A clareira, o desvelar e Ser
A clareira é um pequeno espaço com luz que se abre no meio da floresta, Heidegger faz a definição no sentido filosófico assim: “O destino se apropria como a clareira do ser, que é, enquanto clareira. É a clareira que outorga a proximidade do ser. Nessa proximidade, na clareira do dar lugar, mora o homem como ex-sistente, sem que ele já possa hoje experimentar e assumir esse morar” (Heidegger, 1979), neste sentido o ser se apropria de um “morar” verdadeiro e eterno.
A clareira é então o lugar do desvelar do Ser, em sua temporalidade de ex-sistente ele experimenta, por sua condição finita, um morar agradável e sensível, quase eterno, no entanto temporário como ente.
Então a clareira parte da condição humana, e não é apenas a Teofania divina, entretanto a narrativa bíblica dá ao Jesus humano e temporal em um momento específico no monte Tabor, já postamos algo sobre o tema, mas no sentido da ascese da alma, aqui deseja-se completá-la num desvelar.
Conforme postamos anteriormente, é possível tanto um revelar quanto um desvelar humano, no primeiro caso uma compreensão temporária que se re-vela (esclarece, mas permanecem dúvidas novas) e o desvelar, muitas vezes parcialmente incompreensível ao ser humano por sua finitude cognitiva ou uma ascese mística cujos detalhes são muitas vezes de difícil comunicação pela ausência de palavras ou metáforas apropriadas, como uma obra de arte.
Na narrativa bíblica é no Monte Tabor onde ocorre uma Teofania, não foi no batismo de Jesus e nem nos milagres que ela aconteceu, ao subir o monte Jesus leva três discípulos mais próximos: João, Pedro e Tiago e diante dos olhos deles se transfigura e aparece ao lado de Moisés e Elias, diz a narrativa (Mt 17. 2-3):
“E foi transfigurado diante deles; o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz. 3Nisto apareceram-lhes Moisés e Elias, conversando com Jesus”.
Os apóstolos sentem a “clareira” e querem ficar ali e construir três tendas, depois uma nuvem os cobrem, como no tabernáculo de Moisés, ouvem uma locução divina e prostram o rosto por terra, Jesus os acalma e quando levantam os olhos veem apenas Jesus e descem a montanha.
Para os que não creem a narrativa bíblica é imaginária, mas ajuda a entender o desvelar.
HEIDEGGER, Martin. “O fim da filosofia e a tarefa do pensamento”. In: Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 79.