Entre as alturas e a pequenez humana
Antes de conseguir as viagens aéreas, agora as espaciais, o homem se deliciava com as alturas das montanhas, as paisagens vertiginosas dos picos, desfiladeiros e caminhos nas alturas que pudessem contemplar as casas, cidades e vegetações ao longe.
Um texto que fala destas sensações, e o início da filosofia de Schopenhauer foi escrito por Rüdiger Safranski, autor de obras consagradas sobre Heidegger e Nietzsche, que também escreveu sobre o rebelde filósofo Arthur Schopenhauer em obra intitulada: “Schopenhauer e os anos mais selvagens da filosofia” (São Paulo: Geração Editorial, 2011).
Nela o autor conta a experiência de Schopenhauer aos 16 anos quando escalou o Monte Pilatus (perto de Lucerna, na Suiça) em companhia de um guia da montanha, diz o texto: “Senti uma vertigem quando vi pela primeira vez aquele espaço abrangente que se entendia a minha frente … Percebi que tal panorama, visto do alto da montanha, era tão extraordinário que me levava à ampliação de todos os meus conceitos anteriores. É tão diferente de tudo o mais que se torna impossível fazer uma descrição real de sua abrangência para quem não teve a oportunidade de vê-lo”.
Continua o texto: “Todos os objetos menores simplesmente desaparecem, apenas a grandeza pode ser entendida em seu conjunto. Todas as coisas se misturam umas com as outras; não se enxerga mais uma quantidade menor de objetos isolados, mas uma imagem imensa, colorida, brilhante, sobre a qual o olhar se prende por longo tempo, cheio de prazer”, destaque nosso.
A sagacidade de Safranski ao descrever o filósofo é importante para entender como vê o belo e o mundo, ele não vê mais os “objetos isolados”, mas nos olhos tornamos somente “os olhos” sobre uma “imagem imensa, colorida e brilhante”.
Conta outra experiência forte, mas esta mais “humana”, quando em 30 de julho de 1804, quando a grande viagem já se aproxima de seu fim, chega a escalada da montanha Scheekopp (O Pico da Neve), na Silésia, então alemão, mas hoje na Polónia. A foto acima bem antiga é desta região, nesta região ao subir a montanha tiveram que parar a noite numa cabana em um planalto intermediário, no sopé do cume mais alto da montanha (a montanha ao fundo).
Diz sobre esta experiência “entramos em uma peça única cheia de pastore embriagados … Era insuportável sua quentura animalesca … produzia um calor candente”, diz Safranski da passagem que “foi daqui que Schopenhauer tirou sua metáfora posterior dos porcos-espinho que se empurravam uns contra os outros para se defenderem do frio e do medo”, os leitores de Schopenhauer entenderão a imagem que de certa forma permeia seu discurso.
Há um mérito em Schopenhauer de tirar todo idealismo e romantismo da leitura filosófica e literária do seu tempo, sua visão de enxergar os objetos “do alto” o fez escapar do idealismo, mas sua visão dos homens é pessimista e a metáfora dos porcos-espinho demonstra isto.
Em uma armação da choupana onde está preso um livro para anotar recordações, está o que foi escrito por Schopenhauer: “Quem pode erguer-se sobre as montanhas e depois calar-se?”.
Porém as descobertas do pós-idealismo, pós-iluminismo é que o Cosmos é maior e enigmático.