O desprezo pelas massas e a multidão
Desprezam-se as mídias, as redes e qualquer elaboração mesmo que científica feita pela “massa” termo usado por Peter Sloterdijk em seu livro “Desprezo das massas” (Estação Liberdade, 2001), mas que pode muito bem ser substituído por um adjetivo mais correto: a “multidão”.
O livro nasceu de um diálogo com Elias Canetti e seu diagnóstico acerca da agressividade da “massa” e estendeu-se em um diálogo com Heidegger, Nietzsche, Foucault, Rorty (critica neste a sua aposta em uma estupidez anti-filosófica) e alguns outros, curiosamente em alguns momentos chega a citar a teologia da graça, e esta é sua tônica dizem o que os “amantes das massas inteligentes” vai afirmar: “Por essa razão em todo mundo crescem como erva daninha aquelas comissões de ética que, como institutos da destroçada filosofia, querem substituir os sábios.” (p. 99)
Identifica imediatamente a multidão nem passividade nem objetividade, mas: “Só o fato de que a multidão moderna, ativada e subjetivada, passa a ser insistentemente chamada de massa pelos seus porta-vozes e pelos que a desprezam, já aponta para que a ascensão à soberania do maior número possa ser percebida como um processo inacabado, talvez inacabável.” (p. 12)
Ao contrário de outros modernos tardios, Sloterdijk se posiciona: “A massa não reunida e não reunível na sociedade pós-moderna não possui mais, por essa razão, um sentimento de corpo e espaço próprios; ela não se vê mais confluir e agir, não sente mais sua natureza pulsante; não produz mais um grito conjunto. Distancia-se cada vez mais da possibilidade de passar de suas rotinas práticas e indolentes para um aguçamento revolucionário.” (p. 21).
Daí nasce os dois desprezos da elite “engajada” e da elite econômica, afirma: “Necessariamente aparece duas vezes também o segundo desprezo, ou desprezo composto, uma vez de baixo, como desprezo ofensivo das elites por parte das novas massas flexibilizadas, que fazem de seu modo de vida a medida de todas as coisas e querem libertar-se de seu observador que as despreza; e como desprezo das massas e de seu amplo idioma por meio dos últimos elitistas, que sabem desprezados seus objetivos pela massa e pressentem que na cultura de massas em organização acabou de uma vez por todas aquilo com que se importam.” (p. 70)
E esclarece o pretenso “engajamento”, como: “Essa primeira ciência humana engajada não esquece sua missão em tempo algum. Com seriedade metódica e fineza estratégica ela persegue seu objetivo pretendido: se for necessário suprimir a própria essência — por causa das diferenças essenciais a serem negadas —, ela também pagará esse preço.” (p. 87)
O texto provocou uma polêmica em função do futuro do humanismo, portanto não há final, apenas que a massa quer ser multidão, as redes, os blogs e os heróis anônimos estão aí.