
Neosofisma, inimizade e violência
A polis moderna, culto da civilização ocidental em crise, nasceu da necessidade de políticos que pudessem gerenciar o bem público com virtudes (aretê), verdadeiro conhecimento (episteme) e a justiça acima do que é vantajoso e benefício para determinado grupo.
Sócrates, visto pelo texto a República de Platão era o método de diálogo (dialética, mas no sentido grego) onde o poder da argumentação e da maiêutica, “parir” o conhecimento.
Assim é que o escrito Teeteto (ver post) de Platão discorre sobre o relativismo e a polis, o diálogo é o método socrático de investigação, incluindo a análise entre razão e sensação, tinha como objetivo principal superar o pensamento sofista que apenas justificava o poder, a despeito de qualquer virtude (moral ou ética) e de qualquer conceito razoável de justiça.
Por isto Teeteto é considerado o primeiro texto clássico sobre relativismo, e o diálogo como método socrático de vencer as dicotomias das formas oligárquicas de poder, tinha também a ideia da superação de toda forma de relativismo que envolvia a sede de poder dos soberanos.
Assim a República de Platão deveria ser relida pelos políticos contemporâneos e poderiam evitar o que chamamos de neo-sofismas, o que vale para o poder não vale para o povo, por exemplo, o que é vantajoso pode ser encontrado na epistemologia de Protágoras, onde segundo alguns comentadores (Chappell, 2005) que discorre sobre o “vantajoso” e a prudência política e moral, e são largamente aplicáveis a política contemporânea.
O sentido do que é vantajoso, Sócrates concede aos sujeitos da epistemologia de Protágoras a possibilidade de sustentarem suas convicções conforme a demanda particular ou social nas cidades, ao mesmo tempo que procura garantir para o estado uma esfera mínima de valores em torno do que é benéfico ou prejudicial, o destaque de mínima aqui é para boa compreensão.
O divórcio entre justiça e benefício conforme o comentador citado (Chappel, 2005), está bem na ordem do dia pois não é muito diferente entre a prudência política e moral atual, aqui incluo o que leva a violência na sociedade moderna, não apenas a falta de prudência como também o que a política moderna considera como justos os benefícios e imoralidades do círculo do poder.
Sócrates foi levado ao martírio, não por causa de cultuar falsos deuses, este era o argumento sofista (vale em certa medida também para a atualidade), mas por querer “parir” o verdadeiro conhecimento, justiça e moral pública, daí a violência do poder dos oligarcas e seus reis.
Claro, a humanidade caminhou 2 mil anos de lá até aqui, porém a polis atual vive uma crise parecida em certa medida às cidades gregas e a violência parece institucionalizada e sem freio.
CHAPPELL, T. Reading Plato’s Theaetetus. Indianápolis/Cambridge: Hackett, 2005.
PLATÃO. Teeteto. Trad. Adriana Manuela Nogueira e Marcelo Boeri. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010.