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Por uma verdadeira ascese

23 jan

Peter Sloterdijk mesmo sendo um agnóstico aponta um defeito “espiritual” da sociedade atual, vive uma ascese desespiritulizada, isto, é uma “sociedade de exercícios” que não levam a uma verdadeira “ascensão” interior, vivem agitados, procurando a “eficiência” caem na “Sociedade do cansaço”.

A falta de tempo para a meditação, para o exercício da mente e da alma, está levando ao “brainrot”, palavra do momento segundo a Universidade de Oxford, que a incluiu no dicionário, significa cérebro podre, não se trata apenas do consumo de má informação, o desconhecimento e o pouco exercício de uma “vita contemplativa” como pede Byung Chul Han cria um espaço na mente para este tipo de pensamento crescer.

Criamos uma cultura que não é nem contracultura num sentido de evolução civilizatória, é apenas algo podre, bombardeamos nosso cérebro de fragmentos de pensamentos, de fragmentos espirituais sem que eles se completem e formem dentro de nós uma verdadeira ascese espiritual.

É o ativismo vazio, para preenche-lo precisamos de mais narcóticos e alimentos que preenchem o vazio corporal enquanto a mente permanece vazia, este mesmo vazio que poderia servir para criar uma “vita contemplativa” que desse sustento a uma ascese e a um equilíbrio do círculo virtuoso.

Chul Han lembra também da pintura, citando a obra do francês Paul Cézanne: “Pintar não significa nada mais do que ´soltar a amizade de todas essas coisas ao ar livre’ ” (Han, 2023, p. 49), significa “encontrar a concordância das coisas, ou seja, da verdade” (idem) (na foto a obra Monte Sainte-Victoire de Cézanne), a perda da cultura (ou o que restou dela segundo Antoine Daniels) é isto incapacidade de ver o belo e a verdade.

É claro que uma verdadeira ascese, no sentido espiritual, não pode deixar de se encontrar com o divino, e quantos “exercícios” inúteis que depois de um “banho de espiritualidade” caem no vazio e sem encontrar o ser, como afirma Han: “nas camadas profundas do ser, eles são suspensos” (Han, 2023, p. 49).

Lançar-se sobre o divino, para a espiritualidade cristã lançar-se em Jesus, em sua sabedoria e não apenas em discursos sobre ideologias, consumo, riqueza e todas superficialidades modernas, não é apenas a cultura midiática que faz isto, é a ausência de valores estruturais da virtude e da moral.

“A paisagem da inatividade”, escreve Byung Chul-Han sobre Cézanne, “rompe com a natureza tornada humana e restaura uma ordem não humanizada das coisas, na qual elas podem se encontrar” (Han, pag. 50).

Ainda citando Cézanne: “Ah! Nunca se pintou a paisagem. O ser humano não deve estar aí, mas sim ter encontrado inteiramente na paisagem” (pg. 51), deve-se “fazer silêncio” ao “eu barulhento”.

Quantas pessoas participam da “sociedade de exercício” apenas para rir e se emocionar, sem ter “entrado na paisagem”, sem o menor contato com o divino, precisam do barulho, da comida e da bebida para empanturrar-se do vazio que possuem na alma e não no estomago e nos nervos.

Somente um exercício de verdadeira ascese podem nos conduzir ao Amor, síntese das virtudes, mas sem esquece-las: nos introduz em equilíbrio, coragem, escuta e sincera relação social.

HAN, B. C. Vita Contemplativa: ou sobre a inatividade. Trad. De Lucas Machado. Petrópolis, RJ: Vozes, 2023.

 

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