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Filosofia oriental e o idealismo

08 mai

Em sua análise crítica do idealismo, Han inicia reafirmando a metáfora do “espelho vazio” no qual repousa a ausência do “eu desejante, sobre um coração em jejum”, ao contrário de Fichte (1752-1814) “filósofo do eu e do estado-de-ação”, um dos expoentes do idealismo alemão.

 Citando Fichte, em seu livro sobre a Ausência: “o sistema da liberdade satisfaz meu coração, o sistema oposto o mata e aniquila. Ficar frio e morto, apenas observando a mudança dos acontecimentos, um espelho inerte das figuras que passam e escapam – essa existência me é insuportável, eu a desprezo e execro” (Han, p. 34).

Ele vai lembra a doutrina da “felicidade celestial” (tian le, 天樂, Z. livro 13) de Ziang Zhou, uma “felicidade suprema” (zhi le, 至樂 , Z. Livro 18), já de outro modo a sorte (fu, 福) repousa sobre uma diferença ou presença, “uma percepção parcial”, quem aspira a sorte acaba se entregando ao azar (Z. livro 15) (Han, 2024, p. 35).

É importante notar que “a ausência de sentido não conduz ao niilismo, mas é uma felicidade celestial com o ser que não tem direção nem rastro” (idem, p. 35).

A doutrina da felicidade celestial de Zhuan Zhou é diametralmente “oposta à doutrina kantiana da felicidade”, em sua antropologia Kant observa que “preencher o tempo com ocupações que progridem um grande fim proposto” é “o único meio seguro de se tornar feliz com a própria vida e, ao mesmo tempo, também saciado dela” (Han pgs. 35-37 citando a obra de Kant Antropologia de um ponto de vista pragmático).

Kant compara a vida a uma jornada, termo presente em muitas narrativas ocidentais, e que elas ocasionam na memória a “inferência […] de que se percorreu um grande espaço e, por conseguinte, também a inferência de um tempo mais longo exigido para isso” (Han citando Kant), para ele Ser é agir, onde “a ausência de objetos perceptíveis, engendra retrospectivamente o sentimento de um tempo mais curto” (Han, 2024, p. 36).

Tanto para Laozi como para Zhuang Zhou “um projeto de existência e um mundo inteiramente distinto são possíveis” (idem, p. 36).

Para estes mestres orientais: “o mundo, com cujo curso natural o ser humano deve se resignar, não é narrativamente estruturado. Por isso ele também é resistente à crise do sentido, que é sempre uma crise narrativa” e o “mundo impelido a uma trajetória narrativa estreita e reduzido”, esta narração e seleção de sentido são uma “exclusão massivas, ou ao mesmo tempo uma diminuição do mundo”. (HAN, 2024, p. 37).

A ideia de nações fechadas, de estruturas belicistas de poder fez o mundo ficar reduzido a narrativas “estreitas”, enquanto Zhuang Zhou ensina a conectar o mundo inteiro, a ser “tão grande quanto o mundo, elevar-se ao mundo inteiro em vez de agarrar-se a uma pequena narrativa e a uma distinção” (HAN, 2024, p. 38).

 

HAN, B.C. Ausência: sobre a cultura e a filosofia do extremo oriente. Trad. Rafael Zambonelli. Petrópolis, RJ, Vozes, 2024. 

KANT, I. Antropologia do ponto de vista pragmático. São Paulo: Iluminuras, 2006.

 

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