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Arquivo para junho, 2022

O Ser e a contemplação

16 jun

O pensador Byung-Chul Han desenvolveu os temas de Hannah Arendt Vita Activa e Vita Contemplativa em seu livro “A sociedade do Cansaço”, onde revela que “a perda da capacidade contemplativa está em correspondência com a absolutização da vita activa – que leva em grande medida à histeria e ao nervosismo da sociedade moderna da acção” (Han, 2015), e esta leva ao cansaço, a depressão, a auto-exploração e ao esgotamento.

Segundo o pensador coreano-alemão, a vida atual levou ao “imperativo do trabalho, que degrada a pessoa em animal laborans”, que lhe faz perder o “mundo” e o “tempo”, para revitalizar uma nova contemplação é necessário que acolha de novo “a vita contemplativa em seu seio” e “volte a pôr-se ao seu serviço” (O Aroma do tempo. Um ensaio filosófico sobre a arte da demora, 2009).

Apesar desta perda há na civilização ocidental um renovado interesse pela espiritualidade, porém não considera mais importante as religiões tradicionais, que ocorre na esfera de um fenômeno chamado de “mindfulness”, ligado as neurociências e nos cuidados da saúde, educação e negócios.

Não há nesta relação um significado mais profundo que alcance o divino, o sobre-humano ou o além-do-humano, se volta para aquilo que Peter Sloterdijk chama de “a sociedade de exercícios”, sem a possibilidade de uma verdadeira espiritualidade, ou uma ascese desespiritualizada.

Hannah Arendt havia tocado levemente o problema, deve-se lembrar que sua tese foi sobre “O amor em Santo Agostinho”, já Byung-Chul Han, como seria próprio, vai por um caminho mais oriental, porém a elevação “da alma”, que sem a ajuda do divino o faz sem sucesso, fica oculta.

“Com o título Vita contemplativa não deveria ser reconjurado aquele mundo no qual esta estava alocada originariamente. Ela está ligada com aquela experiencia de ser, segundo a qual o belo e o perfeito e Imutavel e Imperecivel e se retrai a todo e qualquer lançar mão humano” (HAN, p. 35), embora para o autor a capacidade contemplativa não está necessariamente ligada ao Ser imperecível.” (HAN, pg. 36).

O conceito do que é alma foi tratado por São Justino, no século II da era cristã, antes de tornar-se cristão ele se aproximara dos estoicos, mas estes não consideravam importante conhecer a Deus, depois aproximou-se dos Pitagóricos e devia se dedicar aos números e a música, e finalmente foi aos discípulos de Platão que pensavam tanto nas coisas corpóreas como nas ideias, mas o problema chave que o distanciou foi a questão da “alma” e está no seu “Diálogo com Trifão”.

Para os cristãos mais antigos (católicos, ortodoxos e orientais) a Adoração Eucarística é a maior contemplação, porque Deus se faz um pedaço de pão, uma hóstia consagrada.

Han, Byung-Chul Sociedade do cansaço. tradução de Enio Paulo Giachini. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2015.

 

O ser e a ação

15 jun

Ser não é inatividade, porque é o ser que determina sua ação, porém o puro projeto sobre a ação esvazia o ser, é o ativismo ou a “vita activa”, aquele que Husserl, Heidegger, Hannah Arendt, e mais recentemente Byung Chul Han questionam sobre a ausência de vita contemplativa, o interior.

Não se trata de subjetividade, porque é justamente a separação entre o ser objetivo e subjetivo o primeiro grande impulso para o esvaziamento do ser, não se trata também do ser social, ele é o que está projetado na consciência do homem, na intenção que se dirige ao objeto, à vida exterior.

A vita activa foi assim expressa por Hanna Arendt: “A expressão vita activa, compreendendo todas as atividades humanas e definida do ponto de vista da absoluta quietude da contemplação, corresponde, portanto, mais à askholia grega (ocupação, desassossego) com a qual Aristóteles [define] toda atividade, que ao bio politikos dos gregos. A expressão vita activa é perpassada e sobrecarregada de tradição. É tão velha quanto nossa tradição de pensamento político, mas não mais velha que ela. A própria expressão que, na filosofia medieval, é a tradução consagrada do bios politikos de Aristóteles, já ocorre em Agostinho onde, como vita negotiosa ou actuosa, reflete ainda o seu significado original: uma vida dedicada aos assuntos públicos e políticos” (Arendt, 2007, p.23), nesta explicação de Arendt está também uma completa tradução do animal político.

O que é a ação para Arendt, não é aquela do ativismo ou voluntarismo, mas a que ocorre “entre” os homens, depende da intersubjetividade (a relação de interioridades), dita por ela assim: “or fim, o último dos elementos da vita activa abordado por Arendt é a ação. A ação é o elemento da interpessoalidade e o ambiente da intersubjetividade, ou seja, ocorre entre os homens. Logo, em razão de ser desenvolvida entre pessoas, a ação é observada de forma destacada do labor e do trabalho, tais elementos não influenciam na mesma.

Então o que considera a condição humana da ação é a pluralidade, diz textualmente: “Considerando que a ação é uma atividade dos homens livres na esfera pública, ela é uma expressão da pluralidade humana. A sua concretização depende da convivência entre indivíduos diferentes. Todavia, visto que a ação exige uma diversidade interativa, ela particulariza os homens. Ela promove a aparição de individualidades e possibilita a construção de identidades. Ora, o homem jamais poderá manifestar a sua singularidade no isolamento. Ninguém mostra o que é na esfera pessoal da intimidade. Somente quando está com os outros o homem pode revelar o que é” (ARENDT, 2007, p.189).

Mas Hannah Arendt considera a modernidade em crise somente a partir do início do totalitarismo e os eventos das duas guerras mundiais, e ao nosso ver o problema surge já no pensamento racionalista/idealista.

ARENDT, Hannah. A Condição Humana. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.

 

Novo polo de tensão: Taiwan

14 jun

Em meio a guerra na Ucrânia, a batalha de Severodonesk segue com avanço russo, que promete maior proteção a república separatista do Donbass, sem perspectivas de acordo, um novo polo de tensão mundial envolvendo o Ocidente e as republicas socialista se encaminha para a Taiwan.

Cada vez está mais próximo a tentativa de tensão entre a República Popular da China, que é Continental e a Taiwan que está na Ilha de Formosa, que se separou da China desde a derrota de Chiang Kai Shek pelos partidários socialistas de Moa Tse Tung.

Entendamos a história, fundada em 1912, a República da China agrangia grande parte da China Continental e da Mongólia, no fim da segunda guerra mundial com a rendição do Japão, o país anexou as ilhas de Formosa e Penghu (pescadores) a sua jurisdição, quando o Kuomintang (KMT) perdeu a guerra para o partido comunista liderado por Mao Tsé Rung em 1948, o governo de Chiang Kai-Shek se refugiou em Taipé, capital da Ilha Formosa e fundou a República em Taiwan.

A china nunca aceitou esta separação, mas os partidos políticos e políticos de Taiwan, como os ex-presidentes Lee Teng-hui e Chen Shui-bian consideraram que não havia necessidade de uma declaração formal de independência, entretanto isto ficou polêmico diante de países da ONU.

A resolução da ONU 2758  de 1971 expulsou a República da China (Taiwan) e deu o assento para a República Popular da China que perdeu sua participação em todas organizações intergovernamentais relacionadas às Nações Unidas, como como o Tribunal Internacional de Justiça, onde direitos internacionais são discutidos.

Mas a votação da resolução não foi unânime (foto) e muitos países querem reconhecer a República da China, que mantém sua independência, sendo um dos quatro tigres asiáticos com uma econômica forte em especial, na parte de componentes da microeletrônica.

A tensão é enorme e a ideia que a Republica Popular da China vai atacar Taiwan é quase certa.

 

‎Covid 19: the fourth wave has arrived‎

13 jun

Alertamos aqui em várias postagens o risco da ausência ou fragilidade de protocolos, e que isto induzia a população a acreditar que a Covid 19 estaria no fim, mesmo a vacinação estando alta e a variante ser menos letal, o risco era claro e poucas atitudes sanitárias foram tomadas.

O número de da média de casos conhecidos no Brasil volta a se aproximar da casa dos 50 mil e número da média de mortes voltou a ultrapassar as 100 mortes pela Covid, deve se levar em conta que muitos casos são diagnosticados na rede privada e em farmácias, e alguns são assintomáticos.

Agora a quarta onda chegou, retomar o uso de máscaras e cuidados em ambientes como ventilação e distanciamento s]ao pouco observados porque os hábitos sanitários são seguidos só por uma pequena parcela consciente da população.

A nível mundial o número de casos está em queda, mas boa parte dos países da américa latina, os vizinhos do Brasil estão em alta, e a vigilância em aeroportos não é constante e rigorosa.

As atitudes tomadas até agora são titubeantes e pouco incisivas nos efetivos cuidados e protocolos, apenas a recomendação do uso de máscaras, não há uma politica de testagem, as empresas e as pessoas fazem por conta própria e não fiscalização de protocolos, quando existe.

Espera-se das autoridades atitudes mais responsáveis e o reconhecimento de que a crise sanitária é ainda grave e exige cuidados muito sérios e especiais por parte da população.

Os dados não mentem, uma quarta onda de Covid já está presente em todo país, e o número de internações e mortes volta a crescer.

 

O Ser e a Verdade

10 jun

Em tempos de crises, fake News e pandemia, pouca verdade vem a tona, cada um e cada grupo quer interpretar a verdade segundo a sua narrativa, mas a verdade é o Ser, e sua morada está na linguagem, é preciso ter interioridade e Espírito de Verdade para habitá-la.

O jogo de palavras, a crueldade da guerra ou a manipulação política e até jurídica da verdade são instrumentos de esvaziar a verdade, também a pura subjetividade não é um exercício de fato espiritual, é como diz Sloterdijk parte de uma “sociedade de exercícios”, neste caso é desespiritualizado.

O círculo hermenêutico que propõe a fusão de horizontes e abertura de discursos e narrativas ortodoxas foi o caminho de Hans-Georg Gadamer para escrever sua obra magna “Verdade e Método”, nela o autor desenvolve a hermenêutica heideggeriana colocando-a diante do Ser.

A ausência de profundidade que desvele o Ser, a verdade mais alta e interior, faz derramar sobre as realidades as mentiras (fake-news é só um uso midiático delas), as narrativas que não dão conta da totalidade da verdade, os fanatismos, as guerras e as aberrações.

O homem fora de seu Ser é jogado no vazio sem sentido, não é o vazio da busca e da epoché, é o vazio da angustia e da ausência de caminhos sólidos, que nos conduzam a plena verdade.

Para os cristãos, a passagem bíblica João 16,12 é bastante forte: “Quando, porém, vier o Espírito da Verdade, ele vos conduzirá à plena verdade. Pois ele não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e até coisas futuras vos anunciará”.

Assim este espírito é capaz de desvelar até mesmo o futuro, agora tão incerto e temeroso, e só ele pode de fato nos libertar de um presente tão pesado e sombrio para o humanismo.

GADAMER, H. G. Verdade e Método. Tradução de Flávio Paulo Meurer. Petrópolis: Vozes, 1999.

 

Clareira, morada e Ser

09 jun

Para Heidegger o Ser tem morada e presença, e isto é o que potencializa a clareira enquanto destino, este vazio da modernidade é justamente o esvaziamento do Ser como Morada e Pré-sencia, necessário para que o Ser preencha este vazio, nele que o Ser de re-vela ou desvela, o conceito é confuso no português porque re-velar, seria velar de novo e desvelar seria presença.

Diz o texto heideggeriano: “O destino se apropria como a clareira do ser, que é enquanto clareira. É a clareira que outorga a proximidade do ser. Nessa proximidade, na clareira do “Dar lugar”, mora o homem como ex-sistente, sem que ele possa hoje experimentar e assumir esse Morar” (HEIDEGGER, 1987).

A morada pode-se dizer que a casa do ser como linguagem, nela se consuma a manifestação do ser, diria a filosofia antiga isto é uma volta ao nominalismo, mas a viragem linguística superou isto, pois dela se irradia e se transforma em ação, como algo a partir do pensar, pois só do ato de pensar podemos retirar o processo do fazer e operar, então por isto a linguagem é “habitação”.

Nesta habitação preserva-se o ex-tático, e nela se determina a clareira, ela nos retira do abismo de nossa essência ex-sistente, a clareira é o “mundo”, e a linguagem é o advento que clareira e revela o próprio ser, isto foi contestado por Peter Sloterdijk, em sua resposta no livro Regras para o Parque Humano, onde revela a falência do projeto do humanismo, sim, mas o Humanismo que Heidegger revela em “Cartas para o Humanismo”, que nada mais é que a da modernidade.

Isto é fácil de ser demonstrado uma vez que Sloterdijk considera o humanismo que critica (de Heidegger) como pastor do ser, que sua essência e sua tarefa se originam em saber guardar o ser e corresponde ao mesmo, assim guardar seu rebanho na clareira, que é o mundo aberto, mas qual

Toda a obra de Sloterdijk fica então no entorno deste dilema da modernidade, vez por outra evocando termos que vem da teologia, em suas obras posteriores Esferas I, II e III: “Matrix in grêmio” que lembra a figura religiosa de Maria, ou o In-sein In-Sein tem, segundo Sloterdijk, uma origem antropológica, que é a experiência do feto no útero da mãe, sem a perspectiva cristã.

Será um discípulo seu, Byung Chul Han que abordará mais amplamente a questão do Ser enquanto questionamento na modernidade, certamente por sua origem oriental, a leitura da clareira vai a fundo na modernidade: A sociedade do cansaço, O aroma do tempo e A agonia do Eros, desvelam o drama da modernidade, espero ansioso algo de Chul Han sobre o panorama da guerra.

Porém um quadro da pandemia Chul Han já traçou em seu A sociedade paliativa e a dor hoje, já fizemos um post, o quanto o Ser se afasta da dor ou daquilo que pode se aproximar dela, então criamos uma série de paliativos, que é o distanciamento da clareira (conclusão minha).

HAN, Byung-Chul. A sociedade paliativa: a dor hoje. Trad. Lucas Machado. Petrópolis: Vozes, 2021.

HEIDEGGER, M. HEIDEGGER, M. Carta sobre o humanismo. Tradução Revista de PINHARANDA GOMES, LISBOA: Guimarães Editores, 1987. (pdf).

SLOTERDIJK, P. Regras para o parque humano. Tradução: José de Alencar A. Marques. São Paulo: Estação liberdade, 1999.

 

Ser, clareira e desvelamento

08 jun

Toda questão material, humana e substancial desenvolvida no humanismo iluminista provocou um velamento do Ser, nele são as questões externas mais importantes e pensadas que as interiores, mesmo que e Kant a Hegel a questão do espírito tenha sido tratada, sempre resultou num dualismo entre a vida ativa (exterior) e a vida contemplativa (interior), esta traduzida como subjetividade (que é do sujeito) e aquela como objetividade.

Para Heidegger ela vai além, porque toca a questão profunda da verdade, é nela que foi decidido e desenvolvido o pensamento metafísico ocidental, para isto o pensador retomou a questão que os gregos chamavam “alétheia”, comumente traduzida apenas como verdade, mas o sufixo a-léthea, indica negação, assim, não-velada ou como Heidegger preferiu traduziu: desvelada.

O velamento está ligado a “presença” o [ón), que é a presença e a luz, sintetizada na questão que é motriz para o pensamento de Platão no mito da caverna, vir a luz, sair da caverna, em tempos de escuridão, significa encontrar a clareira e o desvelar.

A presença da luz, sintetizada na questão do Eidos, que foi traduzida no ocidente pela palavra ideia, não se pode esquecer que para os gregos a grande questão é o permanecer na luz, ou sair do dualismo objetivo/subjetivo que é ter a luz do Ser, não apenas interior, mas nos atos exteriores.

Ao questionar o fim da filosofia como tarefa do pensamento, o ato de questionar enquanto pensar torna-se pura interpretação de “dados”, não é mais a questão do “[on” (presença) e sim o que está presente apenas como coisa, que para Heidegger a partir da fenomenologia é adjetivo da “luz”, enquanto o pensar é um “livre aberto”, que nada possui de comum, nem do ponto de vista da linguagem, escreveu neste questionamento: “ claro, no sentido de livre aberto, não possui “nada” de comum, nem do ponto de vista linguístico, nem no atinente a coisa que é expressa com o adjetivo “luminoso”, que significa claro” (HEIDEGGER, 1979, p. 79).

Não se trata de abolir a tradição, ela teve um papel na história, mas desvela-la, trazer à luz.

Trata-se, portanto, do pensar livre sobre o mundo, em exercício permanente da visão de mundo.

HEIDEGGER, Martin. “O fim da filosofia e a tarefa do pensamento”. In: Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 79.

 

Entre a clareira e a escuridão

07 jun

É preciso que hajam forças eficazes lutando pela paz, infelizmente boa parte da mídia ocidental está polarizada e é incapaz de fazer uma reflexão sensata sobre os horrores e insensatez da guerra, não por desconhecimento dos seus efeitos, as duas guerras já mostraram, mas por causa de um comportamento infantil e fanático em ambos os polos.

A ameaça de fechar embaixadas na Rússia, os mísseis já disparados na Coréia do Norte, a guerra que é cada dia mais sangrenta na Ucrânia, com armamento mais pesado e letal, é engrossada pela mídia que chega a distorcer os fatos para polarizar ainda mais a guerra, já quase sem trégua.

Sobre as embaixadas o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken fez uma brincadeira (de mal gosto ao meu ver) de dedicar a Putin a música “We are Never Ever Getting Back Together”, de Taylor Swift, querendo dizer que nunca se separarão completamente.

É claro que a Rússia se voltou para o leste Europeu e sonha com uma federação russa ampliada, já a China nunca deixou de sonhar com a recuperação de Taiwan, e a Coréia do Norte pode ser mais uma peça nessa guerra que avança com “cuidados”, mas parece ter um objetivo sombrio.

A clareira, no contexto em que foi desenvolvida por Heidegger significa uma abertura em meio a floresta, em meio a escuridão, onde deve emergir o ser, e isto que é apropriado para a modernidade é também apropriado para um momento de uma guerra mundial avistada num horizonte, porque é oposto ao ente, as materialidades econômicas, sociais e até mesmo políticas, assim aparece o Ser, a vida e sua lógica, seu “lebenswelt” como diria Husserl.

Há uma sombra, ou uma escuridão que percorre as mentes da humanidade, a guerra parece não ser o que é: um grave perigo civilizatório, o fim das argumentações e dos diálogos, a negação do Outro como Ser, da sua cultura e de suas opções e convicções, e esta é a escuridão.

Diz a leitura bíblica: se o sal se torna insosso, com que salgaremos? Ele não servirá para mais nada, senão para ser jogado fora e ser pisado pelos homens (Mt 5,13), é preciso que haja luz e sensatez.

A paz é sempre possível e desejável se tivermos tolerância e compreensão com o Outro.

 

Covid 19: responsabilidade e riscos

06 jun

Não é fácil dar notícias ruins, entretanto se tratando de doenças graves e problemas sanitários não se pode omitir nem deixar de dar diagnósticos e dados precisos das doenças e problemas sociais.

Há uma relativa tolerância aos dados da Covid 19, porém a observação de amigos e parentes em nossa volta não é difícil notar já um novo aumento de casos da Covid-19, a cepa atual, uma variante da ômicron é menos letal então o número de mortes (no Brasil) se mantém em torno de uma centena.

Os dados desta última semana, que vinha num crescente, revelam uma pequena queda, porém é preocupante que em 8 estados os dados não foram fornecidos, dois deles populosos que são os Estados de São Paulo e Bahia, segundo eles foram problemas nos dados do Ministério da Saúde.

O pico nestes dias de 29 a 31, se recuarmos os 10 dias da infecção do vírus cai justamente no Carnaval fora de época realizado, como defendemos no post, o monitoramento e os protocolos de saúde não poderiam baixar a guarda, o que foi dito por alguns infectologistas responsáveis.

Os órgãos públicos que controlam grandes aglomerações querem uma volta a normalidade, claro que todos queremos, em tempos de ameaça de guerra os esforços para manter a sociedade com uma economia e um abastecimento saudável torna-se imperativo, mas não pode custar vidas.

Uma aposta que não haverão novas variantes letais e que a Covid 19 está cedendo não tem dados reais para confirmar isto, se ouvirem os infectologistas e sanitaristas sérios, a precaução é certa.

Olhando os dados de nossos vizinhos, o Chile registros nos últimos dois meses um maior número de novos casos, chegando na última quinta-feira (26/05) a 7.550 novas infecções, no Uruguai há um aumento de 50% dos diagnósticos positivos (dados da rádio Jovem Pan) e as autoridades sanitárias do Paraguai já admitem a chegada da quarta onda da doença.

O fato que a variante é menos letal é confortante, mas não pode ser motivo para despreocupação.

Cabe às autoridades sanitárias serem responsáveis e indicarem os riscos e protocolos para a situação atual.

 

O espírito e a religião

03 jun

Um dos traços importantes como ponto de partida no pensamento hegeliano é o conceito de religião, e nela a etapa final da construção do pensamento subjetivo do idealismo, que depois de se deslocar do sujeito para o objeto, cria uma ideia de representação em si e para si.

Já dissemos que um fio condutor é a ideia da suprassunção, que representa a consciência do movimento daquilo que contrapõe o objeto e a necessidade de algo de si e para si “ideal”, lembrando do post anterior que a suprassunção é uma interação entre tese e antítese.

O conceito de si, que vai do sujeito ao objeto e o para si que faz a transcendência deste caminho não contem o “outro”, a alteridade, conforme pensou na ontologia cristã:

“A presença de um objeto, é presença de um outro, determinado como o ser não divino, o mundo finito, a consciência finita. Essa finitude do outro articula-se na natureza em si ou no espirito em si, ou então na consciência ou no espírito para um outro”. (AQUINO, 1989, p.242).

Portanto a contradição já se apresenta anterior a questão de um “espírito” divino, Santo como pressupõe o cristianismo, está na consciência de si, e a questão da representação do objeto.

O para-si não um para-além, mas um retorno ao em-si transcendente, um fechamento em si, por isto não contém o outro, assim a ideia de sujeito é o diferencia da religião é a questão do Ser, um Ser que é Outro, e não um para-si que volta-se ao em-si.

Assim tendo observado essa junção que se refere a presença de um objeto e de um outro, ambos estabelecem uma relação com a consciência, porém a consciência em si é só interioridade enquanto a para-si se admite um além, já que do grego este sufixo significa isto, como paralaxe (além da posição), paradoxo (além da opinião), etc.

Em termos de representação, a consciência está em relação tanto com o mundo, tanto quanto com outra consciência, ainda permanecem no mundo, porém um para-si significa além do mundo, além da realidade sensível e palpável, não apenas na ideia, mas enquanto Ser.

Um espírito assim pensado, transcende ao ser e ao ser-com-Outro, tornando outro-Ser, que para muito religiões é o mundo espiritual, no qual há um Ser por excelência.

A relação trinitária cristã é um para-si-Além-do-Ser, ou um Ser por excelência, por isto um Espírito Santo, o qual se relaciona com o Ser-no-Mundo que é consubstanciado com o puro-Ser divino.

Está então além da suprassunção, não há tese e antítese, mas cada Ser é no Outro, no raciocínio trinitário: Jesus é consubstanciado no Pai, gerado pelo Espírito Santo, que é relação com o Ser.

A relação trinitária cristão é pericorética, ou seja, cada um ser “interpenetra” o outro e há comunhão, não havendo contradição.

Jesus revela aos apóstolos esta relação pericorética Jo (20:21-22(: “Novamente, Jesus disse: “A paz esteja convosco. Como o Pai me enviou, também eu vos envio”. E, depois de ter dito isso, soprou sobre eles e disse: “Recebei o Espírito Santo””, a realidade divina na alma humana.

AQUINO, M. F. O conceito de religião em Hegel. São Paulo: Loyola, 1989.