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Posts Tagged ‘ontologia’

O todo, a parte e o Ser

02 jul

Foi a partir desta teorização do todo que Werner Heisenberg deu início ao princípio quântico, quando formulou sua teoria não havia qualquer resposta de experiência científica, o que por si só já contesta o empirismo, e era uma “teoria” o que por si só contesta que a realidade é prática, mas foi a primeira tentativa, feliz porque depois a Física e a Ciência viriam em seu socorro, sobre partir do todo e não das partes como propunha o método cartesiano.

A verdade da física, porém vai se mudando ao longo do tempo, as novas descobertas sobre as novas descobertas de subpartículas (entre elas o bóson de Higgs), os 7 estados da matéria (junta-se aos três amplamente conhecido, o plasma (luz líquida), os estados de Bose-Einstein, gás fermiônico e superfluido de polarations, e pode haver um oitavo, assim já há uma para-física.

Porém já há, e sempre houve a meta-física (posterior a física), a modernidade quis reduzi-la a subjetividade (algo próprio do sujeito, mas preso apenas a sua mente), a ontologia atual, fruto da hermenêutica e da fenomenologia, recupera-se questionando o “velamento” do ser, e propõe uma clareira, a crise do humanismo não é outra coisa senão esta crise.

A pergunta filosófica sobre o tudo é “porque existe o tudo e não o nada” e isto supõe a ex-sistência, já a pergunta sobre o todo poderia ser, ela não é feita filosoficamente e sim apenas teologicamente, se existe “tudo” qual é a intenção que justifica a ex-sistência de tudo ?

A fenomenologia recupera a intencionalidade, uma subcategoria da consciência na filosofia medieval, com um sentido de estar dirigida a algo, ou de ser acerca de algo, assim ontológica.

Husserl a recuperou dirigindo-a a um objeto, categoria essencial no idealismo moderno, mas dirigindo-a algo que pode ser imaginário ou real, assim inclui-se a metafísica e o Ser.

Assim o fantástico da existência de tudo não é apenas sua existência, mas a intenção pelo Todo.

Qual é o todo e se existe é Ser, assim só Ele pode Ser além do todo universo que é locus, já que na física moderna o tempo é uma abstração, diz o físico italiano Carlo Rovelli, que está entre os mais respeitados.

Para os cristãos a entrada de Deus na physis acontece com Jesus, diz a passagem que Jesus pergunta quem dizem ser “o filho do homem” (Ele assim fala de uma de suas duas naturezas: divina e humana), e vai perguntar aos apóstolos o quem dizem que Ele é.

Os apóstolos respondem (Mt 16,14-16) {a questão do mestre: “Alguns dizem que é João Batista; outros que é Elias; outros ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas”. Então Jesus lhes perguntou: “E vós, quem dizeis que eu sou?” Simão Pedro respondeu: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”, e Jesus diz que ele é feliz porque foi Deus que o revelou.

 

Entre o Ser, o Nada e a interioridade

01 jul

A primeira sensação ontológica, diante da racionalidade foi uma tentativa de confinar o Ser em sua subjetividade (que vem de sujeito) para tornar a relação com o Ente uma “objetividade” que existe fora do Ser (para a modernidade fora do sujeito).

Como ambas negam a a ex-sistência, aqui significa ex “sair de” e o verbo sistere “ser colocado”, assim existir é o que está colocado fora do ente, mais que a subjetividade é a própria essência do Ser, além do imaginário e do simbólico, do imaginário porque é o irrepresentável e o simbólico porque significa o não-sentido, mas aí estão toda essência e existência do Ser.

A concepção de negar a existência do ser, que tem que negar até mesmo a razão que a concebe, vem de Górgias (485-380 a.C.), sofista que Platão refutou em um livro, para ele não havia verdade e pode-se dizer que é o princípio longínquo para o relativismo.

A existência e realidade do Ser, embora velada, está na possibilidade de uma clareira, dela depende a abertura do Dasein, sua relação com a physis (a natureza no sentido geral dos gregos) e para a qual deve ser retirado o véu que cobre o ser, e assim a relação com o ente e a interioridade.

Se nos vemos apenas como vemos num espelho vemos a imagem do nosso ente, se vemos como somos significa que temos capacidade de ver além dele nossa interioridade, nossa complexidade e a partir delas como nos relacionamos com o todo do qual somos parte.

A projeção sobre a exterioridade e negação da interioridade é parte do esvaziamento do Ser na modernidade, somos o que fazemos e não importa muito o que somos de fato interiormente.

Deste esvaziamento nasceu o niilismo (nihil – nada), o solipsismo (o eu e minhas sensações) e de certa forma o subjetivismo (considerações só sobre o que é pessoal, uma interioridade vazia) e boa parte das teorizações prezas as dicotomias infernais (subjeito x objeto) e (natureza x Cultura).

Numa interpretação mais atual, na Sociedade do Cansaço, Byung Chul Han fala da interioridade, em outro livro A Sociedade da Transparência ele afirma: “hoje o mundo não é um teatro no qual são representadas e lidas ações e sentimentos, mas um mercado onde se expõem, vende e consomem intimidades” (HAN, 2017, p. 80).

HAN, Byung-Chul. Sociedade da Transparência Trad. Enio Paulo Giachini. Petrópolis, Vozes, 2017.

 

A possibilidade da clareira

30 jun

Perscrutar e investigar o insondável é próprio do homem, porém há sempre a possibilidade do devaneio e de esquemas bem montados de pensamento que não levam a clareira, assim como um explorador na floresta, o risco de andar em círculos sem uma bússola, um rio de guia ou astros celestes são essenciais.

Isto ocorre desde os primórdios, alertava Heráclito em um fragmento “A φύσις gosta de se ocultar”.

A φύσις (“Physis kryptesthai philei”) foi deixada sem tradução porque ao pé da letra seria physis, mas isto era para os gregos a própria natureza e o que hoje está separado dela como Ser, a dicotomia em sujeito e objeto.

Em Heidegger, a verdade é este fundamento abissal, oculto mas possível de ser desvelado, isto está ligado neste autor pelo vínculo entre o ser e a verdade como sem-fundo, fundamento abissal, o insondável, porisso exploramos nos posts da semana passada a metáfora, ao contemplar o ser, isto se torna inefável.

O que poder-se-ia chamar de excesso ontológico nada mais é que o mistério do ser, sua escatologia sem fundamento único, ele nem é um fragmento do universo, nem é o próprio, parte dele e incógnito como ele.

A verdade é geralmente pensada como correção, concordância de enunciado com a que que enuncia, ou de uma coisa com o que já foi pensada previamente dela, uma hipótese que se procura torná-la verdade.

Pode-se pensar no relativismo, mas é exatamente o contrário, para Heidegger a verdade é sempre a verdade, a experiência de verdade, de Platão a Husserl, foi sempre uma adequação das representações, tentando escapar das metáforas, com a essência das próprias coisas.

Assim a verdade não é ser descobridor, mas é ser descoberto, o Dasein (ser aí) está aberto para si mesmo e para o mundo, e só nele pode-se alcançar a originalidade do fenômeno da verdade, o que os gregos chamaram de Alétheia, e que Heidegger vai além propondo ser instauradora do pertencer de Ser-homem.

Este é o sentido de originalidade do Ser, pensa o ser em seu sentido primordial como “presentar”, Ser é ser no presente, nele se desvela,

Assim o único sentido que poder-se-ia pensar a dialética como ontologia é aquele no qual o “traço básico do próprio presentar é determinado pelo permanecer velado e desvelado”, é o Ser em movimento.

A razão que estamos presos ao velamento do Ser (o seu esquecimento como dizia Heidegger) é a prisão a esquemas lógico-racionais que aos quais a verdade é ligada ao ente e desligada do Ser.

 

HEIDEGGER, Martin. Alétheia. Os pensadores. São Paulo : Abril Cultural, 1985, p. 126.

 

Da linguagem ao Ser

29 jun

A linguagem enquanto fala e retórica é apenas aquilo que se exterioriza, porém se pensada como ontologia é a abertura (Erschlossenheit) a partir da apropriação silenciosa do si-mesmo, como Heidegger pensou em Ser e Tempo, seja a abertura (offenheit) pensada como clareira do ser (lichtung des Seins), aquela usada por pensadores e poetas, e que se mostra na medida que sua correspondência silenciosa como ser, expressa em Carta sobre o Humanismo.

Escreve neste texto: “O destino se apropria como clareira do Ser, que é, enquanto clareira. É a clareira que outorga a proximidade do ser. Nessa proximidade, na clareira do Da lugar, mora o homem como ex-sistente, sem que ele já possa hoje experimente e assumir esse mora” (Heidegger, 1967, p. 61)

Em termos gerais linguagem é um veículo da expressão de algo interno ao homem, isto é, uma ponte que vincula o dentro e o fora do homem, tal forma de falar é pensada como uma atividade que acontece na qual o homem é o próprio meio, por isto há o silêncio antes.

Mas segundo a concepção ontológica da linguagem, não é a linguagem que pertence ao homem, mas antes o próprio homem concebido ontologicamente como ser-para-a-morte resoluto ou ser ontologicamente que responde como mortal à solicitação silenciosa do Ser.

Em termos mais simplistas trata-se aqui da diferença entre o ente que “tem” uma linguagem, no sentido de capacidade de falar, e a concepção ontológica que pensa o homem como “sendo” por meio de ser possuidor da capacidade de falar, a linguagem aqui não é apenas a transmissão de informações, mas o modo no qual manifesta o próprio existir humano.

Neste contexto comunicação começa com o silêncio, é preciso um vazio, um epoché na comunicação, que pressupõe um Outro que será destinatário, não é assim receptor, mas destino de sua fala, e este é o modo pelo qual se manifesta o próprio existir humano.

Assim para Heidegger, mas de outro modo também para Niklas Luhmann, seria preciso rever toda a teoria da Comunicação, pois receptor e transmissor são eles próprios o meio não humanos, e não “substituem” o homem, não podem existir nem ter relação como se o homem fosse algo acessório, aí está toda a alucinação da Inteligência Artificial atual, colocar receptor e transmissor no lugar de fonte e destino, seria preciso prever uma “clareira” do ente “fora” do Ser.

Por isto a clareira é interna, já postamos em outro oportunidade aquilo que Heidegger afirma em sua obra magna Ser e Tempo: “Na medida em que o ser vige a partir da alethéia, pertence a ele o emergir auto-desvelante. Nós denominamos isso a ação de auto-iluminar-se e a iluminação, a clareira” (cf. Ser e Tempo). (* aletheia do grego: a- não, lethe- esquecimento, desvelar).

HEIDEGGER, Martin. Carta sobre o humanismo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1967, p. 61.

 

O círculo hermenêutico e a metáfora

25 jun

Somos traídos quando julgamos conhecer e estamos ainda na etapa inicial da interpretação, aquela que ainda não iniciou um processo de epoché, colocar entre parênteses nossos pré-conceitos e iniciar uma verdadeira dialogia.

A metáfora nos ajuda a aproximar usando de linguagem poética uma relação de pertencimento, trazer o mundo a poesia e levar a poesia ao mundo, isto porque o poema projeta um mundo na sua dimensão ontológica, uma realidade que está entre o ver como da metáfora e o próprio ser.

Há além desta função no âmbito da inovação semântica, o desvelar de realidade mais profundas, por exemplo, explicar questões que são complexas de modo a permitir este pertencimento, esta proximidade, é a função por exemplo, das parábolas, a metonímia e a sinédoque.

Exemplos de parábolas mais conhecidas são as bíblicas, associar o Reino de Deus às sementes que crescem sem serem percebidas, ou ao grão de mostarda, uma pequenina semente que se torna uma árvore, isto para dizer que há uma força vivificadora no homem, e em todo homem.

Porém a metáfora, pelo uso de linguagem figurada corre sempre o risco de ficar na superfície.

Exemplificamos na semana passada a passagem bíblica em que Jesus ia para a obra margem do mar da galileia e uma tempestade ameaça a barca e Jesus acalma a tempestade (Marcos 4:35-41), porém a sutileza desta passagem é os significados metafóricos de ir a outra margem e da própria tempestade.

Precisava explicar coisas mais profundas e questionou os discípulos o medo das tempestades, e segue para a outra margem, significando lá um momento mais direto com os apóstolos, boa parte da exegese analítica (ver o post anterior) se fixa numa compreensão imediata que ir para a outra margem significa mudar a rota, quando na verdade além descansar (Jesus dormia na tempestade), as realidades mais profundas eram explicadas diretamente aos apóstolos.

Isto se comprova se verificarmos que depois Jesus retorna “a outra margem” onde volta a encontrar a multidão (Mc 5,21-43), e nesta multidão está além de uma mulher desconhecida que toca o manto do mestre e é curada de uma hemorragia de 12 anos, há um chefe de Sinagoga chamado Jairo.

Jairo tinha a filha nas últimas, e enquanto se encontrava com Jesus pedindo que impusesse as mãos na filha, chegam amigos de Jairo, que dizem que ela faleceu e Jesus diz que ela “apenas dorme”, vai a casa de Jairo e realiza o milagre pronunciando as palavras “Talitá cum” (na foto quadro pintado por Benito Sáez Garcia), menina levanta-se.

Esta sutileza, uma pessoa comum e um chefe da sinagoga, mostra bem claro que na “multidão” se encontram também autoridade religiosas que querem sinais (os judeus querem sinais e os gregos sabedoria) e assim a metáfora é complementada com “sinais” e uma “sabedoria” inerente a Jesus.

 

O que é compreender

24 jun

Compreender se tornou na estrutura analítica ocidental um círculo vicioso que tende apenas a repetir aquilo que considera verdade partindo de algum aforisma histórico, o que Gadamer chama de historicismo romântico em sua crítica a Dilthey.

O esquecimento do ser ignora que o círculo hermenêutico que vai da interpretação até uma nova compreensão é a própria estrutura de um novo sentido, um sentido existência, que está no Ser.

Assim a circularidade da compreensão não é primeiramente uma exigência lógica, a partir de um método A ou B, mas o próprio desdobramento ontológico: “a reflexão hermenêutica de Heidegger tem o seu ponto alto não no fato de demonstrar que aqui prejaz um círculo, mas um círculo este tem um sentido ontológico positivo” (GADAMER, 2013, p. 355).

Heidegger (2014) em sua obra magna Ser e Tempo elaborou uma hermenêutica da facticidade a partir da analítica temporal da existência humana (Dasein), aqui facticidade é o modo de ser em seu Dasein que encontra, na existência temporal, a possibilidade de revelação, de clareira:

“A estrutura da temporalidade aparece assim como a determinação ontológica da subjetividade. Mas ela era mais que isso. A tese de Heidegger era o próprio ser é tempo” (Gadamer, 203, p. 345), eis a essência mais profunda da obra de Heidegger, que aponta para o círculo hermenêutico:

“O decisivo não é sair do círculo, mas nele penetrar de modo correto. Esse círculo do entender não é um círculo comum, em que se move um modo de conhecimento qualquer, mas é a expressão da existenciária estrutura-do-prévio do Dasein ele mesmo. O círculo não deve ser degradado em vitiosum nem ser também tolerado. Nele se abriga uma possibilidade positiva de conhecimento o mais originário, possibilidade que só pode ser verdadeiramente efetivada de modo autêntico, se a interpretação entende que sua primeira, constante e última tarefa consiste em não deixar que o ter- prévio, o ver-prévio e o conceber-prévio lhe sejam dados por ocorrências e conceitos populares” (Heidegger, 2014, p.433), mas dirigir-se as coisas mesmas.

O compreender visto assim pode parecer filosófico demais ou uma teorização sobre o pensar, não o é, pois, mesmo no esquecimento do Ser, estrutura atual de fragilidade do pensamento, este é o processo de aprendizagem que envolve desde o aprendizado da linguagem por uma criança até os mais elaborados métodos de descoberta e inovação, ou são apenas repetição de algo já feito, e assim sem a facticidade, pois é mera repetição.

 

GADAMER, H-G. Verdade e método Trad. Flávio Paulo Meurer, revisão da tradução de Enio Paulo Giachini. 13. ed. Petrópolis: Vozes; Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2013.

HEIDEGGER, M. Ser e tempo Tradução, organização, nota prévia, anexos e notas de Fausto Castilho. Campinas, SP: Editora da Unicamp; Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2014.

 

A linguagem como pluralidade

23 jun

O problema da interpretação quando estamos pensando na linguagem surge como uma proposição demonstrativa, ocorre quando se torna tal interpretação como única e verdadeira, a proposta de Heidegger esta é uma das possibilidades da linguagem, mas não a única nem a principal, quando tratamos apenas de lógica ela não compreende a pluralidade da linguagem.

Isto está presente naquilo que hoje seja chama narrativa ou discurso, já tratamos em vários posts quando tratamos da Metáfora Viva de Paul Ricoeur, mas aqui a problemática é ontológica: o Ser.

A ciência e a técnica, assim como também a narrativa ideológica sequer tangencia o problema essencial da questão do ser, está voltada àquilo que se chama ciência natural ou da natureza:

“a ciência natural só pode observar o homem como algo simplesmente presente na natureza (…) dentro desse projeto científico-natural só podemos vê-lo como ente natural, quer dizer, temos a pretensão de determinar o ser-homem por meio de um método que absolutamente não foi projetado em relação à sua essência peculiar” (Heidegger, 2001, p. 53).

Este é o devaneio da tradição na concepção de linguagem e de verdade, aquela que traz a noção de finitude do ser: ser é tempo, assim por exemplo, acelerando o tempo pensamos em acelerar o ser, quando na verdade é o que provoca seu esvaziamento, tema comum dos heideggerianos.

Separamos o Ser ontológico do existencial, citando o próprio Heidegger, porque a analítica cai em outra armadilha que é ligar o ser ao sujeito, cópula e atributo, criando uma possibilidade estrutural da linguagem, ela é tentadora justamente por sua composição analítica, mas no fundo é essencialmente lógica e não onto-lógica, escapa-lhe o Ser.

Tal evasiva já era prevista por Heidegger: “a essência do ser em sua multiplicidade jamais pode ser em geral recolhida a partir da cópula e de suas significações” (Heidegger, 2003,p. 391). 

A linguagem carrega sua própria relação hermenêutica. Heidegger, a partir de Ser e Tempo, realoca a questão da compreensão e da busca da verdade, que estava colocada no âmbito da teoria do conhecimento, e a lança para o plano existencial, neste caminho surge o círculo hermenêutico, não preso a mera opinião ou ao logicismo funcional, nem ao analítico.

A hermenêutica de Heidegger ilumina a finitude humana enfatizando sua pertença à linguagem como o lugar que o humano habita, a noção de logos como desvelamento, como aletheia como os gregos a pensavam, verdade e realidade.

HEIDEGGER, M. Seminário de Zollikon Petrópolis: Vozes, 2001.

HEIDEGGER, M. Os conceitos fundamentais da Metafísica: mundo, finitude, solidão. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003.

 

O conhecimento e o fazer

22 jun

A sociedade que vivemos é uma sociedade do desempenho, assim a chama Byung Chul Han que fez seu doutorado em Heidegger, é uma sociedade do fazer, mas não do saber-fazer.

Recordar “velhos teóricos”, endeusar teorias antigas que tiveram um funcionamento temporal determinado constitui o ocaso e a crise da filosofia, do pensamento não, porque o homem enquanto Ser é capaz de desvelar e descobrir, mas há um esquecimento do Ser.

O conhecimento não fechado em lógicas, com abertura e possibilidade de novas descobertas é o movimento constitutivo do tempo, não há algo totalmente compreendido e acabado, ele é constitutivo daquilo que acontece no tempo, e ele é que está sujeito a história, é um saber prático e da vida, um Lebenswelt como o chamava Husserl.

Heidegger partiu daí com influência direta de Husserl, o significado de sua Fenomenologia, supõe esta abertura para que se vejam as coisas como se manifestam, princípio do saber.

Assim não há algo compreendido, acabado, o que há é uma compreensibilidade num constante devir, implicando num saber prático, um saber-fazer mais do que objetivo de ciência, deve ser o fundamento de todo ato compreensivo como aquele que busca o conhecer.

A abertura essencial não é para a consciência hermenêutica como vista por Heidegger um ato primeiramente racional, é uma disposição afetiva, uma das estruturais existências do ser-ai, se mostra que compreender é sempre um compreender afetivamente, no sentido de “afetar”.

Segue-se ao afeto a interpretação, mas o que é interpretar aqui senão revisões e elaborações de sentido, postas em movimento, assim interpretação é para Heidegger:

“A interpretação de algo como algo funda-se essencialmente por ter-prévio, ver-prévio e conceito-prévio. A interpretação nunca é uma apreensão sem-pressupostos de algo previamente dado […]” (HEIDEGGER, 2014, p.427).

Um dos problemas filosóficos centrais de Heidegger é a questão acerca das possibilidades da linguagem, é a partir dela que o Ser elabora sua visão de mundo, da qual não pode escapar, ela que nos possibilita compreender o mundo, ela que elabora o ser-no-mundo.

Ser no mundo que implicaria num saber-fazer depende da visão de mundo, empobrecida e obscurecida pelo desempenho, pela exigência de eficiência e pela má articulação com o tempo.

HEIDEGGER, M. Ser e tempo Tradução, organização, nota prévia, anexos e notas de Fausto Castilho. Campinas, SP: Editora da Unicamp; Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2014.