Perdão, utopias e mudança
Não só pessoalmente, mas principalmente socialmente o perdão pode mover a história no caminho inverso do ódio, da guerra e da opressão, isto não é diferente em muitas religiões, afinal a “regra de ouro”, não faz ao outro aqui que não gostaria que fosse feito a si, está presente nas grandes religiões e culturas contemporâneas.
Há vários textos e discursos sobre o perdão que não estão conexos com a realidade, por exemplo, quem perdoa nem sempre esquece, o perdão deve reparar o dano, porém não significa que isto seja proporcional, muitas vezes não é.
Cada ofensa se repetida não deve ser perdoada, lembremos do ensinamento de Jesus: “setenta vezes sete” (Mt 18, 21), apenas para dizer muitas vezes, e se entendemos que o erro é mais comum do que imaginamos (veja os vários posts desta semana) pode-se entender melhor a oração dada pelo próprio Jesus: “perdoai nossas ofensas, assim como perdoamos o quem nos tenha ofendido”, este é o caminho possível do Amor em muitas dimensões.
Lembro que este trecho vem logo depois da passagem que Jesus pede a unidade das pessoas (não precisam ser cristãos, mas estarem “em seu nome”), “onde estiverem dois ou três em meu nome, aí estou no meio deles” (Mt 18,20), assim não há proprietários desta “presença”, inclusive ela pode não estão entre pessoas que são religiosas.
Karl Jaspers (1883, 1969), que influenciou muitos dos pensadores modernos como Hannah Arendt e Heidegger, em seu livro Introdução ao Pensamento filosófico indagava sobre o caminho que já trilhávamos muitos anos atrás:
“Irritamo-nos mutuamente. A psicologia profunda surge como refúgio que tudo obscurece. A superstição científica leva a recorrer, para busca de salvação, às pseudociências. E nos dizem: quando tiverem desaparecido todas as ficções e ideologias, o homem, até agora doente e alienado (em sentido etimológico), recuperará saúde. E a saúde é a felicidade, o fim supremo” (Jaspers, 1965, p. 30).
É claro que existe ciência verdadeira que não é pseudociência, e que a felicidade que não tem bula nem fórmula, pode e deve ser almejada, porém a recuperação da saúde emocional depende de rever a história e daí caminhar para frente.
JASPERS, K. Introdução ao pensamento filosófico. SP: Cultrix, 1965.