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Arquivo para a ‘Política’ Categoria

A crise precede o advento promissor

11 dez

É preciso coragem (já postamos aqui sobre virtude cardeal da “fortaleza”) em tempos de crises, valores, instabilidades, relações sociais confusas e muitas pré-ocupações (ocupações antes do tempo).

É normal nestes tempos pessoais ou sociais que a mente se projete para o passado ou futuro, o futuro gera ansiedades e o passado remorsos ou angústias, claro se mal interpretados ou mal colocados, porque em geral é uma passagem a um futuro promissor, um advento, algo a vir.

Não podemos estar sufocados por preocupações que ainda não se materializaram, mas não podemos ser inocentes ou provincianos a ponto de olhar somente um mundinho ao redor, a vida e o mundo vão além de nossos próprios horizontes e sempre há algo promissor a frente.

Byung-Chul Han escreveu sobre a Sociedade Paliativa: a dor hoje, eram reflexões devido a pandemia, porém com um horizonte largo que via uma sociedade que quer abolir a dor e o sofrimento, porém eles existem e são parte inalienável da vida.

As guerras, agora sobre perspectivas de tréguas (vejam o post anterior), uma crise social ao mesmo tempo de valores e de perdas de muitas conquistas anteriores, não é apenas sinal de crise é sinal que algo virá, há um advento que toda a humanidade espera.

Porém cada um tem sua própria ansiedade, um futuro que imagina e até mesmo uma volta ao passado, uma Paris no seu auge que as luzes de Natal podem inspirar, uma Lisboa com seus bons valore nacionais (é triste que nasça um nacionalismo um pouco doentio), porém isto pode ser uma alavanca para pensar num futuro sustentável, uma nova era em que não apenas o mundo eurocêntrico se ilumine, mas também os povos historicamente colonizados.

Na cultura africana, ou afro-americana há celebrações, que embora tenha também origem no Canadá e na região do Caribe, são celebrações que vão de 26 de dezembro a 1º. de janeiro, a Kwanzaa.

Os valores de comunidade e união familiar depois de uma violenta rebelião de Watts (causada por abuso policial contra um jovem negro em 1966), um professor negro Dr. Maulana Karnga, presidente do Centro de Estudos Negros na universidade Califórnia State criou a “matunda ya kwanza”, que significa “primeiros frutos”.

Este é um exemplo do nascimento de um “fruto bom” resultado de uma crise, criando uma festa com canções, danças e batuques com tambores africanos, leitura de histórias e poesias próprias da cultura e uma grande refeição tradicional feita em família ou em grupos sociais.

Ali são lembrados princípios da cultura suali (língua tradicional no Quênia, mas muitos povos africanos falam), um castiçal (Kinara) é aceso com velas de várias cores, ali relembram o “Harambee” que significa “reúnam todas as coisas” e “vamos fazer juntos”.

Não são princípios diferentes da boa cultura ocidental (aquela que não coloniza e respeita valores e culturas locais), é possível assim pensar num advento para toda humanidade, que está além das crises e obstáculos do presente.

 

Fim das guerras e o Natal

09 dez

Pode esta época do ano, contagiar o mundo de forma a dar uma virada na escalada bélica, o cenário desta primeira semana de dezembro parece dizer que sim.

Caiu o ditador da Síria, Bashar al-Assad que governou a Síria por quase um quarto de século, enquanto o Observatório de Direitos Humanos de Londres diz que ele fugiu num avião particular, o Ministério do Exterior da Rússia, tradicional aliado, declarou que ele “renunciou”.

O líder de uma coalisão de opositores Abu Mohammed al Jolani (agora já adota seu verdadeiro nome Ahmed Al-Shara), liderou a Organização para a libertação do Levante (Hayat Tahir al Sham, ou apenas HTS), de origem extremista (foi ligado a Al Qaeda) adotou uma postura mais moderada conseguindo aliados.

O primeiro-ministro da Síria, Mohamed Ghazi al-Jalali, declarou-se disposto a colabora com os insurgentes afirmando que estenda a mão a “qualquer sírio que se interesse pelo país para preservar suas instituições”, mas o provável é que também renuncie ou seja retirado do cargo.

Também conversas avançam com o patrocínio do presidente eleito nos EUA: Donald Trump, um encontro com o presidente Makron da França e Zelensky da Ucrânia e tomou conta do cenário internacional pela perspectiva de paz aparentemente possível agora.

Na América Latina, em reunião em Montevidéu na última sexta-feira (6/12), após 25 anos de negociação, os líderes do bloco sul-americano assinaram acordo com a União Europeia, para o Brasil o acordo tem sentido estratégico de promover um aprendizado e aperfeiçoamento de como nossos setores produtivos geram commodities, que são as mercadorias primárias no setor de produção: agrícolas, pecuárias, mineral e ambiental, na qual o país é abundante.

Enfim, tudo parece construir uma harmonia nova e favorecer o clima de Natal, porém é preciso uma paz duradoura onde os setores envolvidos não se sintam “derrotados”, é preciso uma economia global equilibrada sem protecionismo ou concorrências desleais e é preciso sobretudo um ataque frontal as sérias questões sociais e ambientais.

O Natal existe, as belas iluminações como a de Lisboa (video)e muitas outras pela Europa tentam retomar um clima de esperança e paz, há até um filme da indústria cinematográfica (não é um filme teológico) sobre a Virgem Maria (bombou no lançamento dia 06/09) e por consequência do nascimento de Jesus.

https://youtu.be/FnV5RxjwvtI

 

E a Europa não acordou

02 dez

A criação do euro, apesar da polêmica saída da Inglaterra, não o Reino Unido, porque a Escócia tentou fazer um referente sobre a questão e o Parlamento britânico rejeitou, a tentativa de criar um conceito e uma política europeia não fracassou, apenas não avançou no essencial.

Porém suas profundas raízes humanistas e culturais foram sufocadas pelas ideologias idealistas e iluministas. 

O livro Se a Europa despertar (acordasse, na versão de Portugal) traça linhas essenciais do que seria a Europa verdadeira, suas fronteiras e suas bases étnicas, qual seria sua identidade religiosa praticamente abandonada, não são as imigrações que deterioram esta visão de identidade e unidade, mas a pergunta que faz Sloterdijk em seu livro é que cena desenham os Europeus nos seus momentos históricos decisivos? Quais as ideias que os animam, as ilusões que os mobilizam? E não é difícil apontar seus equívocos tanto quanto as bases étnicas como as culturais.

Também o padre Manuel Antunes, o livro Repensar Portugal escrito antes da União Europeia, dizia que seu país deveria voltar-se para a Europa, antes era um cantinho da Europa que lhe dava as costas e se voltava para as colônias africanas, no livro dava linhas de repensar o país.

A colonização e as Guerras, intestinais, porque houveram as guerras religiosas no período final do renascimento, e a paz de Vestfália tratado que retirava a questão religiosa das disputas, porém a Europa teve outras disputas de fronteiras e étnicas, até culminar em duas guerras mundiais.

Elas acabam envolvendo todo o mundo, porque há interesses que extrapolam as fronteiras, porém é preciso compreender que uma verdadeira identidade e unidade europeia ainda não se construiu, abriu-se as fronteiras, mas agora elas parecem incertas e ameaçadas com o envolvimento na guerra do leste europeu.

A tese principal de Sloterdijk neste livro é que o modelo de colonização que deu a Europa a ideia de um Império de Centro (como o autor a chama) e que abriu um vácuo no pós-guerra que criou uma geração de intelectuais que buscou um novo modelo imperial, assim o autor conclui que não se conseguiu entender que ela não é mais um centro e tem dificuldade com isto.

As guerras então são um caminho trazem de volta a ideia de império, o contrário que Sloterdijk propôs em seu livro que seria abandonar este modelo, também é a conclusão do padre Manuel Antunes que acrescenta um modelo de “democracia social” a Portugal.

Sloterdijk, P. Se a Europa despertar. Trad. José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2002.

 

A sabedoria e amor na hominização

28 nov

Sabedoria não é o mesmo que inteligência, cultura ou astúcia, é algo límpido e puro que é vida plena, assim é também uma virtude, chamada de cardeal junto à justiça, fortaleza e prudência.

A cultura é ligada a tradição cultural dos povos, pode e deve estar ligada a sabedoria porque é o único caminho que pode ajudar o processo civilizatório (ou de hominização como chamada Edgar Morin) tornar-se um caminho seguro e sustentável.

Aqueles que precisam dominar pela força caminham pelo caminho do poder, ali pode haver algo de inteligência, em geral há, porém é usada no sentido contrário ao civilizatório, o argumento que as guerras ajudaram a evolução só é válido porque tiraram lições amargas da guerra, que poderiam tirar se a inteligência fosse de falto elevada e imbuída do amor.

Sabedoria e amor na hominização

A astúcia é a mais perigosa inteligência porque em geral liga-se ao poder e a opressão, cria caminhos inteligentes, mas repletos de armadilhas para si e para os outros, não é caminho de solidariedade e comunhão entre os povos e culturas.

Assim a virtude da natureza é aquela que mais aproxima o homem da consciência divina, ou da nossa divina consciência, e assim o homem encontra um caminho sólido para sua hominização.

O sábio sabe viver na pobreza e riqueza, sabe dominar-se na guerra, a prudência é a virtude que mais se alia neste aspecto, sabe viver na paz, não se agita com ela porque sabe que é o verdadeiro estado de graça, aqueles que precisam de bens ou de abundância para viver bem estão mais próximos dos vícios do que das virtudes.

Junto ao amor, a virtude da sabedoria contém as outras, alia-se a prudência, a coragem (fortaleza) e a justiça, não a dos homens que é imperfeita e sem misericórdia, mas a divina.

 

Os falsos profetas e a esperança

26 nov

A má religião e as falsas profecias são aquelas que não anunciam a boa nova, não há nenhuma leitura histórica ou verdadeiramente profética daquilo que é o reino divino: a paz e a esperança.

Sim é verdade que estamos em tempos sombrios, mas ainda assim é preciso anunciar a paz e a esperança, que o homem até hoje construiu a civilização sobre guerras e vinganças é fato, porém foi a paz e esperança que desenvolveu a agricultura, o comércio e a produção de bens sociais, mesmo em meio às guerras a esperança sobreviveu e fez estrada.

São maus leitores bíblicos, quando os discípulos perguntaram quando os tempos de destruição viriam, diz a leitura Lc 21:8-9, “Jesus respondeu: “Cuidado para não serdes enganados, porque muitos virão em meu nome, dizendo: ‘Sou eu!’ E ainda: ‘O tempo está próximo’. Não sigais essa gente! Quando ouvirdes falar de guerras e revoluções, não fiqueis apavorados. É preciso que estas coisas aconteçam primeiro, mas não será logo o fim”

Continua a leitura sobre conflitos mundiais (Lc 21:10-11): “e Jesus continuou: “Um povo se levantará contra outro povo, um país atacará outro país. Haverá grandes terremotos, fomes e pestes em muitos lugares; acontecerão coisas pavorosas e grandes sinais serão vistos no céu”, mas esta não é a profecia e sim aquilo que os homens farão antes de um tempo de paz e de verdadeiro processo civilizatório no planeta.

Aprendemos mais pela dor do que pela razão e pelo amor, ainda que estes tempos se digam racionais, a visão do todo, da Terra como uma pátria comum a todos povos e nações ainda não chegou, impera o poder mundano, as tentativas de saques e de vinganças entre os povos, e não há nada de divino nisto, é apenas a insanidade de um racionalismo raso e antissocial.

A esperança é que conduzirá os homens a um outro patamar civilizatório, que socorrerá os pobres, que renovará a vida e os modelos saudáveis de desenvolvimento, até mesmo aquilo que é considerado um princípio de sustentabilidade, não consegue gerir os recursos terrestres.

Uma nova civilização será aquela que sobreviveu destes tempos sombrios e sem temperança, como dizem as virtudes cardeais esquecidas (post da semana passada da filósofa Philippa Foot): temperança, sabedoria e prudência e coragem (fortaleza) são virtudes morais esquecidas, mas não de todos.

 

A escalada bélica e a esperança

25 nov

Aumentam a potência e o uso de armas de longo alcance na guerra entre a Rússia e a Ucrânia, o uso de armas de longo alcance pela Ucrânia e os mísseis hipersônicos que podem transportar cargas atômicas já foram testados na guerra, e a ameaça de guerra com países europeus até mesmo na TV Russa já apareceu e foi manchete no mundo todo.

As bases militares da OTAN na Alemanha, Varsóvia e Londres aparecem num suposto mapa dos primeiros ataques em caso da Rússia se sentir ameaçada, internamente ela já alterou os seus estatutos sobre uso de armas nucleares rompendo acordos internacionais e o Kremlin autorizou o aumento na produção de mísseis para estas cargas nucleares.

Da psicologia que se pode entender de Putin é que ele despista, mas não blefa, os países nórdicos parecem ser os que mais temem um ataque russo, a Noruega distribui a população um manual do que fazer em caso de catástrofes ambientes ou guerras, em alusão a isto, Finlândia e Suécia (foto da cartilha) já se prepararam para esta hipótese e são novos membros da OTAN.

A guerra entre Israel e Hezbollah segue em sua escalada, no sábado (23/11) um ataque israelense matou ao menos 11 pessoas e 23 ficaram feridas, o tipo de míssil usado é capaz de atingir até mesmo bunkers e segundo as autoridades, havia forte cheio de explosivos após o ataque.

Ao menos ali há tentativas de acordos de paz, mas as negociações parecem estagnadas, no leste europeu espera-se que após a posse de Donald Trump, que venceu as eleições nos EUA, possa haver algum tipo de acordo, mas certamente a Ucrânia perderia parte do território.

A esperança jamais é esquecida entre as pessoas que desejam a paz, mais do que isso que rejeitam o discurso de ódio e de guerra, pois muitos dos que falam da paz não a querem de fato, acreditam que é possível algum tipo de “vitória” em campos de batalha, lá todos perdem.

Assim podemos fazer nossa pequena parte, se a guerra se tornar impopular os governos se mexem, a única coisa que pode comovê-los é a opinião pública, pois nem mesmo uma possível catástrofe econômica, ambiental e civilizatória os comovem, apesar da retórica.

 

O mau pensamento, a má política e a má religião

20 nov

A estrutura da crise civilizatória que vivemos, a ameaça nuclear tornou-se real após a liberação de mísseis para o território russo estes dias, a crise energética e o problema da miséria mundial estão na pauta civilizatória, mas o pensamento, a política e a religião (em seus desvios) não os percebem claramente.

Trata-se de conseguir aliados e não de construir pontes e derrubar muros políticos, culturais e até mesmo religiosos, o pensamento iluminista ainda domina o ocidente, a visão cultural rasa invade o discurso até das camadas mais cultas e a religião quando não é puro comércio se desvia para preceitos e pré-conceitos humanos pouco ou nada tem de puro e divino.

Sobre o pensamento um texto interessante de ler é “Cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento” de Edgar Morin, diz ele sobre a crise que já era presente nos discursos sobre o “mal estar civilizatório”: “De modo que podemos, ao mesmo tempo, integrar e distinguir o destino humano dentro do Universo; e essa nova cultura científica permite oferecer um novo e capital conhecimento à cultura geral, humanística, histórica e filosófica, que, de Montaigne a Camus, sempre levantou o problema da condição humana” (Morin, 2003, p. 38).

Diz na introdução do livro: “O saber tornou-se cada vez mais esotérico (acessível somente aos especialistas) e anônimo (quantitativo e formalizado). O conhecimento técnico está igualmente reservado aos experts, cuja competência em um campo restrito é acompanhada de incompetência quando este campo é perturbado por influências externas ou modificado por um novo acontecimento.” (Morin, 2003, p. 19).

Porém as redes invadiram o discurso dos experts e piorou o conhecimento cultural e político, agora sob a influência do “enxame digital” (ler Byung-Chul Han: o Enxame), uma onda de má política e má religião foi deflagrada e invadida por “influencers”, pseudo-profetas e políticos cuja conduta anti-civilizatória já denunciam suas falsidades e maldades.

É hora dos oportunistas, do pouco pensamento (ele já atingiu a camada seleta de “cultos”) e de má religião, que profetiza o mal, a desordem, e anuncia como “profecia” a religião do lucro fácil, do desprezo a cultura e de outras culturas que não as próprias.

Porém a luz persiste, a resistência persiste entre aqueles que anunciam a boa-nova e um mundo mais humano, a nova civilização e o protagonismo do que é bom, belo e humano; e aos poucos o que é pensamento ultrapassado, má política e religiões e profetas falsos desaparecerão, será um longo e doloroso processo, mas a noite só persiste na ausência da luz.

A quem tem pouco (pensamento, cultura e fé) até o pouco lhe será tirado.

MORIN, E. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento / Edgar Morin; tradução Eloá Jacobina. – 8a ed. -Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.

 

COP20 e a geopolítica

18 nov

O tema será evitado em ser tocado diretamente, já que países árabes como o Egito e a Turquia participam da conferência e a Rússia estará presente através do ministro das relações exteriores Serguei Lavrov.

O Brasil sedia a conferência que deverá ir até a segunda feira, o G20 ou Grupo dos 20 foi formado com sentido econômico após as sucessivas crises financeiras da década de 90, em 1999, ministros de finanças, chefes de bancos centrais das 19 maiores econômicas do mundo mais a União Africana e a União Europeia, visavam criar um grupo econômico forte que coordenasse ações globais na economia.

Estes países representam 90% do PIB mundial e 80% do comércio mundial (incluindo o comercio intra-EU) e dois terços da população mundial, esperasse algo de muito interesse econômico, mas temas como opções de gênero e geopolítica (indiretamente o tema será tocado) devem ser evitados e como nas edições anteriores o clima deve ser o grande tema, porém há uma expectativa que o tema taxação de grandes fortunas avance.

O texto base já está sendo elaborado nos bastidores e deve avançar até a madrugada de terça- feira para apresentação do texto final, a reunião é relevante para a paz, ainda que não seja tema do encontro, porém a conversa de líderes e ministros destes países melhora a relação.

Enquanto isto a guerra no leste europeu vai tomando contornos dramáticos, a capital Kiev da Ucrânia tem sido constantemente atacada por drones e os Estados Unidos deram permissão para Kiev usar misseis de longo alcance que poderão atingir alvos dentro da Rússia.

No oriente médio há uma expectativa de acordo de Israel com o Líbano, mas os bombardeios continuam e o Irã não participa desta negociação, assim o Hezbollah permanece em guerra.

Espera-se da COP20 além dos tradicionais temas sobre a emissão de gases e problemas sobre o clima que algum aceno para a paz seja lançado, uma vez que Rússia, China e Estados Unidos estarão presentes na Conferência.

 

Um extra na consciência planetária

14 nov

No final do século parecíamos tomar consciência de nossa realidade, de repente explodem novos conflitos e as guerras adormecidas acordam: ódios étnicos, ódios raciais e ideológicos.
Escreveu Morin sobre este momento:
“Ainda até os anos 1950-1960, vivíamos numa terra desconhecida, vivíamos numa Terra abstrata, vivíamos numa Terra-objeto. Nosso fim de século descobriu a Terra-sistema, a Terra Gaia, a biosfera, a Terra parcela cósmica, a Terra-Pátria. Cada um de nós tem sua genealogia e sua carteira de identidade terrestres. Cada um de nós vem da Terra, é da terra, está na terra.
Pertencemos à Terra que nos pertence” (Morin, 2003, p. 175).
Então o que seria esta tomada de consciência, escreve Morin:
• “a tomada de consciência da unidade da Terra (consciência telúrica);
• a tomada de consciência da unidade/diversidade da biosfera (consciência ecológica);
• a tomada de consciência da unidade/diversidade do homem (consciência antropológica);
• a tomada de consciência de nosso estatuto antropo-bio-físico;
• a tomada de consciência de nosso dasein, o fato de “estar aí”, sem saber por que;
• a tomada de consciência da era planetária;
• a tomada de consciência da ameaça damocleana;
• a tomada de consciência da perdição no horizonte de nossas vidas, de toda vida, de todo planeta, de todo sol;
• a tomada de consciência de nosso destino terrestre. “ (Morin, 2003, p. 175)

Embora reconheça que precisa ir além, pois escreve: “E é através dessas tomadas de consciência que podem con- vergir doravante mensagens vindas dos horizontes mais diversos, umas da fé, outras da ética, outras do humanismo, outras do ro- mantismo, outras das ciências, outras da tomada de consciência da idade de ferro planetária” (Morin, 2003, p. 176), está preso a ideia do humanismo das luzes “que reconhece a qualidade de todos homens” (idem), mas esbarra nas limitações humanas sem saber como superá-los.
“Dominar a natureza? O homem é ainda incapaz de controlar sua própria natureza, cuja loucura o impele a dominar a natureza perdendo o domínio de si mesmo. Dominar o mundo?” (Ibidem), não está claro para o autor nos “horizontes mais diversos” a consciência do divino.
Sem fazer parte do imaginário um ponto elevado da civilização, que veja ao longe uma nova civilização, que o próprio autor reconhece: “Esse homem deve reaprender a finitude terrestre e renunciar ao falso infinito da onipotente técnica … ” (p. 177), porém não é o cosmo o limite.
Reconhecer como parte do imaginário realizável, “o já mais não ainda” de Byung-Chul Han (está na nota de nosso blog), é reconhecer que o destino do homem é divino, é o reino do “já” aqui na terra, mas não ainda porque caminhamos para a pátria celeste, não do cosmos apenas, mas de uma vida eterna.

Morin, E. e Kern, B. Terra-Pátria. Trad. Paulo Neves, Porto Alegre: Sulina, 2003.

 

Civilizar a civilização

12 nov

Este é um dos capítulos centrais do livro “Terra-Pátria” de Edgar Morin, é sempre importante lembrar que isto foi muito antes da atual crise bélica, que é o cume de um dos mais perigosos pontos da crise civilizatória.

Escreveu sobre o que significa civilizar: “A busca da hominização, que faria sair da idade de ferro planetária, nos incita a reformar a civilização ocidental, que se planetarizou tanto em suas riquezas como em suas misérias, a fim de realizar a era da civilidade planetária” (Morin, 2003, p. 110).

O lema é bonito, parece tão simples quando falamos do amor, mas realiza-los é algo muito mais difícil do que se imagina: “Nada é mais difícil de realizar que o desejo de uma civilização melhor” (Morin, 2003, p. 110).

É como quando foi feita a Revolução Francesa, o seu lema trinitário: “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” parecia simples e realiza-lo, porém adverte Morin, a norma democrática de 1848  é complexa porque: “porque seus termos são ao mesmo tempo complementares e antagónicos: a liberdade sozinha mata a igualdade e a fraternidade; a igualdade imposta mata a liberdade sem realizar a fraternidade; a fraternidade, necessidade fundamental para que haja um vínculo comunitário vivido entre cidadãos” (Morin, 2003, p. 112).

Estes antagonismos vão desde o egoísmo econômico até o ódio político, e também o exercício da democracia: “ … exige simultaneamente consenso e conflitualidade, é muito mais que o exercício da soberania do povo” (idem) e este limite que exige tolerância foi ultrapassado.

Assim o que temos em jogo é “… a dificuldade de instaurar a democracia após a experiência totalitária. A regra do jogo democrático necessita de uma cultura política e cívica cuja formação foi impedida por décadas de totalitarismo; a crise económica suscita um excesso de conflitualidade que ameaça romper a regra democrática” (Morin, 2003, p. 113) e em várias partes do planeta este rompimento já aconteceu.

Escreveu Morin em tom profético para a época (escrito em 1993): “Correlativamente, o desmoronamento das grandes esperanças do futuro, a crise profunda do revolucionarismo, o esgotamento do reformismo, o achatamento das ideias no pragmatismo do dia-a- dia, a incapacidade de formular um grande projeto, o enfraquecimento do conflito de ideias em proveito dos conflitos de interesses ou dos etnocentrismos étnicos ou raciais ..” (p. 114).

É preciso ultrapassar estas fragilidades para reencontrar o caminho do bem comum e do bem estar social, não está longe o seu alcance, o problema é que este caminho como o amor e a fraternidade não são tão simples e exigem uma resiliência de fazer o bem exercitando-o.

MORIN, E. e KERN, B. Terra-Patria. Trad. Paulo Azevedo Neves da Silva. Brazil, Porto Alegre : Sulina,2003.