O grande sono idealista
O sono idealismo foi propor metas a serem alcançadas que se mostraram aos poucos contraditórias e algumas delas são parte fundamental na crise do pensamento atual, nela as razões de estado precedem a vontade popular, mesmo que atue em nome dela, na verdade a concentração de poder parece justa aqueles que julgam ter a palavra final, enfim a razão, para exercerem o poder, isto tem origem medieval, embora difusa.
Ainda que a literatura diferencie “idealistas” de “realistas” isto existe após o paradigma renascentista/seiscentista, onde em “O príncipe” de Maquiavel (1513) fosse entendido que é lícito ao governante todos os meios facultados pela força e pela inteligência, desde que empregados com habilidade e conforme as circunstâncias (MAQUIAVEL, 2001, p. 85), assim despontam e todo mundo e em todas as sociedades atitudes de força consideradas razoáveis quando exercidas pelo Estado.
Também o contratualismo, a partir de Thomas Hobbes, que viveu entre 1588 e 1679, o Estado é a instituição fundamental para regular as relações humanas, dado o caráter da condição natural dos homens que os impele à busca do atendimento de seus desejos de qualquer maneira, a qualquer preço, de forma violenta, egoísta, isto é movido por paixões.
Nas palavras de Hobbes, “se dois homens desejam a mesma coisa […] eles se tornam inimigos”. Todos seriam livres e iguais para buscarem o lucro, a segurança e a reputação, lendo o autor nacional Francisco Welfort, em sua obra Os Clássicos da Política (2006), a igualdade entre os homens, na visão de Hobbes, gera ambição, descontentamento e guerra”, mas foi o idealismo que dividiu o Homem, ou o Ser do ente, como prefere-se na ontologia, em duas metades opostas.
Ainda que o contratualismo tenha o empirismo de Locke (1632-1704), onde o estado deve ser um mediador dos conflitos, interferindo o mínimo possível na vida dos indivíduos, e finalmente Rousseau (1712-1778) que afirma que o homem é bom a sociedade que o corrompe (vejam que há contratualismo de esquerda e de direita).
Voltando ao aspecto ontológico, no sentido heideggeriano: “a batida do coração por aquela “chave mágica” que poderia “rebentar mil cadeados” não seria o traço fundamental” (Han, p. 280), nela não se encontra uma luz rígida e perene, cuja violência e presença desenfreada como causa e senhora pudessem penetrar, explicar e dominar todos os fenômenos” (Han, p. 281) onde há uma referência direta a República de Platão, e Byung-Chul o vê como o primeiro Heidegger.
O segundo Heidegger é aquele que vê a clareira, que “não oferece um cenário fixo com uma cortina constantemente levantada, onde se desenrola o teatro do ente” (Han, p. 283) citando Heidegger, onde ele substitui o paradigma físico da “luz” pela figura da clareira, para “reagir contra os mecanismos violentos daquela luz que permite que tudo se coagule em imagem” (Han, p. 283), embora não haja referencia direta ao iluminismo, é inevitável a esta visão “luminosa” de poder.
A presença evidente é substituída pelo não aparente, que não pode se traduzir como a contraparte de um encontro: “Aqui não há mais ´encontro´, nenhum aparecer para o homem já se fixa previamente e capta o que apareceu” (Han, 284), o mundo das sombras de Platão nunca pareceu tão real quanto nos dias de hoje.
Assim faz sentido tanto “desvelar” como “clareira”, como termos que não são “re-velar” e nem iluminar, são veredas ontológicas onde o Ser “vive”.
HAN, Byung-Chul. Coração de Heidegger: sobre o conceito de tonalidade afetiva em Martin Heidegger. Trad. Rafael Rodrigues Garcia, Milton Camargo Mota. Petrópolis: Vozes, 2023.
MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. Tradução de M. J. Goldwasser. São Paulo: Martins Fontes, 2001.