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Essência, o justo e a ética
Ao discutir a “vida boa”, conceito clássico que Paul Riocour retoma em sua reflexão sobre o justo, ele o liga a filosofia clássica onde “ é “o desejo de uma ´vida boa´ com e para os outros em instituições justas”, e há problemas nas instituições democráticas, porque abandonou-se o conceito do ser.
A reflexão que fizemos sobre a questão do Ser em Heidegger, deixamos um link para o que é essência pensada como agir, on se diferencia o universal concreto de universal conceitual ou representacional, o agir é uma questão e não se pode reduzi-lo ao conceito, então envolve uma interioridade, e não apenas uma subjetividade ou objetividade, como queria Hegel.
Assim a justiça depende do Justo, que questiona e corrigi seu agir, nisto consiste a dialética Platônica, vista como a arte de pensar, de questionar e de organizar as ideias (eidos grego), e isto implica em corrigir a ação pelo pensar, não apenas punir, mas modificar o pensamento sobre a ação.
Não podemos apenas questionar os aspectos legais da justiça sem que cada homem, incluindo aqueles que praticaram crimes, possa repensar e agir de forma nova na condução de sua própria vida e da vida com os outros, claro há reincidentes, mas tanto as normas para isto são claras, para a correção não.
O que há de fundo na eticidade de Hegel, e insto perpassa o pensamento de Rawls é que devemos sempre optar entre dois males, quando é possível corrigir tanto o mal menor (de onde se originam maus maiores) como o mal maior para repensar a sociedade e a justiça, inclusive na distribuição dos bens sociais.
O longo discurso de Jesus aos seus discípulos em Mt 5,17-37, ele explica que a justiça deles deveria ser superior a dos homens, começa explicando que não veio abolir a lei e os profetas, mas dar a ela maior amplidão, depois explica sobre não matar, e diz que mesmo quem se encoleriza contra os irmãos já está pecando, enfim vai dando a cada ensinamento “legal” maior profundidade, e assim não é mero legalismo, mas o pleno cumprimento do que é justo.
Aqueles que condenam a norma, e lembram apenas do fato dos fariseus não permitirem que Jesus curasse e fizesse o bem no sábado, sem dúvida uma hipocrisia, não podem esquecer que para Ele haviam “leis divinas”, que corrigiam a ação humana e que a sociedade moderna quer abolir.
A liberdade plena significa também a justiça plena, e não há sociedade justa sem homem justos, é preciso educa-los, isto se pensa desde Platão.
O justo e o legal
A legalidade evidentemente baseia-se nas leis, mesmo que estranhas ou questionáveis, ela é uma espécie de “contrato social” para se viver em sociedade, por isto o tema do post anterior é relevante, ainda mais se for considerado que o ponto mais alto do que é legal hoje é o neocontratualismo.
Paul Ricoeur escreveu em dois volumes sobre o assunto, feito na forma de ensaios, no terceiro ensaio ele trata da Teoria da Justiça de John Rawls, não só atesta sua atualidade como também ele reivindica aquilo que quase todos nós dissemos em um momento da nossa infância: “isto é injusto” e então isto precede ao sentido do Justo como também dizem respeito não só ao direito, mas a todas as pessoas.
Ricoeur no prefácio de Justo 1 já atenta para o detalhe que o tema está conectado a ideia do que é ético, na filosofia clássica, é “o desejo de uma ´vida boa´ com e para os outros em instituições justas”, e aqui situa-se boa parte da crise civilizatória: a desconfiança que há nas instituições democráticas.
A expressão “vida boa” retomada de Aristóteles é um qualificativo de bom num sentido estrito do ético, assim o bem é inseparável do bem do outro, sob a pena de nada mais ser do que um egoísmo repreensível, que rebaixa o sujeito no sentido do plano moral.
Dito de forma mais clara a relação com o outro é constitutiva da consciência de si, e ela é em certa medida um ético além do legal e do meramente moral.
Onde apenas é determinante a obediência, mesmo com uma conformidade interior à Lei moral, podendo ela ser incontornável de toda vida ética, essa tem algo para além da Lei, nela o homem deseja o Bem, aspira o Bem para si e para os outros, num sentido que torna-se também consciência para o outro.
É obvio que isto encontra uma barreira em nossas falhas, os maus sentimentos, as más ações, a violência que marcam a sociedade desde os tempos mais primitivos, neste sentido é preciso despertar a consciência da culpabilidade, que encerra nela a própria concepção de julgamento, isto significa limitar-se.
Por isto o tema da liberdade é relevante, deseja-se tolher qual liberdade e a pretexto de qual concepção de justiça, assim é preciso “instituições justas”.
Assim esta é a formula de Ricoeur: “: « o desejo de uma vida boa com e para os outros em instituições justas », sem elas o legal torna-se revoltante.
Porém é preciso dizer que as “instituições” não se limitam ao aspecto jurídico, do mesmo modo que o justo não se reduz ao legal, é preciso analisar a fundo.
Para explicar isto Ricoeur diz o que é consciência da Lei: “Aplicar uma norma a um caso particular é uma operação extremamente complexa, que implica um estilo de interpretação irredutível à mecânica do silogismo prático”, ou seja, simples regras lógicas, há não uma subjetividade, mas uma transcendência.
Ao fazer uma palestra a Associação L´Arche (fundada por Jean Vanier) que cuida de excepcionais, ele abordou o tema e falou de respeito ao tratar da diferença entre o normal e o patológico, apoiando-se nas obras de Georges Canguilhem, que discute a epistemologia da biologia.
RICOEUR, Paul. O justo ou a essência da justiça. Trad. Vasco Casimiro. Lisboa: Instituto Piaget, 1995.