O Ser, a multidão e as classes
Multidão é o nome de uma imanência. Assim a multidão é um conjunto de singularidades e não uma unidade homogênea de partidários uniformizados e carregando a mesma bandeira.
É a partir desta premissa que pode-se esboçar uma conceitualização de ontologia que não prenda o ser humano a esquemas ideológicos ou temporais de liberdade e transcendência.
Conceitualização é quando o conceito não é homogêneo e permite a multiplicidade.
Na história conceituou-se povo e não multidão, embora Spinoza e Leibniz tenham esboçado.
O conceito de povo foi delineado dentro da tradição hegemônica da modernidade feito por Hobbes, Rousseau e Hegel e produziram, cada qual a seu modo porém todos idealistas, um conceito de povo assentado na transcendência do soberano: nas cabeças desses autores, a multidão era considerada como caos e como guerra, assim eles formaram o conceito do Estado Moderno para o qual a pós-modernidade chamou a atenção.
Sobre esta base, o pensamento da modernidade opera de uma maneira bipolar: abstraindo, por um lado, a multiplicidade das singularidades, unificando-a transcendentalmente no conceito de povo, e dissolvendo, por outro lado, o conjunto de singularidades (que constitui a multidão), para formar uma massa de indivíduos.
A teoria moderna do direito natural, seja em suas raízes empíricas ou ideológicas, é sempre um pensamento da transcendência e da dissolução do plano de imanência.
A teoria da multidão exige, ao contrário, que os sujeitos falem por si mesmos: trata-se muito mais de singularidades não-representáveis que de indivíduos proprietários do saber e da produção social.
A multidão é um conceito de classe, afirma o artigo de Antonio Negri(*), e não me parece desconfortável esta definição uma vez que ainda temos uma multidão de pessoas exploradas e a lógica do poder não parece ainda alcançá-las.
Com efeito, a multidão é sempre produtiva e está sempre em movimento.
Considerada a partir de uma perspectiva temporal, a multidão é explorada pela produção; de um ponto de vista espacial, a multidão é ainda explorada, na medida em que constitui a sociedade produtiva, a cooperação social para a produção.
Há diversas perspectivas que apontam para esta cooperação social.
As classes tiveram um papel na história, agora é a hora da multidão.
(*) NEGRI (2002), «Pour une définition ontologique de la multitude», en Multitudes nº 9, Paris, Exils.
.