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João Damasceno e a pericorese
Mesmo aos que não creem o conceito de pericorese é importante porque torna a ideia de relação algo mais substancial, embora já se admita que o homem é um ser relacional, a relação está cheia de dualismos e interpretações não trinitárias (no caso dos cristãos) e pode levar a indiferença.
Depois de resolvido o dogma trinitário pelos padres capadócios, que explicaram que Deus é Uno e Trino, são pessoas (hipóstase) e mantem a unidade (ousia), Damasceno vai se debruçar sobre a relação entre as três pessoas e cria um termo usado também na filosofia: pericorese, a interpenetração nas relações, isto é a possibilidade de ouvir o Outro não apenas por respeito, que já seria um passo, mas tentando penetrar e entender as razões de seu pensamento.
Foi João Damasceno (675-749) ou de Damasco foi um padre Sirio, que estudo direito e musica e na teologia estudou relação de pericorese ou a relação trinitária, o termo emerge propondo a articulação entre a unidade e a comunhão na Trindade, parece simples dizer isto, mas difícil de entender e praticar, pois a maioria das relações excluem o Outro que é diferente, seja ele de cor, raça, credo ou cultura, muito a frente do seu tempo João Damasceno era amigo dos sarracenos, mas tarde a igreja católica o tornou santo.
No seu percurso teológico histórico procurou buscar algo que explicasse a relação, que estive de acordo com aquilo que as escrituras diziam de Deus e sua relevância na história: a articulação entre o conceito de Deus que é trino e uno, mas sendo cada um, uma pessoa singular (prosopon) e Deus, João estruturou a via intra-trinitária, a partir do conceito grego de pessoa: hipóstase.
Na palavra grega significa hypo, o que é sub, debaixo, e stasis, o que está sub-posto, como se fosse um suporte, porém como relação divina este conceito devia ser ampliado e explicado.
O termo pericorese emerge nesta Teologia Patrística, como a articulação entre unidade e comunhão da Trindade, mas indo além, assim o Pai é uno no Filho e o Filho uno no Pai, e ambos unos no Espírito Santo, assim há uma interprenetração, é mais que pura relação, é Ser no Outro.
O problema de algumas interpretações religiosas é a relação estática dos três, que é a relação dualista que vem da filosofia idealista, onde sujeito e objeto estão separados e são relacionais por um tipo de transcendência, que na verdade nada tem a ver com o mistério Divino nem é religiosa.
O mistério divino tem a ver com o período Pascal, morte e ressurreição numa relação trinitária, na filosofia há algo semelhante que é a epoché, a suspensão de conceitos (ou juízos religiosos) porém colocados entre parênteses, gera assim uma abertura que permite a relação, e como resultado que cada pessoa é compreendida, ela não perde sua identidade e é capaz de entender o Outro.
Numa ascese espiritual mais profunda é o esforço de entender e amar o Outro que é diferente, que não é meu espelho, não tem os meus conceitos e juízos, não classifica o mundo como eu, a grande tragédia de nossos dias é a falta de pericorese, e assim de relações trinitárias.
Penso que a pandemia nos mostra isto, mesmo tendo uma grande dor que mata a todos e que sensibiliza muita gente, que abre o coração para olhar o sofrimento do outro, há aqueles que se fecham em grupos, ideias e esquemas para não olhar a dor, a fome e o desespero que a pandemia gerou, ou acordamos juntos ou perecemos juntos, ficar na nossa trincheira é não relacional.
Platô do corona no Brasil
Defendemos aqui o uso de LockDown, sendo que na semana passada já seria tardio, agora o que a curva mostra é um platô em 1 mil mortes durante 14 dias (sem o LockDown a curva alongou), dependo de quando começará a cair é que se pode avaliar a extensão do platô e a perspectiva de queda, como foi feito um feriadão a uma semana, com resultado pequeno, espera-se alguma resposta em uma semana.
A perspectiva será de uma queda tão lenta quando a subida, contando só a partir de março para ficar fácil a projeção (março, abril e maio) teremos a retração da curva só em agosto (junho, julho, agosto) que coincide inclusive com o final do inverno, assim a “nova normalidade”, pois não há como prever o que pode acontecer depois inclusive se houver uma segunda onda de infecção, só mesmo em setembro.
Qualquer plano que pretende uma abertura maior, que conte com a colaboração e educação da população que não aconteceu até agora, é uma aventura, um mergulho no escuro.
O sensato seria permitir abertura de comércio com severas restrições e punições, a colaboração é de metade da população no máximo, o que é insuficiente para conter a contaminação, e contamos ainda com a desinformação as vezes auxiliadas por governantes.
Sairemos da pandemia mais divididos que antes, com a moral baixa porque não fomos liderados e nem tivemos capacidade de nos unir, e procurar culpados vai ser pior do que a própria pandemia porque teremos que enfrentar uma situação económica grave a seguir.
Ter esperanças que alguma lição tiremos disto, os milhares de médicos, enfermeiros, auxiliares, motoristas, socorristas e seguranças que ajudaram a salvar vidas, a solidariedade de quem socorre a população desempregada e as instituições que lutam para manter este socorro.
Podia ser pior, sim se não houvesse o isolamento social e os hospitais de campanha que ampliaram a capacidade do sistema de saúde, se não houvesse a ajuda emergencial para os desempregados e trabalhadores informais, além da ajuda do bolsa-familia, mas fica no povo a impressão que faltou uma decisão mais firme de um isolamento social maior.
A pandemia não passou, e a queda da curva vai depender da população e da vigilância.
O pós-pandemia e a espiritualidade
A vida feita de exercícios que nos levou a “Sociedade do Cansaço” (Byung Chul Han) apesar da pandemia e da quarentena em muitos lugares não parou, acostumados ao ritmo frenético da sociedade moderna, continua-se atrás da ação, da agitação e de preencher o vazio com nada.
Apressados já há os que prognosticam uma sociedade mais fechada em fronteiras, fortalecendo o nacionalismo e o protecionismo nos negócios, os que proclamam uma “nova ordem mundial” (uma nova teoria da conspiração) e os sempre prontos a defender as ideologias: é nossa vez.
Porém assim como a pandemia ninguém previu o que virá está fora das grandes teorias e uma novidade será uma busca de refugio em forças além do humano para suportar as novas e reais novidades que já aconteceram: maior recolhimento em casa e tempo para inspiração e contemplação, uma vida mais pobre ou ao menos mais austera, e, as novas formas de convívio.
Os que apocalípticos da sociedade em rede, redescobriram as novas mídias, porém devido ao atraso ainda o uso é irregular e mais curioso que frutuoso, mas com o tempo amadurecerá, há um hiato sem dúvida que é a educação online e pouco se pensou e se planejou sobre isto.
Porém uma coisa já mudou, algo fizemos com nosso “tempo livre”, fazer a comida da casa, dividir as tarefas cotidianas, olhar com olhos novos as pessoas do convívio próximo e para muitos um novo olhar sobre a natureza e a nossa própria natureza: o complexo fenômeno humano.
Se fizemos grandes teorias do diálogo, agora temos que praticá-la ou ficaremos presos a nossas relações mais próximos, pois ao sair delas enfrentamos um Outro diferente e impensado.
Os que sobreviveram a pandemia, e ela poderá inclusive retornar, a Espanha e a China apresentam novos casos preocupantes, vai requerer de cada e da sociedade uma lição nova: repensar tudo o que tem sido os fundamentos de nossas vidas, inclusive a religiosa, podemos acordar ou não.
Aos convictos do futuro próximo lembro que não previam a pandemia, talvez uma guerra ou uma profecia, ou um caminho histórico irrevogável, um vírus invisível e desconhecido balançou a vida.
#LockDown de feriado, não fizemos a lição de casa
A taxa de isolamento social subiu para 51% no Estado de São Paulo e 53% na Capital, o que é muito pouco perto do avanço da Covid 19, embora os números indiquem estarem estabilizados num patamar em torno de mil mortes, a queda poderá ser muito lenta se não houver formas de aumentar o nível de isolamento social, o dia de hoje também é feriado antecipado em São Paulo.
Aos poucos vamos tirando lições duras da pandemia no Brasil, mesmo com a reunião do governo com governadores o já previsto “day after” aconteceu e da pior maneira possível, o vídeo da reunião ministerial causou perplexidade em todo país e aumentou a distância entre poderes e do governo com governadores e prefeitos.
O frio também chegou embora ainda estejamos no outono no hemisférico sul, e a América Latina já é o novo epicentro da pandemia, enquanto a Europa devagar vai retornando a nova normalidade (embora Espanha tenha problemas), e com esperanças de eliminar a pandemia e que os índices de infecção caiam ainda mais.
Os leitos na capital estão se esgotando, chegaram neste domingo a 91% de ocupação, assim ou toma-se uma medida dura ou será inevitável acontecer um novo avanço na curva de mortes e o Brasil já é o segundo só abaixo dos EUA.
A esperança da vacina avança na farmacêutica AstraZeneca da Inglaterra, seu CEO Pascal Soriot afirmou neste domingo (24) que o Reino Unido poderá ter acesso a vacina em setembro deste ano se os testes forem bem sucedidos, agora com 10 mil voluntários que começam a ser vacinados.
Apesar do isolamento social ser aquém do necessários, sua eficácia é comprovada, a curva que é exponencial de mortes e de infecções, deve ser analisada numa escala logarítmica (veja figura), onde pode ser observado, inclinações cada vez menores podendo ficar numa inclinação horizontal quando este número parar num patamar, que seria o desejável para não ultrapassar o limite do sistema de Saúde, dependendo da medida de #LockDown podemos variar de 30 a 100 mil mortes.
Sobre São Paulo, os cientistas avaliam, a analise foi feita por pesquisadores da USP segundo o portal G1, que ao invés de termos um pico podem ter uma platô onde o pico máximo se mantém por vários dias antes de recuar, isto também esgotaria o sistema de saúde já em taxa elevada.
Alguns estados já revelam uma atenuação da curva, é o caso de Rio Grande do Sul e Santa Catariana, porém Amazonas continua grave, já o Ceará e Maranhão devido ao #LockDown tiveram melhoras enquanto o Pará ainda não mesmo com o isolamento radical.
A verdade, o método e a vida
O conceito contemporâneo de verdade, embora bastante preso ao logicismo e idealismo, nasce da maiêutica de Sócrates, técnica de valorização do diálogo para a parturição (vem de parto) de ideias que são consolidadas de acordo com as condições concretas do conhecimento (diz-se material, mas o hilé grego é algo diferente de matéria hoje) onde se questiona o que é inabalável e absoluto.
Entre as verdades modernas fortemente influenciada por Hegel, há uma dose elevada de subjetivismo, dita da seguinte forma em Fenomenologia do Espírito: “… tudo decorre de entender e exprimir o verdadeiro não como substância, mas também, precisamente, como sujeito. Ao mesmo tempo, deve-se observar que a substancialidade inclui em si não só o universal ou a imediatez do saber mesmo, mas também aquela imediatez que é o ser, ou a imediatez para o saber. […] “, assim parece referir-se ao Ser e ao Espírito, porém é subjetiva e fluida.
O que resultou do hegelianismo foi a formulação da ideia de Poder exercída pelo Estado e dela decorrerá grande parte das formulações modernas, até chegar ao relativismo geral, ou seja, em termos rudes “cada um tem a sua verdade”, retornamos a doxa grega, a mera opinião.
Torna-se necessário assim discutir o método, porém também as metodologias modernas estão penetradas de dogmatismo, a mera repetição de conceitos abstratos, a construção lógico-teórica de teorias formais, o empirismo, segundo Popper o maior perigo da ciência moderna, e a base da retórica idealista: a verdade abstrata.
A hermenêutica inicialmente e mais tarde a círculo hermenêutico a partir de Heidegger e consolidado em Verdade e Método de Hans-Georg Gadamer, reconstrói uma maiêutica moderna, onde não só o diálogo se viabiliza, como também a possibilidade de uma fusão de horizontes torna-se possível, inclusive em diálogo com a ontologia clássico e a historicidade moderna.
O método hermenêutico tem profunda relação com a vida, o Lebenswelt de Husserl, é eficaz para o diálogo com visões de mundo diferentes, assim favorece a relação ente pessoas que expressam culturas diferentes, e assim é crucial para a interpretação de textos nos campos do direito, da teologia e da literatura, sem fundamentalismo e falsa ortodoxia que esconde o erro e a doxa.
A hermenêutica numa relação pandêmica faz pessoas agirem juntas mesmo com uma leitura política, médica e social diferente, é ela que ajuda discursos distantes a se solidarizarem pela vida, o bem comum e no futuro próximo traça planos para a recuperação da sociedade pós-traumática.
#LockDown ainda que tardio
Países que realizaram um #LockDown mais cedo tiveram êxito não apenas nocombate ao coronavírus, como é o caso da Nova Zelândia e da Eslovênia, primeiro país europeu a não registrar nenhuma morte pelo covid-19, como também tiveram o retorno a nova normalidade mais cedo.
Até mesmo do ponto de vista econômico foi melhor medidas radicais, poder retomar mais cedo com as atividades sociais, pois as econômicas deverão ser retomadas aos poucos e em muitos casos já sofreram mudanças radicais, o que estão chamando de nova normalidade, casos como a Suécia e a Coréia do Sul (que não é verdade que não tenha feito fortes restrições de isolamento social, embora não seja um #LockDown total), foram isolados, mas tem um povo consciência e organizado capaz de cumprir regras sociais.
O Brasil já tem algumas cidades do Norte e Nordeste com um #LockDown decretado, no sudeste é mais difícil tanto pelo volume populacional como por uma parte da população que insiste em ignorar aquilo que salta os olhos: a agressividade do coronavírus e o número de mortos, além do esgotamento do sistema de saúde.
Entraremos numa semana de conflito, com mais um ministro da saúde que sai do governo central, com medidas de liberação do governo central e medias restritivas de governadores, além do polêmico uso da hidroxicloroquina cuja eficácia não tem comprovação científica, além dos efeitos colaterais.
O resumo de todo o problema brasileiro é a impossibilidade de uma discussão racional em torno de um tema que afeta a morte de milhares de pessoas, no entanto, continuamos defendendo um #LockDown nos grandes centros, que são os focos principais do vírus no país, para que a curva pare num patamar, que está em torno de 900 mortes diárias, o número 485 do domingo é uma subnotificação, devido aos centros médicos que reduzem o pessoal nos fins de semana.
Esperamos uma semana muito turbulenta, que se não bastasse resta ainda mais polêmica na área política, com retorno a velhas práticas já condenadas pela sociedade de fisiologismos, espera-se que os governadores e prefeitos mantenham uma posição firme diante da urgência do #LockDown.
Pandemia e poder
Uma situação de catástrofe se enfrenta com solidariedade, compaixão com os que a sofrem diretamente, apoio aos que devem enfrenta-la de frente e principalmente com todo apoio daqueles que podem e devem dar condições para o enfrentamento da catástrofe.
É também uma situação nova, que exige que todos revejam ações, conceitos e o próprio estilo de vida pode e deve mudar, aqueles que se comportam tentando evitar a nova rotina, atrapalham o enfrentamento da catástrofe e a pioram pessoal e socialmente.
Tudo isto envolve poder, os poderes centrais e os micro-poderes, o filósofo Foucault desenvolveu o conceito de biopoder, ou seja, o controle dos fenômenos coletivos a partir dos processos de natalidade, longevidade, mortalidade e fecundidade, já em filosofia recente Byung Chul Han criou o conceito de psicopoder, aquele que através das mídias e da comunicação controla o meio social.
A pandemia parece ter conjugado os dois, e ainda mais aprofundado a antropologia humana no seu retorno a casa, usa tanto a questão do controle da mortalidade como a comunicação, em especial a digital, para tarefas, compras e trabalho em casa, assim como o controle pelo poder.
As instituições do estado são mobilizadas, assim o Estado Moderno entra em cena, para solidarizar ou para abrir suas contradições ao meio social, hospitais, instituições de ensino e meios de comunicação de massas são todos mobilizadas pelas forças do poder.
Aparecem as faces mais fraternas e mais hostis do modelo idealista, na ânsia de substituir a saúde e o poder da solidariedade intrinsicamente fraterna da família, da espiritualidade e do bem-comum social ele poderá apontar para uma saída ou colocar o conjunto da vida em xeque.
O poder religioso também está em xeque, com os templos fechados ou dão respostas sérias e concentras ou ficam no subjetivismo espiritual de frases e chavões conhecidos que não explicam nem resolvem nada, o dualismo subjetivismo/objetivismo desmorona e pedem um transcendente.
Na leitura cristã de João (Jo 15,15) pode se ler: “Já não vos chamo de servos, mas de amigos pois o servo não sabe o que faz o seu Senhor”, e isto é fundamental numa pandemia, e gera solidariedade.
E para aqueles que vão além da amizade e geram o amor fraterno, há uma promessa divina que consola e nos fortalece neste momento (Jo 14,21): “Ora, quem me ama, será amado por meu Pai, e eu o amarei e me manifestarei a ele”, e terão paz interior para enfrentar a guerra exterior que a pandemia gerou.
A pandemia e o sinal de Jonas
Nínive (atual Mossum) foi uma das maiores cidades durante o reinado dos assírios, para os padrões da época tinha mais de 100 mil habitantes e era bastante alargada já que a Bíblia revela que Jonas levou 3 dias para explorá-la e pedir a mudança de conduta de seus habitantes.
A data em que aconteceu a pregação em Nínive é incerta e o próprio autor do livro que leva o nome deste profeta também é desconhecido, mas como se refere ao reinado de Jeroboão II como rei de Israel, a data deve estar entre os anos 700 e 742 a.C., pela escrita do texto num aramaico típico do hebraico tardio, tanto em estilo como em gramática, é pós-exílio o que significa entre 722 e 742 a.C.
Do final do século XVII a.C. (quando o Império Neoassírio caiu), até meados do século VII, era uma entidade geopolítica, governada por outros povos, os assírios eram conhecidos por sua impiedade e violência, onde podia-se até matar por dívida, e a narrativa bíblica disse que o profeta Jonas que devia pregar e pedir a mudança e conversão do povo, teve medo de fazer sua missão.
Não se sabe ao certo qual era a praga que poderia vir ao povo ali, mas o povo incluindo o rei todos mudaram de atitude e se converteram, e a praga não aconteceu naquela região, a pandemia atual já tem o seu sinal de mudança de hábitos e a exigência da solidariedade com todos, mas há ainda aqueles que pensam que a pandemia vai passar sem nenhuma mudança de atitude.
Os livros de história não registram exatamente qual foi a mudança, mas foi durante o governo de Assurbanipal, filho Assaradão, que faleceu em 667 a.C., que a Assíria viveu seu período mais profícuo, construindo inclusive a primeira Biblioteca da história, justamente a Biblioteca de Nínive, que é onde se encontram os milhares de textos (crônicas, cartas reais, decretos, religião, mitos e muitos outros) escritos em tabuleta de barro cozido.
A mudança que precisamos não apenas para evitar o número de mortes que cresce, vai desde hábitos pessoas até a preocupação com a alimentação e manutenção de vida dos que já não tinham emprego, os que agora não tem e os que devem perder com o crescimento da pandemia.
Para os que creem devem também repensar em que creem e vivenciar o que creem, senão é só uma lenda ou fábula contada como uma bela estória.
Midias, redes e isolamento social
Os três fatores agora se conjugam e desvelam a realidade que muitos “teóricos” apontavam da mundialização, enquanto neo-teóricos ficam em filosofias abstratas que mal interpretam a realidade pandêmica ou que nada dizem sobre ela.
Um que anteviu a realidade, Manuel Castells que escreveu a Sociedade em Rede, explica porque não conseguimos antever o vírus, sua potência e violência não eram biologicamente possível de conhecer, mas a necessidade de uma política de saúde séria e uma educação para o futuro não só ele apontou, como também Sloterdijk, Edgar Morin e muitos outros.
Sobre a crise atual Castells diz que é preciso entender o aplauso das sacadas dos prédios aos médicos, enfermeiros e profissionais da saúde e levam a saúde mais a sério, isto podia ter sido previsto e estaríamos noutra etapa, defensor da tecnologia culpa também uma idolatria dela.
Afirmou que a supervalorização da tecnologia no caso da saúde atrasou o sistema como um todo, e ao mesmo tempo a desvalorização e incompreensão de sua aplicação em educação e no trabalho levou a um atraso que agora tenta-se superar mas com certa defasagem.
As redes sociais, cujas mídias potencializam, mas não são a mesma coisa, como é o caso da tele- medicina como uma possibilidade secundária agora, pois o paciente com covid precisa de lugar físico e ser assistido presencialmente, ainda que decisões e conferências online sejam úteis.
O isolamento social potencializou o uso das mídias nos lares e influenciou agora mais a fundo o mundo do trabalho, compras e serviços online, e a educação corre atrás do tempo perdido, a descoberta mais óbvia é que educação online não é simples e não é o mesmo que a presencial.
A mudança global deverá ser feita se desejamos combater com eficiência o vírus, deixar os avisões em terra e proibir as pessoas de viajar, é possível temporariamente, e o pior favorece a visão neo- nacionalista que levou muitos países a crise pandêmica, pensava-se o problema é na China.
Afirmou Castells, em entrevista recente: “um sistema global interdependente requer uma governação global, não necessariamente um governo global. Mas os Estados-Nações resistem a perder seu poder e cada um utiliza mecanismos de governança supostamente globais para defender seus interesses nacionais”, apesar das barreiras diria que o vírus não sabe que existem fronteiras construídas, mesmo com os “isolamentos” nacionais por barreiras protetoras.
O que precisamos diz Sloterdijk é um “escudo global”, a co-imunidade, agora com investimentos sérios, como co-governanças globais e levando a sério a saúde, o trabalho e a educação em uma nova normalidade, podemos voltar a frivolidade anterior, mas seremos irresponsáveis com o futuro que pode vir, ou uma nova onda deste vírus ou sua mutação, ou outro que é certo virá.
LockDown e frivolidade
Enquanto o vírus se expande e começa a chegar mais no interior do Brasil e em muitos lugares a vida continua “normal”, enquanto a Europa tenta aos poucos voltar a nova normalidade, isto é, voltar ao comércio e o consumismo e a vida agitada anterior, que Sloterdijk chama de frivolidade (El país).
São dois cenários, o caso brasileiro enquanto alguns apostam que a curva chegou no platô, os novos dados apontam para uma expansão ainda maior do vírus, apostar que podemos conter a grave situação pandêmica com medidas pouco radicais vai se mostrando ineficiente.
A razão da pressão para abertura do comércio, mais que econômica, é claro que ela atinge a economia de todo o planeta, o motivo real na cabeça de muitas pessoas é voltar ao dia a dia de um elevado stress, de correria e de consumismo para aqueles que dispõe de recursos para isto.
Atingimos, no Brasil, o patamar de 10 mil mortes, tanto na vida pessoal quanto na vida social, se chegamos a uma gravidade de uma doença ou tomamos medidas radicais ou assistimos ao total agravamento da doença, no caso social, a expansão virótica e o agravamento da pandemia.
Na reflexão de Sloterdijk, que escreveu ao meu ver, dois livros emblemáticos Esferas e Crítica da Razão Cínica, ele apresenta dois conceitos-chave que são a coimunidade e a antropotécnica.
O primeiro conceito de coimunidade significa que podemos estabelecer um compromisso individual voltado à proteção mútua, que marcaria uma nova maneira mundial de enfrentar os problemas e o conceito de antropotécnica significa entender que as técnicas, neste caso e é o principal conceito usado por Sloterdijk, a biotecnologia, ou seja, o que inclui a manipulação genética.
Quando lançado gerou muita polêmica na Europa, devido a manipulação de genes por exemplo, porém agora que as principais pesquisas de defesa do coronavirus mostram a importância do uso de anticorpos para a produção da vacina, e a primeira coisa foi a foi a sequenciação genética.
O agravamento da crise brasileira exigirá um confinamento mais sério, ou veremos os números extrapolarem e o Sistema de Saúde já praticamente esgotado.
O confinamento é necessário e a volta a frivolidade deve ser repensada como forma não apenas de evitar uma crise econômica maior, mas principalmente a distribuição de bens mais justa.