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Arquivo para maio 6th, 2025

Ausência oriental além da funcional

06 mai

Byung-Chul o vazio (xu) como ausência não permite uma interpretação puramente funcional (Han, 2024, p. 16), citando o livro 15 Zhuang Zhou “nota: “quietude, serenidade, ausencialidade, vazio e inação: eis o equilíbrio entre o céu e a terra” (tian dan ji mo, xu wu wu wei, ci tian di zhi ping, 恬淡寂寞, 虚无无为, 此天地之平). O vazio xu, na expressão xu vu (虚无无), não possui significado funcional” (Han, 2024, p. 26).

Ele dá vários exemplos anotados por Byung-Chul em nota de rodapé, o vazio dos raios de uma roda de carroça, o vazio na argila para tornar-se um vaso, portas e janelas de aposentos, e critica François Julien que interpreta segundo uma análise funcional:

“despojado de todo misticismo (uma vez que não possui orientação metafísica), o célebre retorno ao vazio de Laozi é uma exigência de dissolver os bloqueios aos quais o real está sujeito assim que não encontra mais nenhuma lacuna e fica saturado. Quando tudo está preenchido, não há mais espaço de ação. Quando todo vazio é abolido, destrói-se também a margem que permitia o livre desdobramento dos efeitos” (Han, 2024, p. 27 citando Julien F.).

Lembra da história a “aparência assustadora do aleijado” que não precisa ir a guerra, e recebe “abundante” auxílio do Estado e também a anedota do cozinheiro que trincha o animal com facilidade, em vez de cortar resolutamente passa a faca nas cavidades já presentes nas juntas.

Segundo as duas histórias a interpretação funciona sugere que ela aumenta a eficácia da ação, mas lembra citando também uma árvore nodosa (cheia de nós) que atinge uma idade muito avançada, permite também uma interpretação utilitarista, mas o fato de haverem tantos aleijados e tantas coisas inúteis nas histórias de Zhuang, conduz a própria funcionalidade ao vazio, estes personagens aparecem precisamente contra a utilidade e eficiência (pg. 28).

Lembro-me também da mística ocidental, onde ela ainda existe, que a busca pelo pão, pela saúde e pelo socorro social é muitas vezes motivada também por um vazio existencial, mesmo que tem alguma condição social busca algo em sem “vazio” não funcional, mas espiritual.

Quando alguém pede pão, está pedindo também dignidade, cidadania, respeito e muitas outras além do vazio funcional, o princípio da inclusão não é meramente retórico e não deve ser funcional, deve ser ontológico enquanto Ser-aí, porém além do pré-sente e do au-sente (abwesend em alemão ou absent em inglês), é apenas um sente (wow feel em inglês ou Wow Gefühl em alemão), a palavra wow tanto em ambas línguas é uma expressão para uau!), mas claro, traduções são sempre imperfeitas, o significado permanece acoplado a um língua.

Em português seria melhor um “sendo” no sentido de sentimento, sein em alemão e being em inglês onde o ver to be possui um sentido mais estrito que outras línguas, aqui num sentido de existindo ou subsistindo a vida, misticamente o pão funcional é também um pão místico no cristianismo.

HAN, B.C. Ausência: sobre a cultura e a filosofia do extremo oriente. Trad. Rafael Zambonelli. Petrópolis, RJ, Vozes, 2024. 

*escultura de Albert György intitulada “Melancholy” (lago de Genebra) representa “vazio de uma alma” (foto).