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A paz e a morte do papa
As conversações de tréguas entre Rússia e Ucrânia, entre Israel e o Hamas e a guerra só tarifaço de Trump põe o mundo sob alerta de uma grave período de instabilidade civilizatória.
A morte do papa Francisco nesta madrugada da Brasil e manhã da Itália significa também a perda de um defensor incansável da paz e repercute no mundo todo.
Em nota oficial, na tarde de hoje (21/04) o Vaticano esclareceu que a morte do Papa Francisco aconteceu as 7h35 (hora da Itália), portanto 2h35 do Brasil), causada por:
– AVC Cerebral
– COMA
– COLAPSO CARDIOCIRCULATÓRIO IRREVERSÍVEL
Deixo um vídeo pessoal onde faço uma reflexão sobre o verdadeiro pensamento do Papa sobre questões polêmicas expressa no capítulo 3 de sua encíclica Fratelli Tutti (todos irmãos), segue:
A grande paixão civilizatória
Guerras militares, guerras de mercado, situações endêmicas (a dengue atualmente no Brasil, por exemplo) e uma retórica polarizadora sem fim é uma crise civilizatória, a base não é a situação conjuntural de agora, ela vem desde o início da colonização e se agravou com duas guerras mundiais.
Parecia no final da segunda grande guerra que com a ONU, o estabelecimento de direitos humanos e os acordos nucleares que tínhamos encontrado a saída, porém a base de todo este processo, temos postado aqui, é um pensamento idealista, que a polarização chama de neoliberal e o outro polo de comunista, porém toda guerra é de pilhéria e morte de inocentes.
Reunidos pela OTAN, os ministros da Defesa europeus (foto) salientaram em reunião finalizada no domingo (13/04), que apesar das negociações dos Estados Unidos com a Rússia, que ambos consideram avanços, a Europa desacredita porque as agressões da Rússia continuam, e ameaçam a região.
Não importa a retórica, a base de todo pensamento idealista/iluminista é um estado forte e muitos países não abandonam este pensamento, a crise tarifária agora é a manifestação do lema de Trump: “American first”, americano primeiro enfrentando até mesmo a Europa.
O pouco que entendo de economia, entendo que há uma interdependência das nações, um carro produzido em qualquer parte do mundo tem peças produzidas no mundo inteiro, os americanos querem que voltem a ser produzidos lá, com as tarifas o carro americano fica mais caro, enquanto a tática da China tem sido produzir barato e dominar os mercados.
Aliás a pedido das montadoras americanas, no quesito produção de carros Trump recuou, no sábado (12/04) recuou também na taxação de smartphones, computadores e chips.
Haverá mais empregos nos EUA, mas isto não me parecia um problema, muita gente ia para lá porque haviam empregos e bem remunerados, porém neste quesito a deportação de ilegais é também no caminho contrário e a falta de mão de obra poderá representar outro problema.
A guerra no Oriente Médio segue cruel com os Houthis, nos ataques o chefe da inteligência do grupo Abdul Nasser Al-Kamali foi morto, e as ameaças ao Irã prosseguem um caminho perigoso.
Há sempre esperança, há sempre negociadores com desejo sincero da paz, o que faz a crise civilizatória avançar é o pensamento imperialista e belicista aumentar com a eleição cada vez maior de governos autoritários, influenciados pelo pensamento iluminista, que veem os países de outros povos como inimigos e não cedem em qualquer processo de negociação.
É uma semana para os cristãos que envolve a paixão de Jesus, parece estar mais próxima de uma paixão civilizatória da humanidade, é preciso pensar nos inocentes, no futuro da humanidade e na paz tão desejada, mas pouco lembrada na hora de algum conflito, é preciso semear a paz.
Liberdade, memória e eternidade
O tema pode parecer apenas teológico, mas não é, tanto Hannah Arendt como Byung-Chul Han trataram este tema, claro além de autores de alcance teológico como Agostinho de Hipona e Thomas de Aquino, também por autores atuais como Kierkegaard, Heidegger e Ricoeur que delinearam algumas questões na problemática entre tempo e eterno.
O esquema epistêmico de Hannah Arendt é bem mais profundo porque apresenta também o aspecto político: a memória, que tem referências a história, a narração, que tem a ver com a possibilidade ([hermenêutica] de resgatar os eventos, e a imortalidade, que coloca a ação do mundo concreto, tornando homens seres capazes de continuidade no tempo, visto assim:
“o sentido da Política é a liberdade” (ARENDT, 2002, p. 9).
Mneumônicos são inseridos em processos para preservar a narração, ou seja, sua memória.
Por outro lado, a imortalidade é aquilo que está sendo perpetuado pela memória e narração, porém a autora não se negou a ver uma diferença entre imortalidade e eternidade, apontamos no post anterior aquilo que é também a elaboração da autora, a ligação entre estas categorias.
Isso não nega e sim evidencia a concepção de imortalidade, que se impõe como aquilo que está sendo perpetuado no tempo pela memória, pela narração e também se desenvolve como uma Vita Activa, isto é o que compõe a tradição e a atualização de uma narrativa e neste ponto se confunde com a teologia, ou seja, ultrapassa o temporal e se desvela no eterno.
A tradição porém, foi gradativamente perdendo essa noção do público e do privado, a ponto desta fronteira entre os dois desaparecer, é fácil perceber isto na atualidade ao ver a exposição do privado até mesmo daquilo que é mais sagrado, e na concepção de Arendt, isto é um prejuízo vital, em vista da ação, categoria central para a constituição do mundo público, ela deixa de ser considerada em favor do respeito aos membros da sociedade.
Byung-Chul Han, no livro o Enxame sentencia: “o respeito é o alicerce da esfera pública. Onde ele desaparece, ela desmorona. A decadência da esfera pública e a recente ausência de respeito se condicionam reciprocamente.” (B.-C. Han, No exame, 2018, p. 12).
Arendt ressalta a ausência de empatia: “A morte da empatia humana é um dos primeiros e mais reveladores sinais de uma cultura à beira da barbárie”.
As religiões chamaram isto de aliança, porque todas elas têm um caráter simbólico, como a Arca da Aliança para o antigo testamento e a Paixão de Jesus para o novo testamento, este significado é o transcender a morte (eternidade), ultrapassá-la com todos seus valores: ódios, guerras, divisões e todo tipo de desumanidades praticamos pela finitude humana (Pillars of Creation, imagem do telescópio James Webb).
ARENDT, A. O que é Política. Tradução Reinaldo Guarany. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.
Finitude, guerras e paixão
Não nos referimos aqui a paixão emocional, porém aquela que os sofrimentos causam e que segundo o sentimento religioso (lembrando a paixão de Jesus) é também um momento de muitas mudanças trágicas e reafirmação de um alento salvífico.
O homem quando esquece de sua finitude se imagina dono do seu futuro e não olha ao lado.
A humanidade parece viver isto, agora no lado econômico, com uma economia já frágil devido as guerras, o tarifaço do governo Trump sobre as importações daquele país trazem uma forte instabilidade no comércio internacional, com reflexo no câmbio financeiro e nas bolsas.
Apenas alguns países com pouca expressão econômica ficaram fora deste tarifaço, as ilhas Seycheles, Burkina Fasso e algumas ilhas do pacífico, até mesmo o governo da Argentina que correu para algum acordo (Milei foi pessoalmente aos EUA) voltou de mãos vazias, a desculpa foi o atraso do helicóptero que levava Trump, mas pouco depois afirmou que exige que um afastamento da China que tem fortes investimentos lá, desde o governo anterior.
As tarifas lembram os níveis do Ato de Tarifas de Smoot-Hawley de 1930, aprovado por uma margem de 20 votos no Senado americano, que provocou uma guerra mundial global e aprofundou a Grande Depressão, conforme análise de especialistas em comércio.
Não apenas por estas tarifas, pois cresce a impopularidade do governo Trump, houveram diversas manifestações neste fim de semana nos EUA, até tradicionais parceiros os vizinhos México e Canadá estão nesta guerra, já com medidas de retaliação as importações dos EUA.
As bolsas asiáticas já abriram em “forte queda” nesta segunda feira, segundo diversos canais de notícias, e deve provocar além dos problemas econômicos agravamento nas guerras e uma onda ainda mais forte de governos autoritários, medidas de restrição de liberdade, etc.
Assim é um clima de paixão, não a divina, mas a humana, o processo civilizatório pode entrar em uma fase mais acelerada que as guerras militares em uma crise econômica e humanitária, que já é grave em quase todo o globo, tudo parece próximo ao cenário da pré-guerra de 39.
O Brasil na época, durante o início do governo Vargas (que depois de eleito se tornará uma ditadura) queimou toneladas de café nos portos, então uma riqueza nacional, para segurar os preços e isto encerrou o grande ciclo do café no Brasil e em especial no Estado de São Paulo, grande produtor.
Dois analistas econômicos André Valério e Rafaela Vitória afirmaram que “o cenário que já era complexo ficou consideravelmente mais incerto”, referindo-se também aos índices de produção no Brasil que tiveram uma leve queda em fevereiro/2025 apontou Rafaela no X (veja o gráfico).
O agir segundo a Vita Activa
Conforme exposto anteriormente a Vita Activa não é separada da Vita Contemplativa, isto já estava elaborado em Hannah Arendt e será amplamente tratado em Vita Contemplativa de Byung Chul Han.
Para estabelecer paralelos é preciso entender que Arendt retoma Aristóteles que via três modos dignos da vida do homem, os povos submetidos a escravidão pela guerra permaneciam ligados aos senhores apenas para suprir as necessidades de manterem-se vivos, e o filósofo grego via de modo similar a vida dos artesãos e mercados.
Para ele o homem “político” era realmente livre e podia se dedicar ao contemplativo, assim a dignidade estava ligada a contemplação, mas vista como a vida da fortuna (a Eutychia) que personificava o destino, boa sorte, prosperidade e abundância.
Isto porque o homem ainda que aspirasse a imortalidade, é a vida sem a morte nesta terra, é uma vida “imanente” neste mundo, Arendt vai diferenciar da eternidade, que aspira um além do cosmos, ou o próprio cosmos pensado com criação da eternidade transcendente.
Já a imortalidade é continuidade no tempo, é vida sem morte nesta terra, é vida “imanente” a este mundo, a vida dos deuses do Olimpo era assim do modo como os gregos entendiam a natureza e sua “imortalidade” junto ao cosmos, sendo a mortalidade dos homens o que o distinguia no cosmo.
Byung-Chul descreve que “poucos antes do Vita activa ou sobre a vida ativa de Arendt, Heidegger proferiu uma palestra com o título Ciência e reflexão [Besinnung]. Em oposição à ação que impulsiona adiante, a reflexão nos traz de volta para onde sempre já estamos” (Han, 2023, p. 62), assim “uma dimensão da inatividade é inerente à reflexão” (idem).
Para Hannah Arendt, labor e trabalho são dois elementos que compõem a atividade humana, juntamente com a ação, enquanto labor corresponde a atividade biológica do ser humano para sua sobrevivência como espécie, já o trabalho permite a criação de objetos e a transformação da natureza.
A sociedade da performance, do midiático e da impulsividade desloca o ser para uma ação que não é nem boa nem má, é pura reatividade e assim é incapaz do agir consciente, a ação do Ser.
É ainda fácil perceber aqueles que agem com sabedoria pelos resultados de suas ações, não a simples resposta a algum discurso ou ação, mas uma reflexão em ato, ainda que seja o silêncio.
HAN, B.-C. Vita contemplativa: ou sobre a inatividade. Trad. Lucas Machado, Brazil, Petrópolis, RJ: Vozes, 2023.
Silêncio, parte essencial da linguagem
A questão do silêncio é fundamental na valorização da linguagem, a palavra falada supõe que haja um interlocutor capaz do silêncio, se for profundo acontece o epoché (vazio interior) que todos os filósofos de certa forma impõe para que haja a articulação da palavra no pensamento, ela é antes e complementar a ação, Foucault foi um dos filósofos que percebeu esta lacuna já no século XIX.
No círculo hermenêutico ela é anterior ao processo de interpretação e necessária para que haja o diálogo e “fusão dos horizontes” como a hermenêutica filosófica exige, esse apenas agir sobre o impulso da linguagem omite uma parte essencial que é a reflexão, meditação ou para mentes que realmente buscam a verdade a contemplação, hoje há a impulsividade da ação.
Hans-Georg Gadamer foi o grande filósofo da hermenêutica, ele argumenta que não há só o conhecimento significativo das humanidades redutível ao das ciências naturais, uma lógica e uma linguagem apenas gramatical, há uma verdade mais profunda que o método científico.
Não é um simples retorno a metafísica, é o agir segundo o pensar, segundo uma articulação da consciência humana e coletiva, capaz de enxergar o outro e sua hermenêutica, capaz de rever o humanismo de todo homem, sem uma leitura vertical, da simples autoridade de poder.
Agamben em “A linguagem do silêncio” também fala desta articulação falsa da linguagem como um campo que procura apreender com a razão apenas ela é uma “experiência de linguagem que vai em direção ao pensamento sem jamais atingi-lo; ela é a tensão e infinita nostalgia, que jamais compreende o que quer apreender e jamais chega aonde quer ir” (Agamben, 2013, São Paulo, Revista Fronteira Z, p. 293).
O famoso canto das sereias que atraiam os marinheiros para a morte, na Odisseia de Homero (foto mosaico do sec. III Museu Nacional do Bardo, Túnis), é também esta falta de silêncio que Ulisses via em seus subordinados (Ulisses tapa os ouvidos e amarra os marinheiros no mastro do navio), tornou-se metáfora para o falatório que encantam seus seguidores, os maiores ditadores foram sempre bons oradores.
Assim colocar a contemplação em ação, requer uma verdadeira contemplação, a palavra lida é um guia sempre que é purificada por uma “arte de amar”, de solidarizar, de humanizar a ação.
Pequenas ações, ausência do pensar e grandes desastres
Li de um psicólogo: “Não são grandes ações que causam grandes efeitos!” é preciso estar atentos a pequenos vícios, pequenas faltas que julgamos toleráveis porque elas se tornam com o passar do tempo grandes problemas, a ideia de deixar livre tudo a nossa volta, torna-nos mais vulneráveis às frustações, as dificuldades da vida, as decepções e obstáculos.
Não se trata também da disciplina rígida dos ditadores e pessoas de pouco diálogo, donos da verdade, pseudo “pensadores” cada dia mais comum na vida cotidiana da sociedade midiática.
As ideias do simplificar, do fazer o que dá na “telha”, liberdade sem obrigações, um mundo sem obstáculos e sem dor (Byung-Chul Han: A sociedade paliativa: a dor hoje), cria um mundo de rebeldes sem medir consequências, ódios gratuitos, intolerância, bolhas e obstáculos ao diálogo, ao direito do Outro e do diferente, enfim a sociedade do ódio e da guerra.
Cada pessoa pode dar seu passo interior antes de levá-lo a sociedade, a ideia que toda ação é externa é própria do não-pensar, o agir impulsivamente e isto não tem apenas ligação com as novas mídias, mas a ausência de reflexão, de meditação e de contemplação (Vita Contemplativa, Hannah Arendt e Byung-Chul Han), pensamentos verborrágicos sem reflexão.
Explica Han citando Arendt: “Vita activa, de Hannah Arendt, começa com a distinção entre imortalidade e eternidade” (Han, 2023, p. 144), e prossegue: “Envolto pelo infinito, o ser humano, como ser moral, busca pela imortalidade ao criar obras que permanecem” (Han, p. 145), mas “em contrapartida, o objetiva da vita contemplativa não é, segundo Arendt, o persistir e durar no tempo, mas a experiência do eterno, que transcende tanto o tempo como também o mundo circundante” (Han, p. 145).
Esclarece que ao escrever também a própria Arendt pode ter tido a intenção de ser imortal, mas “mesmo a escrita pode ser uma contemplação que nada tem a ver com a busca da imortalidade” (p. 146) e ela admira-se que Sócrates não tenha escrito, renunciando assim a imortalidade, não o cita, mas também Jesus não escreveu, os evangelhos só foram escritos pelos discípulos.
Assumir os pequenos tropeços, recomeçar e pensar porque tropeçou ajuda a caminhar.
HAN, B.-C. Vita contemplativa: ou sobre a inatividade. Trad. Lucas Machado, Petrópolis, RJ: Vozes, 2023.
Maus acordos e ameaças
No mesmo dia (18 de março) em que o acordo de trégua parcial (apenas o ataque a postos de energia da Ucrânia e navios no Mar Negro da Rússia), a Ucrânia acusou de ter sido atacada em 8 estações energéticas.
A Rússia deseja que o banco estatal russo fosse novamente ligado ao sistema de pagamentos internacional, mas a Europa rejeita esta posição afirmando que isto só acontecerá quando a Rússia retirar todas as tropas da Ucrânia.
Uma coisa é fato da personalidade de Putin, ele despista, mas não blefa, quando fez o acordo de paz sobre a Criméia, curiosamente foi também no dia 18 de março de 2014, na visão de Putin ele faz o mesmo que a OTAN vai avançando sobre o terreno inimigo e demarcando posições.
A Europa teme novos avanços sobre países da OTAN, a julgar pela história a Polônia pode ser o próximo passo, ali Hitler avançou na II Guerra e o regime estabelecido pelo estado soviético no pós-guerra foi também cruel com o povo polaco, lembre-se as revoltas do Sindicato Solidariedade em Gdansk, já no período final do regime do general Jaruzelski.
Os acordos de trégua têm pouca sustentação porque não há forças “neutras” que os garanta.
Também o Oriente Médio vive sobre maus acordos, depois do acordo Hamas e Israel pouco ou nada caminhou no sentido de uma trégua mais ampla, o reconhecimento do território palestino não caminhou, Israel e os EUA querem manter o controle da região sob a ameaça de novos ataques a Israel.
O Irã que é um personagem nas sombras desta guerra, porque financia e dá apoio a grupos extremistas, a ameaça de Trump de bombardear Teerã teve como resposta que os EUA irão receber um “golpe recíproco”, o que Trump quer é um novo acordo nuclear de limitação das armas nucleares no Irã, é bom lembrar que são parceiros da Rússia que já possui vasto arsenal nuclear.
O mundo segue sobre a sombra de uma guerra insana, aqueles que não pensam sobre esta insanidade, não sabem os horrores e as consequências de uma guerra hoje.
A figura acima é uma escultura feita por Marie Uchytilová em Lídice, republica Checa, em lembranças a um grupo de 82 crianças asfixiadas com gás no campo de extermínio de Chelmno no verão de 1942.
A linguagem, o ser e o infinito
A linguagem e o ser são ontologicamente ligados, quer dizer, a linguagem é um modo do ser (ou sua morada) que Heidegger chama de Dasein e se apresenta na constituição fundamental do ser-no-mundo.
Porém os limites da linguagem não são limites para o ser, ela é a expressão da comunicação de nossa ligação com o outro e com o mundo, a marca característica da linguagem é o sinal (ou o signo como conceitua a semiótica) porque é ele que vai identificar o saber, ela o mostra o objeto e concede a ele uma “re-presentação” (aqui para lembrar o conceito de “presentar).
Já a eticidade como objetividade (este conceito é hegeliano que Heidegger usa) do representante (por isto usa o re-) dá a ele uma vigência presente do objeto, então é a palavra que produz o conhecimento concede uma verdade de correção de representação, então ela tem uma verdade lógica e assim outras correções serão necessárias, porém todas finitas no tempo.
Os limites da representação estão na escuta atenta e silenciosa ao outro do si-impessoal que todos trazemos em nossas relações, bem como é a escuta apropriada ao outro coexistente que o ser-aí dá a compreender o que realmente importa na relação consigo e com o outro.
Em seu trabalho “o caminho para a linguagem” (2003), escrito nos anos 50 (assim em sua maturidade, Heidegger falece em 1976), afirma que falar não é o mesmo que dizer, pois se pode falar muito sem nada dizer; por outro lado, ao calar-se e silenciar, alguém pode dizer muito, isto significa que falar pode ser apenas mostrar, aparecer, ver e deixar de ouvir.
Nada mais importante que em períodos midiáticos que desejamos ouvir parlatórios públicos e não ouvimos o outro em nosso silêncio interior, os gregos e a fenomenologia chamam de epoché, é tão importante que nenhuma filosofia ou religião realmente verdadeiras podem se abster deste recurso, assim temos uma filosofia vazia, pensadores de barriga cheia e vaidosos.
O passo para ir além, para estender o nosso conhecimento além da representação mundana é desvelar o mundo, já que sua re-velação é apenas um novo velamento, o desvelar nos faz ir além alcançar aquilo que para a objetividade presente parece impossível, não se trata nem de riqueza, nem de bens utilitários, nem de visibilidade pública, mas um encontro com o Ser.
Na Carta sobre o Humanismo (1949), no qual analisa seu período de viragem ao longo dos anos 30 e início dos anos 40, ele afirma que seu pensamento se dirigiu a relação do ser para a essência do homem, porém será este Heidegger que Peter Sloterdijk questiona porque somente viu uma face do processo, o esquecimento do ser, e deixou impensado o seu caráter propriamente domesticador, em seu livro: “Regras para o parque humano” em que questiona a bioengenharia, a tecnologia que recolocam a questão humanitária em crise novamente.
Alcançar o além dos limites humanos tem sido um desafio para o processo civilizatório e isto é divino.
HEIDEGGER, Martin. A caminho da linguagem. Tradução de Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis, RJ: Vozes; Bragança Paulista, SP: Editora Universitária São Francisco, 2003.
A paz e os horrores da guerra
As eleições na Alemanha, na qual os debates foram para polarizações jamais pensadas naquele país depois dos horrores da II Guerra Mundial fez muitas analistas pensarem que já estamos um pouco distantes daquele momento triste para a história da civilização e talvez não saibamos mais entender os horrores da guerra, não importam as narrativas, toda guerra é sempre algum tipo de saque, algum nível de genocídio e o que morre primeiro é a verdade.
Apesar de tentativas e propostas o conflito do leste europeu parece escalar em limites e em envolvimentos de forças antagônicas cada vez mais perigosos, a tentativa de um cessar-fogo não só fracasso, como também mostrou interesses diferentes daqueles que são declarados.
Também o cessar-fogo no médio oriente, depois de um primeiro ciclo, quando parecia que poderia entrar numa segunda fase, voltou a recrudescer, o exército israelense afirmou na última terça-feira (18/03) estar realizando “ataques extensivos” e o ministério da Saúde de Gaza, administrado pelo Hamas, disse que 400 palestinos ficaram feridos nos ataques.
No leste europeu, mesmo as propostas americanas de cessar-fogo inicial ter sido aceita, tanto o exército russo realizou ataques com drones a Kiev e fontes energéticas da Ucrânia, como a Ucrânia lançou ataques a uma base de armas nucleares na região de Engels (Oblast de Saratov), como também ataques a capital Moscou, inviabilizando qualquer cessar-fogo neste momento.
Uma análise da CNN, no sábado 22/05, o que a Rússia quer é muito, muito maior que o fim da Ucrânia como estado independente, há o desejo que a OTAN volte ao tamanho do que era no período soviético, países que hoje integram a OTAN estavam antes na esfera soviético-russa.
Não há uma visão forte de que a paz é melhor do que qualquer guerra, sentar a mesa e travar o debate diplomático evita a morte de milhares de civis inocentes, deixa de alimentar uma crise mundial que afeta a vida, por razões óbvias, o equilíbrio econômico e o espirito fraterno.
Ainda há muito que caminhar na direção da paz, desarmar espírito não só nos países em guerra, mas entre aqueles que nas sombras alimentam um espírito genocida do ódio e do conflito, o perdão e a concórdia precisam partir de cada pessoa que deseja um mundo de paz.