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Arquivo para outubro 23rd, 2024

O cosmos, a noosfera e a perdição

23 out

No capítulo sobre “A perda da salvação, a aventura desconhecida” do livro Terra-Pátria de Edgar Morin ele lança um olhar profundo sobre a nossa falta de cosmovisão e a perdição em nossas microscópicas preocupações que não olham um mundo e uma realidade maior a nossa volta.

Diz no início: “Se houvesse navegadores do espaço, sua rota no aglomerado de Virgem ignoraria a muito marginal Via Láctea e passaria longe do pequeno sol periférico que tem em sua órbita o minúsculo pla- neta Terra. Como Robinson em sua ilha, pusemo-nos a enviar sinais em direção às estrelas, até agora em vão, e talvez em vão para sempre. Estamos perdidos no cosmos” (Morin, 2003, p. 163).

Acrescenta: “Este mundo que é o nosso é muito frágil na base, quase inconsistente: nasceu de um acidente, talvez de uma desintegração do infinito, a menos que consideremos que surgiu do nada” (idem, p. 163).

Mas o homem na modernidade agigantou seu ego, quer ele próprio ser uma espécie de “Homo Deus” usando a metáfora de Yuval Harari, cujo subtítulo é “uma breve história do amanhã”, também pessimista como Morin, porém o autor de Terra-Pátria espera que o homem encontre um novo futuro mais promissor.

Morin ainda que reconheça que “A vida, a consciência, o amor, a verdade, a beleza são eféme- ros … Estamos na itinerância. Não marchamos por um caminho demarcado, não somos mais teleguiados pela lei do progresso, não temos nem messias nem salvação, caminhamos na noite e na neblina” (pgs. 164-165), acrescenta: “Estamos na aventura desconhecida. A insatisfação que faz recomeçar a itinerância jamais poderia ser saciada por esta. Devemos assumir a incerteza e a inquietude, devemos assumir o dasein, o fato de estar aí sem saber por que” (p. 166) lembrando esta categoria cara a Heidegger, que elaborou o “esquecimento do ser”.

Como recomeçar a itinerância, poderíamos perguntar, o autor dá uma “Boa-má nova” (lembrando a boa nova significado da palavra Evangelho): “Eis a má nova: estamos perdidos, irremediavelmente perdidos. Se há um evangelho, isto é, uma boa nova, esta deve partir da má: estamos perdidos, mas temos um teto, uma casa, uma pátria: o pequeno planeta onde a vida criou seu jardim, onde os humanos formaram seu lar, onde doravante a humanidade deve reconhecer sua casa comum (pg. 166), e a resposta mesmo agnóstica, não é diferente da evangélica.

E então lembra deste apelo: “O apelo da fraternidade não se encerra numa raça, numa classe, numa elite, numa nação. Procede daqueles que, onde estiverem, o ouvem dentro de si mesmos, e dirige-se a todos e a cada um. Em toda parte, em todas as classes, em todas as nações, há seres de “boa vontade” que veiculam essa mensagem” (Morin, 2003, p. 167).

E aqueles que conhecem esta mensagem, esta esperança não podemos permanecer calados, indiferentes ou o que é muito pior, aderir a desesperança, devem lembrar daquela mensagem evangélica: “A quem muito foi dado, muito será pedido” (Lucas 12, 39-48) sob a pena da omissão, da distorção ou do abandono da mensagem fundamental da salvação terrena e celeste.

MORIN, Edgar e Kern, Anne-Brigitte. Terra-Patria. Trad. francês por Paulo Azevedo Neves da Silva. Porto Alegre : Sulina, 2003.