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O Ser e o caminho

23 jun

Mesmo que tenha lido Heidegger, poucos leram pelo menos na integra O ser e o tempo, ou outra obra que julgo importante A origem da obra de arte, e a mais polêmica (pelo menos atualmente) que é Cartas sobre o humanismo, não apenas porque Sloterdijk a refugou, mas porque pensar o que é o humanismo hoje é a tarefa mais importante para tentar salvar a civilização.

Basta olhar ao redor, da pandemia a guerra, a extrema e as vezes irracional politização política, e não só tudo isto, mas principalmente o olhar e o pensar aguçado que via além das aparência.

Existem duas biografias boas de Heidegger, uma de Hugo Ott, que li pedaços e outra que li e passei para tantos amigos que é a de Rudiger Safranski, as duas merecem ser lidas e não são Heidegger.

No caminho da floresta, o tempo que Heidegger passou ao redor da fogueira, onde fumava cachimbo com os camponeses e lenhadores da Floresta Negra, se conta que em silêncio, talvez diga mais de Heidegger do que sua filosofia, diga algo da poesia que não escreveu, mas viveu.

Foi lá numa entrevista que Heidegger concedeu a Der Spiegel que ele disse (não num tom religioso e sim num tom de descrença) falou a frase: “Só um Deus poderá salvar-nos”, e tinha razão.

A cabana rústica e simples que Heidegger habitou durante o tempo que escreveu o Ser e o Tempo, também foi o seu refúgio no tempo do Caminho da Floresta, e de um curto escrito pouco conhecido que “Paisagem Criativa: por que perpassemos na província”, que não é um elogio a província, mas a necessidade de uma contemplação que a vida urbana tinha perdido, um caminho parecido com aquele que um filosofo mais jovem Byung-Chul Han escreveu em A sociedade do cansaço.

Está escrito em “Paisagem criativa”: “O habitante da cidade acha que “se mistura com o povo” assim que se digna a ter uma longa conversa com um camponês. À noite, num intervalo de trabalho, quando me sento junto à lareira com os camponeses, ou à mesa no Herrgott swinkel5 , então, na maioria das vezes, não falamos nada. Fumamos nossos cachimbos em silêncio”, a nota esclarece que Herrgottswinkel é um estabelecimento no campo.

Assim não se trata de isolamento ou provincianismo, mas uma pausa para retomar o caminho.  

 

HEIDEGGER, M. Paisagem Criativa: Por que permanecemos na província , in: Idéia. Campinas (SP)|n. 9, 2014.  

 

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