Apagamento, invisibilidade e política
Não é ignorado na história o fato que o estado sendo um “possível” solucionador de conflitos, tenha tomado para si o direito da violência, que em última instância é o direito de matar.
O filósofo camaronês Achille Mbembe tomou este extremo do poder do estado para desenvolver sua tese sobre o direito de matar do estado, chamando-esta política de “Necropoder”.
O ensaio foi traduzido para o português em 2018, e no centro deste ensaio há uma pergunta sobre quem pode viver ou morrer no mundo contemporâneo? Mbembe denúncia que a função dos Estados, deveria ter a defesa da vida dos mais vulneráveis como um princípio, e não aquilo que é feito estruturalmente que é o apagamento da memória e das condições destas vidas.
Vemos que para além do apagamento há uma permanente invisibilidade destas pessoas, por uma camada que está ligada ao poder, chegando ao limite de não ter registro civil e direitos culturais.
Abordada no que diz respeito ao esquecimento (ou invisibilidade social) e silenciamento feito pelo Estado relativo ao passado histórico destes grupos vulneráveis, ela é além do campo acadêmico, a memória social, cognitiva e identitária daquilo que foi vivido no passado e que é vergonhoso não só pelo esquecimento e invisibilidade, mas feito a partir de uma narrativa oposta à sua memória.
Se olharmos a partir do pensamento complexo, que significa etimologicamente tecido junto (complexus), o termo biológico “necrose” remete a questões que envolve a morte biológica de tecidos corpóreos ou parte deles, assim, não se pode pensar na morte de uma parte sem que todo o corpo sofra, ainda que não procure ver o tecido que está em falência.
É importante abordar a complexidade deste conceito de necropolítica e invisibilidade, porque só ele pode abordar os problemas que envolvem o racismo, o sexismo e o apagamento de diversas culturas (como a indígena, mas há muitas outras no mundo contemporâneo), a já conhecida e não resolvida dimensão econômica, que é o acesso a bens e serviços sociais, une-se a dimensão política (os espaços de poder), a construção de narrativas e historicidade de subjugar culturas (a dimensão psicológica) e a abrangente dimensão cultural.
Partir da miséria e invisibilidade de povos, culturas e raças, não pode negar fatores estruturais que são fortes e impedem uma mudança mais sustentável de convivência pacífica e harmônica.