Serenidade e o pensamento que calcula
O livro “A Serenidade” de Heidegger vai dividir o pensamento contemporâneo entre o que calcula e o que medita, sobre o que calcula afirma:
“O pensamento que calcula (das rechnende Denken) faz cálculos. Faz cálculos com possibilidades continuamente novas, sempre com maiores perspectivas e simultaneamente mais econômicas. O pensamento que calcula vai de oportunidade em oportunidade. O pensamento que calcula nunca para, nunca chega a meditar.” (p. 13).
Ele argumenta que não se trata de uma meditação “elevada”, todo homem pensa e o pensamento pode levar a meditação, basta meditar sobre o aqui e agora que está a nossa volta.
Heidegger lembra que todos devemos pensar sobre nossas raízes, dito de modo mais contemporâneo não negar nossas origens e suas influências em nossa visão de mundo, mesmo que limitada, afirma: “o enraizamento (die Bodentändigkeit) do Homem actual está ameaçado na sua mais íntima essência. Mais: a perda do enraizamento não é provocada somente por circunstâncias externas e fatalidades do destino, nem é o efeito da negligência e do modo superficial dos Homens. A perda do enraizamento provém do espírito da época no qual todos nós nascemos” (p. 17).
É isto que faz Heidegger e outros filósofos atuais analisar os fundamentos do pensamento atual, Edgar Morin também fala desta necessidade de superar este pensamento alertando para a visão contemporânea da educação.
A mais atual e surpreendente visão de Heidegger, publicada em 1955, é a característica de nossa época onde “a mais atormentadora é a bomba atômica”, ele percebe que o pensamento que calcula vê apenas as possibilidades industriais e liberação das energias da natureza, porém o filósofo medita sobre o que significa este domínio.
“O poder oculto na técnica contemporânea determina a relação do Homem com aquilo que existe. Domina a Terra inteira. O Homem começa já a sair da Terra em direção ao espaço cósmico …” (p. 19), que além de ser incrivelmente atual tinha também um presságio sobre o futuro.
Mas não deixou de ver o perigo destas “grandes energias atómicas”, e assim: “assegura à humanidade que tais energias colossais, subitamente, em qualquer parte – mesmo sem ações bélicas -, não fogem ao nosso controle, e “tomam o freio nos dentes” e aniquilam tudo ?” (p.20).
Vimos os acidentes de Chernobyl e Fukushima (foto) esta perda de controle, agora vemos a uma guerra que aponta para o uso bélico destas forças, Heidegger tem razão ao pedir serenidade e meditação.
HEIDEGGER, M. Serenidade. trad. Tradução de Maria Madalena Andrade e Olga Santos. Lisboa: Instituto Piaget, s/d.