, então tanto profecias antigas quanto modernas não são mais que oráculos que estabelecem esta religação atualizada entre o “ômega” do princípio e fim, anunciando grandes mudanças e ao mesmo tempo conectando-as.
Há um exemplo muito claro da aceleração de Jürgen Schmidhuber, dado no livro de Wurman, “A ansiedade da informação” (1991), onde diz que uma pessoa que leu o New York Times durante um ano, leu mais que o melhor o mais letrado dos homens do século XVIII e anteriores, então é claro que há mais leitura hoje que nos séculos anteriores, mas o pensar …
Referências:
Kurzweil, Ray The Age of Intelligent Machines, 1987.
Kurzweil, Ray Ensaio: A teoria das mudanças aceleradas, 2001.
Markoff, J. When A.I. Matures, It May Call Jürgen Schmidhuber ‘Dad’ New York Times, nov 2017, Disponível em: https://www.nytimes.com/2016/11/27/technology/artificial-intelligence-pioneer-jurgen-schmidhuber-overlooked.html , Acesso em: janeiro de 2017.
Wurman, Richard Saul. Ansiedade de Informação. São Paulo: Editora Cultura, 1991.
Robôs autônomos ?
Robôs autônomos é a denominação para aqueles que dentro de limites ambientais, podem realizar os objetivos desejados (por humanos ou por tarefas organizadas em um algoritmo) nestes ambientes desestruturados sem a ajuda humana, por isto o são em certos níveis.
Por exemplo, dentro de uma fábrica onde tarefas mecânicas são realizadas, para evitar acidentes o seu espaço geográfico é limitado e deve detectar algum defeito que possa cumprir determinada tarefa fora do previsto, já um robô espacial deve ter menos limites e ser o mais autonomo possível, por estar sem a possibilidade de uma ação humana direta e ter dificiuldades de comunicação devido a distância.
O projeto chamado SWARM, financiado pela União Européia e que já fizemos um post, agora tem o primeiro sistema multi-robôs de autono montagem que tem coordenação sensório-motor observando robôs parecidos ao seu redor, eles vão variar de forma e tamanho conforme sua tarefa e/ou ambiente de trabalho.
Um ssitema “cerebral” central coordena todos eles, através de um sistema chamado MNS (Sistema Nervoso Combinal, em português), e assim são reconfigurados absorvendo diferentes capacidades mas combinadas por um único controlador central.
Eles também podem se dividir e realizar tarefas de auto reparo, eliminando partes do corpo com defeito, incluindo uma unidade cerebral com algum defeito, claro que pode-se definir que estes defeitos e auto reparos possuem limitações conforme a complexidade.
Em robos autônomos, o aprendizado refere-se a aprender e ganhar novas capacidades sem assistência externa e ajustar estratégias de acordo com o ambiente, o que pode fazer com que sua autonomia aumente, mas pelo que se pode ler do artigo ainda não é o caso.
O modelo atual tem 10 unidades, e os autores apontam no paper publicado na Nature Communications, afirmam que o projeto é escalável, tanto em termos de recursos computacionais para controle robótico quanto tempo de reação para estímulo, dentro do sistema.
Olhando para o futuro, a equipe sugere que os robôs provavelmente serão projetados para adaptação aos requisitos de tarefa em mudança e não mais somente para tarefas específicas.