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Posts Tagged ‘pandemia’

Dar uma “alma” a Terra

18 mar

A ideia de dar ao homem de nosso tempo uma cidadania planetária, vivemos o tempo da mundialização ou da globalização, e isto implica em direitos, só terá sustentabilidade se na contrapartida este caminho apontar também para uma “alma” terrena onde todos se vejam como codependentes entre si, a pandemia já deveria ter despertado isto, mas ainda não aconteceu.

Diz Chardin no livro que estamos analisando: “o homem de nossa época passará ainda um período de grande ilusão, imaginando que, chegado a um melhor conhecimento de si mesmo e do Mundo, não tem mais necessidade de Religião” (Chardin, 1958) e isto piora quando vemos a noite de Deus que paira sobre a humanidade, confusa entre ideologias e fundamentalismos.

Via o imperativo que “da evolução universal Deus emerge nas nossas consciências”, e via que era preciso superar “a religião entendida como simples apaziguamento das nossas dificuldades, um ‘opio’. Sua verdadeira função é de sustentar e estimular o progresso da Vida” e notem que os sistemas propostos contra ela não foram capazes de se mostrarem eficientes nesta direção.

Explica que a função religiosa é “nascida da ´hominização´, e ligada a esta só pode continuamente com o Homem mesmo”, e perguntará: “Não é isto que podemos constatar em nossa vida?  Em que momento, na Noosfera, existiu uma necessidade mais urgente de procurar, de encontrar uma Fé, uma Esperança para dar um sentido, uma alma ao imenso organismo que nós construímos?

Dava a entender que este processo de hominização, como ponto alto da complexificação do Cosmos, sua forma “mais avançada” se encontra “personalizada”, e ela faz surgir uma dupla condição necessária para o futuro: super-animar a Pessoa (anima e alma tem a mesma origem etimológica), mas sem a destruir, e uma convergência universal “deve ainda possuir (eminentemente) a qualidade de uma Pessoa”, invertemos de propósito, pelos eventos atuais.

Chardin imaginava que a pessoa cresceria junto com esta “super-anima” (aqui no sentido de alma) mas vemos que a Pessoa ficou em segundo plano, ou como preferem existencialistas mais atuais, o Ser e o Ser-com-o-Outro, que deveria ter evoluído junto com a super-anima, mas não ocorreu.

Nos escritos de Pequim datados de 1937, ele especula sobre esta energia humana motora de tantos avanços e esta força de “ser-mais” sob uma forma mais primitiva e mais selvagem: a Guerra.

Acreditava que virá o tempo em que “aqueles que triunfam dos mistérios da Matéria e da Vida” ao contrário de ser usada para a guerra, dos exércitos e frotas, “dobrar esta outra potência que a máquina tornará livre, e uma maré irresistível de energias disponíveis levará aos círculos mais progressivos da Noosfera”.

Como uma primeira conclusão, os textos ainda irão a frente, afirma: “O amor, assim como o pensamento, está sempre em pleno crescimento na Noosfera. Torna-se cada dia mais flagrante o excesso de suas energias em relação às necessidades cada mais restritas da propagação humana.”

 

CHARDIN, T. Construire la Terre. Paris: Editions du Soleil, 1958.

 

A cura, a alma e a lei

16 mar

A pandemia segue um percurso ainda mais perigoso que é a produção de novas variantes ou novas cepas, toda humanidade quer a cura, mesmo os chamados negacionistas, todos sofremos e porque a cura não vem, o que falta para a ciência, ou para a compreensão do vírus que não acontece, na verdade temos outras doenças que são comorbidades sociais: fome, miséria, ignorância e intolerância que não dão trégua também, e a doença da alma humana da qual não se fala ou apenas da “religiosa”.

Ah sempre foi assim, não temos outra solução, falamos no post anterior sobre a próxima pandemia, se não nos curarmos é claro, há um caso diferente e emblemático.

Em 1977, Ali Maow Maalin, um cozinheiro de um hospital na Somália, pegou varíola, ele não sabia, mas era a última pessoa do mundo a contrair naturalmente a doença, ela infectou 1 bilhão de pessoas e matou 300 milhões no século 20, quando ficou curado entrou para a história, a varíola foi considerada erradicada, duas coisas foram necessárias: a vacina e gerenciar a doença.

O gerenciamento deve ser global e a OMS deve ter um papel essencial nesta luta, identificar os focos e agir com rapidez e firmeza para evitar que doenças infecciosas se alastre.

A doença que impede isto é a doença da alma, estamos quase sempre em polos de radicalização e não permitimos um avanço fraterno e geral de todos os países e em todos os países pela OMS, este problema da “alma” humana não será resolvido apenas pela lei, política e repressão, é preciso educar.

As religiões poderiam ter um papel essencial nisto, criados para tornar a família humana filha de um só Pai e assim todos seus filhos, limitados que somos diante de doenças sanitárias e sociais, não se realiza porque a alma humana segue doente, e só a “lei” não resolve é preciso mudar a mentalidade, só a radicalização produziremos mais ditaduras e menos fraternidade.

Na passagem Bíblia que Jesus cura um paralítico, e ele sai levando a cama, os judeus dizem que não era permitido carregar a cama no sábado (João 5,10-13) e Jesus já havia perdoado seus pecados, isto é curado sua alma, e nós permanecemos doentes do pecado e da mentalidade.

Teilhard Chardin escreveu “Construire la terre” (Ed. Soleil, 1958) onde fala da “alma comum”, voltaremos ao tema.

 

O futuro imprevisível da pandemia

15 mar

Fica cada vez mais claro que o futuro da pandemia pode ser distante do que todos imaginam, o número de variantes do vírus, os cientistas começam a identificar as pequenas variações que ele faz em seu código genético, e durante anos os epidemiologistas diziam que devíamos nos preparar para uma próxima pandemia, se não o fizemos antes, agora mais que nunca deve ser feito.

Enquanto isto a epidemia não dá sinais de arrefecimento, apesar do número cair, na Europa por exemplo, houve um aumento considerável nesta semana, de cada 100 infecções registradas no mundo, 41 são da Europa, o caso brasileiro já revelamos é trágico devido aos recordes de infecções e mortes superiores aos dados do ano passado.

Os estudos sobre as variantes constatam também uma alteração no seu código genético que assusta pois a cada transmissão as alterações do código genético podem influenciar na eficiência da vacina (já explicamos os índices de eficácia que dependem do “tipo” de vacina), ou seja, pode acontecer que a próxima epidemia seja do próprio coronavírus em uma de suas mutações.

O que fazer por enquanto, aumentar a vacina e combiná-la com lockdown, é um fato cultural que será difícil no Brasil e as restrições são altamente impopulares, mas não há outra coisa a fazer, e é preciso combiná-la com aumento nas taxas de vacinação.

Outro problema é a crise humanitária que pode ocorrer, limitar a circulação de pessoas significa limitar o comércio, o consumo de bens etc., que teve no ano de 2020 um fato positivo, pois a pouca circulação de veículos e uso de energias não renováveis, fez a emissão de CO2 cair em média 6% em todo planeta, e alguns sinais de reabilitação da natureza surgiram, presença de golfinhos próximos a costa, que significa abundância de peixes, melhoria nos níveis de poluição das grandes cidades.

Porém é importante dizer que o número de mortes cresce que havia começado a diminuir, volta a patamares muito preocupantes, e novos repiques voltam a acontecer devido as variantes do virus.

A economia também deve ser um fator preocupante porque já há sinais em muitos países de problemas sociais, desempregos, índices de miserabilidade e as questões correlatas: distribuição de renda e empobrecimento.

Podemos aprender com esta cruel lição, mas ainda a maioria das pessoas pouco se preocupa com aquilo que não o afetou diretamente ainda, mas aos poucos afetará a todos.

 

LockDown da calamidade e a Variante P1

08 mar

Poderíamos desde o início da pandemia ter mitigado os períodos mais críticos da pandemia com fases de lockdown e abertura, entretanto quase sempre se vacilou pela impopularidade da medida, principalmente ao comércio e a alguns ambientes que priorizam os lucros às vidas, porque vários setores não essenciais poderiam ter fechado, sem falar da irresponsabilidade de festas e aglomerações para algum tipo de “festa”.

Agora quase todo país na fase vermelha que indica o esgotamento dos hospitais e números recordes de contaminação e mortes, ainda titubeamos em medidas duras, mas necessárias.

A variante brasileira do vírus, chamada de P1 é mais contagiosa e para a qual a vacina Coronavac se mostra menos eficaz ainda, e a AstraZeneca que é mais eficiente ainda está em fase lenta de vacinação, no total ainda não vacinamos 10% da população e a redução de 8 milhões de vacinas foi anunciada pelo próprio governo.

Os países que aumentaram a eficiência da vacinação combinaram lockdown com vacinação, porque o contato de vacinado com pesquisadores da Universidade Imperial College London e da Universidade de Leicester explicam que o contato entre vacinados e variantes podem dar origem a mutações “superpotentes” que são capazes de driblar a ação imunizante, e isto no Brasil pode tornar-se uma bomba pandêmica.

A calamidade na qual estão quase todos estados e a maioria das cidades, pode colocar um pouco de juízo na cabeça daqueles que gerenciam a crise, não apenas o governo central, mas também os governos estaduais e os prefeitos de cidades brasileiras.

A variante P1 já é temida, muitos países já cuidam da migração brasileira temendo que a variante se espalhe e contamine o processo que em muitos países já é de redução da pandemia, é triste para o Brasil, mas devemos entender estas medidas como necessárias.

É certo que alguns serviços não podem parar, há sim serviços essenciais e eles devem estar ativos para que não aconteça um desabastecimento, uma perda de poder aquisitivo ainda maior, algum já é observado em todo mundo, porém a vida precede aos ganhos e são necessárias medidas que garantam o mínimo de sacrifício, em especial aos mais pobres.

É necessária uma medida dura e sem ela pode-se comprometer até mesmo a vacinação, e também é preciso cuidar desde já a eficácia contra a variante P1 já presente na maioria das cidades brasileiras.

Serão semanas duras e devemos todos nos cuidar com maior rigor e entender se as autoridades tiverem que tomar medidas restritivas, o cenário é praticamente de uma guerra.

É quase impossível na conjuntura brasileira pedir isto, mas seria bom uma solidariedade maior e verdadeira para enfrentar o momento mais crítico da pandemia.

 

Notícia boa, ruim e pós-trauma pandêmico

01 mar

A notícia boa é que a pandemia diminui no mundo todo, a má é que no Brasil pelo menos 7 estados com uma piora maior que os dados de 2020, é preocupante, porém o que já se começa a pensar é o que virá depois, nossa visão de mundo foi alterada e precisamos caminhar em nova via.

São eventos que acontecem individualmente quando sofremos um grave acidente, uma ruptura em relações pessoais, ou algo que cria um trauma, segundo David Trickey, psiquiatra e membro do Conselho de Trauma do Reino Unido, a ruptura do trauma é uma “construção de significado”.

Esclarece o psiquiatra: “a maneira como você se vê, a maneira como você vê o mundo e a maneira como você vê as outras pessoas” ficam abaladas pela reviravolta de um evento, surge uma lacuna em seu “sistema de orientação” e um simples estresse cotidiano transforma-se em trauma se são mediados por sentimentos fortes e prolongados de impotência e apreensão.

Será preciso olhar para a saúde mental das pessoas, estender nosso limite de tolerância e atenção, é neste momento que intolerâncias e práticas de pessimismo latente ou simplesmente de pouca

De que se trata este sistema de orientação e significado, todos possuímos uma espécie de “GPS pessoal”, ligado ao trabalho, a realização humana e suas necessidades, enfim a autoestima e a relação com os outros, tratamos demoradamente o assunto na semana passada.

A resiliência mental é uma espécie de bálsamo que movimenta nossa máquina cognitiva e nos faz seguir em frente ao estresse e se fica perto de um esgotamento cria um trauma psíquico, tão grave quando um trauma físico.

Lembrar as lições desta crise pandêmica e construir significados novos é mais difícil que ser apenas “otimistas”, porém a penúltima grande epidemia da crise espanhola mostrou que ela foi esquecida e as lições que podíamos tirar não foram tiradas.

Martin Bayly, um cientista social da London School of Economics (LSE), citado em reportagem da BBC, foi revisitar arquivos sobre a gripe espanhola no Reino Unido onde morreram 250 mil pessoas, e não conseguiu encontrar nenhuma evidência de homenagem pública, disse na reportagem “A ausência de memoriais fez com que desaparecesse da memória pública, na escrita da história”.

Isto afeta nossa preparação para crises futuras, quando ocorreu a pandemia de 1957 (a gripe asiática matou um milhão de pessoas), vários analistas destacaram conforme relato de Bayly “falhamos completamente em aprender as lições de 1918”, mas também a lição moral porque estávamos em meio a guerra.

Criar uma significação a partir de uma narrativa social, seria um passo importante destaca a reportagem, e um dos esforços no Reino Unido será o de lembrar a NHS (National Health Service) no caso brasileiro o SUS (Sistema Único de Saúde), além disto pensar em memórias e outros modos de lembrar e historiar esta crise serão alertas e preparação para o futuro.

 

A ascese da alma

26 fev

Vivemos tempos em que mesmo o pensamento organizado sofreu desvios e quem desejar encontrar a verdade terá dificuldade, a grande maioria das pessoas busca a ascese através daquilo que Peter Sloterdijk chama de “vida de exercícios”, receitas de como ter uma vida boa, em geral, apenas a financeira, mas em muitos casos também o cuidado com a alimentação e com o corpo e para ai, como fica a ascese da alma e onde encontra-la é a questão.

É certo que há aqueles que nem mesmo acreditam que existe a alma, porém vivem num desconforto de se apegarem apenas as coisas que passam e nunca encontrarem a que não passa, o desenvolvemos esta semana é a ascese do encontro com o Outro, aquele que não é o espelho.

As torcidas organizadas deste ou daquele tipo, desta ou daquela forma de espiritualidade, desta ou daquela corrente estão em busca apenas do espelho, alguém que pensa e que vive o modelo de ascese vinculado apenas a um grupo, por esta razão como são excludentes, não são um modelo para todos e não podem ser uma verdadeira ascese.

Mesmo em termos de religião, aquele que “ama a Deus que não vê e não ama o irmão que vê, é mentiroso” (Jo 1:4,20) também outras religiões têm fórmulas parecidas que se resumem na chamada “regra de ouro”, não fazer ao Outro aquilo que não gostaria que fosse feio a você.

Os mercados e shoppings lotam em tempos de pandemia, aparentemente até mais que em tempos normais, claro quando estão abertos e é permitido, as pessoas buscam lá o que uma falsa ascese deu, ou seja, uma vida de exercícios, neste caso de consumo.

Assim os tempos serão mais duros, e com mais dificuldade de encontrar a verdadeira paz que é aquela que nos leva ao alto, afinal ascese significa elevar-se, subir e chegar a uma região de conforto da alma, não material e nem mesmo aquele que entramos ali e ficamos bem (no nosso grupo ou torcida), e sim uma elevação do espírito e da alma que nos conforta, mesmo na crise.

A passagem bíblica que revela esta ascese é a passagem em que Jesus escolhe três discípulos e vai ao monte Tabor (cuidado porque a outra ascensão de Jesus é uma ascensão dívida, que foi depois de sua Morte e Ressurreição), diz esta passagem (Mc 9,2-3): “Naquele tempo, 2Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, e os levou sozinhos a um lugar à parte sobre uma alta montanha. E transfigurou-se diante deles. Suas roupas ficaram brilhantes e tão brancas como nenhuma lavadeira sobre a terra poderia alvejar”.

Depois do monte Tabor (foto acima) tiveram que voltar a realidade e descer de lá, Pedro queria ficar lá, esta é a diferença da outra ascensão na qual Jesus retorna a sua realidade divina (o céu é uma metáfora).

Tempo de ascensão verdadeira, a pandemia nos retirou tudo que era falso, ficamos diante do Ser.

O vídeo a seguir dá uma explicação cristã do significado litúrgico da leitura acima.

Transfiguração do Senhor, no Monte Tabor – YouTube

 

A cura do Outro

24 fev

Gandhi afirmava que “não se pode ferir o outro sem ferir a si próprio”, porém Carl Jung tem uma receita ampliada “aquele que cura o outro, cura a si próprio”, em termos de pandemia é bom pensar nisto, cuidar o distanciamento, as regras de higiene, etc.

Alguns dizem isto nunca vai acontecer comigo, são pessoas já com comorbidades, etc. sim eles estão no grupo de risco, mas a pandemia agora com as novas cepas ampliaram o “grupo de risco”, pode-se dizer toda a sociedade está vulnerável.

E junto com a pandemia, as economias estão ruindo, mas os modelos idealistas continuam aí, temos a resposta a tanto tempo, não se esqueçam que elas já foram testadas, assim não se trata deste ou daquele modelo, todos modelos atuais estão centrados na “economia” como centro de qualquer política e não no ser humano, isto valeu ainda mais profundamente nesta crise.

A usina de Fukushima por exemplo, houve tremores naquela região recentes, mostrou novos vazamentos, a água usada para resfriá-la será jogada no mar e então irá pelo mundo agora.

Se tivermos outros acidentes naturais, terremotos estão sempre acontecendo aqui e ali, e se forem perto de outras usinas, e se outro tipo de crise planetária, diferente da pandemia vier, e isto não é só pessimismo, é uma possibilidade que todos sabemos que existe.

Sim agora o problema é a doença, fonte da cegueira atual, ela é também um prolongamento da crise cultural e noite de Deus, vejam os diversos tipos de religiosidade que cresce, os apelos e profecias não faltam em todo canto, a meu ver alguma poderá ser verdadeira inclusive, mas não se trata disto e sim de perguntarmos como vai a vida “saudável” no planeta, e ai entra o Outro.

Diziam que a crise era das mídias, ou das redes que é uma coisa bem distinta, agora são a salvação para manter os contatos com a devida distância, hora não eram os celulares que faziam isto e porque não fazem agora, manter empresas e escolas funcionando, não é tão mal, o uso sim.

Claro que não, a perda das relações independe dos meios (as mídias) que usamos, e colocar-se em rede é ainda melhor, agora parece mais claro é colocar-se primeiro diante dos mais próximos, cuidar e se ocupar deles, coisas que lembramos de serem feitas pelos nossos avós, que pareciam fechados e atrasados, mas eles sabiam o que significava ser próximo, ser amoroso e ser fiel.

Salvar a economia mesmo que as pessoas morram, eis o fundamento de um mundo onde no fundo é a economia que todos estavam preocupados, talvez uma minoria pensasse realmente no bem-estar e no equilíbrio da vida vivida na essência, sem luxo e com um certo “conforto”.

Lembre-se que o oeconomicus em grego, tratava-se da economia doméstica e da agricultura, é verdade que a economia evolui muito, porém não devia ter perdido as origens, organizar a economia “doméstica” das pessoas e produzir alimentos, parece o essencial nesta crise.

Não temos só que nos curar, é preciso curar e cuidar do outro, assim nos ensinam nossos heróis da medicina, pois as consequências serão para todos, a descoberta desta interdependência é saudável para um mundo que começa a se fechar em nacionalismos e mentalidades autoritárias.

 

Variante, vacinação lenta e a terceira onda

22 fev

As variantes são várias, destacam-se a da África do Sul, a Brasileira e a Britânica, apesar de haver controvérsias sobre a gravidade delas o certo é que a propagação do vírus é mais rápida, e no caso brasileiro já parece estar presente em boa parte do território brasileiro, não há isolamento de regiões e o combate a pandemia é um dos mais ineficientes e titubeantes.

A vacinação segue lenta, porém os resultados na Europa são mais eficazes porque estão combinados com as políticas de restrições e confinamentos, e também estão no final do inverno, e espera-se que a chegada de novos lotes de vacinas, a AstraZeneca confirma um lote de 10 milhões de vacinas para o Brasil neste final de fevereiro, mas é lenta a vacinação também em outros países.

A chamada terceira onda é decorrente da Europa da liberação para o Natal e final de ano, muitos governos reconheceram o erro, aqui no Brasil as praias continuam registrando movimento e não há uma política clara de evitar aglomerações, não se trata apenas de fechar lojas e comércio, como algumas cidades fizeram até com supermercados, o problema central é a consciência.

A terceira onda veio então por causa da liberalidade das festas de fim de ano, e logo em seguida quase toda Europa fechou, incluindo a Suécia que era mais liberal até a chegada do inverno, o único país que começa a liberar aos poucos é a Grécia porém teve um #lockdown bastante austero.

Outra preocupação é com a terceira onda é a variante, a infecção é mais rápida e rapidamente lota os hospitais e cria uma situação de caos no já estressado sistema de saúde que luta a um ano com os casos mais graves, oficialmente os números da Covid caem no mundo todo e está freado na Europa, porém as medidas continuam severas.

O número de vacinados no Brasil supera 5,5 milhões, porém o ritmo poderia ser maior, o problema é o abastecimento, estão prometida para março mais 18 milhões de doses da Coronavac e 16,9 milhões da AstraZeneca, as outras União química/Gamaleya e Precisa/Bharat Biotech estão no cronograma, ainda para o primeiro semestre, os laboratórios produzem as vacinas Sputnik V e Covaxin, respectivamente.

O estado de Amazonas tem percentualmente o maior número de vacinados 4,87% enquanto São Paulo tem o maior em números absolutos um total de 1.620.182 vacinados num percentual de 3,5% população, já havendo um grande percentual de segunda dose.

O mapa acima mostra os percentuais no Brasil todo da vacinação.

 

A pandemia, o deserto e as tentações

19 fev

A pandemia nos colocou em xeque quanto as normas de conduta de nossas vidas, primeiro a ideia primária (mas muito usada) que podemos fazer tudo o que queremos se estiver ao nosso alcance, a segunda é imaginar a onipotência humana no caso da medicina humana para enfrentar qualquer dificuldade que nos impõe, e a terceira o jogo bruto do poder, que esquece os que sofrem.

As tentações não são um problema apenas religioso, também elas existem no plano espiritual (a onipotência humana acima dos mistérios divinos), mas é também um problema social, queremos beber, sair de casa, ir aos shoppings enfim desfrutar dos benefícios sociais, e poucas vezes nos lembramos que eles não são acessíveis a todos, e que seu uso também deveria ser moderado.

O isolamento nos propôs um modo de vida mais restrito, uma maior convivência com aqueles que nos são mais próximos, mas também ao sair para alguma atividade lembrar dos que estão por obrigatoriedade enfrentando a pandemia: as pessoas da área da saúde, as pessoas responsáveis pelo abastecimento de gêneros alimentícios (lembrando dos que não os tem em quantidade necessária) e também as pessoas responsáveis pela segurança e serviços essenciais (são muitos, mas a polêmica aqui pode ficar de lado).

Temos que enfrentar um deserto próprio, o isolamento nos obriga, a enfrentarmos primeiro os nossos próprios limites, aceitá-los, não ter receio de solicitar ajuda nas questões necessárias para a nossa sobrevivência: o deserto, o silêncio, o refletir, o saber recolher-se é também um exercício.

Há uma tentação mais usual que é a de poder, somente a nossa ideia e os nossos conceitos são os que devem ser aceitos, e também a luta pelo poder numa polarização social crescente onde pouco ou quase nada se dialoga, apontamos neste blog está escalada que está agora num cume delicado.

A receita cristã para o poder é muito simples, além de valorizar a humildade e a escuta respeitosa do Outro, prestar culto e chamar de mestre somente o seu Deus, e seu filho único: Jesus, sem isto a luta pelo poder é crescente e pode levar a guerras e convulsões sociais.

Antes de começar sua vida pública Jesus foi ao deserto para enfrentar as suas fragilidades humanas (Mc 1,12-13), foi a sua grande ascese, os judeus acreditavam que no deserto vivia um espírito maligno chamado Azazel (Lev. 16 e Tb 8,3), porém uma leitura contemporânea, a pandemia é uma oportunidade, ainda que forçada e não seja exatamente um bem, é uma doença grave, o deserto que cada um teve que enfrentar pode ser uma ascese.

 

Rever a vida e reeducar-se para viver

18 fev

Parte da crise econômica mundial, esta é análise de Morin é além da econômica, a moral e ética, no seu sexto livro sobre o Método da complexidade, ele desenvolve a análise antropológica, histórica e filosófica do problema, explicando que ela parte de um conceito inspirado em Kant.

Define-se aí a ética como exigência moral auto-imposta, em lugar dos imperativos provindos da razão prática, na ética de Morin a partir da complexidade, ela provém de três fontes: uma interna, análoga a nossa consciência, outra externa simulada e orientada pela culturas, crenças e normas pré-estabelecidas na comunidade, e de fontes anteriores que são a própria organização dos seres vivos e transmitida geneticamente.

Sua ética apresenta assim uma ética que exige uma reflexão quanto as nossas escolhas morais, sociais e de valores que levamos ao nosso cotidiano, aqui a crise civilizatória é grave.

Porém a ética Kantiana favoreceu a uma ética autocentrada, egocêntrica, segundo meus interesses e minha vontade, ignorando que ela deve compartilhar com o outro, e isto significa que devemos também nos orientar a uma visão sensível ao conjunto da sociedade e aqueles sem voz.

Em tempos de pandemia fomos “obrigados” por razões de saúde pública, mas também de educação, a limitar nossos movimentos, a guardar um isolamento social seguro, e a olhar para cada pessoa e se sentir responsáveis por ela, será que é isto que todos fazem

Esta aparente limitação de liberdade é na verdade aquela que já devia estar incorporada em nossa ética social, sem uma educação consistente para a prática da fraternidade e de um olhar atento e sensível ao outro, podemos cair num vazio social e alimentar a crise civilizatória já presente.

É preciso passar por um longo caminho de reflexão pessoal e estar disposto a mudar hábitos e atitudes para ajudar o conjunto da sociedade a sair de uma crise que é sanitária, mas também social.